Acórdão nº 1478/21.4T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Dezembro de 2022

Magistrado ResponsávelRAQUEL REGO
Data da Resolução15 de Dezembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acórdão no Tribunal da Relação de Guimarães I – RELATÓRIO S... – SOCIETÉ CIVILE IMMOBILIÉRE, com sede em 4, ..., ..., instaurou a presente acção declarativa comum contra V..., Lda. – MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA, LDA., com sede na Praça ..., ..., ..., União de Freguesias ... (... e ...) e ..., ..., pedindo a condenação desta a pagar-lhe uma indemnização €14.950,18 (catorze mil novecentos e cinquenta euros e dezoito cêntimos), a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros de mora legais, contados desde a citação até integral pagamento e, ainda, a indemnização que se vier a apurar em sede de liquidação de sentença ou decisão ulterior.

Para tanto, alega que celebrou com a ré um contrato de mediação imobiliária, com objecto na fracção que identifica, sendo que esta, em 04.01.2017, outorgou, em sua representação, o contrato de arrendamento, com fiador, relativo à dita fracção.

Todavia, a arrendatária só pagou três rendas e apesar de interpelada, nem ela nem o fiador, procederam ao pagamento das quantias em divida, pelo que teve de propor ação judicial de despejo e, subsequentemente, uma acção executiva.

O comportamento da arrendatária permite concluir que aquando a negociação e formação do contrato não pretendia cumpri-lo e nem o fiador pretendia assumir o pagamento em substituição daquela, sendo que a ré, aquando a celebração do contrato, não teve o cuidado de verificar as capacidades económicas dos mesmos.

A conduta da ré, ao não ter cumprido a sua obrigação de garantir que o contrato celebrado respeitava os interesses da sua representada, aqui autora, causou nesta os prejuízos no montante que peticiona.

Os autos mereceram contestação, com invocação de prescrição, impugnação dos factos que lhe imputam uma conduta geradora de responsabilidade civil e a ré requereu também a intervenção principal provocada, ou caso assim se não entenda acessória, da seguradora G..., com quem celebrou um contrato obrigatório de seguro de responsabilidade civil.

Admitida a intervenção principal provocada da referida companhia de seguros, apresentou esta contestação, impugnando a factualidade alegada pela autora.

Por seu turno, a autora pronunciou-se quanto à excepção de prescrição, pugnando pela sua improcedência.

Dispensou-se a audiência prévia, procedeu-se ao saneamento dos autos, tendo sido julgada improcedente a excepção da prescrição e procedeu-se à identificação do objecto do litígio bem como a enunciação dos temas de prova.

O processo seguiu os seus termos, vindo a ser proferida sentença julgando a acção totalmente improcedente, com absolvição do pedido.

Inconformada, apelou a autora, apresentando alegações onde conclui nos seguintes termos: 1. Vem o presente recurso da douta sentença que julgou a presente acção totalmente improcedente e, consequentemente, absolveu a ré e a chamada do pedido.

  1. Entende a recorrente que a decisão proferida não traduz uma correcta e integral valoração das provas apresentadas e produzidas nos autos, com influência na aplicação do direito e no desfecho da acção, e numa correcta interpretação e aplicação da lei.

  2. Com este recurso impugna a recorrente, igualmente, a decisão proferida sobre a matéria de facto, visando obter a modificabilidade da decisão recorrida, por reapreciação da prova testemunhal gravada em sede de audiência de discussão e julgamento.

  3. É entendimento da recorrente ter sido produzida prova de que a ré/recorrida não cuidou de averiguar as condições económicas da arrendatária e do fiador, ou seja, ficou provada a ilicitude da sua conduta e, por conseguinte, deveria a acção ter sido julgada totalmente procedente.

  4. São seguintes as questões que a autora/recorrente pretende ver apreciadas: QUESTÃO UM: Atentas as declarações de parte do legal representante da autora, a prova testemunhal produzida, os factos dados como provados nos pontos 15 a 27, e a documentação junta aos autos, deveria o Tribunal a quo ter dado como provados os factos das alíneas a), b), c) e d), constantes da matéria não provada.

    QUESTÃO DOIS: Atentas as declarações de parte do legal representante da autora, a prova testemunhal produzida e a documentação junta aos autos, deveria o tribunal a quo ter dado como provados os factos das alíneas e) e f), constantes da matéria não provada.

    QUESTÃO TRÊS: Os factos não provados das alíneas g), h) e i) têm de ser eliminados, uma vez que tais factos foram dados como provados no ponto 32.

    QUESTÃO QUATRO: Os factos provados nos pontos 35, 36, 37, 38 e 39 nada têm a ver com a questão dos presentes autos e, nessa medida, não devem constar da matéria provada e, consequentemente, não deviam ter sido valorizados pelo Tribunal a quo para a decisão proferida.

    QUESTÃO CINCO: O Tribunal a quo partiu do pressuposto errado de que não existe procuração outorgada pela recorrente a favor da recorrida para esta celebrar o contrato de arrendamento com a arrendatária, quando na verdade a procuração existe e está junta aos autos.

