Acórdão nº 7883/17.3T8VNF-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 21 de Novembro de 2019

Magistrado ResponsávelHELENA MELO
Data da Resolução21 de Novembro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório Os executados (…) e (…) vieram, por apenso à execução para pagamento de quantia certa com o n.º (..), em que é exequente (…) S.A. e são executados os ora embargantes, deduzir embargos de executado, arguindo/requerendo, em síntese: 1º - A extinção da execução, por falta de título executivo, uma vez que a norma que prevê a exequibilidade do documento apresentado como tal (art. 9.º, n.º 4, do DL n.º 287/93, de 20.08) é incompatível com o regime legal comunitário da concorrência e padece de inconstitucionalidade, por violação do princípio da igualdade, tornando aquela norma inaplicável; 2º - A absolvição dos executados do pedido executivo, em virtude da nulidade da fiança constante no contrato apresentado como título executivo, uma vez que se verifica a indeterminabilidade do seu objecto, pois a mutuante e os mutuários poderiam ajustar vários aumentos ao capital inicial mutuado e poderiam modificar o prazo e estabelecer moratórias; 3º - A exclusão da cláusula de fiança que configura a obrigação assumida pelos executados, uma vez que tal cláusula configura uma cláusula contratual geral e não foi objecto de comunicação aos embargantes. Nesta parte, os embargantes alegam que o contrato de mútuo foi negociado apenas entre mutuante e mutuários, tendo os embargantes limitado a sua intervenção a aceitarem, a solicitação dos mutuários, ser fiadores e a aparecerem no local combinado para assinarem o contrato, conforme lhes foi solicitado pelos mutuários, assinaturas que apuseram nos locais do contrato indicados pela funcionária da exequente presente na altura. Referem os embargantes que apenas estavam cientes de que iriam ser fiadores porque os mutuários lhes haviam solicitado/comunicado, pois que nenhum funcionário da exequente comunicou a cláusula da fiança aos embargantes ou sequer perguntou se tinham dúvidas. Referem ainda os embargantes que, na sequência do que lhes foi comunicado pelos mutuários, estavam convencidos que apenas seriam responsáveis pelo pagamento do mútuo em caso de incumprimento e após a exequente “ir buscar” os bens dos mutuários. E ninguém da exequente esclareceu os embargantes que estes se estavam a responsabilizar como principais pagadores, com renúncia ao benefício de excussão prévia, o que os embargantes não apreenderam, até pela escolaridade e conhecimentos que têm.

4º - A anulação ou modificação do negócio jurídico, por erro, uma vez que, como dizem, se soubessem que não beneficiavam do benefício da excussão prévia, nunca teriam aceitado ser fiadores.

A exequente contestou, contraditando de facto e de direito, a argumentação dos embargantes.

Foi realizada audiência prévia, na qual se submeteu às partes a perspetiva de decisão imediata do mérito da causa, na medida em que as questões suscitadas se apresentavam como meramente jurídicas ou sem relevância como fundamento de oposição à execução.

Após foi proferido saneador/sentença que julgou totalmente improcedentes os embargos.

Os embargantes não se conformaram e interpuseram o presente recurso de apelação, tendo concluído as suas alegações do seguinte modo: I. - Em primeiro lugar, o presente recurso fundamenta-se numa nulidade processual do Douto saneador-sentença, consubstanciada na inobservância do preceituado na alínea d) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC, que ocorre quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento, vicissitude essa que ocorreu “in casu”, mercê da absoluta falta de pronúncia acerca da NULIDADE PROCESSUAL oportunamente invocada pelos Apelantes nos autos, a qual, ao ter-lhe sido dada cobertura, vem tacitamente sancionada pela sentença, circunstância essa não permitida pelo nosso ordenamento jurídico, pelo que deverá a decisão baixar ao julgador de 1.ª instância para suprimento de tal vício; II. - Em segundo lugar, estriba-se o presente recurso na circunstância do douto aresto recorrido padecer de uma adicional nulidade por violação do preceituado na alínea b) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC, que ocorre quando o juiz incumpra “in totum” com o dever de fundamentação, no sentido que a Lei impõe, pelo que consequentemente a decisão proferida encontra-se ferida de nulidade por falta de indicação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, nulidade essa que os Apelantes aqui expressamente invocam, mais devendo a decisão baixar ao julgador de 1.ª instância para suprimento de tal vício (v.g.

fundamentação da sentença).

  1. - Na sequência das aludidas nulidades, incorre, ainda, o douto aresto recorrido em inconstitucionalidade pela violação dos Princípios Constitucionais da Tutela Jurisdicional Efetiva e do Acesso à Justiça consagrados no art.º 20.º da CRP, bem como no dever de fundamentação previsto no art.º 205.º, n.º 1 da CRP.

