Acórdão nº 8257/18.4T8VNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 14 de Novembro de 2019
Magistrado Responsável | MARIA DA PURIFICAÇÃO CARVALHO |
Data da Resolução | 14 de Novembro de 2019 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
- Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães – I.
RELATÓRIO No processo executivo acima identificado em que figuram como exequentes Transporte X Lda. e como executados M. R. e M. M. foi com data de 29.05.2019 proferido o seguinte despacho: O n.º 1 do art. 127º do CIRE prevê expressamente a preclusão do direito de o credor instaurar uma acção pauliana se o mesmo negócio foi declarado resolvido pelo administrador da insolvência (n.º 1).
Mais, decorre do n.º 2 que o destino das paulianas pendentes à data da resolução em benefício da massa - tenham sido instauradas antes da declaração de insolvência ou depois – será a suspensão. A suspensão da instância deverá manter-se pelo período mínimo de 3 meses, prazo findo o qual caducará o direito de impugnação da resolução (cf. art. 125º). A acção só prosseguirá se a resolução vier a ser procedentemente impugnada. Caso contrário, extinguir-se-á por inutilidade superveniente da lide, já que deixará de ser possível a execução do bem no património do terceiro em virtude da sua “viagem de regresso para a massa”.
O referido regime aplica-se à presente execução, movida pelo aqui exequente contra os executados na sequência do provimento da acção impugnação pauliana.
Assim, ao abrigo do disposto no artigo 127º, n.º 2 do CIRE, suspendo a presente execução.
Notifique.
Solicite à Srª AI que informe: - Se a resolução foi impugnada ou já caducou o direito de impugnação da resolução (cf. art. 125º).
Informe o exequente se o crédito que detém sobre o executado/insolvente lhe foi reconhecido nos autos de insolvência.
Inconformada a exequente apresenta recurso que termina com as seguintes conclusões: 1. O presente recurso vem interposto na sequência do despacho com a ref. ª 163426925; 2. Uma vez que não pode a Recorrente não conformar-se com o teor do referido despacho, que afirma, desde logo, o seguinte: “Mais, decorre do n.º 2 que o destino das paulianas pendentes à data da resolução em benefício da massa – tenham sido instauradas antes da declaração de insolvência ou depois – será a suspensão. A suspensão da instância deverá manter-se pelo período mínimo de 3 meses, prazo findo o qual caducará o direito de impugnação da resolução (cf. art. 125º). (….) O referido regime aplica-se à presente execução, movida pelo aqui exequente contra os executados na sequência do provimento da ação impugnação pauliana. Assim, ao abrigo do disposto no artigo 127º, n.º 2 do CIRE, suspendo a presente execução.” (sublinhado nosso) 3. Ora, os presentes autos não são de impugnação pauliana, mas sim de execução da sentença proferida (no âmbito de uma ação de impugnação pauliana).
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Sendo a decisão proferida procedente e podendo a recorrente executá-la, como está a fazer, não se encontra qualquer razão lógica para estes autos ficarem suspensos por aplicação do 127.º do CIRE, que se aplica a processos de impugnação pauliana que ainda não foram julgados.
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E não a casos, como o dos presentes autos, em que já há uma decisão proferida e a ser executada, uma vez que, apesar de ter sido interposto recurso pelo impugnado, a execução da sentença corre os seus termos, em virtude de a apelação não ter efeitos suspensivos, nos termos previstos na lei, e os seus efeitos retroagem sempre à data em que foi instaurada a ação.
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Pelo que, salvo melhor opinião, não existe qualquer razão para estes autos de execução serem suspensos, pois o artigo 127.º do CIRE aplica-se aos autos de impugnação pauliana e, os presentes autos, já se encontram numa fase posterior àquela que está prevista no artigo do CIRE, que se destina a ações relativamente às quais ainda não foi proferida uma sentença, e já não às execuções de sentença de ações que, pela sua natureza não são apensadas aos autos de insolvência e que, consequentemente prosseguem os seus termos.
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No entanto, e mesmo que assim não se entenda, o que por mera cautela de patrocínio se admite, não pode a Recorrente conformar-se com o restante teor do despacho recorrido; 8. Nomeadamente no que diz respeito ao seguinte: “A ação só prosseguirá se a resolução vier a ser procedentemente impugnada.
Caso contrário, extinguir-se-á por inutilidade superveniente da lide, já que deixará de ser possível a execução do bem no património do terceiro em virtude da sua “viagem de regresso para a massa”.” (sublinhado nosso) 9. Antes de mais, é certo que “mostra-se convertida na doutrina e na jurisprudência a questão da articulação dos meios de tutela dos credores relativamente a atos praticados pelo devedor em seu prejuízo no âmbito da insolvência (resolução em benefício da massa insolvente) e fora dela (impugnação pauliana), atendendo ao facto do atual CIRE ter deixado cair o recurso à chamada “impugnação pauliana coletiva” prevista no artigo 157.º do Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e da Falência (CPEREF)” – neste sentido, veja-se o recente Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15.01.2019, relatora Graça Amaral (processo 3134/14.0TBBRG.G1. S1).
