Acórdão nº 5175/19.2T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Setembro de 2022
Magistrado Responsável | ALEXANDRA ROLIM MENDES |
Data da Resolução | 15 de Setembro de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães Relatório: C. M., C.F. ………, divorciada, residente na Praceta …, Fafe intentou a presente ação declarativa de condenação contra H. M., C.F. ………, divorciado, residente na Rua …, Braga. Peticiona que se declare válido e existente o contrato promessa de partilha e que se reconheça que o Réu não cumpriu as obrigações aí referidas, condenando-se o mesmo a pagar à A. a quantia de 14.000,00€, acrescida de juros vencidos e vincendos, calculados à taxa legal.
*O Réu contestou e deduziu pedido reconvencional.
Disse que, aquando da transmissão da quota societária, tal como determinado no contrato promessa, a A. declarou perante testemunhas que nada deviam reciprocamente a partir dessa data e abdicando do remanescente dos 20.000,00€. Refere ainda que o contrato promessa padece de vícios que o tornam inválido porque foi coagido a assinar o documento pois a A. disse que não concederia o divórcio ao R. caso ele não assinasse o mencionado documento. Por outro lado, do acervo de bens a partilhar constantes do referido documento, constam bens próprios dos ex-cônjuges relacionados como bens comuns o que constitui uma alteração ao regime de bens legalmente fixado e, portanto, violação de lei imperativa. Acresce que o contrato em causa viola a regra imperativa de que os cônjuges participam de metade no ativo e no passivo da comunhão e a partilha em causa é manifestamente desproporcional em prejuízo do Réu.
Pede a improcedência da ação e que a A. seja condenada a devolver-lhe a quantia de 6.000,00€.
*À matéria da reconvenção, replicou a Autor pedindo a sua pela sua absolvição do pedido reconvencional.
* Realizou-se o julgamento, tendo sido proferida sentença que julgou a ação nos seguintes termos: “Pelo exposto, julgo a presente acção procedente por provada e, em consequência: - declaro a validade do contrato promessa partilha celebrado entre A e R., operando-se a redução do mesmo, através da exclusão das cláusulas atinentes com as quotas e com os móveis de sala de jantar e sala de estar, que constituíam bens próprios dos cônjuges, e da divida de 60.000,00€, por inexistente.
- declaro que a A cumpriu as obrigações que para ela advinham do aludido contrato.
- decreto a execução específica do contrato, nos termos do artº 830º do CC, condenando, assim, o R. a cumprir na íntegra aquilo a que se obrigou no mesmo, ou seja, a pagar à A o remanescente dos 20.000,00€ acordados, isto é, .a quantia de 14.000,00€, acrescida de juros, à taxa legal de 4%, contados desde a data de vencimento da primeira prestação em falta, até integral e efectivo pagamento.
- julgo a reconvenção totalmente improcedente, absolvendo a A/reconvinda do peticionado pelo R/reconvinte.”* *Inconformado veio o R. recorrer, formulando as seguintes Conclusões: A. A Douta Sentença padece de vícios graves, no que respeita à matéria considerada como provada “Factos Provados” e “Factos não Provados” e à respetiva “motivação da matéria de facto”, pois o Tribunal a quo fez uma incorreta apreciação da prova produzida nos autos resultante da audiência de discussão e julgamento e dos documentos juntos aos autos, B. Padecendo também de vícios graves no que diz respeito à interpretação e aplicação do direito aos factos que constituem a causa de pedir nos autos, violando, assim, o disposto nos artigos 255.º, 1714.º, e 1730.º do Código Civil e 607.º e 615.º do Código do Processo Civil.
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Tais vícios conduzem à nulidade da sentença.
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Numa apreciação genérica da sentença ora recorrida verifica-se incompreensivelmente que as testemunhas da recorrida são consideradas credíveis, repetindo-se algumas vezes esta convicção, descredibilizando-se as testemunhas do recorrente, assim como o depoimento de parte do recorrente, foi completamente desvalorizado pelo Tribunal a quo; E. E atenta a motivação apresentada, relativamente à prova testemunhal apresentada pelo recorrente a mesma não foi valorada, mesmo tratando-se de depoimentos credíveis e isentos, contrariamente à prova testemunhal da recorrida, que foi atendida como se de única verdade se tratasse.
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O mesmo se poderá dizer dos esclarecimentos prestados pelos senhores peritos, em que o Tribunal a quo, sem apresentar qualquer fundamentação apenas valorizou, os esclarecimentos do senhor perito indicado pela Ré e do senhor perito indicado pelo Tribunal, fazendo tábua rasa daquilo que foi apresentado pelo senhor perito indicado pelo recorrente, desconsiderando-o completamente.
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É merecedor de crítica o Tribunal a quo na valoração da prova, quer da testemunhal, da pericial e da documental, uma vez que considerou determinados elementos que seriam fundamentais para a boa decisão da causa, ou tendo considerado outros, não fez uma correta apreciação dos mesmos, do ponto de vista legal, limitando-se a perante a situação fazer um juízo de valor, e desconsiderando o valor legal e firmeza que sobre os mesmos pende, nomeadamente no que diz respeito à prova testemunhal e documental.
