Acórdão nº 6080/15.8T8GMR-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Março de 2022

Data17 Março 2022

Acordão no Tribunal da Relação de Guimarães I – RELATÓRIO F. I., solteira, estudante, nascida aos -/01/2001, residente na R. …, Guimarães, interpôs a presente acção de alimentos, com processo especial, contra a sua mãe M. F., divorciada, operária fabril, com domicílio em R. …, Guimarães.

Nela peticiona que se condene a ré a pagar-lhe uma pensão de alimentos, de 200 euros, dado continuar a estudar e não ter meios de prover à sua subsistência, pedindo ainda a restituição, pela mesma ré, do montante recebido pela progenitora, a título de pensão de sobrevivência da autora, ao longo do ano de 2018, que computou em €1.446,31.

Frustrando-se a tentativa de acordo, a requerida defendeu a improcedência do pedido, alegando não ter condições para pagar qualquer pensão, que a filha tem rendimentos que cheguem para se sustentar e que, finalmente, não lhe é exigível o requerido pagamento dado o carácter conflituoso daquela.

Os autos seguiram os respectivos trâmites e, a final, veio a ser proferida sentença do seguinte teor: «…julga-se a presente ação parcialmente procedente, na medida do provado, e condena-se a R. a pagar à A., mensalmente e até ao fim do curso enquanto não reprovar por culpa sua, ou até ter 25 anos (nos termos do art.º 1905.º, n.º 2, do C.C.), a pensão de alimentos de 90 Euros mensais a atualizar anualmente, em janeiro de cada ano, de acordo com a taxa de inflação.

Mais se condena a R. a restituir à A. o montante de 1233,81 Euros que recebeu a título de pensão de sobrevivência da filha».

Com ela não se conformando, interpõe, agora, recurso a requerida M. F., apresentando as suas alegações, onde conclui nos seguintes termos: 1. A sentença proferida padece de nulidade nos termos e para os efeitos das alíneas c) e d) do n.º 1 do artigo 615º do CPC e, consequentemente deverá ser revogada e substituída por outra que absolva a Ré/Recorrente dos pedidos contra si formulados.

  1. Em virtude dos factos dados como provados e da própria fundamentação da decisão, imperava que a decisão proferida pelo douto Tribunal a quo fosse totalmente distinta daquela que efetivamente foi proferida.

  2. A Recorrente entende que o comportamento da Recorrida revela, sem quaisquer dúvidas, uma grave violação de respeito relativamente à sua pessoa, atentatória da sua personalidade moral, ofendendo a sua dignidade pessoal, o respeito e a consideração que lhe são devidos pela sua filha.

  3. Ora, o comportamento adotado pela recorrida é censurável, na justa medida em que encara a sua progenitora, única e exclusivamente, como uma fonte de rendimento, como sujeita de deveres, desprezando ou ignorando outros valores, como o de respeito pela personalidade moral, a estima, a consideração e a solidariedade familiar.

  4. Mormente, porque não havendo contactos pessoais entre ambas desde os seus dezassete anos, desde que abandonou o lar da progenitora, por iniciativa própria, conforme resulta dos autos, também se apura que não exista outro género ou nível de relações/contactos entre ambas! 6. Aliás, espelho do ponto de vista da Recorrida é, precisamente, o facto de esta referir que saiu de casa porque existia miséria, falta de alimentação e, um ano depois vir exigir da sua mãe o pagamento de uma pensão de alimentos.

  5. O Tribunal a quo conseguiu fixar como matéria provada que Recorrente e Recorrida têm uma relação praticamente inexistente e a que existe é péssima.

  6. Ficou demonstrado que a Recorrida aufere, mensalmente, 232,78 Euros, não paga passe escolar e tem senhas para refeições na escola, onde está matriculada no presente ano letivo de 2021/22 no terceiro ano do curso profissional de técnica auxiliar de saúde.

  7. Entende a Recorrente que os poderes-deveres previstos no artigo 1874º do Código Civil, reciprocamente atribuídos a pais e filhos, transcendem a mera obrigação de prestar alimentos.

  8. Deve atender-se ao princípio da razoabilidade, da exigência do cumprimento da obrigação de alimentos, nos termos do disposto nos arts. 1880º e 1905º do Código Civil.

  9. As necessidades da recorrida não poderão sobrepor-se às da recorrente, ao efetuar cotejo entre as necessidades de quem pretende receber e as possibilidades de quem paga.

  10. No caso em apreço, entende a recorrente não ser razoável exigir-lhe o pagamento de alimentos, considerando o rendimento mensal que a Requerida aufere, a ausência de encargos de renda de casa e demais despesas inerentes às despesas de um agregado familiar da recorrida, bem como, a falta do dever de respeito perante a progenitora, patenteada pela factualidade descrita e dada como provada.

  11. Quanto à medida dos alimentos rege o artigo 2004.º, n.º 1 do CC, de acordo com o qual “Os alimentos serão proporcionados aos meios daquele que houver de prestá-los e à necessidade daquele que houver de recebê-los.” 14. Dos factos provados e da fundamentação da decisão doutamente proferida pelo Tribunal a quo, entende a Recorrente que a decisão deveria ter sido a de absolvição da Ré do pedido formulado já que se verifica claramente a irrazoabilidade da exigência feita pela Recorrida.

  12. O Tribunal a quo não deveria ter conhecido sobre o pedido de devolução de quantias que a Recorrida entende que a Recorrente delas se apropriou ilegitimamente.

  13. O próprio Tribunal a quo refere que: “(…) pois de outro modo verificar-se-ia um enriquecimento sem causa, como definido no art.º 473º do C.C.” 17. O pedido formulado pela Recorrida quanto a esta questão deverá ser discutido noutra sede que não a presente.

  14. Verificando-se, por isso, a incompetência material do Tribunal para conhecer do pedido em causa.

  15. Não são, sequer, pedidos conexos que permitam que a Recorrida possa peticionar tal no âmbito do incidente de alteração de responsabilidades parentais.

  16. A pretensão da Recorrida deveria ser acionada através de ação declarativa comum, fundada no artigo 473º do Código Civil.

  17. Ao conhecer de um pedido formulado pela Recorrida estando impedido de o fazer, o Tribunal a quo feriu de nulidade a sentença proferida e, consequentemente, deverá a mesma ser revogada e substituída por outra que absolva a Recorrente de tal pedido formulado.

  18. A sentença proferida é nula ao abrigo das alíneas c) e d) do nº 1 do artigo 615º do CPC, devendo por isso ser integralmente revogada e substituída por outra que absolva a Recorrente de todos os pedidos contra si formulados.

Termina pedindo que seja revogada a sentença em crise, substituindo-se a mesma por outra que absolva a recorrente dos pedidos contra si formulados.

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