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Com efeito, o CIRE passou apenas a regular a resolução em benefício da massa insolvente enquanto meio de tutela dos deveres do insolvente, sendo que ao regulamentar a articulação desta figura com o instituto da impugnação pauliana, aboliu a referência aos efeitos coletivos da impugnação pauliana.
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Para além disso, o regime atual da impugnação pauliana, previsto no Código Civil, ao invés do que se passava com o Código de 1867, caracteriza-se quanto aos efeitos da procedência da respetiva ação, enquanto direito pessoal de restituição, porquanto o ato visado não é afetado na sua validade intrínseca, apenas deixa de produzir efeitos em relação ao credor impugnante na medida do seu interesse, ou seja, uma vez satisfeito o direito do credor o ato impugnado permanece integralmente válido.
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O regime legal da ação de impugnação pauliana não se confunde com o da ação de nulidade ou de anulação pois que se caracteriza por não comportar o retorno dos bens ao património do alienante para ali serem executados, mantendo-se os mesmos no património do terceiro adquirente uma vez que os atos praticados permanecem válidos, tendo o credor direito apenas à restituição dos bens na medida do seu interesse – eficácia pessoal da impugnação pauliana – e nessa medida os presentes autos nunca serão inúteis.
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Pelo que, os efeitos da impugnação pauliana aproveitam apenas ao credor que a tenha requerido e, como consequência lógica da inexistência de nulidade ou anulação do ato, isto é, atenta a preservação da validade “condicionada” do ato, não é possível falar de um “regresso” do bem alienado ao património do devedor, sendo que, igualmente, não deixa de existir o ónus que sobre esse bem entretanto se tiver constituído – é neste sentido que vai a jurisprudência mais recente, nomeadamente o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15.01.2019, relatora Graça Amaral (processo 3134/14.0TBBRG.G1.S1).
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O referido Acórdão refere ainda que tendo presente o elemento literal de interpretação e, bem assim, a opção do legislador ao deixar de prever como efeitos da impugnação pauliana a afetação dos bens para a massa falida, não nos é possível descortinar outra interpretação que não seja a de que, atenta a natureza da ação de impugnação pauliana, não pode a procedência daquela assumir efeitos coletivos no sentido de beneficiar a massa insolvente e muito menos pode prejudicar o credor que exerceu o seu direito através da ação de impugnação pauliana, já que este é um direito muito mais abrangente para o credor que usou mão dessa faculdade, e eficaz, e que foi declarado antes da insolvência e muito antes da resolução operada pela Sra. Administradora de Insolvência.
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No caso em apreço nos presentes autos, existe uma ação de impugnação pauliana julgada procedente a favor da Requerente – anterior à declaração de insolvência – pelo que os seus efeitos não são (nem podem ser) coletivos, nem pode ser prejudicada pela insolvência posterior e pela muito posterior resolução, aproveitando apenas à Requerente e não havendo uma viagem de regresso dos bens para a massa (que a ocorrer deverá ser de aqueles remanescentes depois de pago, através da presente execução, o crédito do credor impugnante, que não pode ser prejudicado por uma resolução ocorrido em momento posterior a ter sido declarado o seu direito).
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A jurisprudência mais recente vai no sentido de que os efeitos da impugnação pauliana aproveitam apenas o credor que a requereu, pelo que, neste caso, havendo uma decisão proferida no processo de impugnação pauliana que é anterior ao processo de insolvência, e a qualquer resolução, o credor impugnante terá sempre que ver assegurada a eficácia pessoal da sua impugnação, não podendo seu direito, já declarado judicialmente ser coartado.
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Por fim, mesmo que a resolução seja julgada procedente, não se pode aceitar o afirmado no despacho recorrido, isto é, que nesse caso a presente ação “extinguir-se-á por inutilidade superveniente da lide, já que deixará de ser possível a execução do bem no património do terceiro em virtude da sua “viagem de regresso para a massa”.
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Mesmo que se entendesse que neste momento não existe um direito judicialmente válido e eficaz, uma vez que a decisão proferida no âmbito da ação pauliana foi alvo de recurso, o qual ainda não obteve uma decisão por parte do Tribunal da Relação do Porto, é certo que caso o recurso venha a ser julgado improcedente, mantendo-se a decisão proferida a favor da impugnante, ora recorrente, os efeitos da decisão terão que retroagir à data da decisão de 1.ª instancia.
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O que significa que, caso o recurso seja improcedente, à data da declaração de insolvência e à data da resolução por parte da Administradora de Insolvência, já existia uma decisão procedente no âmbito da impugnação pauliana – pelo que qualquer decisão do processo de insolvência, nomeadamente a procedência da resolução, não pode afetar o direito já constituído do credor impugnante.
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A douta sentença violou assim, por erro de interpretação, o...
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