Acórdão nº 225/21.5T8VRL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Fevereiro de 2022
Magistrado Responsável | ANTÓNIO BEÇA PEREIRA |
Data da Resolução | 10 de Fevereiro de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I X Lda. instaurou a presente ação declarativa, que corre termos no Juízo Central Cível de Vila Real, contra A. J., formulando os pedidos de: "
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Declarar-se que ocorreu a resolução, com justa causa, do Contrato Promessa de Compra e Venda n.º ...-2020 Casas ... - Lote B, celebrado entre A. e R. em 23 de junho de 2020, operada pela A. e decorrente do incumprimento definitivo, por atos culposos por parte do Réu, por desrespeitar as Cláusulas Terceira, Sétima e Oitava daquele contrato e por se recusar a celebrar a escritura pública de compra e venda definitiva.
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Declarar-se nulo o Contrato de Empreitada C...-2020 "Casas ... M - Lote B", celebrado em 24 de junho de 2020, entre o R. e Y - Engenharia e Construção, Lda. e que faz parte integrante do Contrato Promessa de Compra e Venda n.º ...-2020 Casas ... Lote B, celebrado entre A. e R. em 23 de junho de 2020.
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Ser o R. condenado a reconhecer os pedidos formulados em a) e b).
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Ser declarado que a Autora tem direito a fazer sua a quantia entregue a título de sinal pelo Réu, no valor de 15.000,00 €.
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Ser o R. condenado a reconhecer o pedido formulado em d).
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Ser o R. condenado a pagar à A. a quantia de 15 000,00 €, a título de indemnização pelo não cumprimento do contrato promessa pelo Réu, conforme estipulado na Cláusula Décima Primeira do contrato promessa, acrescido de juros de mora à taxa legal desde a citação até integral e efetivo pagamento.
" Alegou, em síntese, que é proprietária de um prédio rústico, situado na ..., Rua ..., n.º ..., da União das Freguesias de ..., concelho de Vila Real, e que em junho de 2020 celebrou com o réu um contrato-promessa de compra e venda desse bem, tendo-lhe este entregue então, a título de sinal, a quantia de 15.000,00 €.
Nesse contrato consta ainda que o réu e a Y Engenharia e Construção Lda. "celebram em simultâneo com este contrato, um contrato de empreitada com a designação: Contrato de Empreitada C... Casas ... Lote B, que faz parte integrante deste contrato".
Mais alega que, face à posterior recusa do réu em celebrar o contrato prometido, comunicou-lhe a sua decisão de resolução do mesmo.
O réu não contestou a ação, pelo que foram considerados confessados os factos articulados pela autora.
Foi proferido saneador-sentença em que se decidiu: "As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas.
(…) Por tudo quanto de deixa exposto, julgo a presente ação procedente e, consequentemente:
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Declaro que ocorreu a resolução, com justa causa, do Contrato Promessa de Compra e Venda n.º ...-2020 Casas ... - Lote B, celebrado entre A. e R. em 23 de junho de 2020, operada pela A. e decorrente do incumprimento definitivo, por atos culposos por parte do Réu, por desrespeitar as Cláusulas Terceira, Sétima e Oitava daquele contrato e por se recusar a celebrar a escritura pública de compra e venda definitiva.
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Declaro ineficaz o Contrato de Empreitada C...-2020 "Casas ... M - Lote B", celebrado em 24 de junho de 2020, entre o R. e Y - Engenharia e Construção, Lda. e que faz parte integrante do Contrato Promessa de Compra e Venda n.º ...-2020 Casas ... Lote B, celebrado entre A. e R. em 23 de junho de 2020.
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Condeno o Réu a reconhecer os pedidos formulados em a) e b).
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Declaro que a Autora tem direito a fazer sua a quantia entregue a título de sinal pelo Réu, no valor de 15 000,00 € (quinze mil euros).
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Condeno o Réu a reconhecer o pedido formulado em d).
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Condeno o Réu a pagar à Autora a quantia de 15 000,00 € (quinze mil euros), a título de indemnização pelo não cumprimento do contrato promessa pelo Réu, conforme estipulado na Cláusula Décima Primeira do contrato promessa, acrescido de juros de mora à taxa legal desde a citação até integral e efetivo pagamento.
" Inconformado com esta decisão, o réu dela interpôs recurso, que foi recebido como de apelação, com subida nos próprios autos e efeito devolutivo, findando a respetiva motivação, com as seguintes conclusões: A. Nos presentes autos e perante a revelia do réu, por falta de contestação, sempre o tribunal deve conhecer de todas as matérias que sejam de conhecimento oficioso, como a exceção dilatória de ilegitimidade, nos termos dos arts. 577.º e 578.º do CPC, devendo ainda "julgar a causa conforme for de direito", nos termos do art. 567.º n.º 2, do CPC.
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Na relação material controvertida, tal como é configurada pela autora, a sociedade Y - Engenharia e Construção, Lda., outorgou nos contratos promessa e de empreitada que a autora colocou em crise através da presente ação.
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Pelo que, para que a decisão a obter produza o seu efeito útil normal, nos termos do art. 33.º, do CPC, deveria ter intervindo nestes autos a outorgante nos contratos Y - Engenharia e Construção, Lda..
