Acórdão nº 3236/13.0TJVNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 30 de Junho de 2022

Data30 Junho 2022

Acordam, em conferência (após corridos os vistos legais) os Juízes da 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, sendo Relatora - Maria João Marques Pinto de Matos; 1.º Adjunto - José Alberto Martins Moreira Dias; 2.ª Adjunta - Alexandra Maria Viana Parente Lopes.

*ACÓRDÃO I - RELATÓRIO 1.1.

Decisão impugnada 1.1.1.

X - Imobiliária, Limitada, com sede na Praça …, nº .., freguesia de ..., foi declarada insolvente por sentença de 07 de Janeiro de 2014 (proferida nos autos n.º 3236/13.0TJVNF, que correm termos no Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo de Comércio de ..., Juiz 1), já transitada em julgado.

1.1.2.

Em 23 de Junho de 2020, a Insolvente (X - Imobiliária, Limitada) apresentou uma proposta de plano de insolvência.

1.1.3.

Por despacho proferido em 21 de Julho de 2020, o Tribunal a quo decidiu, em razão da pandemia e do número de credores, que: não seria realizada a assembleia de credores prevista no art. 209.º, do CIRE; e a votação do plano de insolvência ocorreria por escrito.

1.1.4.

Em 10 de Dezembro de 2020, votado por escrito o plano de insolvência, o Administrador da Insolvência apresentou um requerimento ao Tribunal a quo, com o resultado da contagem dos votos emitidos.

1.1.5.

O requerimento do Administrador da Insolvência não foi notificado à Insolvente (X - Imobiliária, Limitada), ou aos seus credores.

1.1.6.

Por despacho proferido em 08 de Fevereiro de 2022, o Tribunal a quo considerou não aprovado o plano de insolvência, lendo-se nomeadamente no mesmo: «(…) Ref.ª 10864456 – Ao abrigo do disposto no nº 1 do artigo 212º do CIRE, uma vez que o plano de insolvência não recolheu mais de 2/3 da totalidade dos votos emitidos, declaro que o plano apresentado não recolheu os votos necessários para ser aprovado.

(…)» 1.1.7.

O despacho que antecede foi notificado à Insolvente (X - Imobiliária, Limitada) e aos seus credores; mas não foi acompanhado do requerimento do Administrador da Insolvência, a comunicar o resultado da votação do plano de insolvência.

1.1.8.

A Insolvente (X - Imobiliária, Limitada) recorreu do despacho a considerar não aprovado o plano de insolvência, por forma a que fosse revogado e ela própria fosse notificada do resultado da votação, lendo-se nomeadamente no mesmo: «(…) Ocorre que a Insolvente não foi notificada, até à presente data, do teor de qualquer requerimento relativo à votação e ao cálculo das percentagens respetivas, desconhecendo em absoluto porque motivo o plano não foi, alegadamente, aprovado, o que configura uma irregularidade processual que influi no decurso dos autos; (…) Termos em que deverá ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, ser declarada a nulidade do despacho recorrido devendo, em sua substituição, ser ordenada a notificação da Recorrente do(s) requerimento(s) com base nos quais a Meritíssima Juiz “a quo” concluiu pela não aprovação do plano de recuperação por si apresentado.

(…)» 1.1.9.

