Acórdão nº 2037/20.4T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 03 de Novembro de 2022
Magistrado Responsável | ANTERO VEIGA |
Data da Resolução | 03 de Novembro de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães.
E. M., residente em Braga e com os demais sinais nos autos, intentou a presente ação declarativa, sob a forma de processo comum laboral, contra X Car Multimédia Portugal, S.A., com sede em Braga, pedindo se declare que a alteração do seu horário de trabalho do 3º para o 1º turno é ilícita, com a consequente condenação da ré: - A repor o horário que, até 01.10.2018, vinha a cumprir, correspondente ao 3º turno; --- - A pagar-lhe a quantia de € 7.651,40, bem como a importância, a liquidar em execução, a que, no futuro e até àquela reposição, resultar da diferença entre a retribuição mensal que irá auferir e a que deveria receber correspondente ao 3º turno; --- - A indemnizá-la, por danos de natureza não patrimonial, na importância de € 5.000; --- - A pagar, em partes iguais, a ela, autora, e ao Estado, a quantia de € 500,00 por cada dia de atraso no cumprimento das obrigações que vierem a ser impostas por via da decisão a proferir e a partir do momento em que esta se apresentar na condição de exequível. --- Fundamentou as correspondentes pretensões, alegando/sustentando, em síntese, que, foi admitida como trabalhadora da autora, como operadora fabril, a que corresponde, atualmente, a denominação de operadora especializada. Foi individualmente acordado entre as partes o horário de trabalho a ser cumprido, que, de acordo com a respetiva Cláusula 5ª., e após o período de aprendizagem, se iniciava pelas 23h00m, terminando, de terça a sexta-feira, pelas 6h00m e, aos sábados, pelas 8h30m, com intervalo para descanso entre as 3h00m e as 3h30m; que, aos 29.05.98, foi celebrada “Alteração ao Contrato de Trabalho”, acordando, nessa oportunidade, e individualmente, as partes que a atividade dela, autora, passaria a ser prestada em regime de tempo inteiro, de 40 horas por semana, com entrada pelas 14h30m, descanso pelas 19h00m e saída pelas 23h00m; que, posteriormente, aos 08.11.98, foi celebrado novo “Aditamento ao Contrato de Trabalho”, por via do qual, e mais uma vez, foi individualmente acordado que ela, autora, ficaria sujeita a horário de trabalho com entrada pelas 6h00m, descanso entre as 11h00m e as 11h30m, e saída pelas 14h30m, entre segunda e sexta-feira.
Por carta de 18.04.2013, a ré, de forma unilateral, procedeu à alteração do horário que ela, autora, vinha cumprindo, correspondente ao 1º turno, para o 2º turno, que era das 14h30m às 23h00m, alteração essa relativamente à qual comunicou o seu desagrado, o que determinou que continuasse a cumprir o horário de trabalho correspondente ao 1º turno, o que se manteve até 22.06.2013; que, nesta data, as partes acordaram, de forma individual também, que ela, autora, passaria a exercer funções no 3º turno parcial, entre as 23h00m e as 6h00m, de segunda a sexta-feira, situação que perdurou entre 23.06.2013 e 31.09.2018; que, nesta última data, a ré procedeu, unilateralmente, e sem o seu acordo, à alteração do horário de trabalho; que, a anteceder essa ocorrência, a ré, por comunicação escrita de 19.09.2018, lhe comunicou que, com efeitos a partir de 01.10.2018, passaria do 3º turno parcial para o 1º turno, com entrada pelas 6h00m, descanso das 11h00m às 11h30m, e saída pelas 14h30m, de segunda a sexta-feira; que, na sequência da mencionada comunicação, ela, autora, manifestou a sua oposição, por comunicação escrita datada de 24.09.2018, remetida por via postal registada à ré; que, não obstante isso, a ré manteve a alteração do seu horário de trabalho, passando a ficar sujeita a cumprir o horário correspondente ao 1º turno; que, para além de a alteração imposta não ter sido antecedida de consulta a ela, autora, a ré não consultou nem informou a Comissão de Trabalhadores, o SITE, de que era associada desde 30.04.2003, nem os delegados sindicais existentes na empresa; que, a acrescer à ilegalidade do seu procedimento, à luz do convencionado entre as partes e quanto aos formalismos de consulta prévia aplicáveis, a atuação da ré teve como efeito que, auferindo ela, autora, à data em que cumpria o 3º turno, a retribuição mensal ilíquida de € 1.333,46 e líquida de € 1.030,01, tivesse passado a auferir a