Acórdão nº 882/19.2T8FAF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 24 de Fevereiro de 2022
Magistrado Responsável | CRISTINA CERDEIRA |
Data da Resolução | 24 de Fevereiro de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO Fundo de Garantia Automóvel intentou a presente acção declarativa sob a forma de processo comum, contra X - Companhia de Seguros, S.A.
e, subsidiariamente, contra: 1.
J. M.
, 2. C. A.
, pedindo que seja o condutor do veículo JL considerando único e exclusivo responsável pelo acidente de viação em causa nos presentes autos e, em conformidade: a) seja a Ré X condenada no pagamento ao aqui Autor da quantia de € 20.457,44, acrescida dos juros legais vencidos, contados desde a data da citação até efectivo e integral pagamento, incrementados em 25%, e ainda no pagamento das despesas que o Autor vier a suportar com a cobrança do reembolso que também serão oportunamente liquidadas em ampliação do pedido ou em execução de sentença, bem como nas custas a que deu causa; b) Subsidiariamente, caso se demonstre a inexistência e invalidade do seguro de responsabilidade civil que titulava a circulação do veículo JL à data de 3/07/2015, sejam os Réus subsidiários condenados no pagamento ao Autor da quantia de € 20.457,44, acrescida dos juros legais, contados desde a data da citação até efectivo e integral pagamento, e ainda no pagamento das despesas que o Autor vier a suportar com a cobrança do reembolso que também serão oportunamente liquidadas em ampliação do pedido ou em execução de sentença, bem como nas custas a que deu causa.
Para tanto alega, em síntese, que em 3/07/2015, pelas 20h20, ocorreu um acidente de viação na Rua ..., sensivelmente em frente ao n.º de polícia ..., freguesia de ..., concelho de Fafe, em que foram intervenientes o veículo ligeiro de mercadorias, de marca Seat, modelo Ibiza, com a matrícula JL, conduzido pelo 1º Réu subsidiário e propriedade do 2º Réu subsidiário, e o peão C. P..
Após descrever o acidente, as características e condições da via, bem como o local onde o mesmo ocorreu, alega que o acidente, que consistiu no atropelamento do peão C. P., ficou a dever-se ao comportamento culposo do 1º Réu subsidiário, que conduzia o veículo JL em velocidade excessiva para o local, face ao limite legal, e sem prestar a devida atenção ao trânsito de peões, não observando as precauções exigidas pela mais elementar prudência e cuidado.
O proprietário do veículo JL, aqui 2º Réu subsidiário, celebrou com a Ré X um contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel emergente da circulação desse veículo.
Defende a interposição da presente acção contra todos os RR. atenta a existência de fundado conflito decorrente da nulidade do contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel que titulava a circulação do veículo interveniente no sinistro invocada pela Seguradora, contraposta à validade de tal contrato de seguro invocada pelo proprietário do veículo, tomador do seguro.
Em face dessas posições divergentes, o A. procedeu ao pagamento de indemnizações e despesas relacionadas com o sinistro, nos termos do artº. 50º do DL 291/2007 de 21/8, que descrimina nos artºs 82º a 84º da petição inicial, tendo despendido o montante total de € 20.457,44 na regularização do sinistro dos autos.
Conclui que se encontra sub-rogado nos direitos dos lesados ressarcidos, nos termos do artº. 54º, nºs 1, 3 e 4 do supra citado diploma legal, assistindo-lhe o direito de exigir dos RR. as indemnizações satisfeitas, tendo ainda direito aos juros de mora legais e ao reembolso das despesas de liquidação e cobrança que houver feito.
Os RR.
J. M.
e C. A.
contestaram, invocando a excepção da prescrição do direito de regresso invocado pelo Autor relativamente aos pagamentos efectuados por este até 25/09/2016, pugnando pela validade do contrato de seguro celebrado com a Ré Seguradora relativo ao veículo JL e impugnando grande parte da factualidade alegada na petição inicial, apresentando uma versão da dinâmica do acidente distinta da ali descrita, imputando a culpa pela ocorrência do sinistro exclusivamente ao peão C. P., que atravessou a faixa de rodagem sem observar as mais basilares regras de precaução e cuidado. Concluem os RR., pugnando: - pela procedência da excepção de prescrição invocada, com a absolvição dos RR. do pedido; - seja considerado válido e em vigor o contrato de seguro de responsabilidade civil celebrado com a Ré X sobre o veículo de matrícula JL, titulado pela apólice nº. .....33; - pela improcedência da acção, com a absolvição dos RR. contestantes do pedido.
A Ré X - Companhia de Seguros, S.A.
, por sua vez, contestou, impugnando a factualidade alegada na petição inicial, designadamente quanto à dinâmica do acidente e aos danos invocados como ressarcidos, defendendo, ainda, a existência de fundamentos para a nulidade ou anulabilidade do contrato de seguro referente ao veículo interveniente no sinistro, por falsas declarações do tomador de seguro no tocante à propriedade e condutor habitual do mesmo.
Termina, pugnando pela improcedência da acção e sua absolvição do pedido.
