Acórdão nº 452/21.5T8EPS.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 30 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelLÍGIA VENADE
Data da Resolução30 de Novembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes da 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I RELATÓRIO (seguindo o elaborado em 1ª instância).

Companhia De S..., SA, pessoa coletiva n.º ..., com sede na Rua ..., ...

...

, vem intentou a presente ação declarativa com forma de processo comum contra AA, portador do cartão de cidadão n.º ... e do NIF ..., residente na Travessa ... ...

...

, pedindo a condenação do réu no pagamento da quantia de €24.868,67, acrescida de juros de mora à taxa legal, contados desde a data de citação até integral pagamento.

Para tanto alegou, em síntese, que celebrou com o Réu, um contrato de seguro de responsabilidade civil obrigatório titulado pela apólice n. º ...18, por força do qual a responsabilidade pelos riscos decorrentes da circulação do veículo automóvel de matrícula ..-DV-.. foi transferida para a A..

Invocou ainda que no dia 06 de março de 2018, pelas 14:35 horas, ocorreu um acidente de viação na Estrada ...

- também denominada naquele local por Av. ...

- ao quilometro n.º 49,300 da mesma, na união das freguesias ... e BB, concelho ..., acidente esse do qual resultaram danos para terceiros.

Invocou ainda que o sinistro se deveu à conduta do réu, que descreve, alegando ainda que réu conduzia o veículo ..-DV-.. sob efeito do álcool, Cuma TAS de 2,751 g/l correspondente à TAS de 2,99 g/l registada, facto que contribuiu para a produção do sinistro.

Sustenta que ao abrigo da referida apólice, a A. aceitou a responsabilidade pelos danos causados no descrito acidente, tendo pago a quantia global de €24.868,67, a título de despesas e prejuízos suportados pela A. ao abrigo do citado contrato de seguro, quantia essa que pretende reaver do réu.

O réu contestou.

Excecionou, em primeiro lugar, a prescrição do direito da autora, por terem decorrido mais de 3 anos desde o sinistro em causa. Mais sustenta que, ainda que se contasse a data do início da prescrição desde a data do cumprimento pela autora, ainda assim, o eventual direito da autora estaria parcialmente prescrito.

No mais, impugna a matéria invocada pela autora e sustenta que nenhuma responsabilidade teve na produção do sinistro.

Impugna ainda os danos que o condutor do MO alega ter sofrido em consequência do acidente, sustentando que já existiam à data do mesmo, em particular as lombalgias identificadas no relatório da perícia de avaliação do dano corporal no âmbito da intentada ação emergente de acidente de trabalho.

Defende ainda que as patologias que o condutor do veículo MO alega ter sofrido em consequência do acidente são todas elas de natureza degenerativa e não traumática, alegando ainda que o embate do veículo DV, propriedade do Réu, no veículo MO, conduzido pelo CC ocorreu de forma suave, não existindo qualquer nexo de causalidade entre o embate e as lesões.

Exceciona ainda que que a Autora incumpriu com os deveres impostos nos artigos 33º e 36º do DL 291/2007, sustentando que manteve o réu completamente afastado de qualquer participação e compreensão sobre os procedimentos a adotar e adotados após o sinistro, tendo-lhe, designadamente, sido vedada a possibilidade de participar e controlar a ponderação da culpa, o estado dos veículos sinistrados e também discutir, se o valor da indemnização era o mais “justo” de acordo com as de acordo com as circunstâncias e segundo critérios de coerência, razoabilidade e adequabilidade.

Defende, por isso, que, não tendo o Réu qualquer intervenção nos valores pagos, deverá considera-se ilegítimo o exercício do direito de regresso da Autora, afastando-se, dessa forma, o pagamento de qualquer quantia por abuso do direito.

**A autora respondeu à exceção de prescrição, defendendo que não se verifica a exceção invocada.

**Realizou-se audiência prévia, atribuiu-se á causa o valor de € 24.868,67.

Proferiu despacho saneador e se conheceu da exceção de prescrição, tendo-se julgado a mesma improcedente.

Fixou-se o objeto do litígio e os temas de prova, sem reclamações.

**Realizou-se audiência de julgamento, tendo sido proferida sentença que julgou a ação parcialmente procedente, por provada, e, em consequência, condena-se o réu AA a pagar à autora Companhia de S..., SA a quantia de €24.703,52 (vinte e quatro mil, setecentos e três euros e cinquenta e dois cêntimos), acrescido dos juros, à taxa legal civil, vencidos desde a citação e vincendos até integral e efetivo pagamento. Mais imputou as custas às partes consoante o decaimento.

***Inconformada, o R. apresentou recurso com alegações que terminam com as seguintes -CONCLUSÕES-(que se reproduzem) “1. O Réu/Apelante recorre da douta sentença recorrida porquanto considera ilegítimo o exercício do direito de regresso da Autora/Apelada na medida em que foi completamente afastado da participação sobre os procedimentos, instruções e decisões, que foram adoptadas pela Autora/Apelada “Companhia de Seguros A..., SA após o sinistro.

  1. Violou a Autora/Apelada o dever de boa-fé na celebração e execução do contrato de seguro celebrado com o Réu/Apelante, actuando numa situação de abuso de direito nos termos do artigo 334 do C.C.