Por acórdão de 04 de Novembro de 2021 (onde a aqui Relatora foi então 2.ª Adjunta), o Tribunal da Relação de Guimarães concedeu provimento ao recurso da Insolvente (X - Imobiliária, Limitada), lendo-se nomeadamente no mesmo: «(…) Ora, como deflui de tudo quanto já foi referido, temos de convir que, tendo-se eliminado a realização da assembleia presencial e optado pela votação escrita, haveria que, para salvaguardar ao máximo o prejuízo dali decorrente e aproximar o procedimento até onde fosse praticamente possível daquele que teria sido normalmente seguido e assim se garantir o menor prejuízo para o exercício dos direitos ao mesmo inerentes, notificar do resultado da votação recebida e processada pelo AI, quando este dela deu conta ao Tribunal pelo menos a devedora insolvente enquanto proponente do plano e interessada em analisar e ponderar os termos em que o mesmo não foi alegadamente aprovado e as razões por que tal sucedeu, dando-lhe prazo para eventualmente propor alguma modificação e submetê-la à apreciação do universo de credores votantes em ordem a que estes, assim colectivamente confrontados, pudessem negociá-la, reponderar a sua posição e porventura alterá-la como lhes teria sido possível caso a assembleia se tivesse realizado presencialmente e nela discutissem o plano e a sua alteração, para tal trocando dialecticamente as opiniões e pretensões que os respectivos interesses motivassem.

A adequação da marcha processual em correspondência com o procedimento por que excepcionalmente se entendeu e decidiu enveredar haveria, então sim, de inspirar-se, em coerência, no nº 5 do artº 36º, e sempre tendo em, vista a maior aproximação possível da normalidade e evitar ao máximo qualquer prejuízo para o exercício dos direitos das partes e para a prossecução do desígnio visado pela apresentação e discussão do plano na perspectiva da recuperação claramente preferida pela lei em face do estado de insolvência.

Acresce, ainda, que mais do que a preterição da dita formalidade e da consequente possibilidade de ela, arredando a participação das partes, influir “no exame e decisão da causa” (na apreciação da regularidade da votação, do apuramento do respectivo resultado e da verificação das condições de aprovação ou não), acabou por precipitar a prolação da decisão declaratória de que “o plano apresentado não recolheu os votos necessários para ser aprovado” quando isso ainda não lhe era permitido por inobservância ainda que mínima das referidas condições de discussão do mesmo e, portanto, propiciar pronúncia sobre questão de que ainda não podia tomar conhecimento.

De resto, ela limitou-se a proclamar, austera e conclusivamente, aquele desfecho apenas se estribando na circunstância não menos conclusiva de que o plano não obteve “mais de 2/3 da totalidade dos votos” sem discriminar a factualidade relativa aos termos e resultado da votação que a tal conduziram e, sobretudo, sem mínima alusão a qualquer resquício de discussão entre credores e destes com a devedora a que a “votação por escrito” não obstaria de todo e à possibilidade de, em função disso, ela contrapropor alterações porventura tendentes a evitar a rejeição que, deste modo, inelutavelmente se consumou e assim surpreendeu as expectativas legítimas da insolvente, quiçá dos credores que terão votado a favor em percentagem cujo valor, apesar de afirmada como insuficiente, se ignora.

Não resulta, pois, da decisão recorrida que, muito por o resultado da votação não ter sido notificado nem sujeito ao contraditório em que a discussão na assembleia sempre redundaria, tenha sido assegurado, efectiva e ainda que minimamente, dada a tramitação seguida, o debate por lei preconizado como imprescindível em relação ao plano proposto, nem que aos interessados (credores e, em especial, a devedora insolvente) tenha sido proporcionada qualquer forma de participação que, em concreto e para além do simples acto de votar, assegurasse o seu contributo dialéctico para a consolidação e definitiva aprovação ou rejeição do mesmo.

Assim como não resulta que o Tribunal tivesse feito qualquer controlo da recolha dos votos e do apuramento do resultado levados a cabo pelo AI, sendo certo que lhe competia presidir à assembleia em que tal deveria ter lugar se esta se tivesse realizado e que, portanto, disso não o exime o procedimento adoptado, assim acabando a decisão recorrida por apenas se fazer eco da insuficiência dos votos a favor que lhe terá sido por aquele comunicada.

É que, não obstante as particularidades desta forma de processo, as especificidades dos interesses que nele se debatem e as finalidades próprias que por ele se almejam, não pode perder-se de vista nem deixar que se lhe sobreponha a preocupação de simplicidade, celeridade e eficácia, posto...

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