Acórdão nº 117544/21.7YIPRT-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Dezembro de 2022

Magistrado ResponsávelMARIA CRISTINA CERDEIRA
Data da Resolução15 de Dezembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO AA instaurou procedimento de injunção contra BB, pedindo a condenação deste no pagamento da quantia total de € 7.239,05, sendo € 6.900,00 de capital, € 37,05 de juros de mora vencidos entre 25/11/2021 e 22/12/2021, calculados à taxa legal vigente para as operações comerciais, € 200,00 de outras quantias e € 102,00 de taxa de justiça, a que acrescem juros de mora vincendos até efectivo e integral pagamento.

Alega, em síntese, que no âmbito da sua actividade profissional de construção de edifícios (residenciais e não residenciais), foi contratado pelo Requerido para prestar serviços de colocação de capoto no imóvel sito na Rua ..., ..., ..., tendo o Requerente e um funcionário despendido vários dias de trabalho na dita obra.

Os serviços prestados pelo Requerente, correspondentes à colocação de capoto no dito imóvel, no valor de € 6.900,00, foram facturados e deram origem à factura n.º ...03, emitida e vencida em 25/11/2021, a qual foi enviada ao Requerido, sem que a mesma tivesse sido devolvida ou objecto de qualquer reclamação.

O Requerido ainda não procedeu ao pagamento da referida quantia em dívida, apesar de ter sido por diversas vezes instado para o efeito, nomeadamente através de carta.

O Requerido deduziu oposição, invocando o incumprimento contratual por parte do Requerente, na modalidade de cumprimento defeituoso, nos termos descritos nos artºs 8º a 30º do seu articulado, na sequência do Requerente ter abandonado a obra desde 24/04/2021 sem a concluir, nunca mais tendo voltado à mesma.

Acrescenta que procedeu à devolução da factura/recibo, por não aceitar nem o preço nem a execução dos trabalhos.

Deduziu reconvenção, alegando que necessitou de contratar outros serviços para concluir trabalhos inacabados e colmatar outros trabalhos e defeitos da obra, de forma a minimizar os seus prejuízos, o agravamento dos defeitos e a deterioração do imóvel, uma vez que o Requerido se indisponibilizou a concluir a mesma, pelo que o Requerente deve ao Requerido a quantia de € 14.443,75 resultante do seguinte: - o Requerido para finalização da colocação do capoto em determinadas áreas (nomeadamente muros e paredes inacabadas), despendeu os montantes de € 3.580,75 em material e € 1.140,00 e € 4.450,00 em mão de obra; - a pérgula exterior, além de inacabada, apresentava vários defeitos, nomeadamente de humidades, pelo que foi necessário proceder à colocação de um vidro, não previsto inicialmente no projecto, para estancar as referidas humidades, no valor de € 1.600,00; - todas as pedras das sacadas ficaram danificadas, mais concretamente manchadas, e a sua substituição acarreta uma despesa de € 2.890,00; - o Requerido necessitou de contratar uma empresa para a remoção do lixo resultante da obra, deixado pelo Requerente na garagem da moradia, tendo despendido a quantia de € 271,00; - não foi possível aplicar as pedras de granito que tinham sido adquiridas para os rodapés exteriores, uma vez que a má execução das camadas do capoto pelo Requerente engrossou a estrutura das paredes e impossibilitou o encaixe daquelas pedras, nas quais o Requerido despendeu o montante de € 425,00; - o Requerente solicitou ao Requerido a compra de uns perfis em alumínio para ajudar na colocação dos Leds embutidos, os quais nunca foram por aquele colocados, tendo assim o Requerido um prejuízo de € 87,00.

Invoca, ainda, o direito de se proceder à compensação do eventual débito do Requerido na parte correspondente ao seu crédito, e uma vez que a alegada compensação de créditos não se mostra suficiente para assegurar o reembolso da totalidade do crédito do Requerido, deve o Requerente ser condenado a proceder ao pagamento do remanescente da quantia apurada.

Conclui, pugnando pela improcedência da acção, com a declaração de que o Requerido nada deve ao Requerente, e procedência do pedido reconvencional, com a consequente condenação do Requerente a: I. eliminar definitivamente os defeitos de construção existentes na moradia dos autos, bem como aqueles que surjam na pendência da acção, no prazo de 30 dias ou quando tal não seja possível, a indemnizar o Requerido em valor a apurar em execução de sentença; II. pagar integralmente ao Requerido a realização das obras de eliminação dos defeitos, caso o Requerente não proceda às referidas obras de eliminação no prazo supra referido; III. pagar ao Requerido o montante de € 14.443,75, acrescido de juros de mora à taxa legal desde a notificação, referente aos prejuízos e despesas por este sofridos, nomeadamente todos os valores dos materiais não colocados, trabalhos realizados e materiais adquiridos, em especial os elencados nos artºs 44 a 55 da oposição; IV. considerar verificado o direito de se proceder à compensação do eventual débito do Requerido na parte correspondente ao seu crédito, e na medida de que a compensação de créditos não se mostrar suficiente para assegurar o reembolso da totalidade do crédito do Requerido, deve o Requerente ser condenado a proceder ao pagamento do remanescente da quantia apurada.

