Acórdão nº 213/20.9T8CHV-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Dezembro de 2022

Magistrado ResponsávelMARIA JOÃO MATOS
Data da Resolução15 de Dezembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência (após corridos os vistos legais) os Juízes da 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, sendo Relatora - Maria João Marques Pinto de Matos; 1.º Adjunto - José Alberto Martins Moreira Dias; 2.ª Adjunta - Alexandra Maria Viana Parente Lopes.

*ACÓRDÃO I - RELATÓRIO 1.1.

Decisão impugnada 1.1.1. E..., Limitada, AA e BB (aqui Recorrentes), propuseram os presentes embargos à execução, contra D... - Sucursal em Portugal (aqui Recorrida), pedindo que · os mesmos fossem julgados procedentes e, em consequência, fosse rejeitada a acção executiva de que são apenso.

Alegaram para o efeito, em síntese, que, tendo sido apresentado como título executivo uma livrança, como garantia do bom cumprimento de um contrato de locação financeira, não teria, porém, sido acompanhada da interpelação para cumprimento do dito contrato e da sua posterior resolução. Defenderam, por isso, inexistir título executivo, ou ser a obrigação exequenda inexigível.

Mais alegaram não ter sido feita com certeza a determinação da obrigação exequenda, isto é, a explicação do montante nela inserto (nomeadamente, em termos de capital e de juros de mora). Defenderam, por isso, não ser a obrigação exequenda líquida.

Alegaram ainda não terem sido considerados pagamentos parcelares efectuados por eles (que discriminaram), bem como o valor da máquina locada, que eles próprios entregaram. Defenderam, por isso, encontrar-se desse modo paga a quantia exequenda.

1.1.2.

Recebidos liminarmente os embargos, e regularmente notificada a Embargada/Exequente (D... - Sucursal em Portugal), a mesma contestou, pedindo que os embargos fossem julgados parcialmente improcedentes (quanto à inexistência do título executivo) e parcialmente procedentes (quanto à redução da quantia exequenda para € 5.195,49, a título de capital, acrescida de juros de mora, calculados à taxa supletiva legal, contados desde a data de interposição da acção executiva até integral pagamento).

Alegou para o efeito, quanto à pretensa inexistência do titulo executivo, e em síntese, que, executando-se um título cambiário, o mesmo dispensaria qualquer interpelação ou resolução contratual para ser perfeito, mercê da literalidade e abstração que o caracteriza.

Mais alegou que, ainda que assim se não entendesse, teria de facto interpelado os Embargantes/Executados (E..., Limitada, AA e BB) para pagarem as prestações em atraso no contrato de locação financeira que lhe estava subjacente; e, não o tendo os mesmos feito, ter resolvido o mesmo.

Alegou ainda, quanto à pretensa incerteza ou inexigibilidade da obrigação exequenda, ter procedido à sua liquidação no campo específico do formulário do requerimento executivo.

Por fim, alegou que a máquina locada lhe foi entregue, não voluntariamente, mas sim mercê de um procedimento cautelar para entrega judicial respectiva, por si interposto; e que, tendo de facto recebido, quantias parcelares dos Embargantes/Executados (E..., Limitada, AA e BB), não foram as mesmas suficientes para pagarem integralmente a quantia exequenda, estando ainda em falta o montante de € 5.195,49.

1.1.3.

Foi proferido despacho: saneador (certificando tabelarmente a validade e a regularidade da instância); fixando o valor da causa em € 14.284,47; definindo o objeto do litígio («A existência e validade do titulo executivo oferecido nos autos principais de execução») e enunciando os temas da prova («Apurar da (in)existência e validade do título executivo que serve de título executivo aos autos principais de execução» e «Apurar o valor da quantia exequenda»); apreciando os requerimentos probatórios das partes; e agendando a realização da audiência final.

1.1.4.

Realizada a audiência final, foi proferida sentença, julgando a acção parcialmente procedente, lendo-se nomeadamente na mesma: «(…) DECISÃO Pelo exposto, decide-se julgar parcialmente procedentes por parcialmente provados os presentes embargos de executado deduzidos pelos Executados/Embargantes, determinando-se a redução da quantia exequenda para o montante de 5.195,49€, acrescida de juros, à taxa de 4%, desde a data da interposição da ação executiva até integral pagamento.

As custas serão suportadas por Executados/Embargantes e pela Exequente/Embargada, na proporção do decaimento.

(…)»*1.2. Recurso 1.2.1. Fundamentos Inconformados com esta decisão, os Embargantes/Executados (E..., Limitada, AA e BB) interpuseram o presente recurso de apelação, pedindo que se julgasse o mesmo provido e se revogasse a sentença recorrida.

Concluíram as suas alegações da seguinte forma (aqui se reproduzindo as respectivas conclusões ipsis verbis): I.

Os Recorrentes não se conformam com a sentença de 1.ª instância, por entenderem que a mesma não se apresenta correcta, desde logo, no julgamento da matéria de facto que materializou.

II.