    QUESTÃO SEIS: O Tribunal a quo aplicou ao caso dos autos, de forma errónea, o artigo 17º, n.º 1, alínea d) da Lei 15/2003 de 8 de Fevereiro.

    QUESTÃO SETE: A autora/recorrente tem direito à compensação das despesas provadas nos pontos 28 e 31.

    QUESTÃO OITO: O facto provado no ponto 32 merece a atribuição de compensação à autora/recorrente.

    QUANTO À QUESTÃO UM: 6. O Tribunal a quo deu como não provados os factos das alíneas a), b), c) e d) essencialmente com base no depoimento das testemunhas AA e BB, funcionários da Ré, não tendo atentado às declarações de parte do legal representante da autora, CC, e ao depoimento da testemunha DD.

  5. Entende a recorrente que o depoimento das testemunhas AA e BB fazem prova contrária à fundamentação constante da sentença, ou seja, prova a falta de cuidado e zelo que existiu por parte da recorrida, na análise das condições económicas da arrendatária e do fiador.

  6. A testemunha AA depôs que: - a arrendatária tinha um rendimento declarado de 300,00 euros e fazia trabalhos de limpeza “por fora”, o que ascendia a um rendimento de cerca de 600,00 euros mensais - o fiador recebia cerca de 400,00 euros; - não viu os documentos comprovativos desses rendimentos, porque trata da área comercial; - que telefonou à autora a comunicar o valor da proposta de renda e comunicou as condições económicas da arrendatária, mas não diz quando; - enviou um email a informar que o espaço já estava arrendado; - não fez figurar no contrato de arrendamento o marido da arrendatária, garante também do contrato em causa.

  7. Do depoimento desta testemunha resulta que a ré/recorrida não atendeu à real situação económica que a arrendatária e o fiador possuíam à data da subscrição do contrato de arrendamento, tendo aceitado celebrar o contrato com os mesmos, não obstante os seus rendimentos inferiores ao ordenado mínimo e, por conseguinte, insusceptíveis de penhora.

  8. O Tribunal a quo não devia ter valorizado este depoimento, quanto à prova de que informou a autora sobre as condições económicas da arrendatária e do fiador e de que esta as aceitou, pois que, a testemunha declarou que não analisou os documentos (não os tendo analisado, não tinha condições para a informar) e apenas enviou um email a dizer que o apartamento já estava arrendado.

  9. Resulta também do seu depoimento que não existiu por parte da recorrida o cuidado de fazer figurar no contrato de arrendamento o marido da arrendatária, facto que prova também a negligência da recorrida, mas que não foi considerado pelo Tribunal a quo.

  10. Quanto à testemunha BB, é entendimento da recorrente que com base no seu depoimento também não podia o Tribunal a quo ter dado como não provados os referidos factos das alíneas a), b), c) e d).

  11. Esta testemunha depôs que: - pediu a declaração de IRS e os três últimos recibos e a arrendatária só entregou um; - que a arrendatária além dos 300,00 euros declarados fazia limpezas por fora, auferindo mais 300,00 euros, e que “acharam que havia capacidade de pagar a renda”; - que têm documentos relativos à arrendatária e ao fiador, os quais foram entregues antes da celebração do contrato de arrendamento, nomeadamente o recibo de vencimento da arrendatária e a declaração de reforma do fiador; - que o comercial AA lhe transmitiu que tinha falado com o senhorio e que era para avançar com o arrendamento; - o facto de o marido da arrendatária não figurar no contrato, não obstante a mesma ser casada “à partida faz parte do contrato”.

  12. O depoimento desta testemunha revela total falta de zelo e cuidado da recorrida na angariação do cliente.

  13. Para celebrar o contrato de arrendamento em causa, a recorrida bastou-se com rendimentos inferiores ao ordenado mínimo da arrendatária e do fiador, insusceptíveis de penhora, com a entrega apenas de um documento sobre tais rendimentos, documento que nem foi junto aos autos, com a mera informação verbal da testemunha AA, o qual disse que tinha falado com o senhorio sobre as condições económicas da arrendatária e do fiador (mas que não analisou os documentos), com a omissão do marido da arrendatária no contrato de arrendamento.

  14. Entende a recorrente que ambas as testemunhas, AA e BB, tiveram plena consciência que, nem a arrendatária, nem o fiador tinham condições de fazer o pagamento da renda, e, não obstante isso, avançaram para a concretização do contrato.

  15. O Tribunal a quo devia ter tomado em consideração as declarações do representante legal da autora, bem como, da testemunha DD, nomeadamente quando referem que a ré nunca lhe comunicou nada sobre as condições económicas da arrendatária e do fiador.

  16. Não se compreende como pode o Tribunal a quo ter valorizado o testemunho de AA que disse que informou a recorrente sobre as condições económicas da arrendatária e do fiador, mas não viu os documentos e apenas existe um email por si enviado para a recorrente, com a informação de que “o apartamento já está arrendado”.

  17. Não foi produzida qualquer prova sobre a data em que alegadamente a testemunha AA comunicou ao senhorio e de...

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