Acórdão nº 5261/20.6T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Março de 2022

Magistrado ResponsávelJOSÉ FLORES
Data da Resolução17 de Março de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes da 3.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães*ACÓRDÃO 1.

RELATÓRIO N. M. e S. R.

propuseram acção declarativa de condenação, com processo comum contra ConstruX – Construção e Reabilitação, Unipessoal, Lda., pedindo que seja julgada procedente a acção e, em consequência: - se declare nulo ou anulável o contrato-promessa de compra e venda celebrado entre os autores e a ré, e seja a ré condenada a restituir-lhes o valor de 30.000,00€ (trinta mil euros), prestado a título de sinal, acrescido de juros vencidos e vincendos até efectivo e integral pagamento; - caso assim não entenda, seja declarado o contrato-promessa de compra e venda celebrado definitivamente incumprido pela ré e, em consequência, seja a ré condenada a restituir aos autores o valor de 60.000,00€ (sessenta mil euros), correspondente ao sinal em dobro, acrescido de juros vencidos e vincendos até efectivo e integral pagamento; - ou, em alternativa, caso assim não se entenda, se declare resolvido o contrato-promessa de compra e venda celebrado entre os autores e a ré, nos termos das cláusulas 6.ª e 10.ª do mesmo contrato, e a ré condenada a restituir-lhes o valor de 30.000,00€ (trinta mil euros), prestado a título de sinal, acrescido de juros vencidos e vincendos até efectivo e integral pagamento; - ainda, “supletivamente”, caso não seja concedido provimento a nenhum dos pedidos supra, seja a ré condenada a restituir aos autores o valor de 30.000,00€ (trinta mil euros), a título de enriquecimento sem causa.

A ré contestou, pedindo a improcedência da acção.

Em reconvenção, peticiona ainda a ré que, (a) seja declarada a resolução do contrato-promessa celebrado entre Reconvinte e Reconvindos em 29.11.2020, por facto imputável aos ora Reconvintes; (b) seja declarado o direito da Reconvinte de fazer sua a importância entregue pelos Reconvindos a título de sinal à Reconvinte; c) sejam os Reconvindos condenados a pagar à ora Reconvinte o quantitativo de €7.887,16, a título de danos patrimoniais, acrescida de juros de mora calculado à taxa de juro legal desde a citação até efectivo e integral pagamento.

Os autores replicaram, pedindo a improcedência da reconvenção.

Dispensada a realização da audiência prévia, foi proferido o despacho-saneador com a admissão da reconvenção.

Instruída e julgada a causa, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo.

“Pelo exposto, o Tribunal decide julgar a presente acção improcedente e a reconvenção parcialmente procedente e, em consequência: - declara-se válida a resolução do contrato promessa celebrado a 29.11.2019, por incumprimento definitivo imputável aos autores/promitentes-compradores; - reconhece-se o direito da ré/reconvinte a fazer sua a importância entregue pelos autores/promitentes-compradores a título de sinal; - absolvem-se os autores de tudo o mais peticionado em sede reconvencional.

Custas por autores e réus na proporção de 2/3 para 1/3.” Conclusões.

  1. A sentença proferida pelo Tribunal a quo padece da nulidade prevista no art.º 668.º, n.º1, al. d), do Cód. de Proc. Civil, porquanto é totalmente omissa quanto à resolução do contrato promessa compra e venda com fundamento nas cláusulas sétimas e décima primeira do referido contrato.

  2. Os Recorrentes impugnam a matéria de facto constante da sentença, entendendo que do elenco dos factos provados haveria de constar que: “o prédio foi prometido vender livre de quaisquer ónus, encargos ou responsabilidades”, com fundamento na prova documental e no depoimento do legal representante da R., dado que o mesmo tinha consciência que teria de cancelar, sob pena de não conseguir realizar o contrato definitivo, o ónus existente no prédio de renúncia à indemnização por aumento de valor, a que alude o artigo 61º, n.º 1 al. d) e n.º 2 da Lei n.º 2110 de 19/08/1961, constante da prova documental, fls. 71 a 78, conforme alegado pelos AA. na carta a dirigida à R. em 09 de março de 2020, sendo tal facto determinante para a apreciação da perda de interesse na prestação pelos Recorrentes, nos termos do art.º 830.º, do Cód. de Proc. Civil.

  3. Do elenco dos factos provados haveria também de constar que “A R. não respondeu à comunicação que lhe foi dirigida pelos Recorrentes em 09.03.2020, na qual invocaram a resolução do contrato, e encetou diligências no sentido de arranjar um novo comprador, demonstrando conformar-se com o conteúdo da comunicação dirigida pelos Recorrentes e criando nos Recorrentes a convicção de que iria restituir o sinal prestado.”. Sendo que tal facto resulta da ausência de prova documental nesse sentido, bem como do depoimento do legal representante da R. que não só admite não saber se respondeu, como admite ter encetado diligências no sentido de arranjar um outro comprar. Depoimento corroborado pela prova testemunhal produzida através da testemunha Maria. Tal facto importa decisão diferente na apreciação da constituição em incumprimento definitivo pelos Recorrentes, conforme foi decidido em sede de 1.ª instância.

  4. Dos factos provados deveria ainda constar que “os AA. tomaram conhecimento da recusa do crédito bancário em data anterior à data da emissão da carta de recusa, datada de 13/02/2020, em data que não se pode precisar, mas sempre anterior a 13/02/2020 e haviam já tentado obter crédito junto do Banco ..., o que foi recusado.”, conforme resulta do depoimento da testemunha B. S. e das declarações de parte da A. S. R.. Tal facto tem influência directa na decisão da legalidade da resolução do contrato promessa com fundamento nas cláusulas sétima e décima-primeira, relativamente à qual o Tribunal a quo se pronunciou, enfermando, por isso, a decisão de nulidade.

  5. Por seu turno os factos 8. Os autores ao renunciar expressamente necessidade do reconhecimento presencial das assinaturas no contrato-promessa, geraram na ré a confiança e legítima convicção de que a referida nulidade jamais seria invocada pelos mesmos; 9. E de que iriam honrar os compromissos contratualmente assumidos outorgando o contrato prometido, do elenco dos factos provados haveria de constar dos factos não provados. Na verdade, os depoimentos prestados pelo legal representante da R. e pela testemunha Maria são totalmente contraditórios neste ponto, não permitindo ao Tribunal ter segurança em tal conclusão. Sequer o legal representante da R. ou a referida Maria souberam explicar o conteúdo de tal cláusula. Também em sede de declarações de parte a A. S. R. confirmou não ter entendido tal depoimento. Fazer constar do elenco dos factos não provados os pontos 8 e 9 dos factos provados importa decisão em sentido diverso quanto à invocada nulidade do contrato promessa compra e venda com fundamento na preterição do reconhecimento das assinaturas apostas no mesmo.

  6. O Facto 17. Os autores foram sempre informados pela ré dos motivos no atraso da celebração do contrato prometido, em face dos obstáculos encontrados para obter a licença de utilização e remover os ónus e encargos que oneravam o prédio prometido vender, mormente por força do contexto decorrente da propagação do coronavírus com o decretamento do estado de emergência, em que muitos serviços públicos foram encerrados ou se encontravam em teletrabalho., constante do elenco dos factos provados não está de acordo com a prova produzida em sede de julgamento, impondo-se, pois considera-lo como parte do elenco dos factos não provados. Tal facto não provado tem influência directa na apreciação da resolução do contrato promessa pelos Recorrentes, impondo-se considerar que a perda de interesse na prestação é fundada.

  7. Com fundamento no depoimento da A.. S. R. haveria de constar do elenco dos factos provados que “Os AA. tentaram obter financiamento bancário, pelo menos, junto de mais uma instituição bancária”. Na verdade, tal facto influi na apreciação da resolução operada pelos Recorrentes com fundamento nas cláusulas sétima e décima primeira do contrato promessa compra e venda, devendo a mesma ser considerada objectivamente motivada.

  8. Ao arrepio do que consta do facto 1. Do elenco dos factos não provados, dos factos provados haveria de constar que “A R. nunca enviou qualquer comunicação aos Recorrentes para prorrogação do prazo de 30 dias”, dado que resulta do contrato promessa compra e venda a exigência do envio de carta registada com aviso de recepção para fazer operar tal prorrogação. Para além disso, dos depoimentos prestados em julgamento não foi possível inferir com o mínimo de certeza que tal resolução aconteceu de forma extrajudicial. Tal facto importa entendimento diverso na apreciação da mora da R., conforme invocada pelos Recorrentes.

  9. O Tribunal a quo faz constar do elenco dos factos não provados que “2.

    Os autores limitaram-se a aderir na íntegra ao clausulado inserto no contrato promessa, sem negociação, e sem configurar a hipótese dele não ser perfeito;”. Ora, de acordo com a prova produzida em sede de julgamento, é imperativo que tal facto conste do elenco dos factos provados. Considerar-se tal facto como provado importa decidir-se pela nulidade do contrato promessa compra e venda com fundamento na preterição do reconhecimento de assinaturas do referido contrato.

  10. O Contrato promessa compra e venda é nulo por falta de reconhecimento das assinaturas nele apostas, ao contrário do que foi decidido na sentença aqui colocada em análise. Na verdade, o Tribunal sustenta a sua posição no facto de “temos entendido que quando as partes, no próprio contrato, declaram prescindir dessa formalidade e renunciar à invocação da respectiva omissão, ocorre válida renúncia tácita dos contraentes ao direito de obter a declaração de nulidade ou de anular o negócio, extinguindo-se, em consequência, esse direito”.

  11. O entendimento preconizado pelo Tribunal a quo quanto à referida nulidade há muito que se encontra ultrapassado. Veja-se o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça pronunciou-se em sentido diverso, sendo posição maioritária, que os promitentes compradores, nos termos do art.º 410.º, n.º 3, do Código...

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