Acórdão nº 3/16.3T8VRL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 07 de Novembro de 2019

Magistrado ResponsávelSANDRA MELO
Data da Resolução07 de Novembro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães Autores e e Apelados: (…), contribuinte nº …, residente na Rua(..),Alijó, Réus e e Apelantes: (…) contribuinte nº … e mulher (…) contribuinte nº …, residentes da (…) Vila Real Autos de apelação em ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, I - Relatório O autor peticionou a condenação dos Réus a: A) - Pagarem ao Autor a importância de 47.500,00 €, correspondente ao valor ainda em dívida pelos trabalhos já efetuados, acrescido de juros de mora vencidos, à taxa legal, no montante de 4.000,00 €, tudo totalizando 51.500,00 €, assim como em juros de mora vincendos, à taxa supletiva legal, desde a propositura da presente ação, até efetivo e integral pagamento; B) – Indemnizarem o Autor a título de responsabilidade contratual na quantia de 2.500 €, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação e até efetivo e integral pagamento.

Alegou, para tanto e em síntese, que no âmbito da sua atividade profissional celebrou um contrato de empreitada com os Réus, e embora tenha realizado a obra, estes não pagaram a última prestação do preço inicial, no valor de 10.000,00 €, nem o valor dos trabalhos a mais e alteração de materiais, num total de € 37.500,00 €.

Na contestação os Réus arguiram as exceções de prescrição, da nulidade das estipulações contratuais e de não cumprimento e impugnaram os factos alegados pelo autor.

Deduziram reconvenção, pedindo a condenação do autor reconvindo no pagamento da quantia de € 42.825,62, acrescida de juros de mora à taxa legal supletiva, desde a data da notificação até efetivo e integral pagamento.

Após a audiência final foi proferida sentença que julgou, quer a ação, quer a reconvenção parcialmente procedentes: -- condenando os réus a pagarem ao autor a quantia de 22.891,38 €, acrescida de juros à taxa legal desde a citação até efetivo e integral pagamento e -- condenando o autor reconvindo a pagar aos reconvintes a quantia de 12.915,27 €, acrescida de juros à taxa legal desde a notificação do pedido reconvencional até efetivo e integral pagamento, absolvendo-os do demais peticionado.

Não se conformando com a sentença, os Réus apelaram, pretendendo que: -- seja o crédito reconhecido ao recorrido seja reduzido para 18.635,90 €; - e que sejam reconhecidos aos Recorrentes, além dos montantes expressamente constantes da sentença recorrida, os seguintes créditos: a) a quantia de €4.602,14 (quatro mil, seiscentos e dois euros e catorze cêntimos), em conformidade com a matéria de facto dada como provada sob o facto 72.º; b) a quantia de €865,00 (oitocentos e sessenta e cinco euros), relativa aos valores gastos pelos Recorrentes com o arranjo das persianas e do telhado; c) a quantia de €2.836,76 (dois mil, oitocentos e trinta e seis euros e setenta e seis cêntimos) relativa aos trabalhos previstos no contrato de empreitada e não realizados.

d) a quantia de €3.669,76 (três mil, seiscentos e sessenta e nove euros e setenta e seis cêntimos) relativa às poupanças obtidas pelo Recorrido com a aplicação de materiais diferentes daqueles que estavam inicialmente previstos no contrato; Num total de quantia de 24.888,83 € acrescidos de juros à taxa legal desde a notificação do pedido reconvencional até efetivo e integral pagamento.

Formulam, para tal, as seguintes conclusões: I.

O presente recurso tem como objecto: - a nulidade da sentença; - a decisão sobre a matéria de facto; - a decisão sobre as questões de direito.

II.

Na sentença recorrida, o tribunal condenou as partes no pagamento dos juros de mora à taxa supletiva legal, mas não especificou, como devia, o tipo de taxa - civil ou comercial.

III.

Dada a falta de pronúncia quanto à matéria supra, entendem os Recorrentes que a sentença padece de nulidade, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC.

IV.

Sendo o Recorrido um empresário comercial, nos termos do artigo 230.º, n.º 6, do Código Comercial, o mesmo apenas pode exigir juros à taxa supletiva legal comercial quando estiverem em causa transacções comerciais, tal como definidas no artigo 3.º, alínea b), do Decreto-Lei n.º 62/2013, de 10 de Maio, como se retira do artigo 4.º do mesmo diploma legal.

V.

Na relação entre Recorrido e Recorrentes não se pode considerar que existiu uma transação comercial, até porque estes não são empresas, tal como definidas na alínea d) do artigo 3.º do referido diploma legal, sendo meros consumidores, em decorrência da celebração de um contrato de empreitada para a construção de uma moradia unifamiliar que destinaram à sua própria habitação e do seu agregado familiar (cfr. artigo 2.º, n.º 1, da Lei n.º 24/96, de 31 de Julho).

VI.

E, nessa qualidade de consumidores, não lhes pode ser aplicável o regime que regula as transações comerciais, nas quais se prevê a possibilidade de exigência de juros de mora à taxa supletiva legal para operações comerciais, como também resulta do artigo 2.º, n.º 2, alínea b), do Decreto-Lei n.º 62/2013, de 10 de Maio, que exclui a aplicabilidade de tais regras aos contratos celebrados com os consumidores.

