Acórdão nº 137/21.2T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 13 de Julho de 2022

Magistrado ResponsávelLÍGIA VENADE
Data da Resolução13 de Julho de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes da 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I RELATÓRIO (seguindo de perto o elaborado na 1ª instância).

J. F.

intentou contra M. C. e A. C.

, melhor identificados nos autos, a presente ação declarativa condenatória, com processo comum, peticionando, a final, que se declare nulo o contrato de mútuo referenciado na petição inicial e se condene ambos os Réus, solidariamente, a entregar ao Autor a quantia de € 5.063,31, acrescida de juros de mora à taxa de 4% a contar da citação até efetivo e integral pagamento.

Alega, em síntese, que emprestou ao Réu A. C. a quantia de € 10.063,31, destinada ao pagamento de uma dívida que lhe estava a ser executada, tendo a Ré M. C. se assumido como fiadora e principal pagadora no cumprimento da obrigação de restituir aquele montante. O Réu A. C. obrigou-se a restituir o referido montante até ao final do mês de outubro de 2020. Em novembro de 2019, O Réu A. C. transferiu para a conta do Autor a quantia de € 5.000,00, estão, ainda, em dívida a quantia de € 5.063,31.

*Citados os Réus, contestaram, defendendo-se por impugnação.

Alegam, em síntese, que não solicitaram ao Autor o referido empréstimo.

Alegaram que a Ré M. C. entregou em dinheiro ao Réu A. C. € 10.000,00 para proceder ao pagamento da dívida exequenda, que este levou consigo para Braga para pagar à Agente de Execução. De caminho telefonou à sua mãe para lhe comunicar que iria fazer o pagamento à Agente de Execução em dinheiro. Nesse momento, o Autor encontrava-se junto à Ré e logo se voluntariou para fazer a transferência por considerar ser um absurdo efectuar o pagamento em dinheiro. Foi neste contexto que o Autor fez a transferência, tendo-lhe sido restituídos em dinheiro os € 10.000,00.

Mais, alegam que o dinheiro que a Ré M. C. entregou ao Réu A. C. era dinheiro acumulado ao longo da sua vida de trabalho, e já existente à data da celebração do casamento com o Autor.

A transferência de € 5.000,00 foi feita para a conta do então casal (Autor e Ré) para ressarcir a sua mãe, em parte, do dinheiro que esta lhe emprestou.

Mais, invocaram a excepção de erro na forma de processo alegando, em suma, que o crédito em causa a existir é um crédito de natureza comum, pertencente ao património do extinto casal que foi formado pelo Autor e Ré M. C.. Acontece que, a discussão em torno do modo como há-de ser liquidado o referido crédito entre os cônjuges deve ter lugar no momento da partilha, por via do processo de inventário e não do presente processo.

Face ás exceções arguidas, pediram a absolvição da instância.

*Notificado o Autor, respondeu, além do mais pugnando pela improcedência da excepção dilatória invocada.

*Dispensou-se a realização da audiência prévia. Fixou-se o valor da ação em € 5.063,31.

Foi proferido despacho saneador, que julgou a excepção invocada de erro na forma de processo improcedente. De seguida, dispensou-se a prolação do despacho de identificação do objecto do litígio e enunciação dos temas de prova, designando-se, de imediato, audiência final.

*Realizada a audiência final foi proferida sentença que decidiu julgar a ação parcialmente procedente e, em consequência declarou nulo, por vício de forma, o contrato de mútuo, em apreço nos autos, e condenou o Réu A. C. a pagar ao Autor a quantia de € 5.063,31, acrescida dos juros de mora, à taxa legal, de 4% a contar da citação até efectivo e integral pagamento; absolveu do pedido a Ré M. C.. Mais atribuiu as custas ao Réu A. C..

*Inconformado, veio o R. A. C. apresentar recurso, apresentando alegações com as seguintes -CONCLUSÕES- (que aqui se reproduzem) “A. O ponto f) dos factos dados como provados não deveria ter sido dado como provado; B. O Tribunal a quo considerou que as únicas testemunhas do autor, V. M. e V. R., não tiveram conhecimento presencial dos factos, acabando por desvalorizar os seus depoimentos;14 C. Quanto às declarações de parte do autor, considerou o Tribunal recorrido que, de facto, existe ainda antagonismo acerbo com a sua ex-mulher, mãe do ora recorrente, mas, mesmo assim, não deixou de considerá-las para efeito de sustentação da causa de pedir, o que não pode suceder, pois, D. Na realidade, as declarações de parte são um verdadeiro testemunho de parte, devendo ser-lhe aplicadas, analogicamente, as restrições que são processualmente impostas à prova testemunhal e à prova por presunção; E. Por esse motivo, as declarações de parte do recorrido nem sequer podem ser consideradas para efeito de valoração do Tribunal, atento o disposto – aqui aplicável por analogia – nos artigos 393.º, n.º 1, 351.º e 364.º, n.º 1, todos do Código Civil, F. pelo que violou o Tribunal recorrido tais preceitos de direito probatório substantivo, uma vez que não se poderia, in casu, provar-se a celebração de um mútuo nulo por vício de forma (atento o montante da quantia transferida – cf. artigo 1143.º do Código Civil), através de prova por presunção (não olvidemos que o Tribunal recorreu às máximas das regras da experiência comum para forcejar a sua convicção), ou mediante a prova por declarações de parte prestadas pelo recorrido; G. Os documentos n.ºs 1 a 6 juntos à petição inicial foram desvalorizados/omitidos pelo Tribunal a quo na sua motivação, constituindo elementos e serem levados em apreço como sustentação de contra-indícios em relação aos indícios assacados a partir dos documentos valorados na decisão, para alicerçar o juízo inferencial da ocorrência do empréstimo alegadamente feito pelo autor recorrido, ao recorrente, sendo que os mesmos (entenda-se, docs. 1 a 6 juntos à contestação), impunham que não se tivesse dado como provado o ponto f) do elenco de factos provados na sentença, devendo o mesmo ser trasladado para o elenco de factos não provados; H. Tais documentos são demonstrativos da capacidade financeira da ré M. C., para poder emprestar a quantia aludida no artigo 13.º, ao seu filho, ora recorrente, assim dando guarida à tese espelhada na contestação.

