Acórdão nº 115/16.3T8VNC-G.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 13 de Julho de 2022

Magistrado ResponsávelROSÁLIA CUNHA
Data da Resolução13 de Julho de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, na 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães: RELATÓRIO P. B. - UNIPESSOAL, LIMITADA, propôs incidente de habilitação de cessionário contra F. J.

, pedindo que fosse habilitada para intervir, nos autos de insolvência, no lugar da aí reclamante Banco ..., S.A.

Alegou para o efeito, em síntese, ter celebrado um contrato de cessão de créditos (titulado por documento escrito que juntou), no qual Banco ..., S.A. declarou ceder-lhe o crédito que havia reclamado contra o insolvente (F. J.), mantendo a natureza e os acessórios a ele inerentes.

Mais alegou que, quer a cessionária, quer a cedente, comunicaram aquele contrato de cessão ao insolvente, o qual não deduziu qualquer oposição.

*Notificado, o requerido (F. J.) contestou pedindo que a habilitação fosse indeferida, por legalmente inadmissível, ou, subsidiariamente, fosse julgada improcedente.

Alegou para o efeito, em síntese, ser o incidente inadmissível face: à natureza própria do processo de insolvência, visto essencialmente como um processo executivo especial, em que não se pode verdadeiramente falar de partes ou litígio, nem de transmissão de coisa ou direito em litígio (sendo aqui o valor económico do crédito reclamado de € 16.000.000,00 praticamente nulo e inexigível), o que mais se acentuaria no incidente de exoneração do passivo restante (único pendente); à limitação da sua aplicação ao processo declarativo (reiterando ser o processo de insolvência de natureza especialmente executiva); e à exigência de que ocorra em causa pendente, o que não seria o caso face ao encerramento do processo de insolvência, por insuficiência da massa) Mais alegou que o negócio-base da cessão (a compra e venda do crédito) é nulo, quer por simulação absoluta, quer por violar regras legais imperativas pertinentes ao exercício da atividade financeira, já que a cessionária não estaria autorizada a desenvolvê-la, agindo assim em fraude à lei.

Alegou ainda que a pretensa transmissão dos créditos foi feita apenas para tornar mais difícil a sua posição no procedimento de exoneração do passivo restante (sendo desde logo afirmado na carta que lhe comunicou a cessão que a cessionária pretenderia requerer a cessação antecipada do incidente de exoneração do passivo restante): a cessionária agiria como testa de ferro de outrem (seu familiar, com o qual mantém prolongados diferendos económicos), que a teria financiado para o pagamento do alegado preço de € 75.000,00 (já que ela própria não teria capacidade financeira para o efeito), não tendo a mesma qualquer interesse em pagá-lo para adquirir um crédito incobrável.

Por fim, o requerido (F. J.) defendeu atuar a requerente (P. B. - Unipessoal, Limitada) nos autos de má fé, pedindo que fosse sancionada em conformidade.

*Foi exercido o contraditório relativamente à exceção deduzida na contestação.

*Em 20.1.2020, foi proferido despacho que, para além de outras questões, fixou o valor do incidente em € 75 000, julgou admissível a dedução do incidente de habilitação, tendo determinado o seu prosseguimento com vista à apreciação das restantes questões suscitadas na oposição, e designou data para a realização da audiência final.

*Iniciada a audiência final, e na sequência de depoimento prestado pela testemunha R. P., o requerido (F. J.) apresentou requerimento, em 15.11.2021, pedindo que a requerente (P. B. - Unipessoal, Limitada) facultasse a identidade da pessoa ou entidade que em 2019 mutuou a quantia de € 102 708,36, juntando aos autos cópia dos documentos que dão suporte a tal transação e à transferência bancária desse valor.

*Foi proferido despacho que indeferiu tal pretensão probatória o qual, na sequência de recurso contra o mesmo interposto, veio a ser revogado tendo a Relação de Guimarães, por decisão proferida em 14.3.2022, no âmbito do apenso E, (a qual aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais) ordenado “a notificação da Requerente (P. B. - Unipessoal, Limitada) para indicar a identidade da pessoa(s) ou entidade(s) que, em 2019, lhe mutuou(aram) a quantia de € 102.708,36, juntando aos autos cópia dos documentos que deram suporte a essa operação (nomeadamente, da transferência bancária desse valor).”*Em 8.4.2022 foi proferido despacho (ref. Citius 48499613) com o seguinte teor: “Na sequência da decisão sumária proferida pelo TRG no apenso E, determina-se a notificação da Requerente (P. B. - Unipessoal, Limitada) para indicar a identidade da pessoa(s) ou entidade(s) que, em 2019, lhe mutuou(aram) a quantia de € 102.708,36, juntando ainda aos autos cópia dos documentos que deram suporte a essa operação (nomeadamente, da transferência bancária desse valor).”*Por requerimento de 19.4.2022, o requerido (F. J.) requereu a junção aos autos das declarações ficais de 2018 e 2019 apresentadas pela requerente (P. B. - Unipessoal, Limitada), documentos cuja junção foi admitida por despacho de 3.5.2022.

