Acórdão nº 3064/19.0T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Dezembro de 2022

Magistrado ResponsávelRAQUEL BAPTISTA TAVARES
Data da Resolução15 de Dezembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I. Relatório AA, residente na Rua ..., V..., BB, residente na Avenida ..., V..., CC, residente na Rua ..., ..., ..., I..., Unipessoal, Lda.

, representada pela sua sócia gerente DD, com sede na Rua ..., ..., ..., ... e M..., Unipessoal, Lda, representada pela sua sócia gerente EE Maio, com sede na Rua ..., ..., ..., instauraram a presente ação sob a forma de processo comum, contra V... pesca, O... - Cooperativa de Produtores de Peixe de ..., Crl com sede na Doca ..., ..., V..., S.A., com sede na Avenida ..., ..., Lisboa, peticionando:

  1. Seja declarado que pelo acordo celebrado no Ministério do Mar em 3 de junho de 2019, entre os autores e as restantes 11 embarcações, através dos seus representantes, a Associação ... e a Organização de Produtores de Pesca Artesanal, a que se alude nos artigos 32º, 33º e 34º deste articulado, através do qual a 2ª Ré se comprometeu a pagar uma compensação global de 1.000.000,00 € a distribuir, por acordo, mormente por escrito, entre os proprietários das 16 embarcações identificadas no artigo 33º deste articulado; b) Seja declarado que essa compensação a pagar pela 2ª Ré resultou do Estado lhe ter concedido a concessão da Tutela de Utilização Privativa do Espaço Marítimo Nacional com o nº 1/2015/DRGM, emitido em 30 de Novembro de 2015, pelo período de 25 anos e, em consequência os titulares e proprietários daquelas 16 embarcações ficarem privados, durante o período da concessão, de pescar e/ou utilizar o Parque Eólico e de terem de procurar rotas marítimas alternativas, mais extensas e dispendiosas no trajeto de ida e regresso dos locais de pesca habituais. E, em consequência: c) Sejam as Rés condenadas, solidariamente, no pagamento ou na restituição da quota parte daquela compensação a que cada um dos autores tem direito, no montante de €62.500,00 cada, num total de €312.500,00, correspondente à indemnização acordada pelos prejuízos sofridos com a instalação daquele Parque Eólico; d) Sejam as Rés condenadas, solidariamente, no pagamento dos juros legais de tal importância, contados desde a sua citação até efetivo e integral pagamento”.

    Alegam, em síntese, que a segunda Ré vai proceder à instalação de uma central Eólica a cerca de 19 km da linha da costa de V..., a qual ocupará uma área sensivelmente de 10 Km2, para o que dispõe de um título de utilização privativa do espaço marítimo nacional, sendo o prazo de concessão por 25 anos, deixando de ser possível aos Autores pescarem na referida área e de ali passarem para outras zonas piscatórias.

    Mais, alegam que por ação da 1ª Ré, da Associação ... e da O..., bem como do Presidente da Câmara Municipal ..., da Ministra do Mar e do Secretário de Estado das Pescas, a 2ª Ré, em 03 de junho de 2019, aceitou pagar a 15 proprietários das 16 embarcações de Pesca “...”, “S...”, “Senhora do M...”, “FF” e “C...”, “...”, “Senhora da ...”, “P...”, “C...”, “F...”, “M...”, “P...1”, “S...1”, “...”, “Sempre em ...” e “...”, o montante definitivo de €1.000.00,00, tendo sido acordado que seria a 1ª Ré, em articulação com as outras Associações, que ficaria com a responsabilidade de determinar os critérios objetivos da sua divisão, determinando o quantum concreto a atribuir a cada uma das embarcações e respetivos proprietários, ficando acertado que teria que haver acordo escrito entre as 16 embarcações.

    Que os Autores não foram convocados para qualquer reunião, tendo-lhe sido comunicado posteriormente que seria atribuído aos primeiros 4 Autores uma compensação de €10.000,00 e ao último, uma compensação de €5.000,00.

    A quota parte que é devida aos Autores, na ausência de qualquer critério, deve ser fixada para todos, em partes iguais, isto é, no montante de €62.500,00, devendo os Autores receber montante correspetivo.

    Citadas as Rés, ambas apresentaram as suas contestações.

    A Ré V... pesca, O... - Cooperativa de Produtores de Peixe de ..., Crl (de ora em diante designada apenas por V... pesca) alegou, em síntese, que apenas prestou apoio aos seus cooperantes prejudicados com a instalação do parque eólico e mediou as negociações, sendo que aqueles sempre estiveram presentes ou representados, e tomaram as decisões que bem entenderam.

    Mais alega que a Ré não foi mandatada pelos Autores para os representar e que o valor disponibilizado pela Ré W..., S.A. de €1.000.000,00 visava proporcionar uma compensação social aos armadores afetados com a instalação do parque e que teriam que proceder à retirada das artes fixas na zona onde deveria ser instalado o parque.

    Que perante a verba proposta aos armadores afetados procurou que os demais armadores também fossem contemplados o que conseguiu alcançando um acordo entre todos os intervenientes lesados que aceitaram receber menos do que aquilo a que tinham direito a favor dos armadores não lesados, ficando acordado entre os armadores prejudicados atribuir a cada um dos armadores não afetados a quantia de €10.000,00 e €5.000,00 a quem nem sequer operava na zona.