remuneração mensal ilíquida de € 950,89 e líquida de € 764,52, com consequente redução da sua retribuição no montante ilíquido de € 382,57, e que, em termos líquidos, implicou perda remuneratória no montante de € 265,49, correspondente a, pelo menos, 30%; que o agregado familiar dela, autora, é composto por si e pelo seu cônjuge, desempregado, doente e sem qualquer tipo de rendimento, cifrando-se as respetivas despesas mensais fixas no valor, pelo menos, de € 1.000,00, a incluir renda da casa - € 164,77 -, alimentação - € 250,00 -, eletricidade e gás - € 137,00 -, água - € 20,00 -, medicamentos – no mínimo, de € 150,00 – e demais despesas correntes; que, por efeito da ocorrida redução salarial, só com privação na parte dos encargos diários e mensais do agregado lhe tem vindo a ser possível subsistir; que a alteração de horário promovida pela ré também provocou injustificada alteração na organização de vida dela, autora, a nível laboral e pessoal, na medida em que ficou impedida de providenciar pela refeição de almoço do seu agregado e da relativa à sua progenitora, que, aquando da alteração de turno, foi acometida de AVC, estando internada num lar de dia, bem como de realizar as demais lides domésticas que se encontram sob a sua responsabilidade, tudo tarefas que deixou de executar; que a ré desenvolve a sua atividade em laboração contínua, com, pelo menos, cinco turnos, a permitir-lhe a obtenção de elevados lucros, com um volume de vendas a ultrapassar os 1,5 milhões de euros, pelo que não tinha necessidade nem nada justificava a alteração a que procedeu; que a ré não fundamentou a alteração de horário a que procedeu, sendo, por conseguinte, nula a correspondente comunicação, para além de afetada por idêntico vício por falta de requisitos formais prévios, representando a sua atuação comportamento substancialmente ilícito e, ainda, revelador de contrariedade aos ditames da boa fé, na modalidade de abuso de direito; que, tendo a ré tido a oportunidade de alterar a decisão que tomou, não o fez, dando causa a que ela, autora, se sentisse, como se sentiu, afetada, humilhada e vexada, e que vivenciasse intensa preocupação quanto à manutenção dos encargos e despesas do seu agregado, bem como profundo desgosto e sentida indignação; que a ré, líder no seu sector de atividade, gera milhões de euros em vendas e obtém, em decorrência disso, avultados lucros, empregando mais de 3.500 trabalhadores. --- A ré contestou alegando/sustentando, em síntese, não corresponder com a verdade que o horário da autora, definido aquando da sua admissão, haja sido individualmente acordado com ela nem, tampouco, que isso haja sucedido nas alterações a que foi sendo sujeito, tendo aceite a autora, ao invés, no momento da celebração do contrato de trabalho, cumprir o horário que a empresa, em cada momento, e de acordo com o seu poder de direção, viesse a fixar; que a alteração que foi promovida com efeitos a partir de 01.10.2018, obedeceu, como as restantes, a motivos de reorganização e gestão interna da empresa, tendo sido realizada de forma legítima e justificada; que o assunto respeitante a essa alteração foi abordado e discutido nas reuniões mensais realizadas entre ela, ré, e a Comissão de Trabalhadores, ao longo do ano de 2018; que essa comissão sugeriu, na sequência disso, que ela, ré, divulgasse a correspondente informação pelo universo de trabalhadores, o que foi concretizado através de publicação de um “Infor+” sobre transferências do 3º turno para outros turnos, com indicação de que os trabalhadores deveriam manifestar, junto das chefias diretas, qual o turno alternativo preferencial; que a mudança de trabalhadores afetos ao 3º turno resultou de uma transição progressiva, tendo-lhes sido concedida a possibilidade de manifestar a sua preferência, a que ela, ré, sendo possível, atendeu, atendendo, na prevalência dessa escolha, à antiguidade do trabalhador, cabendo-lhe, em última instância, em caso de dúvida ou impossibilidade, decidir; que, para além disso, a mudança de turno foi previamente abordada e discutida com a autora e restantes trabalhadores presentes nas reuniões que ocorreram com as respetivas chefias; que foi na sequência dessas reuniões que a autora, perante o seu chefe de linha, manifestou a sua preferência pelo 1º turno; que a...
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