Acórdão nº 5870/20.3T8BRG-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 20 de Outubro de 2022
Magistrado Responsável | MARIA EUGÉNIA PEDRO |
Data da Resolução | 20 de Outubro de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam os Juízes da 1ª Secção do Tribunal da Relação de Guimarães: I. Relatório L. A.
, intentou a presente acção declarativa de condenação com processo comum contra R. M.
e X – Investimentos Imobiliários, Lda, peticionando que: - Seja declarado nulo por simulação o negócio de compra e venda da casa de morada de família celebrado entre os RR.
- Sejam declarados nulos os registos efectuados com base na escritura de compra e venda que formalizou o referido negócio, ordenando-se o cancelamento do registo de aquisição efectuado a favor da 2ºR.
- Sejam os RR. condenados, solidariamente, no pagamento de uma compensação no valor de €15.000,00 pelos danos morais que lhe causaram.
- E, subsidiariamente, que o contrato seja declarado nulo e de nenhum efeito por configurar abuso de direito.
A fundamentar tal pretensão a A. alegou, em súmula, e no que ao recurso interessa, que: -Viveu em união de facto com o 1º R. desde outubro de 2011 até julho de 2018, tendo dessa união nascido duas filhas, em 2014 e 2016, tendo o agregado familiar residido sempre na fracção autónoma, tipo T3, designada pela letra F, do prédio sito na Rua …, nº …, freguesia de …, concelho de Braga, propriedade do 1ºR.
-No processo de regulação das responsabilidades parentais ficou estabelecido que as filhas viveriam com a A..
- Em Julho de 2018, aquando do fim da união de facto, foi acordado entre a A. e o 1º R., que não tendo este necessidade do imóvel, ficaria lá a residir a A. e as filhas, gratuitamente, enquanto estas fossem menores e assim sucedeu até Janeiro de 2020.
- No dia 21.1.2020, o 1ºR via telefone comunicou-lhe que tinha de sair da casa com as filhas até ao dia 31 desse mês, pois tinha encontrado comprador para a casa e ia seguir com uma nova vida; e no dia 28 de janeiro recebeu uma interpelação escrita para entrega imediata da casa, com a informação de que os contratos de fornecimento da água e da luz estavam cancelados a partir do dia 31, tendo efectivamente nessa data sido cortados os fornecimentos.
- Por não ter meios financeiros para arrendar um imóvel em Braga e estar à procura de emprego propôs no Tribunal de Família e Menores de Braga uma acção pedindo a atribuição da casa de morada de família que sempre foi na referida fracção. Na contestação dessa acção, o 1ºR apresentou um registo provisório da aquisição da fracção com base num contrato promessa em que figuravam como promitentes compradores J. G. e mulher P. R., terminando o prazo para a outorga do contrato definitivo em 15.5.2020. Porém, no dia 19.5.2020, o 1ºR. apresentou nessa mesma ação um requerimento a informar que no dia 19.5.2020 havia procedido à venda da fracção em apreço à aqui 2ºR., tendo-lhe esta, no dia 29.5.2020, remetido uma carta registada a solicitar a entrega imediata do imóvel livre de pessoas e bens, com excepção dos bens listados em tal missiva.
- O contrato de compra e venda da fracção outorgado entre os RR. não passa de um negócio simulado, pois a 2ºR., sendo uma sociedade imobiliária nunca fez qualquer visita à dita fracção, desconhecendo o seu estado de conservação, acabamentos e funcionalidades, e até foi incluído no contrato um conjunto de bens móveis alegadamente existentes na fracção, alguns bens próprios da A., que a compradora nunca viu.
- Além disso, o suposto negócio foi celebrado pelo preço de € 150.000,00 quando o valor duma fracção com características idênticas, no mesmo prédio e a mesma tipologia (T3) é de € 209.000.00. E a fracção alegadamente vendida está a ser publicitada por uma imobiliária como destinada ao arrendamento enquanto outra imobiliária afirma aos potenciais interessados que na base da colocação da mesma à venda esteve um contrato de permuta, o que deixa claro que não houve qualquer compra e venda.
- Nem o 1ºR quis vender, nem a 2ºR quis comprar a dita fracção, tendo a escritura pública de compra e venda sido outorgada com o intuito de prejudicar a A. e as suas filhas, criando um conjunto de factos destinados a impedir que na acção de atribuição da casa de morada de família lhe seja reconhecido o direito ao arrendamento da mesma.
- A 2ª R. menos de dois meses depois da venda apresentou-se a exigir da A. e das suas filhas a entrega da fracção, procedendo ao corte da luz.
- A conduta dos RR. provoca-lhe grande desgaste psicológico, angústia e justificado receio de ficar sem habitação para as filhas de um dia para outro, o que lhe causa um profundo desespero.
- Sem prescindir, invoca o abuso de direito, sustentando que a forma como os RR. têm exercido o direito de propriedade é não só contrária à boa fé e aos bons costumes, mas também ao sentimento jurídico-social dominante de protecção a casa de morada de família.
*Citados ambos os RR. contestaram.
O primeiro R. na sua contestação, com pedido reconvencional, aduziu, em síntese e sinopticamente, o seguinte: - O contrato de compra e venda outorgado entre os RR correspondeu efectivamente à vontade das partes, inexistindo qualquer acordo simulatório com o intuito de prejudicar a A.
- Jamais acordou com a A. que esta e as filhas menores de ambos ficariam a residir gratuitamente na fracção habitacional que lhe pertence até à sua maioridade. O que ficou acordado a esse respeito entre si e a A. foi que esta podia ocupar a fracção juntamente com as filhas até que ele procedesse à venda da mesma, dispondo a A., ao contrário do que alega, de meios financeiros que lhe permitem arrendar um imóvel em Braga.
- Tencionava vender a referida fracção a J. G. e mulher S. V. com os quais celebrou um contrato promessa de compra e venda, sendo que estes necessitavam da mesma num curto espaço de tempo para aí instalarem a sua habitação permanente. Quando a A., ao contrário do que se vinculara, se recusou a desocupar a fracção logo se apercebeu que não poderia honrar o contrato promessa, sendo essa a razão de o mesmo não ter sido cumprido, o que lhe causou um prejuízo patrimonial significativo.
- Surgiu, entretanto, a possibilidade de vender a fracção à 2ª R. que se concretizou no dia 18.5.2020, na 2ª Conservatória do Registo Predial de Braga através do...
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