Os RR. J. M. e C. A. vieram exercer o contraditório, impugnando o alegado pela Ré X e mantendo tudo quanto deixaram dito na sua contestação.
O A. apresentou resposta na qual pugnou pela improcedência da excepção da prescrição deduzida pelos RR. subsidiários, concluindo pela tempestividade da presente acção e mantendo o alegado na petição inicial.
Foi realizada audiência prévia, na qual foi proferido despacho saneador, onde os RR. subsidiários declararam dar sem efeito a excepção de prescrição por eles invocada, se procedeu ao saneamento da acção, verificando-se a validade e regularidade da instância, se definiu o objecto do litígio e enunciou os temas de prova, que não sofreram reclamações.
Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, com observância do legal formalismo, na qual os RR. declararam aceitar a matéria vertida nos artºs 65º a 82º da petição inicial.
Após, foi proferida sentença que julgou a presente acção parcialmente procedente, por parcialmente provada e:
-
Declarou improcedente o pedido de declaração do condutor do veículo JL como único e exclusivo responsável pelo acidente de viação em crise nos presentes autos.
-
Condenou a Ré X - Companhia de Seguros, S.A. no pagamento da quantia de € 10.228,72 ao Autor, acrescida de juros à taxa legal, desde a data de citação até efectivo e integral pagamento, incrementados em 25%, e das despesas extrajudiciais com a cobrança do reembolso que o Autor vier a liquidar.
-
Absolveu os Réus do demais peticionado.
Inconformado com tal decisão, o Autor Fundo de Garantia Automóvel dela interpôs recurso, extraindo das respectivas alegações as seguintes conclusões [transcrição]: 1. O facto 16 da matéria de facto provada deve passar a ter a seguinte redacção: "No decurso de tal travessia. próximo do eixo da via, surgiu o veículo JL circulando na hemifaixa destinada à circulação no sentido Fafe - Celorico de Basto." 2. O facto 18 da matéria de facto provada deve ser alterado passando a ter a seguinte redacção: "Ao aperceber-se da aproximação do veículo JL e que não chegaria ao outro lado da via antes da passagem do mesmo. o peão C. P. voltou para trás, para a hemifaixa de rodagem afecta ao sentido de trânsito Celorico de Basto - Fafe." 3. O facto 19 deve ser alterado e passar a ter a seguinte redacção: "Ao deparar-se com o peão próximo do eixo da via. o Réu J. M. accionou o travão e perdeu o controlo do veículo e despistou-se." 4. O facto 23 da matéria de facto provada deve ser alterado e passar a ter a seguinte redacção: "Após o embate no peão, o condutor do JL manteve-se em despiste." 5. As alíneas c), d) e e) da matéria de facto não provada devem passar a constar da matéria de facto provada.
6. A alínea g) da matéria de facto não provada deve ser eliminada, aditando-se uma nova alínea, considerando-se como não provado que: “O Réu J. M. tenha realizado gualguer manobra no sentido de desviar-se do C. P. antes do embate com o mesmo." 7. A revogação da decisão sobre a matéria de facto acima referida, funda-se na interpretação do acervo probatório constantes dos autos, nomeadamente os depoimentos do R. J. M., e das testemunhas C. P., CABO DA GNR, L. A. e, bem assim, a Participação do Acidente de Viação e o Relatório de Averiguação.
***8. Atenta a reconformação da matéria de facto, deve considerar-se, que o comportamento do condutor do veículo JL contribuiu de forma única e exclusiva para o atropelamento do peão.
9. O condutor do JL violou com a sua conduta várias regras estradais, como sendo as que constam do disposto nos artigos 3º, 13º, 24º e 25º do CE.
10. Da conduta do peão não se surpreende qualquer facto que possa ser objecto de censura.
11. Devendo a companhia de seguros R. nos autos ser condenada na proporção de 100%.
***12. Sem conceder, e ainda que não proceda, o que se admite por mera cautela, ainda assim é forçoso que se conclua, da prova produzida nos autos, que o condutor do JL tem responsabilidade exclusiva na eclosão do sinistro.
13. Na verdade, a velocidade excessiva e a invasão da faixa de rodagem contrária foram elementos determinantes na eclosão do sinistro.
14. O condutor do JL poderia e deveria ter avistado o peão a cerca de 191 metros de distância, quando este se aproximava do eixo da via.
15. O condutor do TZ, caso conduzisse com atenção e perícia, e adequando a velocidade e a condução à estrada e ao trânsito, teria tempo e espaço para avistar o peão e reagir de forma a abrandar e parar no espaço visível e livre à sua frente.
16. Devendo a companhia de seguros R. nos autos ser condenada na proporção de 100%.
***17. Sem conceder, e caso o tribunal ad quem entenda atribuir culpa também ao peão na eclosão do sinistro - com o que não se concorda - tendo em conta a falta de destreza, imperícia e falta de atenção do condutor do veículo, imprimindo ao veículo uma velocidade superior a 80km/h, invadindo a faixa de rodagem contrária, entrando em despiste, sem cuidar das condições da via e do trânsito, nomeadamente de peões, que se processava na altura, deve entender-se que a culpa deve...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO