Acórdão nº 93648/20.4YIPRT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 24 de Março de 2022

Magistrado ResponsávelMARIA CRISTINA CERDEIRA
Data da Resolução24 de Março de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO Pinturas P. - P. Unipessoal, Lda.

instaurou procedimento de injunção contra J. M.

, pedindo a condenação deste no pagamento da quantia total de € 14.464,59, sendo € 14.015,47 a título de capital, acrescido de € 347,12 de juros de mora vencidos entre 11/03/2020 e 22/10/2020 e de € 102,00 de taxa de justiça.

Alega, em síntese, que, no âmbito da sua actividade, celebrou com o requerido um contrato de prestação de serviços para a realização de obras de restauro na sua habitação, sita em Amares, em conformidade com um orçamento apresentado pela requerente e aceite pelo requerido, no valor total de € 22.527,12 (€ 21.252,00 + € 1.275,12 de IVA).

O requerido efectuou o pagamento da quantia total de € 15.000,00, tendo sido emitida uma primeira factura desse valor, cujo IVA no montante de € 900,00 ainda se encontra por regularizar.

No decorrer da obra, por acordo entre as partes, ficou combinado não executar as escadas, tendo sido emitida a nota de crédito referente a esse trabalho não executado.

Ao longo da obra foram solicitados pelo requerido e realizados outros trabalhos não constantes do orçamento inicial. A obra findou em Junho de 2020, tendo a factura nº. SEC120/1, no valor de € 8.026,32, sido enviada para a morada do requerido, por carta registada com aviso de recepção.

Mais tarde, foi igualmente enviada, por carta registada com aviso de recepção, a factura nº. SEC120/15, no valor de € 7.629,38, relativa aos trabalhos extras executados.

O requerido, apesar das interpelações da requerente, recusa-se a proceder ao pagamento dos trabalhos executados, estando em dívida a soma das duas facturas, subtraindo a nota de crédito no valor de € 1.640,24 (€ 8.026,32 + € 7.629,38 = € 15.655,70 - € 1.640,24 = € 14.015, 47).

O requerido deduziu oposição, na qual se defendeu por excepção, alegando a ineptidão da petição inicial, por falta de causa de pedir, sustentando, em consequência, a sua absolvição da instância.

Assim se não entendendo, alega que os trabalhos de construção civil e pintura executados pela requerente, no âmbito do contrato de empreitada entre ambos celebrado, tendo por base o orçamento acima referido, apresentam vários defeitos e anomalias, havendo também diversas obras contratadas ainda por concluir, tanto no exterior como no interior das divisões que compõem o espaço, que descreve no artº. 32º da sua oposição, para além de que falta fazer o portão de entrada da habitação e pintá-lo, alargar os pilares e as sapatas da cozinha, o que obsta a que o imóvel tenha as qualidades necessárias ao fim a que se destina (habitação).

Acrescenta que, em 8/06/2020, a requerente abandonou a obra e pese embora tenha sido, por diversas vezes, interpelada pelo requerido para retomar a execução dos trabalhos que estão por concluir e para eliminar/reparar os defeitos de que padece a obra, a requerente nada fez nesse sentido.

Perante o incumprimento contratual por parte da requerente, na modalidade de cumprimento defeituoso, assiste ao requerido o direito de recusar a sua prestação de pagamento do preço, pelo que invoca a excepção de não cumprimento do contrato nos termos do disposto no artº. 428º do Código Civil, não sendo devidos os valores peticionados pela requerente.

Conclui, pugnando pela procedência da excepção invocada e improcedência da acção, com as legais consequências.

Distribuídos os autos como acção especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato, a Autora veio responder às excepções deduzidas pelo Réu, defendendo que foram alegados factos suficientes para cabal compreensão da sua pretensão e para apresentação de defesa por parte do R., como, aliás, este apresentou, revelando ter compreendido e interpretado convenientemente a petição inicial.

Mais alega que volvidos mais de dois anos desde o início da obra, o R. não denunciou quaisquer defeitos da obra, que inexistem, ou exigiu qualquer reparação - sendo que nem mesmo após as sucessivas interpelações para pagamento, o R. mencionou quaisquer defeitos - salientando que jamais os trabalhos executados condicionam o fim a que o imóvel se destina, que é a habitação.

Refere, ainda, que não tendo existido qualquer interpelação ou denúncia dos defeitos da obra, não pode o R. vir agora invocar a referida excepção de não cumprimento prevista no artº. 428º do Código Civil, salientando, por mera hipótese, que se se demonstrasse a existência de alguns defeitos, haveria um claro desequilíbrio entre os defeitos apontados e os valores não pagos.

Termina, pugnando pela improcedência das excepções invocadas e total procedência da acção.

Ante a posição assumida pelo R., e à luz do disposto no artº. 17º do DL 269/98 de 1/9 e artº. 590º, n.º 2, al. b) e n.º 4 aplicável “ex vi” do artº. 549º ambos do NCPC, por despacho proferido em 10/03/2021 foi o R. convidado a concretizar a matéria dos artºs 27º, 28º e 40º da sua oposição, especificando o(s) momento(s) em que foi comunicada à autora a existência de defeitos e quais e em que momento(s) esta se deslocou à obra para averiguação dos mesmos.