VII.

Nos termos do artigo 617.º, n.º 1, do CPC, o tribunal recorrido ou o Venerando Tribunal da Relação de Guimarães deverão pronunciar-se especificadamente quanto à questão supra, decidindo que a taxa supletiva legal é a prevista para as dívidas civis, ou seja, de 4%, e não para as dívidas comerciais, assim se colmatando a nulidade de que a sentença padece, nesta parte, por omissão de pronúncia.

VIII.

Quanto ao facto provado n.º 65 da sentença recorrida, o mesmo padece de um lapso de escrita, uma vez que não reflecte, nem a resposta dada pelos senhores peritos no relatório pericial ao quesito 50, e apresenta-se em contradição com a própria motivação de direito expendida pela Meritíssima Juiz a quo.

IX.

Por conseguinte, nos termos do artigo 614.º, n.

os 1 e 2, do CPC, deverá proceder-se à rectificação desse manifesto lapso, devendo o facto provado n.º 65 passar a apresentar a seguinte redacção: "Com a reparação do pavimento, os Réus gastaram, em material e mão de obra, a quantia de cerca de €6.204,88 (seis mil, duzentos e quatro euros e oitenta e oito cêntimos)".

X.

Não existindo um lapso ou erro de escrita, sempre haverá que concluir que se verifica, nesta parte, uma nulidade da sentença proferida, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alíneas b) e c), do CPC, pois que existe manifesta contradição entre a redacção do facto provado, a resposta dos peritos ao quesito 50 e a motivação de direito, impondo-se, igualmente, a alteração da respectiva redacção nos termos indicados na conclusão anterior.

XI.

Não obstante a Meritíssima Juiz a quo ter dado como provada a matéria de facto constante dos factos provados n.

os 68 a 72, particularmente a deste último artigo ("Tendo despendido, em mão-de-obra e material, na reparação dos terraços em redor da casa, a quantia de € 4.602,14 (quatro mil, seiscentos e dois euros e catorze cêntimos)."), não tomou em consideração que, para reparar os trabalhos executados pelo Recorrido, foi necessária, além das quantias expressamente constantes da motivação de direito, a quantia de €4.602,14 (quatro mil, seiscentos e dois euros e catorze cêntimos) para a reparação dos terraços em redor da casa.

XII.

Trata-se de um lapso manifesto do tribunal recorrido ou, caso assim se não entenda, de uma nulidade da sentença, atenta a contradição entre a decisão sobre a matéria de facto e a motivação de direito, bem como quanto à parte decisória propriamente dita, que deverão ser supridos/sanados para que, da decisão propriamente dita, passe a constar a condenação do Recorrido a pagar aos Recorrentes a quantia de €12.915,27 (doze mil, novecentos e quinze euros e vinte e sete cêntimos), acrescida da quantia de €4.602,14 (quatro mil, seiscentos e dois euros e catorze cêntimos), num total de €17.517,41 (dezassete mil, quinhentos e dezassete euros e quarenta e um cêntimos), acrescidos de juros de mora à taxa supletiva legal cível, desde a notificação do pedido reconvencional até efetivo e integral pagamento.

XIII.

Os Recorrentes também não se podem conformar com alguns dos factos dados como provados.

XIV.

Desde logo, a matéria de facto correspondente ao facto 7.º, além de contrariar a lógica e as regras da experiência comum, mostra-se desconforme ao alegado pelo próprio Recorrido no artigo 7.º da petição inicial e ao depoimento da Recorrente S..

XV.

Ao contrário do que resulta da sentença, na fundamentação da decisão quanto à matéria de facto, a Recorrente mulher jamais disse, afirmou ou insinuou que aceitou “as alterações na obra” e que os Recorrentes consentiram que certos trabalhos previstos no contrato não fossem realizados, tendo apenas admitido que escolheram materiais mais baratos porque o Recorrido estava com problemas financeiros e preferiram materiais mais baratos para este terminar a obra.

XVI.

Deverá, portanto, ser alterada a redacção do facto provado n.º 7, nos seguintes termos: "7º Autor e Réus acordaram que, no final das obras, se faria o acerto final das contas, para pagamento dos trabalhos a mais efetuados e para pagamento das diferenças de valor de alguns materiais utilizados na obra.” XVII. Também não se conformam os Recorrentes com a matéria de facto dada como provada sob o n.º 8.º, ponto A.

XVIII. No relatório pericial, em resposta ao quesito 2 (correspondente ao artigo 8.º da petição inicial), os senhores peritos consideraram que, quanto à cave, os trabalhos a mais podiam ser interpretados de duas formas diferentes, apresentando uma leitura A e uma leitura B, consoante se entendesse que as paredes envolventes da caixa-de-ar ali existente não estavam ou estavam incluídas na obrigação do empreiteiro, respetivamente.

XIX.

Porém, tendo em conta que: - os senhores peritos preferiram não se pronunciar sobre a opção por uma ou outra leitura, ainda que indiquem, no relatório pericial, que estava previsto um alçapão de acesso à caixa de ar não ventilada, pelo que só faria sentido para este espaço a edificação de paredes...

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