Acórdão nº 3904/19.3T8VCT-H.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Março de 2022
Magistrado Responsável | ROSÁLIA CUNHA |
Data da Resolução | 17 de Março de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam, em conferência, na 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães: RELATÓRIO*Nos autos principais, por sentença de 9.12.2019, foi declarada a insolvência de X – INDÚSTRIA DE CARNES, LDA.
, não tendo sido designada data para a realização da assembleia de credores e tendo sido fixado em 45 dias o prazo para junção do relatório a que alude o art. 155º do CIRE.
*Em 24.1.2020 foi junto aos autos o relatório a que alude o art. 155º, do CIRE, acompanhado da lista de créditos provisória, no qual a Sr. Administradora se pronunciou no sentido de dever ser deliberado o encerramento da atividade do estabelecimento da insolvente e se proceder à liquidação do ativo do património apreendido para a massa insolvente.
*Por despacho de 12.2.2020, proferido nos autos principais, foi determinado o encerramento do estabelecimento da devedora, compreendido na massa insolvente para efeitos do artigo 156º, n.º 2 do CIRE, e que os autos prosseguissem com a liquidação do ativo.
*Por despacho de 2.1.2020, proferido no apenso B, foi declarado aberto o apenso de liquidação do ativo e foi autorizado que a Sr.ª Administradora diligenciasse pela venda dos bens móveis constantes do auto de apreensão, conforme requerimento pela mesma apresentado nesse sentido.
*Em 23.4.2020, foi proferido despacho que, apreciando o requerimento de 17.03.2020, subsequentes pronúncias dos credores e o requerimento de 06.04.2020, autorizou a Sr.ª Administradora à constituição de mandatário a favor da massa insolvente, para efeitos de propositura de ações judiciais e reclamações de créditos.
*Em 31.7.2020, a Sr.ª Administradora prestou informação sobre várias diligências que levou a cabo com vista à cobrança de créditos da insolvente, e requereu a prorrogação do prazo para liquidação do ativo por 90 dias.
Juntou ainda uma lista onde consta a identificação dos devedores da insolvente, o valor da dívida, a situação patrimonial desses devedores que conseguiu apurar nas diligências que efetuou e a resposta que cada um deles deu às cartas que lhes enviou com vista à cobrança desses créditos.
*A Sr.ª Administradora foi prestando regularmente informação sobre as diligências efetuadas no âmbito da liquidação do ativo.
*Em 22.6.2021, a Sr.ª Administradora veio pronunciar-se no sentido do encerramento da liquidação por não existirem bens suscetíveis de apreensão e posterior liquidação e, no que toca às ações pendentes com vista a recuperar créditos da insolvente, não ser expectável que se consiga cobrar efetivamente tais créditos, por ausência de património dos devedores, além de que essas ações implicam gastos e despesas para a massa insolvente.
*Em 23.6.2021, foi proferido despacho que determinou a notificação dos credores para se pronunciarem sobre a posição manifestada pela Sr.ª Administradora.
*Em 8.7.2021, a credora Y – Comércio de Gado, Lda. apresentou requerimento no qual, em síntese: a) requereu que a Sr.ª Administradora procedesse à junção de documento comprovativo de que a massa insolvente não iria receber o crédito no valor de € 613 782,63 no âmbito do processo de insolvência nº 5388/19.7T8STB-L; b) considerou que é pertinente a prossecução do procedimento de injunção em curso contra a sociedade P. C., Unipessoal, Lda. da qual a insolvente é credora; c) pronunciou-se no sentido de deverem ser intentadas as ações judiciais para recuperação dos créditos de que a insolvente é titular, constantes da lista junta em 31.7.2020, após prévia informação de quais dos créditos dessa lista que ainda permanecem por cobrar; d) manifestou interesse em adquirir alguns dos créditos da insolvente, requerendo informações sobre cada um desses créditos, designadamente origem, montante, datas de vencimento, natureza, entre outras de modo a poder avaliar e apresentar uma proposta de aquisição em conformidade.
*Em 12.7.2021, a credora Carnes C. – F. A. & Filhos, Lda. apresentou requerimento no qual declarou aderir na íntegra aos fundamentos invocados, pela credora Y – Comércio de Gado, Lda. no requerimento de 8.7.2021.
*Não houve pronúncia dos restantes credores.
*Notificada para se pronunciar sobre os aludidos requerimentos dos credores, veio a Sr.ª Administradora, em 12.8.2021, em síntese: a) juntar aos autos o mapa de rateio final do processo de insolvência nº 5388/19.7T8STB-L; b) dizer que considera que a instauração de ação executiva contra P. C., Unipessoal, Lda. irá acarretar prejuízos porque a massa insolvente irá ter gastos processuais e muito provavelmente não conseguirá cobrar o crédito por a sociedade devedora não possuir património; c) dizer que, relativamente ao prosseguimento das demais ações judiciais, informou os credores que se nada lhe fosse transmitido em contrário não iria intentar as ações; d) do conjunto de credores dois votaram favoravelmente a esse prosseguimento e um opôs-se, sendo que os restantes credores não se pronunciaram; e) os dois credores que votaram favoravelmente, atento o valor dos seus créditos, não representam a maioria, razão pela qual não propôs as ações; f) além disso, não considera útil, em termos de previsão, propor as ações dada a demora que as mesmas acarretariam, os custos inerentes e ainda a possibilidade de virem a ser invocados créditos por parte dos devedores da insolvente, com vista a obter a compensação; g) por isso, considera que o processo de liquidação deve ser encerrado; h) finalmente, referiu que nada tem a opor à aquisição de créditos da insolvente por parte da credora Y – Comércio de Gado, Lda., desde que os demais credores sejam notificados para se pronunciarem, devendo tal credora referir em que créditos está interessada a fim de ser solicitada a documentação relevante à contabilidade da insolvente e o posterior envio a tal credora para efeitos de apresentação de proposta.
