Acórdão nº 446/20.8T8BGC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 30 de Novembro de 2022
Magistrado Responsável | FRANCISCO SOUSA PEREIRA |
Data da Resolução | 30 de Novembro de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães Apelantes: AA e BB Apelada: Unidade Local de Saúde do ..., EPE I – RELATÓRIO As autoras, AA e BB, ambas nos autos melhor identificadas, intentaram acção, sob a forma de processo comum – intentaram acções autónomas mas foi determinada a sua apensação -, no Juízo de Trabalho ..., contra Unidade Local de Saúde do ..., EPE (U..., EPE), também com os sinais dos autos, pedindo a condenação da Ré a: 1 - reconhecer que as autoras são enfermeiras especialistas e que praticam funções próprias do conteúdo funcional da categoria de enfermeiro especialista, em consequência, 2 – reconhecer que as autoras têm direito ao pagamento de um suplemento remuneratório no valor de 150,00€ desde o dia .../.../2018; 3 – pagar a cada uma das AA. a quantia vencida de 4500,00€ devida a título de pagamento do peticionado suplemento remuneratório.
4 - pagar às AA. a importância correspondente a juros de mora liquidados sobre a totalidade da quantia referida, vencidos desde a data da respectiva constituição em mora e vincendos até integral e efectivo pagamento.
Para tanto, e seguindo a sentença recorrida, alegaram as AA., em síntese, que: Foram admitidas ao serviço da ré, a primeira em 7/7/2010 e a segunda em 21/12/2015, por contrato de trabalho, para exercerem as funções da categoria de enfermeira, bem como todas as funções afins ou funcionalmente ligadas aquela categoria; As autoras são enfermeiras com especialização em saúde materna/obstetrícia; Apesar de estarem adstritas ao serviço de urgência geral, desde que iniciaram a relação laboral, as AA. sempre exerceram funções na área em que se especializaram, desenvolvendo assim competências próprias na sua área de especialização em saúde materna/obstetrícia; As autoras prestam cuidados de enfermagem diferenciados e complexos, dentro da sua área de especialidade e coordenam a supervisão clínica de estudantes de enfermagem; Deste modo, as autoras exercem competências que integram o conteúdo funcional do enfermeiro especialista previsto no art. 10.º - A do Decreto-lei 248/2009 de 22/09 com a redação que lhe foi conferida pelo artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 71/2019 de 27-05; Em virtude do desenvolvimento do conteúdo funcional previsto no art. 10.º - A do Decreto Lei 248/2009 de 22/09, e estando habilitadas com o título de enfermeira especialista, as autoras deveriam estar inseridas na categoria de enfermeira especialista, e têm direito ao pagamento de um suplemento remuneratório no valor de 150,00€; As autoras por várias vezes solicitaram à ré a inserção na categoria de enfermeira especialista e o pagamento daquele suplemento, todavia a mesma nunca procedeu a essa atribuição, ignorando este direito das autoras; Vários colegas de trabalho, enfermeiros ao serviço da Unidade Local de Saúde do ..., EPE, desenvolvem as mesmas funções que as AA., e estes recebem o referido suplemento e estão inseridos na categoria de enfermeiro especialista; O que revela uma diferenciação arbitrária de tratamento por parte da ré, em violação da igualdade de retribuição para trabalho igual em natureza, quantidade e qualidade.
Aquando da audiência de partes, frustrou-se a conciliação.
Notificada para contestar, a R. excepcionou a sua ilegitimidade passiva e a incompetência deste tribunal, alegando, em síntese, que para efeitos do pagamento do suplemento remuneratório peticionados pelas AA. consideram-se apenas os postos de trabalho aprovados por despacho dos membros do Governo da área das Finanças e da Saúde e que a alteração do número de postos de trabalho depende também de autorização prévia dos mesmos membros do Governo, que a pretensão das AA. contende com tais regras e o pagamento do suplemento remuneratório seria ilegal, incorrendo os respectivos gestores em responsabilidade financeira, pelo que deveriam ser demandados judicialmente em sede própria os autores de tal despacho conjuntamente com a R.
Mais impugnou, no essencial, os factos alegados pelas AA., sustentando que as AA. sempre exerceram funções no serviço de urgência, onde não se procede a qualquer atendimento de urgência na área de saúde materno/obstetra pelo que nunca exerceram quaisquer competências ou responsabilidades inerentes ao conteúdo específico da categoria de enfermeiro especialista em enfermagem de saúde materna e obstétrica tal como definidas em regulamento próprio da Ordem dos Enfermeiros.
Foi, em ambas as acções, proferido despacho de aperfeiçoamento.
As AA. corresponderam ao convite, apresentando novas petições iniciais.
A R. deduziu impugnação motivada aos novos factos alegados.
No âmbito da audiência prévia (em que foi ordenada a apensação das acções), foi prolatado despacho saneador, no qual se conheceu das excepções invocadas pela R., que foram julgadas improcedentes, tendo-se decidido pela competência material do tribunal e pela legitimidade passiva da ré. Foi fixado o obejecto do litígio e dispensada a enunciação dos temas da prova.
Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, após o que foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: “Pelo exposto, julgo totalmente improcedentes, por não provadas, as presentes acções e, em consequência, absolvo a Ré Unidade Local de Saúde do ..., EPE do pedido contra si formulado pelas AA. AA e BB.” Inconformadas com esta decisão, dela vieram as autoras interpor o presente recurso de apelação para este Tribunal da Relação de Guimarães, apresentando alegações que terminam mediante a formulação das seguintes conclusões (transcrição): “1. As Autoras não se conformando com a matéria de facto dada como provada, com a interpretação conferida aos factos dados como provados nem quanto à aplicação do direito na análise destes factos dados como provados, apresentam recurso da sentença, nos termos dos art. 79.º n.º 1 al. a), 79.ºA n.º 1 al. a) e 80.º do CPT.
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As Autoras impugnam a decisão sobre a matéria de facto pugnando que da análise das declarações de parte, da prova testemunhal e da prova documental, ao contrário do que fixa a sentença recorrida, ficaram provados os seguintes factos que foram dados como não provados: a) A Autora AA está habilitada com o título de enfermeira especialista na especialidade de saúde materna e obstetrícia; b) A Autora BB no Serviço de Urgência da Unidade Hospitalar de ..., orienta e avalia estudantes do curso de licenciatura em enfermagem; c) Por Despacho Conjunto nº 4590-A/2018 de 9 de Maio, do Ministro da Finanças e da Secretária de Estado da Saúde (publicado no DR- 2ª Série, nº90 de 10 de Maio de 2018) foi aprovado o número de postos de trabalho para enfermeiros especialistas, discriminado por serviço ou unidade de saúde, a que se refere o nº3 do artigo 3º do D.L. nº 27/2018, de 27 de Abril para a Ré.
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Por Despacho da Ministra da Saúde de 10/Setembro/2019, nº 8327/2019, publicado no DR – II Série, nº180 de 19/Setembro/2019 o número de postos de trabalho para enfermeiros especialistas, discriminado por serviço ou unidade de saúde, a que se refere o nº3 do artigo 3º do D.L. nº 27/2018, de 27 de Abril, para a Ré foi de 177.
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Quanto ao facto de que a Autora AA está habilitada com o título de enfermeira especialista na especialidade de saúde materna e obstetrícia é um Facto Assente, em momento algum a Ré impugnou aquele facto, aliás no art. 9.º da sua contestação a Ré reconhece mesmo a área de especialidade da Autora utilizando a expressão (quando se refere às funções “tudo isto no domínio ou área da sua especialização: materna/obstetra”.
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O facto impugnado pela Ré é a prática pela Autora de funções atinentes à sua área de especialidade como bem se depreende dos artigos 6.º e 7.º da sua contestação, vide contestação apresentada a 06/07/2020 com a ref. Citius ..., a especialidade detida pela Autora não é posta em causa. Veja-se que: 5. Na sua contestação à petição aperfeiçoada, a Ré, vide art. 2.º al f) menciona novamente as palavras (…) a sua área de especialização: materna/obstetrícia, e na al. r) r.1 refere-se à A. “Enquanto Enf. Materno/obstetra não faz qualquer procedimento diferente dos Colegas (…) e na al. r) r.6 “ a Autora não é formadora no domínio ou área da sua especialização: materna/obstetra l, vide requerimento apresentado a 06/11/2020 com a ref. Citius ....
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Acresce que, quer das declarações de parte, quer da prova testemunhal, resulta de forma clara e desinteressada a confirmação de que a Autora AA tem especialidade em saúde materna e obstétrica., vide declarações de parte da A. AA, gravação da audiência, ficheiro 20210526102219_1976712_2870628.wma, minutos 3:16 a 3:24, minutos 5:20 a 6:15, minutos 10:50 a 10:54, minutos 26.20 a 26:40, por referência à Ata de audiência de discussão e julgamento do dia 26/05/2021, ref. ...28. e aos minutos 03:10 a 03:32 da gravação 20210526151010_1976712_2870628.wma, por referência à Ata de audiência de discussão e julgamento do dia 26/05/2021, ref. ...54.
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A testemunha CC, vide gravação 20210526154039_1976712_2870628.wma, minutos 09:16 a 09:27 e 12:20 a 12:30, esclarece o Tribunal explicando que a Enfermeira AA coordena e orienta a formação de alunos de enfermagem e aplica os cuidados generalistas e os cuidados especializados para os quais tem especialidade.
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E de resto, face aos articulados e posteriormente à produção de prova nunca se revelou necessária a junção da cédula profissional porquanto a Ré nunca contestou a especialidade da Autora, só agora se revelou necessária a junção de tal documento em virtude do julgamento da 1.ª instância reduzir a improcedência dos autos quanto a esta Autora à inexistência do documento.
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Trata-se de uma questão operante, apta a modificar o julgamento, só revelada pela decisão, o que justifica a junção, a qual desde já se requer ao abrigo do permitido pelo art. 651.º n.º 1 do CPC parte final, juntando para o efeito o documento.
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No que respeita ao facto de que a Autora BB no Serviço de Urgência da Unidade Hospitalar de ..., orienta e avalia estudantes do curso de licenciatura em enfermagem o mesmo...
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