Em resposta, o R. veio alegar que, no decurso da obra, à medida que os defeitos e anomalias eram detectados, eram prontamente comunicados pelo R. à A. por contacto telefónico (chamadas ou SMS’s).

Praticamente todas as vezes que o R. comunicou os defeitos ou omissões de trabalhos à A., o seu legal representante, Sr. P., deslocou-se à moradia do R. para em conjunto, e no local, verificarem os problemas, tendo a A. se comprometido a corrigir os defeitos.

Refere, ainda, que perante a inércia da A., o R. interpelou-a, por intermédio dos seus advogados, através de carta registada datada de 16/06/2020, na qual dá conta que a A. tinha abandonado a obra em 8/06/2020, e de carta registada datada de 11/11/2020, sendo que a A. reconheceu e elaborou uma lista onde elencou os defeitos detectados e os trabalhos em falta, comprometendo-se a reparar tais deficiências e a executar as falhas, o que não chegou a fazer.

Em conclusão, alega que o reconhecimento da A. equivale à denúncia dos defeitos e tem o efeito impeditivo de decurso de um prazo de caducidade para instauração da acção judicial destinada à eliminação dos defeitos, demanda essa que o R. dará entrada em juízo contra a A. oportunamente.

A A. respondeu, salientando, em síntese, que em 8/06/2020 entregou as chaves ao R. por a obra se encontrar concluída, não tendo o R. procedido ao pagamento da factura enviada por a A. não ter efectuado a pintura do portão de entrada (que não constava do orçamento).

Mais alega que o R., nas cartas que enviou à A. a solicitar a conclusão da obra, em momento algum mencionou defeitos da obra e/ou prazo para a sua reparação, nem concretizou quais os trabalhos que não foram concluídos.

Por despacho proferido em 13/05/2021, foi julgada improcedente a excepção de ineptidão da petição inicial.

Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, com observância do legal formalismo, nomeadamente com indicação e produção de prova testemunhal, documental e por depoimento/declarações de parte.

Após, foi proferida sentença que decidiu nos seguintes termos: Pelo exposto, julgando-se procedente a excepção de não cumprimento do contrato, condena-se o réu a pagar à autora a quantia de € 7.527,12 (sete mil, quinhentos e vinte e sete euros, doze cêntimos), assim que executados/concluídos os trabalhos acordados, com a execução das escadas e a colocação do dreno e da tela na garagem em conformidade com o convencionado, em cumprimento integral da prestação da autora, absolvendo-se o réu do demais peticionado.

Custas por autora e réu, pelo decaimento.

Inconformada com tal decisão, a Autora dela interpôs recurso, extraindo das respectivas alegações as seguintes conclusões [transcrição]: 81. O tribunal a quo interpretou de forma adequada a situação jurídica em causa, referindo tratar-se de um contrato de empreitada a execução dos trabalhos realizados pelo recorrente. No entanto, 82. Aquando da avaliação da exceção de não cumprimento por parte do Recorrido como justificação para o não pagamento de parte do preço em dívida, decidiu, com o devido respeito, erradamente, uma vez que, não existem nos autos prova bastante para fazer valer tal tese.

  1. De facto, o Tribunal a quo condenou o réu a pagar à autora a quantia de € 7.527,12 (sete mil, quinhentos e vinte e sete euros, doze cêntimos), assim que executados/concluídos os trabalhos acordados, com a execução das escadas e a colocação do dreno e da tela na garagem, quando em momento algum foi peticionado isso pelo Réu conforme se verá.

  2. Entende a Autora que foram incorretamente julgados diversos pontos da matéria de fato, sendo que- com o devido respeito – a prova testemunhal produzida pelo Réu em sede de audiência de julgamento nunca poderia ter sido dado como provado que ainda falta executar os seguintes trabalhos: a) escadas; b) colocação do dreno; c) tela na garagem; 85.

    Mas mais grave, entendeu o tribunal a quo que e que é devido à falta de tais trabalhos que o Réu não efetua o pagamento do preço em falta, julgando a exceção de não cumprimento provada.

  3. No entanto, e como se verá o não pagamento por parte do recorrido nada tem a ver com os trabalhos mencionados na condenação.

  4. Salvo melhor opinião, as provas produzidas, máxime a prova testemunhal produzida pelo Réu não é suficiente para dar como provada a exceção de não cumprimento.

  5. No entanto, como se evidencia pela motivação da decisão de facto, o Tribunal recorrido, antes de produzida a prova, antecipou o julgamento e decisão do mérito da causa, comprometendo-se com esse pré-julgamento que, de forma inegavelmente notória, flagrante a quase surreal, contamina toda a apreciação crítica e criteriosa das provas.

  6. Assim, considerados os fundamentos que vão ser alegados e realizada a reapreciação da prova gravada (o que se requer), entende a Autora que deverá ser modificada e/ou revogada a douta decisão de facto, por razões...

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