    Alega ainda que os Autores nunca pescaram no espaço marítimo utilizado pela concessão para a instalação do parque eólico, sendo que só três dos barcos dos Autores são cooperantes da V... pesca e que os Autores nunca apresentaram qualquer prejuízo ou formularam qualquer pretensão, nunca tendo assumido qualquer responsabilidade, quer quanto ao resultado das negociações, quer quanto à distribuição pelos armadores prejudicados da verba disponibilizada.

    A Ré W..., S.A. (de ora em diante designada apenas por W..., S.A.), alega, em síntese, que depois da atribuição da concessão pelo Estado português, a Ré passou a ter um direito exclusivo de construir, instalar e explorar a central eólica e todo o perímetro de segurança, não tendo sido estabelecido qualquer dever ou obrigação da Ré de compensar as associações de armadores ou de pescadores por eventuais inconvenientes ou prejuízos de que padeçam ou venham a padecer em virtude da concessão legitimamente atribuída.

    Mais alega que a licença de pesca não atribui aos armadores nenhum direito de utilização privativa de uma determinada área do espaço marítimo, pelo que não há qualquer conflito entre a concessão da Ré e outro título de utilização privativa do domínio público, e que, na sequência das reuniões ocorridas, a Ré aceitou atribuir uma compensação monetária aos armadores, os quais foram identificados pela primeira Ré, que definiu também os critérios da distribuição e os montantes destinados a cada um.

    Findos os articulados, procedeu-se à realização da audiência prévia.

    Na sequência da discussão da causa com vista à delimitação dos termos do litígio, foi proferido despacho a determinar o cumprimento do contraditório quanto à Ré V... pesca, relativamente à contestação e documentos juntos pela Ré W..., S.A., e a notificação desta para juntar aos autos o anexo I do acordo que havia sido junto com a sua contestação como doc. n.º ..., e prestar esclarecimentos relativamente aos pagamentos a que já procedera.

    A Ré W..., S.A. respondeu ao despacho proferido, por requerimento com a refª ...93, que deu entrada em 14/02/2020.

    A Ré V... pesca exerceu o seu direito ao contraditório quanto à contestação apresentada pela Ré W..., S.A. e aos documentos juntos com o referido articulado, mantendo o alegado na sua contestação.

    Em resposta, os Autores vieram requerer novas diligências probatórias e “o aperfeiçoamento do pedido formulado na ação, declarando-se que: 1. A Ré W..., S.A., em resultado da reunião efetuada no Ministério do Mar, em 03/06/2019, na presença da Ministra do Mar, do Secretário de Estado das Pescas, do Presidente da Câmara Municipal ..., dos representantes da Ré V... pesca, da Associação ..., Organização de Produtores de Pesca Artesanal e alguns armadores, assumiu publicamente o compromisso ou a obrigação de pagamento aos proprietários das 16 embarcações identificadas no artigo 34º da petição inicial, de uma compensação no montante global de €1.000.000,00, a troco de estes se absterem de promover qualquer ação direta ou indireta que afete de algum modo a construção e instalação da Central Eólica Offshore ... e na condição de se considerarem inteiramente compensados por qualquer impacto resultante ou possam resultaram da respetiva atividade de implantação e operação daquela central eólica e abdicando de qualquer indemnização ou compensações adicionais.

    2. Declarar-se que, em função desse acordo, a Ré V... pesca assumiu a obrigação de fixar o valor a atribuir a cada um dos 16 armadores, em concreto, 3. Que a Ré W..., S.A. em violação dessa promessa pública, pagou um montante global de 955.000,00 € aos 10 proprietários das 11 embarcações constantes das cópias das declarações juntas como anexo 2 ao acordo junto pela Ré W..., S.A. como doc. nº ... da contestação, através ou mediante um email enviado às 22h e 05m do dia 12 de Junho de 2019, por um dos armadores - R... - Atividades de Pesca, Lda., NIPC ..., proprietária da embarcação S...M, correspondente à cópia por esta (Ré) junta sob o doc. nº ....

    4. Declarar-se que a Ré V... pesca violou esse acordo público ao não proceder, conforme se tinha comprometido publicamente, à fixação do montante concreto a atribuir a cada uma das embarcações contempladas, particularmente em relação aos Autores, nem promoveu qualquer iniciativa com esse objetivo.

    5. Declarar-se que, na falta desse acordo, deve o respetivo montante ser fixado e dividido em partes iguais, entre as 16 embarcações objeto daquele compromisso público assumido pela Ré W..., S.A. em 03/06/2019; 6. Declarar-se cumpridas pelos Autores as condições impostas pela Ré W..., S.A. para o pagamento daquele compromisso público de atribuir uma compensação de 1.000.000,00 € a dividir pelas 16 embarcações, identificadas no artigo 34º da petição inicial, concretamente a obrigação de se absterem de promover qualquer ação direta ou indireta que afete de algum modo a construção e instalação da Central Eólica Offshore ... e de se declararem inteiramente compensados por qualquer...

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