*Por requerimento de 21.4.2022, veio a requerente (P. B. - Unipessoal, Limitada) dizer que não recebeu qualquer quantia em mútuo no exercício de 2019.

*Em 9.5.2022 veio o requerido (F. J.) pedir que se proceda a perícia colegial da escritura comercial da habilitanda P. B. - Unipessoal, Limitada para esclarecimento da seguinte questão de facto: -Natureza e proveniência do passivo corrente de € 102 708,36 constante da IES de 2019 da habilitanda; identificação da pessoa(s) ou entidade(s) que figuram como credor(es) dessa(s) operação(ões) e exibição dos documentos que lhes deram suporte.

*Por requerimento de 9.5.2022, veio a requerente (P. B. - Unipessoal, Limitada) dizer que respondeu à questão que lhe foi colocada e nos termos em que a mesma foi colocada pois efetivamente não lhe foi feito qualquer empréstimo, seja de que montante for, seja porque pessoa for.

Mais alegou que, tal como vertido nos artigos 56.º a 65.º da resposta à contestação, “entre a habilitanda e o Dr. J. O. foi acertada a futura compra dos créditos em causa ou dos activos que porventura lhe sucedessem.

  1. Nesse propósito e nessa comunhão de interesses, a habilitanda assumiu a compra dos créditos e a promoção das diligências necessárias à sua recuperação.

  2. Prometendo vir a cedê-los a uma sociedade da esfera jurídica do Dr. J. O., a sociedade comercial “X, Unipessoal, Lda”, pelo preço de €100.000,00, com um diferencial de lucro por relação ao preço de aquisição, acertando entre eles a futura divisão dos lucros que a operação viesse a gerar no entretanto.

  3. Até ao presente momento, porque não estão ainda criadas as condições acordadas entre as partes, o contrato definitivo não foi outorgado, sendo que a promessa foi celebrada sem prazo, mantendo-se, pois, em vigor.

  4. E daí que, muito naturalmente e conforme determinam as boas regras da organização contabilística, tal quantia figure lançada na rubrica de “Outros Passivos Correntes”, em virtude de se tratar de contrato promessa ainda não cumprido, na qual não se inscrevem apenas empréstimos.

  5. Tornam-se, assim, face ao que agora se deixa vertido, completamente inúteis e desnecessárias quaisquer outras diligências, estando devidamente satisfeito o propósito do insolvente de saber e demonstrar - o que fica agora confessado - qual a proveniência daquela quantia e da identidade da pessoa que a efectuou.

    ”*Na audiência final que teve lugar em 10.5.2022 foi proferido despacho com o seguinte teor: “A questão colocada pelo Tribunal, na sequência da decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Guimarães, mostra-se claramente respondida, razão pela qual se não vislumbra a necessidade de qualquer produção subsequente à prova, designadamente, de carácter pericial, atendendo ademais ao período de tempo já decorrido desde o início dos trabalhos, indeferindo-se respectivamente a pretensão deduzida.”*O requerido (F. J.) não se conformou e interpôs o presente recurso de apelação, tendo terminado as suas alegações com as seguintes conclusões: “1.ª Por mera economia processual, o Recorrente dá aqui por integrada e reproduzida a factualidade enunciada sob os n.ºs 1 a 3 do corpo da alegação, para concluir que, notificada a Recorrida para cumprir a Decisão Sumária de 14.3.2022 (refª 7965220) do Tribunal da Relação de Guimarães no sentido de “indicar a identidade da(s) pessoa(s) ou entidade(s) que, em 2019, lhe mutuou(aram) a quantia de € 102.708,36, juntando ainda aos autos cópia dos documentos que deram suporte a essa operação (nomeadamente, da transferência bancária desse valor”, refugiou-se numa mera alegação de plano redundante, traduzida numa recusa serôdia de cumprir o que estava decidido com trânsito em julgado e lhe havia sido ordenado.

    1. Perante essa conduta da Recorrida, em 19.4.2022, o Recorrente requereu a junção aos autos das declarações fiscais de 2018 e 2019 apresentadas pela X à Administração Tributária e na competente Conservatória do Registo Comercial (refª 3558558), o que foi deferido por despacho de 3.5.2022 (refª 48605989).

    2. Considerando que a conduta da Recorrida consubstanciou, em violação grosseira do dever de cooperação, uma recusa, ao menos tácita, das informações e documentos ordenados pelo Tribunal...

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