Acórdão nº 850/15.3T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 14 de Novembro de 2019

Magistrado ResponsávelPAULO REIS
Data da Resolução14 de Novembro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I. Relatório J. C.

instaurou ação declarativa, com processo comum, contra: 1) P. R.

; 2) A. M.

e mulher F. M.

; 3) M. P.

e mulher L. J.

, todos devidamente identificados nos autos, pedindo que: a) seja declarado anulado o contrato de compra e venda celebrado entre a primeira ré e os segundos réus relativo ao prédio urbano, fração autónoma destinada à habitação, melhor identificado no artigo 10.º da petição inicial, condenando aqueles réus a restituir tudo o que em virtude do mesmo tiver sido prestado; b) seja declarado anulado o contrato de compra e venda celebrado entre os segundos e os terceiros réus relativo ao prédio urbano, fração autónoma destinada à habitação, melhor identificado no artigo 10.º da petição, condenando aqueles terceiros réus a restituir tudo o que em virtude do mesmo tiver sido prestado; c) em consequência, ex oficio, seja declarada a nulidade do registo predial de aquisição do referido prédio, destinado à habitação, fração autónoma designada pelas letras “CC”, correspondente a uma habitação tipo T3, no quarto andar esquerdo, sito na Urbanização ..., Rua …, Entrada …, no lugar ..., freguesia de ..., no concelho de Guimarães, inscrito na matriz sob o artigo ..., com o valor patrimonial de € 84.013,51, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº …, sucessivamente, a favor dos identificados segundos e terceiros réus; d) seja declarada a nulidade do registo de constituição de quaisquer ónus ou encargos que até ao registo da ação venha a incidir sobre a referida fração; e) seja ordenado o cancelamento dos registos que incidem sobre a referida fração autónoma “CC”, na Conservatória do Registo Predial ..., sob a AP 316 de 2013/10/21 e a favor dos terceiros réus na Conservatória do Registo Predial ... sob a AP 597 de 2014/04/22; f) seja ordenado que na inscrição matricial relativa à fração identificada deixe de figurar como proprietários os terceiros réus e em sua substituição passe a constar o autor; g) seja declarado anulado qualquer contrato celebrado pela primeira ré, segundos e/ou terceiros réus, entre eles ou com terceiros, a título oneroso ou gratuito, tendo como objeto a referida fração autónoma, nomeadamente o intitulado contrato de arrendamento identificado no artigo, junto ao documento nº 4.

Alega, para o efeito, que é casado com a primeira ré no regime de comunhão de adquiridos e tomou conhecimento em dezembro de 2014, por intermédio dos filhos, que aquela solicitou a J. M., que contactou telefonicamente na sequência de anúncio de jornal, o empréstimo de € 15.000,00 o qual o concedeu em troca de garantia, escolhendo, depois de conhecer a totalidade do património, a aludida fração autónoma; quando se dirigiu a um Cartório Notarial da …, a ré terá sido advertida que o contrato a celebrar seria uma compra e venda, o que se concretizou em 18 de outubro de 2013, ficando a constar que a mesma outorgava como vendedora, por si e na qualidade de procuradora do marido; contudo, o autor nunca deu o seu consentimento nem subscreveu qualquer documento a atribuir poderes para qualquer negócio; a procuração em causa foi autenticada por Advogada que descreve o seu comparecimento e a sua outorga na presença daquela, o que não aconteceu, tanto que devido a acidente de trabalho ocorrido há 7 anos, com lesões permanentes nas mãos, era-lhe impossível produzir a escrita como está produzida; refere que a ré terá sido pressionada pelos alegados adquirentes ou pelo J. M. a celebrar contratos de arrendamento relativamente aos imóveis alienados; por intermédio de uma notificação judicial avulsa em 7 de Abril de 2015 foi informado que seria arrendatário da sua própria casa e que por alegado não pagamento de rendas o contrato, que nunca assinou e desconhecia por completo, estava resolvido, tomando conhecimento que em 16 de abril de 2014 havia sido celebrado contrato de compra e venda entre os segundos e terceiros réus.

Os terceiros réus contestaram, defendendo-se por exceção e por impugnação, pedindo a condenação do autor como litigante de má-fé.

Também os segundos réus contestaram defendendo-se por exceção e por impugnação, pedindo a condenação do autor como litigante de má-fé.

O autor exerceu espontaneamente o contraditório quanto ao incidente de litigância de má-fé.

Dispensada a audiência prévia, foi proferido despacho saneador.

Identificado o litígio foram enunciados os temas da prova.

