Acórdão nº 3823/18.0T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 21 de Novembro de 2019
Magistrado Responsável | ANTÓNIO SOBRINHO |
Data da Resolução | 21 de Novembro de 2019 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório; Recorrente: (…), SA. (ré/reconvinte); Recorrido: (…) (autor/reconvindo) ***** No presente processo comum que o autor (…) intentou contra a ré (…) SA., realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença a julgar a acção totalmente procedente e, consequentemente, declarou-se a inexistência do direito da ré em reclamar do autor o pagamento do valor referido em 9º da petição inicial e de suspender ou interromper o fornecimento de energia eléctrica ao autor.
Mais se julgou totalmente improcedente o pedido reconvencional deduzido pela ré e, dessa forma, absolveu-se o autor de todos os pedidos contra si formulados.
Inconformado com tal decisão, dela interpôs recurso a ré, de cujas alegações se extraem as seguintes conclusões: A. O presente Recurso de Apelação vem interposto por Distribuição – Energia, S.A. – ora Recorrente - por não se conformar com a sentença que julgou a ação totalmente procedente e, por outro, julgou totalmente improcedente o pedido reconvencional deduzido pela Ré, ora Recorrente.
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Conforme resulta da Petição, está em causa uma ação declarativa de condenação, pela qual o Autor, ora Recorrido, pede que seja reconhecida e declarada a inexistência ou inexigibilidade de qualquer direito da Ré, ora Recorrente, a receber o valor de € 8.834,41. C. A Ré, ora Recorrente, deduziu contestação e reconvenção, pugnando pela improcedência do pedido formulado pelo Autor, aqui Recorrido, e pedindo que o Tribunal julgasse a reconvenção provada e procedente e, em consequência, condenasse o Autor a proceder ao pagamento da indemnização de € 8.834,41.
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O Recorrido apresentou réplica, alegando que não tinha procedido nem por si nem por intermédio de outrem a qualquer viciação no contador.
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De forma sintética, o Tribunal a quo deu como não provado que os técnicos verificaram que o contador havia sido manipulado, mas devido a erro na apreciação da matéria de facto.
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Por outro lado, o Tribunal a quo considerou que a Ré, aqui Recorrente, violou o dever de informar o consumidor – o Autor, ora Recorrido – dos seus direitos, nomeadamente, de requer uma vistoria ao contador.
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Salvo o devido respeito, que é muito, entende a Recorrente que a sentença enferma de um erro na aplicação do Direito, designadamente, no que diz respeito à interpretação do Decreto-Lei 328/90, de 22 de outubro.
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Por esse motivo, o Recurso versa sobre a matéria de facto e de Direito.
I. O auto de vistoria de 26.06.2017 e a fotografia recolhida no mesmo dia permitem concluir que o selo da tampa de bornes do contador estava rebentado e que os shunts da fase L1 e L3 estavam danificados.
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Tal realidade foi confirmada por um dos técnicos da Recorrente na audiência de julgamento – a testemunha F. P..
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A adulteração verificada teve como consequência que cerca de 2/3 da energia consumida na instalação não fosse medida pelo contador.
L. O depoimento das testemunhas F. P., A. C. e P. S., articulado com a documentação junta ao processo (designadamente, os documentos 02 a 06 da contestação) impunha que o Tribunal a quo tivesse dado como provados os seguintes factos: Os técnicos verificaram que o contador havia sido manipulado.
O selo da tampa de bornes estava rebentado.
Os shunts da fase L1 e L3 estavam danificados.
O que fazia com que parte dos consumos efectuados na instalação não fossem contabilizados em virtude da manipulação infligida no equipamento de medida.
Sendo a instalação trifásica, a adulteração detectada tinha como consequência de 2/3 do consumo de energia efectuado não fosse medido nem registado pelo contador.
O quadro factual narrado ocorreu sem o conhecimento e autorização da Distribuição – Energia e contra a sua vontade.