*Este requerimento da Sr.ª Administradora foi notificado à credora Y – Comércio de Gado, Lda. com data de 13.8.2021.
*A credora Y – Comércio de Gado, Lda. não se pronunciou nos autos sobre o aludido requerimento.
*Em 6.9.2021 foi proferido despacho com o seguinte teor: “Visto.
Informe a AI da falta de resposta/oposição dos credores ao requerimento por si apresentado a 12.8.2021, de modo a que diligencie em conformidade.”*Em 20.12.2021, a Sr.ª Administradora apresentou requerimento no qual, designadamente, informou que, em 22.10.2021, enviou comunicação eletrónica à credora Y – Comércio de Gado, Lda. concedendo-lhe o prazo de 8 dias para que informasse quais os créditos que demonstrava interesse em adquirir.
Tendo em conta a ausência de pronúncia dos credores quanto ao requerimento apresentado em 12.8.2021, a perda de interesse na aquisição de créditos da insolvente e por se desconhecer a existência de outros bens suscetíveis de apreensão para a massa insolvente, requereu o encerramento da liquidação.
*Em 21.12.2021 foi proferido despacho com o seguinte teor: “Visto.---*Declara-se encerrada a liquidação do activo.--- D.n..---“*Em 22.12.2021, e após notificação do despacho atrás referido, a credora Y –Comércio de Gado, Lda. apesentou uma proposta de compra de todos os créditos da insolvente no valor de € 3 000.
*A credora Y - COMÉRCIO DE GADO, LDA.
, não se conformou com o despacho proferido em 21.12.2021 e interpôs o presente recurso de apelação, tendo terminado as suas alegações com as seguintes conclusões: “I) Do Objeto do Recurso 1- O presente recurso tem por objeto o douto despacho de 21 de Dezembro de 2021.
2- Em tal despacho, o Tribunal a quo, começa, simplesmente, com o “visto” do requerimento apresentado pela Administradora de Insolvência em 20/12/2021 – que aqui também se dá por integralmente reproduzido – e declara, sem mais, encerrada a liquidação do ativo da insolvente.
Ora, II) Da necessidade de continuação da fase de liquidação do ativo, de forma a satisfazer – ainda que parcialmente – os direitos dos credores e da nulidade da decisão ora recorrida.
3- A este propósito, a recorrente dá por reproduzido o requerimento de 08/07/2021.
4- Nesse requerimento, a recorrente manifestou expressamente interesse em adquirir pelo menos alguns desses créditos, estando a sua concreta proposta dependente das características concretas e específicas de cada um desses créditos – informações essas que a recorrente desde logo solicitou fossem prestadas pela Sra. Administradora de Insolvência, que, como é bom de ver, não o foram.
5- Ora, salvo o devido respeito, para que a ora recorrente precisasse quais os créditos que teria interesse em adquirir, necessitaria primeiro da informação a eles respeitantes, tendo, por esse motivo, peticionado desde logo que a Sra. Administradora de Insolvência indicasse as informações de todos os créditos.
6- É por dizer, de modo a poder tomar uma decisão ponderada sobre os créditos a adquirir, a ora recorrente precisava das informações sobre todos os créditos; não poderia fazer o inverso (indicar quais créditos pretendia adquirir sem as respetivas informações) sob pena de estar a “comprar” créditos que poderiam não ser cobráveis – por qualquer motivo.
7- Urge reiterar que a posição da recorrente nos autos já era cristalina: aguardava as informações sobre os créditos da sociedade insolvente (todos eles) para saber sobre os quais apresentaria proposta de aquisição.
8- Informações estas que nunca foram prestadas, realce-se.
9- Face ao exposto, verifica-se que não foi, materialmente, dada oportunidade à ora recorrente para poder apresentar uma proposta – informada, ponderada e concreta – sobre os créditos que pretendia (e pretende) adquirir.
10-Por outro lado, existiam ainda vários outros créditos (de valor superior a 400.000,00€) cuja prossecução nem sequer foi tentada nestes autos.
11-O processo de insolvência tem como finalidade “a liquidação do património de um devedor insolvente e a repartição do produto obtido pelos credores” (artigo 1º, nº1 do C.I.R.E.), sendo o apenso de liquidação (artigos 156º e ss. do C.I.R.E.) instrumentais para a efetivação dessa finalidade.
12-Ora, existindo património, de...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO