Acórdão nº 629/21.3T8CHV.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 24 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelJOAQUIM BOAVIDA
Data da Resolução24 de Novembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório 1.1. H. B.

e mulher, R. M., intentaram ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra S. M.

e L. G., formulando os seguintes pedidos: «

  1. Julgar-se resolvido o contrato de arrendamento celebrado entre os Autores e a Ré.

  2. Ser a Ré, condenada a despejar imediatamente o locado que tomou de arrendamento, devolvendo-o aos Autores, inteiramente devoluto de pessoas e coisas e em bom estado de conservação e limpeza; C) Serem os Réus, (Arrendatária e Fiador) solidariamente, condenados a pagar aos Autores a importância de € 5.259,80 (cinco mil duzentos cinquenta e nove euros oitenta cêntimos), valor a que devem acrescer juros de mora vincendos, à mesma taxa até integral e efectivo pagamento, e ainda os duodécimos vincendos até à entrega efetiva do locado desde a citação até integral e efetivo pagamento, sempre com as consequências legais».

Para o efeito, alegaram que são donos e legítimos proprietários de um estabelecimento comercial, denominado por Café “G.”, o qual deram de arrendamento à 1ª Ré por contrato celebrado entre 31.05.2017, tendo sido estipulado o valor mensal de renda de € 400,00, tendo depois sido efetuada adenda ao contrato em 13.04.2018, através da qual se estipulou a duração de três anos para o contrato e o 2º Réu assumiu a qualidade de fiador com renúncia ao benefício da excussão prévia.

Mais alegam que os Réus não pagaram as rendas do locado referentes aos meses de abril de 2020 até à data da propositura da ação, no montante global de € 5.259,80.

*Os Réus apresentaram contestação, alegando, em síntese, que não devem qualquer quantia aos Autores, uma vez que no início da vigência do contrato a 1ª Ré adiantou a quantia de € 4.000,00 de rendas, sendo certo que apenas não lhes entregou as chaves do locado por culpa daqueles, uma vez que foi ameaçada de morte pelo Autor marido.

*Os Autores exerceram oportunamente o contraditório relativamente à matéria de exceção alegada pelos Réus, alegando, além do mais, que foi acordado entre Autores e Ré o pagamento de € 4.0000,00 por todo o recheio que se encontrava no estabelecimento.

*1.2.

Dispensada a audiência prévia, proferiu-se despacho saneador, definiu-se o objeto do litígio e enunciaram-se os temas da prova.

Realizada a audiência final, foi proferida sentença a julgar a ação totalmente procedente e, em consequência, a: «

  1. Declar[ar] resolvido o contrato de arrendamento celebrado entre Autores e Réus, com início em 01/06/2017 e referente ao estabelecimento comercial, denominado por Café “G.”, instalado no rés-do-chão esquerdo do prédio urbano sito na Avenida ...

    , Edifício ...

    , Bloco ..

    , loja nº..

    , inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...

    “I” e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o número ...

    .

  2. Conden[ar] a 1ª Ré a restituir aos Autores o imóvel referido em a) deste dispositivo, devoluto de pessoas e bens.

  3. Conden[ar] os Réus a pagar aos Autores a quantia de € 5.259,80 (cinco mil, duzentos e cinquenta e nove euros e oitenta cêntimos) referente às rendas vencidas desde os meses de Abril de 2020 até Maio de 2021 e bem assim nas demais rendas entretanto vencidas e vincendas até efectiva entrega do locado, quantia essa acrescida dos respectivos juros moratórios, à taxa legal de 4%, devidos desde a data de vencimento de cada uma destas rendas até efectivo e integral pagamento.

    ».

    *1.3.

    Inconformados, os Réus interpuseram recurso de apelação da sentença, formulando as seguintes conclusões: «i. DA IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO: 1) A Autora/apelante discorda do tratamento fáctico-jurídico dado pelo Tribunal a quo, pois no seu entender, as alíneas a), b), c), d), e), f), g), h), i), j) da matéria de facto dada como não provada, foram incorretamente julgados, devendo passar a constar da matéria de facto provada.

    2) O processo de convicção, com o devido respeito, afigura-se-nos ilógico e irracional, violando as regras da experiência comum na apreciação da prova.

    3) A Autora/recorrente não concorda com a factualidade dada como não provada nas alíneas a), b) e c), d), e), f), g), h), i), j) nem com a fundamentação vertida na douta sentença recorrida.

    4) Sendo certo que a Ré, prestou um depoimento direto dos factos, coerente, isento, sincero e sem contradições de relevo, antes pelo contrário, descrevendo o acordo celebrado com os Autores, quanto ao montante de renda a pagar, quanto à cedência dos utensílios existentes no estabelecimento, os quais constam de uma relação elaborada e assinada, e, ainda, as circunstâncias subjacentes à cessação do contrato de arrendamento celebrado e, ainda, as circunstâncias subjacentes à cessação do contrato de arrendamento celebrado.

    5) As conclusões a que o Tribunal recorrido chegou, acham-se falaciosas, porquanto recusam a hipótese altamente plausível de que, a quantia de 4.000,00€ (quatro mil euros), paga pela Ré aos Autores, não foi a título de rendas antecipadas, mas sim uma contrapartida pecuniária pelo recheio existente no estabelecimento comercial, na data da outorga do contrato de arrendamento.