Apenas um técnico com conhecimento na matéria conseguiria detectar a manipulação.
O A. consumiu energia eléctrica que não foi registada pelo equipamento de medida por força de manipulação que o mesmo, pelo menos, aproveitou.
Na sequência da execução da ordem de serviço junta como documento 04, os técnicos ao serviço da Ré detectaram, no equipamento técnico que serve, em exclusivo, a instalação da A., que o selo da tampa de bornes estava rebentado e os shunts da fase L1 e L3 estavam danificados.
Facto tecnicamente idóneo de fazer com que duas das três fases do equipamento não registassem a energia eléctrica que pelas mesmas passava.
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As declarações de parte do Recorrido, conjugadas com os depoimentos das testemunhas G. R. e F. P. impõem que seja aditado novo facto ao elenco da factualidade dada como provada: Na vistoria de 26.06.2017, os técnicos da Ré informaram o representante do Autor de que o contador tinha sido adulterado.
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A testemunha P. S. explicou de que forma a Recorrente apurou os prejuízos, confirmando o teor dos mapas de cálculo juntos como documento 10 à contestação, o que revela a necessidade de aditar novo ponto aos factos dados como provados: A adulteração verificada no contador que serve a instalação do Autor aquando da vistoria de 26.06.2017 implicou que a Ré sofresse prejuízos no montante de €8.834,41.
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Das declarações de parte do Autor, ora Recorrido, resulta inequivocamente que a Recorrente jamais comunicou que teria intenção de interromper o fornecimento de energia elétrica à instalação, motivo pelo qual deverá ser aditado o seguinte facto provado: A Ré nunca tencionou interromper o fornecimento de energia elétrica ao Autor.
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Ao contrário do que é referido pelo Tribunal a quo, sobre a Recorrente não recaía a obrigação de informar o consumidor de que poderia requerer uma vistoria à DGEG porquanto não se aplica, in casu, o disposto no número 1 do artigo 4º do DL 328/90, de 22/10.
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O artigo 3º do DL 328/90 estatui que, face a um procedimento fraudulento, o distribuidor tem direito a interromper o fornecimento de energia e a ser ressarcido pelos consumos irregulares e pelas despesas com a verificação e correção da fraude.
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O DL 328/90 só faz depender a interrupção do fornecimento eléctrico da prévia informação ao consumidor dos seus direitos (número 1 do artigo 4º).
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Essa dependência não existe quanto ao ressarcimento do valor do consumo irregular e das despesas inerentes à verificação e eliminação da fraude e respetivos juros.
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A Recorrente actuou no estrito cumprimento da lei, mormente, do disposto no DL 328/90, de 22/10 e na Secção IV, ponto 31.1 da Directiva n.º 5/2016 da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (Guia de Medição, Leitura e Disponibilização de Dados de energia elétrica em Portugal continental).
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Em conclusão, mal andou o Tribunal a quo ao ter declarado a ação procedente e, consequentemente, ao não ter conhecido do pedido reconvencional.
V. Funciona em pleno a presunção constante do número 1, do artigo 2º do DL 328/90, de 22 de Outubro, que dispõe que Qualquer procedimento fraudulento detectado no recinto ou local exclusivamente servido por uma instalação de utilização de energia eléctrica presume-se, salvo prova em contrário, imputável ao respectivo consumidor.
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A factualidade integrante do direito à indemnização traduz-se, como é sabido: i. Na verificação de um facto voluntário, ilícito, neste caso, a desselagem do contador e a abertura dos shunts das fases L1 e L3; ii. Na imputação subjectiva desse facto ao agente, neste caso, ao Recorrido; iii. Na existência de um dano reparável, neste caso, o prejuízo correspondente à energia utilizada pelo Recorrido e não registada pelo contador, no período da anomalia; iv. Num nexo causal entre o facto e o dano, neste caso, a adequação técnica entre a desselagem do contador e a abertura dos shunts das fases L1 e L3 e o não registo da energia medida...
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