  2. - Sem prejuízo do anteriormente aventado, e meramente à cautela, o presente recurso estriba-se, ainda, ao abrigo do art.º 640.º do CPC, na impugnação da matéria de facto ínsita nos pontos 3., 5. e 7. da facticidade dada como provada, indicando como elementos de prova que impõem decisão diversa, o teor dos documentos que instruem a petição de embargos de executado, bem como o próprio articulado, para os quais expressamente se remete V. Ex.ªs.

  3. - Finalmente, sem prescindir, e salvo o devido respeito por melhor opinião, o presente recurso tem ainda por fundamento a desajustada interpretação/aplicação do direito efetuada no douto despacho saneador-sentença recorrido, com a qual os Apelantes não concordam, designadamente, da (in)verificação da incompatibilidade do n.º 4 do art.º 9.º do DL 287/93, de 20/08 com os art.ºs 18.º, 26.º n.º 1 e a alínea d) do n.º 1 do art.º 101.º todos do TFUE/determinativas da sua inaplicabilidade e consequente extinção da instância executiva; da (in)verificação da nulidade da fiança prestada pelos executados, aqui Recorrentes, no âmbito do contrato por indeterminabilidade de objeto (art.ºs 280.º e 400.º do CC); do (in)cumprimento dos deveres de comunicação e informação previstos nos art.ºs 5.º e 6.º do DL n.º 446/85 de 25 de outubro e, por fim, da (in)existência de erro na celebração do negócio jurídico.

  4. - Acerca do primeiro fundamento invocado – nulidade da sentença decorrente da alínea d) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC – sucedeu que, em sede de audiência de prévia, realizada a 3 de dezembro de 2018, conforme teor da respetiva acta – refª: 161024809 do citius, a qual aqui se dá por integralmente reproduzida, o Tribunal “a quo” proferiu despacho no sentido de que se perspectivava os autos reunirem os elementos necessários à prolação da decisão do mérito imediato da causa, tendo nesse acto e de imediato o Mandatário dos embargantes/Recorrentes invocado uma nulidade processual nos termos do art.º 195.º do CPC, conforme pode extrairse da referida acta, para a qual expressamente se remete V. Exªs.

  5. - Ora, uma vez compulsado o teor da decisão aqui sob censura, e/ou por intermédio de qualquer outro Despacho que tivesse antecedido aquela, ressuma de modo inequívoco que a predita nulidade não foi objecto de qualquer pronúncia por parte do Tribunal “a quo”, tendo-se outrossim e ao invés ali – no despacho saneador-sentença - inclusivamente consignado expressamente o seguinte (SIC): “(...) Inexistem nulidades ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.

    ” – negrito e sublinhado nossos.

  6. - Deste modo, afigura-se, que a questão suscitada pelos Apelantes conforma fundamento de nulidade da sentença pela inobservância da alínea d) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC, que ocorre quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento, vicissitude essa que ocorreu “in casu”, atenta a concreta pretensão deduzida pelos aqui embargantes/Apelantes, nulidade essa que os Recorrentes aqui expressamente invocam.

  7. - A apontada vicissitude tem como regra que, incluindo-se no âmbito da cláusula geral sobre as nulidades processuais constante do art.º 195.º, n.º 1, do Cód. de Proc. Civil, cometesse uma nulidade que o tribunal não conhece oficiosamente, razão porque, regra geral, se tem por sanada se não for invocada pelo interessado no prazo de 10 dias.

  8. - Sucede que, como desde há muito integra orientação doutrinal e jurisprudencial uniforme e inquestionável, e em matéria respeitante à respectiva arguição, as nulidades processuais são arrumadas em dois grandes grupos distintos: a) por uma banda, as nulidades processuais que se encontrem a coberto de uma decisão judicial, podendo assim ser impugnadas no recurso da decisão que lhes deu cobertura; b) por outra banda, as nulidades processuais que não estejam a coberto de uma qualquer decisão judicial, sendo, neste caso, o meio impugnatório a reclamação perante o juiz que proferiu a decisão, e, do despacho que recair sobre tal reclamação, caberá então (e só então) recurso nos termos gerais.

  9. - Sem prescindir, e salvo o devido respeito por melhor opinião, que é muito, ressuma, ainda, de modo inequívoco que incorreu ACRESCIDAMENTE o julgador “a quo”, no vício de falta de fundamentação., conquanto, perscrutado o aresto recorrido, conclui-se que o Tribunal “a quo” limitou-se a enumerar os factos que considerou como provados sem, contudo, fundamentar de facto, isto é, tendo obnubilado por completo a especificação/descriminação dos factos que serviram de suporte ao julgamento de direito que conduziram à decisão final.

  10. - Efectivamente, o julgador “a quo” nem tão pouco referiu, fundamentando, em que prova se baseou para dar como provados os factos considerados nesse sentido, limitando-se a tecer o seguinte: “Os factos provados resultam do documento junto referido ou dos factos alegados/confessados pelos próprios embargante.”.

  11. - Nesta sede, e de acordo com a alínea b) do art.º 615.º do CPC, a sentença é nula, acrescendo que o art.º 154.º do CPC impõe o dever do julgador fundamentar a...

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