    6) Ora, estamos apenas e só numa relação locatícia entre as partes, sendo certo que ambas reconhecem e aceitam (resulta até do “SMS” junto pelos AA) que a Ré entregou aos AA. a quantia de 4.000.00€, inicialmente.

    7) Os AA. alegam que foi para pagamento de recheio. Porém, não enumeram, nem descrevem o tipo de recheio.

    8) E, na medida em que estamos no âmbito de uma relação locatícia, o lógico é que para adiantamento de rendas.

    9) Pelo que, cabia aos AA. o ónus de prova.

    10) E, o certo é que não há qualquer documento escrito do recheio entregue, não há faturas, no contrato de arrendamento não há qualquer referência, não há sequer o discriminar concreto e individual do recheio, nomeadamente, qual o tipo de recheio, mercadoria e respetivas unidades.

    11) Por outro lado, não se verificaram contradições no depoimento prestado pela Ré, que explicou, que aquele montante havia sido exigido pelo Autor marido, como garantia do bom e integral cumprimento do contrato, sendo certo que o facto de não saber quantificar o número de meses, nem apresentar uma explicação para não pedir recibo, não é necessariamente, sintoma do caráter inverídico do respetivo conteúdo, pelo contrário, sintoma da sua espontaneidade e da sua veracidade.

    12) Também nos surpreende a estranheza do Tribunal recorrido quanto ao facto de metade daquela quantia ter sido entregue em dinheiro e o remanescente através de transferência bancária, o certo é que tal é confirmado pelo próprio Autor (“20220421140918-141416741-2871893”: [00h:21m:44s a 00h:23m:15s]); 13) Por outro lado, não compreendemos o elevado rigor científico da douta fundamentação, quanto àquela que no seu iter cogniscivo, seria a de que a versão apresentada pelo Autor, de que os 4.000,00€ (quatro mil euros), tinham sido entregues pela Ré para aquisição de recheio do estabelecimento, faria mais sentido do que a apresentada pela Ré.

    14) A este propósito, o Autor H. B., não prestou um depoimento escorreito e muito menos sincero, pois primeiro referiu que recebeu o dinheiro para aquisição de trezentos garrafões de vinho e respetivo vasilhame, para depois, à medida que a Meritíssima Juiz do Tribunal recorrido insistia quanto aos elementos que teriam sido transacionados como recheio elencar e acrescentar outros, sem precisar quantidades, nem o valor pelo qual, supostamente, alienou os referidos bens. (“20220421140918-141416741-2871893”: [00h:10m:57s a 00h:21m:44s] 15) Portanto, não colhe a tese de que a quantia pecuniária entregue fosse como pagamento de recheio existente no estabelecimento, pois nem isso o Autor conseguiu demonstrar.

    16) Desde logo, não pode gerar menos estranheza o facto de todos os bens cedidos pelos Autores resultarem de um inventário e o alegado recheio transacionado não. Mais uma vez, a omissão de tais bens do inventário, assinado pela Ré e pelos Autor revela-se essencial, denotando a falta de veracidade da versão apresentada pelo Autor marido.

    17) Outrossim, testemunha C. S. admitiu que apesar de ter visto o café com recheio, na ocasião em que era explorado pelo Autora, não sabe se na transmissão do mesmo se encontrava cheio ou vazio, pelo que, não se pode considerar provado que o café se encontra repleto aquando da passagem do Autor para Ré. (“20220421140918-141416741-2871893”: [00h:00m:52s a 00h:04m:09s] 18) Sem dúvida que a junção aos autos do documento no qual é remetida pela Ré uma mensagem escrita ao Autor permitiu concluir que se encontrava de boa-fé, na disposição de manter o contrato até ao termo previsto, com consequente pagamento de rendas, em função das suas possibilidades económicas, desde que, se calculasse a diferença quanto ao montante antecipadamente pago; 19) Aliás, a Ré explicou, no seu depoimento, de forma clara, que o Autor lhe exigiu a quantia de 4.000,00€ (quatro mil euros), para a celebração do contrato, o que é consonante com o teor do documento escrito juntos aos autos, do qual consta “(…) quando me arrendou o contrato exigiu me 4000 euros para fazer o contrato. (…)” 20) E, apesar de não existir qualquer recibo de 4.000,00€ (quatro mil euros), a título de rendas pagas de forma adiantada, pela Ré, também se diga que nem tampouco há, faturas da alegada, alienação do recheio existente no estabelecimento comercial aquando da celebração do contrato de arrendamento.

    21) E, a este respeito, a testemunha M. A., deu conta ao Tribunal que emitia, eletronicamente, o recibo respeitante à renda estipulada entre o Autor e Ré, quando tal lhe era solicitado pelo Autor, o que não sucedeu desde o início da relação jurídica de arrendamento estabelecida entre as partes, pelo que, não sabe, nem tem como saber se outros foram entregues, diretamente, ao Autor, em fase pré- contratual e/ou no início da vigência do contrato. “20220421152807_416741_2871893”: [00h:00m:32s a 00h:02m:35s] 22) De facto, da prova testemunhal, documental e do depoimento das partes pode aferir-se que a...

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