Efectivamente, desde logo dela dissentimos quando dá como demonstrada a factualidade vertida nos pontos 6, 7, 8 e 16 dos factos assentes, o que fazemos, note-se, por apelo ao conjunto de meios de prova que, de resto, o mesmo Tribunal valorou na formação da sua convicção.

III.

Primeiramente, há uma incoerência subjacente ao raciocínio estabelecido, porquanto se a um tempo o Tribunal atende à relevância probatória do articulado contratual que subjaz à relação jurídica estabelecida entre as partes em contenda, não tem idêntico peso ponderativo daquele articulado no que tange às comunicações (pretensamente) estabelecidas pelas partes, e que é visada pelos sobreditos pontos - falamos, especificamente, da cláusula 16.ª das condições gerais do contrato de locação financeira junto aos autos como documento n.º ... com a petição de embargos.

IV.

Sendo assente entre as partes que aquele foi o articulado contratual entre si estabelecido, se é facto que os Embargantes rejeitaram que a Embargada se lhes tenha dirigido no sentido de os interpelar ao pagamento ou mesmo por forma a resolver o contrato, aquela, por sua vez, menciona que se dirigiu aos Embargantes, fazendo-o em dois momentos temporais distintos, e por cartas registadas com aviso de recepção.

V.

Ocorre que, perante a recusa dos Embargantes (aliás, novamente reiterada em sede de declarações de parte, como mais bem se alcança das mesmas, prestadas em audiência ocorrida no dia 1 de dezembro de 2021, e devidamente registadas no sistema em uso junto dos tribunais, com início pelas ..., e término pelas 16h36m24s, tudo conforme acta lavrada com a referência ...76), VI.

Dos documentos juntos pela Embargada (falamos, especificamente, dos documentos n.ºs ... a ...) não constam quaisquer comprovativos de expedição e de recepção das comunicações mencionadas, quando esse formalismo não só era contratualmente exigido, como tinha que ser demonstrado pela Embargada, que aparentemente estava em condições de o fazer.

VII.

Conforme se alcança da alegação feita no requerimento executivo, o preenchimento da livrança dada à execução ocorreu na senda da resolução do contrato de locação financeira que a Embargada promoveu, aliás, fazendo-o nos termos do convencionado entre as partes (cláusula 13.ª).

VIII.

Nesta decorrência, a comunicação atinente à efectivação da resolução - com a observância dos formalismos estipulados - era um facto constitutivo do direito invocado pela Exequente/Embargada, sendo seu o ónus probatório respectivo (n.º 1 do artigo 342.° do C.C.).

IX.

Nos termos em que se acha estabelecido o ritual a observar no caso das comunicações entre as partes, o registo com aviso de recepção daquelas é havido, em concreto, como uma formalidade ad substantiam da declaração unilateral receptícia que constituía a comunicação da Embargada sobre a resolução do contrato.

X.

Em qualquer circunstância, não há dúvidas de que o aviso de recepção tem por função a de tornar segura a prova sobre o envio e o recebimento da carta registada; ou seja, mesmo que tenhamos essa como formalidade ad probationem, sempre temos por seguro de que a prova de que a carta foi enviada e recepcionada só poderá ser feita ou através do aviso de recepção, devidamente assinado, ou, nos termos do n.º 2 do artigo 364.° do C.C..

XI.

A partir do momento em que os documentos apresentados foram oportunamente impugnados, e, posteriormente, em declarações de parte não foi admitida a sua recepção, o Tribunal "a quo" não podia dar como demonstrada a factualidade mencionada, tanto mais que a Embargada nunca colmatou a ausência dos documentos mencionados, nem invocou a sua inexistência ou impossibilidade de obtenção.

XII.

Mais, somos do entendimento de que não poderia o Tribunal concluir que essa falta poderia ser colmatada com a produção doutros meios de prova, abdicando, assim, daquele que é o efeito jurídico que as partes, e também o legislador ordinário, quiseram atribuir ao cumprimento dessa formalidade, já que falamos de prova predilecta para a demonstração da expedição e recebimento de tais comunicações.

XIII.

Na situação vertente, aos autos foram juntas meras fotocópias simples das alegadas cartas remetidas; donde, ao serem impugnadas, o Tribunal não podia deixar de exigir que para a demonstração da sua concretização fossem juntos elementos documentais bastantes que o suportassem.

XIV.

E o depoimento da testemunha CC, a que o Tribunal se apega no sentido de colmatar a ausência de melhores elementos não é, salvo melhor opinião, afoito a dar amparo à conclusão obtida.

XV.

É que, mais do que existir uma relação clara de dependência daquela em relação à Embargada, que em muito se relaciona, aliás, com a circunstância de pretensamente o seu trabalho estar a ser posto em crise, perante a alegada intervenção que a mesma tem em casos como o presente, facto é que à testemunha em momento algum foram evidenciados - e por si corroborados - os documentos mencionados.

XVI.

Não deixa de se estranhar que a mesma recorde, pretensamente, dentre um manancial de casos que a mesma assume realizar, da mesma natureza, e perante as funções que exerce, as datas concretas de duas comunicações dirigidas aos Embargados...

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