  1. Para o recorrente era indiferente a conta de destino da transferência aludida no artigo 15.º da petição inicial. O autor encontrava-se casado com a ré. Daí resultar indiferente, para o recorrente, qual a conta para onde seria operada a transferência. Entre casados, presumiu o recorrente que, de mútuo acordo, marido e mulher fariam do dinheiro o que bem entendessem; J. Os documentos juntos à contestação não são factos, mas meros meios de prova de factos alegados e controvertidos, não provando, por isso, que houve um qualquer acordo de pedido de empréstimo celebrado entre recorrido e recorrente;15 K. Do mesmo modo, os documentos juntos pelo recorrido posteriormente à contestação não provam que, a partir da sua conta bancária, tenha sido transferido dinheiro que faça parte do seu património próprio, que não comum dos cônjuges; L. O facto de ter havido uma transferência destinada ao agente de execução de banda do recorrido, com uma subsequente devolução de metade do valor então inicialmente transferido, por parte do recorrente, são factos instrumentais que podem indiciar a existência de um empréstimo, mas dos mesmos não se extrai, com mediana segurança, que tal tenha ocorrido a solicitação expressa do recorrente, perante o autor; M. Compulsada a causa de pedir balizada pela petição inicial, em lado nenhum afirma o autor ter emprestado dinheiros seus; N. Quer pelos factos essenciais ou meramente instrumentais lavrados na petição que constituem a enformação da causa de pedir, inexiste qualquer referência a que a quantia transferida para a agente de execução proviesse do património próprio do autor; O. Como corolário, é incorrecto afirmar-se que o recorrido seja credor da quantia reclamada no presente processo, sendo que a quantia aludida no artigo 13.º da petição inicial, tendo sido movimentada a partir da conta do autor, deverá ser considerada um crédito comum do casal, P. pois, a transferência ocorreu numa altura em que o autor e a ré M. C. se encontravam casados, de sorte que o accionamento da presunção prevista no artigo 1725.º do Código Civil (normativo que assim foi violado pelo Tribunal a quo), ficciona, ope legis, a consideração desse montante como valor pertencente ao património comum dos ex-cônjuges ainda não dissolvido, uma vez que não foi ilidida tal presunção de comunhão, com a instrução e julgamento da causa, Q. pelo que o recorrido, desacompanhado da ré no presente processo para exigir o pagamento dessa quantia, torna-se, pura e simplesmente, parte ilegítima nestes autos, sendo esta uma excepção dilatória que aqui se argúi - cfr. art.º 576º, n.º 1 e 2, 577º, al. e) e 578º todos do CPC - o que se requer que seja reconhecido e declarado para todos os efeitos legais.” Pede por isso que o recurso obtenha provimento total, revogando-se a sentença recorrida, a qual deverá ser anulada, no mais se decidindo pela absolvição do recorrente.”*Foram apresentadas contra-alegações que terminam com as seguintes -CONCLUSÕES- (que aqui se reproduzem): “• Primórdios: I. Interpôs o aqui Apelante A. C., Recurso de Apelação da decisão proferida pelo Tribunal a quo, alegando, em suma, que as declarações de parte do Autor não se afiguram credíveis, atendendo ao que veio a ser considerado no processo n.º 246/21.8T8VCT.G1, não podendo, inclusive, ser consideradas para efeitos probatórios, nos termos do disposto nos artigos 393.º n.º 1, 351.º e 364.º n.º 1 do Código Civil; no contexto da prova produzida, nenhuma vontade expressa ou indiciária da celebração de um mútuo resultou demonstrada, sendo que não deveria ter sido dado como provado o facto f) do elenco de factos provados na sentença; inexiste qualquer referência a que a quantia transferida para a agente de execução proviesse do património próprio do autor, pelo que deveria funcionar a presunção de bem comum dos cônjuges; o acervo patrimonial comum conjugal ainda não se encontra balizado, sendo que a quantia reclamada constitui um crédito comum do casal; verifica-se uma exceção dilatória de ilegitimidade ativa não...

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