Acórdão nº 5454/8.6T8VNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 07 de Novembro de 2019
Magistrado Responsável | ANIZABEL SOUSA PEREIRA |
Data da Resolução | 07 de Novembro de 2019 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES:*I- RELATÓRIO: 1.
JOSÉ (…) e mulher (…) intentaram a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra (..) , LD.ª, formulando os seguintes pedidos: «Nestes termos, e nos demais de direito, com o douto suprimento de V. Excelência, deve a presente acção ser julgada procedente por provada e, por via disso, a Ré condenada a:
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Reconhecer que os Autores os únicos donos, possuidores e legítimos proprietários de um prédio urbano, destinado a habitação, sito na Rua …, anteriormente conhecido por Lugar …, na freguesia de …, concelho de Vila Nova de Famalicão, descrito na Conservatória do Registo Predial de …, sob o número ... - ..., e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo ...; b) Reconhecer que os muros por si erigidos, que confrontam quer a Poente quer a Norte com o prédio dos Autores, encontram-se com uma altura superior à legalmente permitida; E, por via disso, ser a Ré condenada a: c) Proceder, a expensas suas, à eliminação ou diminuição da altura dos muros por si erigidos, que confrontam quer a Poente quer a Norte com o prédio dos Autores, até à altura máxima legalmente permitida, no prazo máximo de 10 dias; d) Pagar, a título de sanção pecuniária compulsória, por cada dia de atraso no cumprimento da decisão, o montante de 100,00 €; e) Abster-se de causar danos na propriedade dos Autores, decorrentes daquela eliminação ou diminuição; f) Abster-se da prática de qualquer acto que elimine, restrinja ou diminua as faculdades contidas no direito de propriedade dos Autores sobre o prédio de que são proprietários e identificado nos presentes autos. g) no pagamento de indemnização aos Autores por danos a si causados, no montante de 2.500,00 €».
Invocam, para tanto e em apertada síntese, que, sendo proprietários de determinado prédio e a ré de um outro que com aquele confina e que se situa a nível superior, a segunda construiu um muro em blocos de pedra que ladeia o prédio dos primeiros pelos seus lados nascente e sul, muro esse que, para além de violar a norma constante de normativo municipal que impede a construção de muros com altura superior a 1,5 metro, priva o prédio dos autores (habitação e quintal) de luz e de sol, situação que os deixou desgostosos e tristes.
*Citada, contestou a ré e, par além de impugnar (por oposição e motivadamente) a versão carrada pelos autores, referiu, a título de exceção, que a obra foi licenciada e executada de forma a suportar as terras do seu prédio, as quais se encontram à cota actual, na parte confinante com o prédio dos autores, matéria de exceção esta que vinha antecipadamente impugnada na petição inicial.
*Dispensada a realização de audiência prévia, procedeu-se ao saneamento dos autos e à admissão dos meios de prova, tendo seguidamente sido designada data para audiência final.
*Realizada audiência final, com observância das formalidades legais, foi proferida sentença, nos seguintes termos : “
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Declaro os autores JOSÉ e A. G. proprietários do prédio urbano, destinado a habitação, sito na Rua … (anterior Lugar do ...), na freguesia de ..., concelho de Vila Nova de Famalicão, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o número .../20030411- ... e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo ....º; B) Condeno a ré X – UNIPESSOAL, LD.ª a demolir do muro descrito em 12), 13) e 14) dos factos provados, erigido no prédio referido em 2) dos factos provados e na parte em que o mesmo confronta com o descrito em 1) dos factos provados (lados poente e norte), nos pontos em que o mesmo ultrapassa a altura de 1,50 metro (um metro e cinquenta centímetros), contada desde o topo dos muros construídos pelos autores mencionados em 6) e 8); C) Condeno a ré X – UNIPESSOAL, LD.ª a executar a demolição do muro referido em B) deste dispositivo, nas condições aí descritas, a expensas suas e abstendo-se de causar danos no prédio referido em A) ou de praticar qualquer acto que elimine, restrinja ou diminua as faculdades inerentes à propriedade do mesmo; D) Condeno a ré X – UNIPESSOAL, LD.ª a pagar aos autores JOSÉ e A. G. a quantia de 2.500,00€ (dois mil e quinhentos euros) a título de compensação por danos não patrimoniais; E) Absolvo a ré X – UNIPESSOAL, LD.ª do demais peticionado pelos autores JOSÉ e A. G.; F) Condeno os autores JOSÉ e A. G. e a ré X – UNIPESSOAL, LD.ª no pagamento das custas processuais da acção, na proporção dos respectivos decaimentos, fixando-se o dos primeiros em 10% e o da segunda em 90%. “ *É desta decisão que vem interposto recurso pela R, a qual terminou o seu recurso formulando as seguintes conclusões: A.
A demandada, aqui recorrente, circunscreverá as suas alegações, tão só, a questões de direito. Deste modo, aceita-se in totum a decisão sobre a matéria de facto julgada na primeira instância.
B.
As razões da discordância em relação à decisão a quo, encontram-se vertidas nos itens 3.
e 4.
das alegações e são coincidentes com as questões a decidir enumeradas na sentença recorrida, nas alíneas C), D), E) e H), que constitui o objecto do presente recurso.
C.
A demandada / recorrente bem reconhece que, hodiernamente, o direito de propriedade não é entendido pelas, doutrina e jurisprudência, como um direito absoluto (de cariz liberal); mas, sim, como um direito que pode – e deve – sofrer restrições decorrentes de outros direitos conflituantes.
D.
O Meritíssimo Juiz a quo entendeu – e bem - inexistir abuso de direito, por parte da demandada/recorrente, porque (v.g.
segundo parágrafo da página 14 da sentença recorrida) considerou que “a altura em que os muros foram erigidos, em si mesmo considerada, não é de molde a que, abstractamente e pelo seu exagero, seja considerada um abuso de direito, sobretudo se considerarmos que a jurisprudência, de um modo geral, configura como não abusiva a construção de muros que não ultrapassem a altura média de um homem [situada entre 1m e 1,75m], acrescida de 1 metro”.
E.
No que tange às confrontações Norte/Sul (sendo que o prédio da Ré confronta a Norte com o terreno dos Autores), pode-se constatar da aludida inspecção judicial ao local, que o muro erigido pela recorrente sobreeleva-se a um “muro de gavião” (construído pelos impetrantes) em cerca de 2,60 metros (alínea K). Cfr. §7 do auto de inspecção.
F.
Importará referir que o “muro de gavião” construído, pelos Autores, na confrontação do seu prédio a Sul, com o prédio da recorrente, atinge a altura de 2,90 metros, conforme resulta do §3 do auto de inspecção judicial (alínea E); sendo certo que, este tipo de muro foi construído em jeito de “escada” ou “bancada de um estádio”, de tal modo que permite a um qualquer homem de média (ou de pequena) estatura escalá-lo facilmente, sem necessidade de qualquer utensílio (exemplo:escada), porque a estrutura da própria edificação – ela mesma – revela-se um “escadório” com 1 metro de altura, em cada degrau.
G.
Em primeiro lugar, salientamos que o prédio dos autores foi “encaixado” num recorte de monte, entretanto adquirido pela ré; não gozando do direito de vistas panorâmicas; quer na confrontação a Nascente, quer na confrontação a Poente; porque os muros por aqueles (autores) edificados atingem a altura variável, a Nascente, de 2,06 metros a 1,80 metros, com vista a suportar as terras na confrontação a Poente do prédio da recorrente; e, na confrontação a Sul (cujo muro foi edificado em forma de “gavião” e “escadório”) sobreeleva-se, em relação à base do solo do prédio dos autores, em 2,90 metros; de modo a suportar a erosão natural, proveniente do “combro”, na confrontação a Norte do prédio da recorrente.
H.
O que está em causa é uma colisão de direitos, dos autores em relação à recorrente, no que tange, por um lado, direito à luz solar (do prédio dos autores); e, por outra banda, o direito à tapagem e suporte de terras (do prédio da ré).
I.
Nas confrontações Nascente / Poente, concedemos que o tribunal ajuizou bem, ao impor o rebaixamento do muro edificado pela recorrente, até à altura de 1,50 metros (altura esta resultante do Código Regulamentar da Urbanização e Edificação, Espaço Público e Actividades Privadas, em vigor no Município de Vila Nova de Famalicão (DR, 2ª série, n.º 213 de 30 de Outubro de 2015).
J.
Pois, se adicionarmos à altura do muro edificado pelos autores, entre 2,06m e 1,80m, com a altura permitida e resultante da sentença a quo, atingiremos uma altura máxima de 3,30 metros; o que dificulta o acesso ao prédio da recorrente e permite a sua privacidade e segurança, sem colidir com o direito ao acesso da luz solar (embora ligeiramente mais reduzida) no momento do nascer do sol, pois direito a vistas panorâmicas já não dispunham os autores.
K.
Já no que tange às confrontações Norte/Sul, estas em nada influenciam (nem diminuem) o direito dos autores à obtenção de raios solares.
L.
Resulta das regras da física que o sol desloca-se de Nascente para Poente, e nunca de Norte para Sul.
M.
Na confrontação (Norte/Sul) os autores já não dispunham de insolação; porquanto, haviam já edificado um “muro de gavião” de cerca de 3 metros de altura, até ao sopé do combro do monte, que chega a atingir 10-20 metros no seu pico mais alto; acrescendo que, existia vegetação e árvores ao logo e todo o combro, o que, antes de edificado o muro por parte da recorrente, já se constatava estas limitações naturais, na confrontação a Sul no prédio dos autores, em relação ao prédio da ré/recorrente.
N.
Neste particular, o muro edificado pela recorrente atinge 2,60 metros; conforme resulta da inspecção judicial ao local, ilustrada no pela fotografia que constitui o §7 do dito auto (alínea K).
O.
A edificação do muro, levada a cabo pela recorrente, contém-se dentro da altura máxima permitida pela doutrina e jurisprudência (2,75 metros). No caso, a altura do muro erigido pela recorrente cifra-se em 2,60 metros.
P.
Numa primeira consideração, devemos salientar que o acesso à luminosidade solar, nesta particular confrontação (Norte/Sul) em nada...
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