Realizada a audiência final, foi proferida sentença, decidindo o seguinte: « Em face do exposto, o Tribunal, julgando a ação parcialmente provada e procedente, a) declara a ineficácia e inoponibilidade do contrato de compra e venda celebrado entre os Réus P. R., A. M. e mulher F. M., identificado nos pontos 11 a 14) da fundamentação de facto, em relação ao Autor J. C.; b) declara a nulidade do contrato de compra e venda celebrado entre os Réus A. M. e mulher F. M., M. P. e mulher L. J. , identificado no ponto 26) da fundamentação de facto, determinando, em consequência, a restituição da fração; c) determina o cancelamento dos registos Ap. 316 de 21 de Outubro de 2013 e Ap. 597 de 22 de Abril de 2014 relativos à fração “CC” do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº 2.533-...; d) determina que os Réus M. P. e mulher L. J. deixem de figurar na inscrição matricial da fração “CC” do prédio inscrito sob o artigo ... da freguesia de ..., passando ali a constar o Autor; e) declara a nulidade dos contratos identificados nos pontos 18) a 22) e 30) a 34) da fundamentação de facto; f) absolve os Réus dos demais pedidos formulados.

Custas exclusivamente a cargo dos Réus, uma vez que a improcedência do pedido identificado no relatório sob a alínea c) e a procedência parcial dos demais deriva da prerrogativa de indagação e interpretação das normas aplicáveis.

Registe e notifique».

Inconformados, os segundos réus A. M. e mulher F. M. apresentaram recurso, pugnando no sentido da revogação da sentença e os réus absolvidos de todos os pedidos formulados, terminando as respetivas alegações com as seguintes conclusões (que se transcrevem): «A. Por decisão do Tribunal Judicial de 1.ª Instância foi julgada a “acção parcialmente provada e procedente, declara a ineficácia e inoponibilidade do contrato de compr e venda celebrado entre os Réus P. R., A. M.e mulher F. M., identificado nos pontos 11 a 14) da fundamentação de facto em relação ao Autor J. C.; b. declara a nulidade do contrato de compra e venda celebrado entre os Réus A. M. e mulher F. M., M. P. e mulher L. J. , identificado no ponto 26) da fundamentação de facto, determinando, em consequência, a restituição da fração; c. determina o cancelmaneto dos registos Ap. 316 de 21 de Outubro de 2013 e Ap. 597 de 22 de Abril de 2014 relativos à fração “CC” do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº 2.533-...; d. determina que os Réus M. P. e mulher L. J. deixem de figurar na inscrição matricial da fração “CC” do prédio inscrito sob o artigo ... da freguesia de ..., passando ali a constar o Autor; e. declara a nulidade dos contratos identificados nos pontos 18) a 22) e 30) a 34) da fundamentação de facto; f. absolve os Réus dos demais pedidos formulados.” B. Ora, no caso sub judice a Exma. Senhora Doutora Juiz a quo conclui na parte “V. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO”, mais concretamente na página 30, último parágrafo que “Não obstante a falsificação, a procuração em causa foi usada pela Ré P. R. na outorga, a 18 de Outubro de 2013, de escritura pública celebrada no Cartório Notarial da Dr.ª C. B., para declarar que, na qualidade de procuradora do marido, o aqui Autor, e também por si, vender ao Réu A. M., pelo preço já recebido de € 34.490, a fração autónoma designada pelas letras “CC”, correspondente a habitação tipo T3 no qurto andar esquerdo e garagem nº 75, no rés-dochão, bloco 5, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal sito no Lugar ..., freguesia de ..., concelho de Guimarães, inscrito na matriz sob o artigo ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº 2.533.

Esta venda é inoponível ao Autor não produzindo efeitos na sua esfera jurídica Não estamos perante uma anulabilidade do negócio jurídico por falta de consentimento do cônjuge nos termos das disposições conjugadas dos artigos 1.682º-A e 1.687º do Código Civil não apenas por se ter provado que entre o Autor e a primeira Ré vigora o regime imperativo de separação de bens, mas também por existir disposição especial que rege os efeitos jurídicos do negócio celebrado sem poderes de representação.

(...) Estes contratos dizem respeito a imóveis relativamente aos quais o Autor é comproprietário, dado que, como referimos, o regime de bens de casamento é o da separação, pelo que, nos termos do artigo 1.408º do Código Civil, são havidos como oneração de coisa alheia e, como tal, padecem de nulidade.” C. Ora, resulta provado que entre o Autor e a primeira Ré vigora o regime imperativo da separação de bens.

D. Resulta também provado que a primeira Ré, ao outorgar, pelo menos a sua vontade foi manifestada presencialmente e quanto a ela nada foi questionado, E. A primeira Ré sabia de todas as condições do negócio, preços, não obstante depois vir dizer que não recebeu o preço, o fato é que resultou provado, ponto 17. Da fundamentação de facto, que “Com data de 18 de Outubro de 2013, a Ré P. R. assinou escrito denominado “requisição” do qual constava que o Autor solicitava ao segundo Réu, a pedido da sua representada, o pagamento do preço da venda da fracção aludida em 11) em dinheiro.” F. Resulta da transcrição do ficheiro áudio de declarações da primeira ré P. R. com o nome 0180222101931_4877833_2870525.wma que: “[00:01:18] Meritíssima Juiz: Como é que a senhora providenciou para poder celebrar os contratos em seu nome e em nome do marido? O que é que fez? [00:01:27] P. R.: Eu, eu falei com o tal R. M. e ele é que arranjou a procuração. Ele ou não sei quem foi.

[00:01:55]...

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