  2. A Autora/Apelada tinha a obrigação de informar o Réu/Apelante de todas as situações que configuram a possibilidade de agir em direito de regresso, o que nunca sucedeu, nem na celebração, quer na execução do contrato de seguro (consiste num dever especial de comunicação e informação totalmente desconsiderado).

  3. O Tribunal “a quo” deu como facto provado no ponto 69 dos factos provados Autora/Apelada não comunicou ao réu/apelante a assunção da responsabilidade e as diligências adotadas na regularização do sinistro.

  4. Tal facto dado como provado (ponto 69) resultou do depoimento do réu, que atestou que nunca recebeu qualquer comunicação da Autora/Apelada, conjugado com os demais elementos probatórios, designadamente do depoimento da testemunha (das Autora) DD e dos documentos juntos aos autos, mormente com o teor da missiva junta a fls.

    186 que data 25/3/2021, não se mostrando junta aos autos qualquer comunicação que ponha em causa as declarações do réu.

  5. Incumpriu, assim, a Autora/Apelada com os seus deveres impostos nos artigos 33º e 36º do DL 291/2007, tendo o Réu/Apelante sido mantido completamente afastado de qualquer participação e compreensão sobre os procedimentos adoptados após o sinistro, tendo-lhe, designadamente, sido vedada a possibilidade de participar e controlar a ponderação da culpa, o estado dos veículos sinistrados e também discutir, se o valor da indemnização era o mais “justo” de acordo com as de acordo com as circunstâncias e segundo critérios de coerência, razoabilidade e adequabilidade.

  6. Não tendo, assim, o Réu/Apelante qualquer intervenção nos valores pagos (que poderiam, na realidade, ser outros, diga-se, avultados e desproporcionais), considera-se ilegítimo o exercício do direito de regresso da Autora/Apelada, afastando-se, dessa forma, o pagamento de qualquer quantia.

  7. 0 principio da boa-fé processual afasta a possibilidade de decisões surpresa, sem que tenha sido dada a possibilidade ás partes de apresentarem a sua defesa, exercendo eficazmente o contraditório no momento e sede próprias.

  8. O Tribunal “a quo” sustenta a sua posição nos artigos 31º, 33º, 34º, 36º e 37º do Decreto-Lei 291/2007, de 21/08, que transpõe parcialmente para ordem jurídica interna a Directiva n.

    º 2005/14/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de Maio, que altera as Directivas n.os 72/166/CEE, 84/5/CEE, 88/357/CEE e 90/232/CEE, do Conselho, e a Directiva 2000/26/CE, relativas ao seguro de responsabilidade civil resultante da circulação de veículos automóveis («5.ª Directiva sobre o Seguro Automóvel»).

  9. Contudo, a interpretação que o Tribunal “a quo” faz destes artigos 31º, 33º, 34º, 36º e 37º do Decreto-Lei 291/2007, de 21/08, é manifestamente redutora, desproporcional e lesiva dos Réu/Apelante , pois considera, desde, logo, fazendo alusão à alínea a) do artigo 36, que a empresa de seguros pode discricionariamente proceder, após o sinistro ,ao primeiro contacto, com o tomador de seguro, com segurado ou com o terceiro lesado, ou seja, considera afastada a necessidade de contactar o tomador de seguro/segurado.

  10. Não colhemos tal sustentação jurídica, omitindo por completo a Autora/Apelada o cumprimento do disposto nos artigos 33º e 36º do Decreto-Lei 291/2007, ou seja, a Autora/Apelada não prestou ao Réu/Apelante nenhuma informação relativamente aos procedimentos que adoptou no sinistro sinistro ( artigo 33 ); não procedeu ao contacto com o Réu/Apelante no prazo de dois dias úteis, marcando as peritagens ( artigo 36º, alínea a)) não notificou o Réu/Apelante da data da conclusão das peritagens (artigo 36º, alínea c)), não disponibilizou ao Réu/Apelante os relatórios das peritagens realizadas (artigo 36º, alínea d)) e, por fim, não comunicou ao Réu/Apelante que tinha assumido a responsabilidade do sinistro.

    (artigo 36º, alínea e)).

  11. Acresce que a Autora/Apelada não só fez letra “morta” da lei ao não dar cumprimento ao disposto nos artigos 33º e 36º do Decreto-Lei 291/2007, como foi mais longe ao afastar completamente o Réu/Apelante de todas as acções judiciais, averiguações e perícias realizadas e que levaram ao pagamento da quantia que reclamou de € 24.868,67.

  12. Na verdade, o Réu/Apelante não foi informado da existência de uma açcão de acidente de trabalho que correu termos no Tribunal de Trabalho ... sob o n.º 4008/18.... (transitada em julgado à data da entrada em juízo da acção); não foi informado da existência de uma acção comum de indemnização por danos não patrimoniais que correu termo no Juiz ... Tribunal Judicial ... sob o n.º n.

    º 119/21.... (transitada em julgado à data da entrada em juízo da acção), e nunca foi informado sobre o estado das diligências levadas a cabo para a quantificação dos danos, tendo apenas sido informado, por simples carta, do montante a pagar à Autora/Apelada, em sede de direito de Regresso.

  13. Omitindo e descurando por completo qualquer informação ao Réu/Recorrente, incluindo a sua...

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