Distribuídos os autos como acção especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato, veio o Autor apresentar um requerimento no qual alega que nesta espécie de acção declarativa, destinada exclusivamente a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a € 15.000,00, não é admissível a dedução de reconvenção, pelo facto do processo não admitir mais do que dois articulados (petição e contestação), nos termos do disposto nos artºs 1º e 3º do DL 269/98 de 1/9, sendo que a inadmissibilidade da reconvenção constitui uma excepção dilatória inominada que leva à absolvição do autor da instância reconvencional.

Termina, pugnando pela procedência da excepção dilatória inominada invocada e consequente absolvição do Autor da instância reconvencional, dando-se assim por não escrito o alegado nos artºs 37º a 67º do articulado do Réu.

Em 8/03/2022, o Tribunal “a quo” proferiu o seguinte despacho [transcrição parcial]: «Questão prévia: Da admissibilidade da reconvenção Deduziu o R. pedido reconvencional pretendendo, pela respectiva procedência, a condenação do A. reconvindo na eliminação d’”os defeitos de construção existentes na moradia dos autos, bem como aqueles que surjam na pendência da acção, no prazo de 30 dias ou quando tal não seja possível, a indemnizar o requerido em valor a apurar em execução de sentença”; mais demandou a condenação do A. reconvindo no pagamento, a seu favor, da quantia de €14.443,75, acrescida de juros moratórios contados à taxa legal desde a notificação do pedido reconvencional, referente aos prejuízos e despesas sofridos bem como a condenação do demandante a “considerar verificado o direito de se proceder à compensação do eventual débito do requerido na parte correspondente ao seu crédito, e na medida de que a compensação de créditos não se mostrar suficiente para assegurar o reembolso da totalidade do crédito do requerido deverá o requerente ser condenado a proceder ao pagamento do remanescente da quantia apurada.” A reconvenção é o instrumento jurídico através do qual o R. deduz contra o A., na acção por este proposta, uma pretensão materialmente relacionada com ela.

  1. Reis definia-a como uma “acção cruzada”: aproveitando o impulso processual do A., o R. deduzia contra ele uma pretensão de efeitos contrários ou diferenciados.

A tramitação inerente a esta forma de processo especial apenas comporta dois articulados (p.i. e oposição).

Ora, a contestação a uma acção reconvencional é efectuada na réplica (cfr. art. 530.º/1 CPC), terceiro articulado expressamente previsto para a forma comum de processo.

Inexistindo esse terceiro articulado na forma processual em análise, a conclusão que se impõe é a de que nos processos que sigam esta forma processual na contestação não pode ser deduzido pedido reconvencional.

Acresce que nas AECOP a oposição eventualmente deduzida pelo requerido apenas é notificada ao requerente aquando da notificação do despacho que designa dia para a realização da audiência de julgamento (cfr. art. 1.º/4 do Regime Anexo ao DL 269/98, de 01.09), pelo que o exercício do contraditório relativamente a eventuais excepções que sejam deduzidas pelo requerido apenas poderá ser exercido, à partida, oralmente, no início da audiência de julgamento, ante o disposto no art. 3.º/4 CPC.

Ora, conclui Salvador da Costa (posição que o Tribunal sufraga), “Daí resulta a intencionalidade da lei no sentido de proibir a dedução de pedido reconvencional na espécie processual em causa, o que, aliás, está de acordo com a simplificação que a caracteriza, em função da reduzida importância dos interesses susceptíveis de a envolver ou da estrutura do litígio em causa.

Com efeito, a simplificada tramitação processual legalmente estabelecida para acção em causa, cuja particular especificidade se centra na celeridade derivada da simplificação, não se compatibiliza com a admissibilidade de formulação de qualquer pedido reconvencional.” [1] No sentido da inadmissibilidade da dedução de pedido reconvencional nesta forma ____________________________________ [1] In “A Injunção e as Conexas Acção e Execução”, 5.ª edição actualizada e ampliada, Livraria Almedina, 2005, pág. 79.

especial de processo, entre outros, vide Ac. Rel. Porto de 21.06.2021, relatado pelo Des. Pedro Damião e Cunha e acessível em www.dgsi.pt).

Pelo exposto, não admito o pedido reconvencional deduzido.

Custas pelo R.

Notifique.

*Questão prévia: Da impossibilidade de obter a compensação Durante muito tempo foi discutida a questão de saber se a compensação poderia ser deduzida por via de excepção ou se teria obrigatoriamente de o ser em sede de pedido reconvencional. Durante a vigência do anterior CPC o entendimento claramente maioritário era o de que a compensação seria deduzida por via de excepção caso o valor do crédito invocado pelo R. fosse igual ou inferior ao do invocado...

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