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No ponto 2. dos Factos Provados, a Douta Sentença considera provado que recorrida e recorrente celebraram um acordo escrito em 19.02.2016, o que o recorrente perante a prova produzida e regras procedimentais não pode aceitar, uma vez que perante a prova produzida, embora conste do mesmo tal data, não se pode aceitar que tenha sido assinado na data indicada, pois o recorrente não teve dúvidas em afirmar que o que assinou foi em data anterior à ida à conservatória, o que ocorreu em 18.02.2016.
I. Também não colhe razão a motivação exposta pelo Tribunal a quo no sentido que pelo facto de constar do referido contrato promessa o número de processo de divórcio e a data do trânsito em julgado, considerando que esses elementos, de acordo com as regras procedimentais do divórcio são transmitidos às partes em momento prévio, aquando da notificação para a conferência de divórcio, que é comunicada às partes pelo menos quinze dias antes da data agendada.
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De modo, facilmente o contrato promessa, poderia fazer menção ao número de processo, bem como, à data do decretamento e trânsito do divórcio, porque estes já eram do conhecimento das partes anteriormente à data em que ocorreu, através da notificação/convocatória para a conferência.
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Pelo que, o argumento de que a presença do número de processo, data do decretamento e trânsito e menção a anexo (que não se encontra junto), permite concluir que a teoria de que o contrato foi assinado posteriormente, cai por terra, porque facilmente estes elementos eram do conhecimento das partes em data anterior ao divórcio e como tal em data anterior a 19.02.2016, podendo o documento ser elaborado em data anterior à que nele consta, sobretudo atendendo a que se trata de um documento particular, sem qualquer forma oficial de confirmar a data nele aposta.
L. No entanto, não prescindindo do supra exposto, ainda que assim não fosse, o que apenas se coloca por mera hipótese académica, o facto do contrato promessa ter sido assinado em dia posterior ao divórcio, e reitera-se que não se aceita que assim foi, o elemento data, em nada afasta os vícios patentes no referido contrato promessa, e que foram invocadas pelo recorrente.
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Mal andou também o Tribunal a quo ponto 5. dos factos provados, ao considerar como assente que o recorrente entrou na posse dos bens dia 19.02.2016, sem ter logrado obter qualquer prova nesse sentido, e não ter qualquer fundamentação que justifique o assentamento de tal matéria, N. E ao considerar provado tal facto o Tribunal a quo contraria tudo aquilo que resultou provado em sede de julgamento, O. Pois efetivamente, quanto a este aspeto, apenas a questão foi abordada aquando do depoimento do recorrente, e este afirmou de forma clara e inequívoca que a recorrida saiu de casa por sua iniciativa, antes dessa data, mas que terá ficado com as chaves do imóvel, desconhecendo o recorrente se esta lá ia ou não.
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Também não pode o recorrente concordar, com o sentido que o Tribunal a quo atribuiu ao ponto 10. dos factos provados, cingindo-se a dar como provado “Tal venda foi efetuada aos pais do R.”, ignorando e omitindo, aquilo que sobejamente resultou como provado da prova testemunhal produzida em audiência de julgamento, e que é essencial para a boa decisão da causa.
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Não restam dúvidas que o imóvel foi vendido aos pais do recorrente, no entanto, e perante o objeto deste processo, importava descortinar as circunstâncias em que a venda ocorreu, e tais circunstâncias foram alegadas e resultaram provadas, e era de todo fulcral para a boa decisão da causa que as mesmas fossem consideradas pelo tribunal a quo, e que elencassem os factos provados, e não desvalorizadas ou sobrecarregadas com juízos de valor, conforme se verifica na motivação.
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Consta do denominado contrato promessa celebrado entre recorrida e recorrente, um bem imóvel, sob a verba nº 3, ao qual, recorrida e recorrente, atribuíram o valor de €80.000,00 (oitenta mil euros), e sobre o destino do mesmo estabeleceram recorrida e recorrente o seguinte: “Os outorgantes pretendem vender o bem da Verba Três, e para o efeito já publicitaram a venda. O produto da venda será aplicado na amortização total do mútuo descrito na Verba Um do passivo, e o sobrante, caso exista, será adjudicado ao Primeiro Outorgante.” S. Tal cláusula permite-nos, por si só, retirar algumas conclusões, que foram totalmente ignoradas pelo Tribunal ora recorrido: o bem descrito na verba três não foi atribuído ao recorrente; a recorrida aceitou que o valor do imóvel correspondia a €80.000,00 (oitenta mil euros); a recorrida e o recorrente pretendiam vender o imóvel; na data da assinatura do contrato, e portanto, à data do divórcio já havia sido publicitada a venda do imóvel; considerando a expressão “caso exista”, reconhece-se não haver certezas sobre a viabilidade de da venda do imóvel resultar quantia monetária superior ao valor da dívida descrita na verba um do passivo, por se saber que o valor de mercado não ultrapassava aquele que constava do...
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