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Nesta sequência, a preterição de litisconsórcio necessário, é causa de ilegitimidade, nos termos do já referido art. 33.º do CPC.
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A ilegitimidade é uma exceção dilatória, de conhecimento oficioso, nos termos dos arts. 577.º al. e) e 578.º do CPC.
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Exceção dilatória de que a sentença recorrida não conheceu.
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Nos termos do art. 615.º n.º 1 al. d), do CPC, a sentença é nula, quando "O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar".
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Ocorrendo, então, nulidade da sentença recorrida, por não se ter pronunciado sobre a preterição de litisconsórcio necessário passivo, causadora da exceção dilatória de ilegitimidade, de conhecimento oficioso.
I. Ao deixar de se pronunciar sobre a preterição de litisconsórcio necessário, a sentença recorrida violou os arts. 33.º, 577.º al. e), 578.º e 615.º n.º 1 al. d), do CPC.
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Não tendo o réu contestado a ação, consideram-se confessados os factos articulados pelo autor, nos termos do art. 567.º n.º 1, do CPC, em cujo artigo se prevê o chamado efeito cominatório semipleno, o qual, in casu, se circunscreve aos factos efetivamente alegados pela autora, não considerando a matéria de direito e conclusiva alegada por esta.
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O facto provado n.º 16, mistura matéria de facto e um conceito conclusivo, pelo que a sua segunda parte deve ser excluída do acervo factual relevante, uma vez que exorbita o âmbito do n.º 1, do art. 567.º, do CPC, devendo do facto provado n.º 16 constar apenas o seguinte: "Aquela cláusula Décima Primeira contém erro de escrita quando refere que "terá de pagar ainda à Segunda Outorgante"".
L. Acresce que, quanto ao sentido pretendido no excerto em questão da cláusula 11.ª do contrato promessa, não incluído no efeito cominatório semipleno, a entender-se que tal circunstância poderia incluir a seleção da matéria de facto, teria tal matéria de ser objeto de especificação sobre os fundamentos de facto na sentença recorrida, o que não sucedeu, sempre ocorrendo, neste caso, nulidade da sentença, nos termos do art. 615.º n.º 1 al. b), do CPC.
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Sem prescindir, desde já se alega que, atendendo ao critério previsto no art. 236.º n.º 1, do CC, certo é que, existindo no contrato promessa uma terceira outorgante, subsiste uma dúvida sobre qual o sentido pretendido pelas partes na cláusula em questão, o que não sucederia se apenas houvesse dois outorgantes no referido contrato.
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Em conformidade, ao decidir pela formulação da 2.ª parte do facto provado n.º 16, a sentença recorrida violou os arts. 567.º n.º 1, e 615.º n.º 1 al. b), do CPC.
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Não ocorreu incumprimento definitivo do contrato promessa por parte do promitente comprador, ora réu.
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Não existe, in casu, uma situação de recusa expressa do réu em cumprir o contrato promessa que celebrou com a autora, o que é reconhecido na motivação de direito da sentença recorrida.
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Não se encontra também alegado pela autora, nem dado como provado na sentença, que a autora tenha objetivamente perdido o interesse na prestação, nenhum facto constando destes autos nesse sentido.
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A autora não procedeu à interpelação admonitória do réu.
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Concretamente, a carta registada remetida pela autora ao réu, e por este recebida no dia 08/10/2020, a que se referem os factos provados n.ºs 50 a 60, na sentença recorrida, e junta com a petição inicial como doc. n.º 9, jamais poderá valer como interpelação admonitória, para efeitos do art. 808.º n.º 1, do CC, não contendo a fixação de um prazo cominatório para a realização da escritura de compra e venda.
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Pelo contrário, na carta remetida pela autora ao réu, esta procede, desde logo, à resolução do contrato promessa, não concedendo ao réu qualquer prazo suplementar para que este cumpra a sua obrigação, nem a declaração de que, findo esse prazo sem que seja cumprida essa obrigação, o contrato se considera definitivamente não cumprido.
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Não preenchendo a carta enviada pela autora ao réu, e por este recebida em 08/10/2020, os requisitos da interpelação admonitória prevista no art.º 808.º, n.º 1, do CC, não houve incumprimento definitivo por parte do réu.
V. Inexistindo, por conseguinte, fundamento para a resolução do contrato promessa pela autora, devendo improceder todos os pedidos formulados pela autora na sua petição inicial, incluindo os pedidos de que a autora tenha direito a fazer sua a quantia entregue a título de sinal pelo réu, no valor de 15.000,00 €, e que o réu pague à autora a quantia de 15.000,00 €, a título de indemnização pelo não cumprimento do contrato promessa pelo réu.
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Ao decidir-se pela condenação do réu, a sentença recorrida violou os arts. 808.º n.º 1, do CC, e 567.º n.º 2, do CPC.
X. Na cláusula 11.ª do contrato promessa, encontra-se prevista uma cláusula penal compensatória, devida em caso de incumprimento definitivo do réu, que não tem aplicação no caso vertente, por inexistência de incumprimento definitivo por este.
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Mas ainda que o pudesse ser – o que, não se concedendo, apenas por cautela de patrocínio se admite – sempre seria a mesma ilegítima, com recurso ao instituto do abuso...
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