Acórdão nº 2458/17.0T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Julho de 2019
Magistrado Responsável | ALDA MARTINS |
Data da Resolução | 10 de Julho de 2019 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
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Relatório A. M.
intentou acção declarativa de condenação, com processo comum, contra X – Transportes, S.A.
, pedindo que o tribunal condene a ré a pagar-lhe a quantia de € 11.343,00 a título de indemnização por assédio laboral e de diferenças salariais, sem prejuízo das demais vincendas enquanto mantiver a disponibilidade para prestar serviço em TIR.
Para o efeito, em suma, alegou ser vítima de assédio moral por parte da ré, que não lhe atribui serviço de TIR, apesar de ele estar disponível para tal, com os inerentes danos patrimoniais e não patrimoniais, designadamente omissão de pagamento da compensação prevista na cláusula 74.ª, n.º 7, do CCT aplicável.
Na contestação, a ré pediu a sua absolvição do pedido, alegando, em suma, que o autor nunca trabalhou em exclusivo no transporte internacional, nem a ré estava obrigada a tal atribuição, nem tal constituindo tratamento discriminatório, e que o aludido suplemento remuneratório só lhe era devido quando prestasse aquele transporte.
Realizou-se a audiência prévia, na qual foi proferido despacho saneador e se procedeu à identificação do objecto do litígio e à enunciação dos temas de prova.
Realizou-se a audiência de julgamento, após o que, pelo Mmo. Juiz a quo, foi proferida sentença que terminou com o seguinte dispositivo: «Pelo exposto, julgo a presente acção totalmente improcedente, por não provada nos termos sobreditos e, em consequência: Absolvo a ré, “X – Transportes, S.A.”, do pedido formulado pelo autor, A. M..
Custas a cargo do autor, sem prejuízo do benefício de apoio judiciário, tendo a acção o valor de € 11.343.» O autor, inconformado, interpôs recurso da sentença, formulando as seguintes conclusões: «1ª- A decisão em recurso julgou totalmente improcedente, por não provado o pedido formulado pelo ora Recorrente, absolvendo a Recorrida nessa medida, do pedido de condenação no pagamento dos valores em falta relativos à retribuição prevista a cláusula 74ª do CCT aplicável (celebrado entre a ANTRAM e a FESTRU), do pedido de condenação pela prática sobre a sua pessoa de assédio moral (e caso assim não se entendesse, pela prática de discriminação direta) e do pagamento da indemnização de 7500,80€.
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- O facto que a sentença considerou provado com o nº 8 não tem qualquer sustentação em documentos, é contrariado pelos recibos de vencimento do Recorrente juntos com a petição inicial com os nº 66 a 94, é contrariado pelo cadastro e listagem de remunerações juntos pela Recorrida a 06 de novembro de 2017 (requerimento com a referência 6235060 da plataforma Citius), e é contrariado pela testemunha A. A. (cfr. 00:02:57 a 00:03:30 do registo da gravação do respetivo depoimento); 3ª- Razões pelas quais, o facto provado nº 8 deve ser excluído.
4º- Porque resulta do depoimento da testemunha A. A., que a colocação do Recorrente no departamento de tráfego por si gerido, que não inclui serviço em TIR (transporte internacional rodoviário), ou com matérias perigosas, foi determinado pela Recorrida (cfr. 00:13:09 a 00:13:39 do registo da respetiva gravação); 5ª- Em substituição do facto provado nº 8, deve o tribunal de recurso dar como provado o alegado no artigo 34º da petição inicial (PI), com a seguinte redação: A Recorrida não distribui serviço TIR ao Recorrente porque entende não o fazer, tendo-o colocado no serviço de carga geral/contentores, com exclusão do recebimento da remuneração prevista na cláusula 74ª nº 7 do CCT celebrado entre a ANTRAM e a FESTRU, que é aplicável à relação laboral em causa.
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- Este facto é relevante para comprovar a existência de comportamento hostil da Recorrida para com o Recorrente e a sua duração.
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- Resulta dos depoimentos do Recorrente (de 00:14:40 a 0:15.07 do registo da respetiva gravação), e das testemunhas A. A. (de 00:01:19 a 00:02:49 e de 00:13:09 a 00:13:39 do registo da sua gravação) e P. G. (de 00:02:01 a 00:02:49, de 00:05:04 a 00:05:20, de 00:05:36 a 00:06:45 e a 00:08:31 do registo da gravação do depoimento prestado), que o tratamento que a Recorrida dispensou ao Recorrente após a sua reintegração foi diferente daquele que tinha antes do despedimento.
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- Logo, como facto provado nº 11.1, o tribunal de recurso deve dar como provado o alegado no artigo 35º da PI, com a seguinte redação: o serviço atribuído ao Recorrente depois da condenação da Recorrida a reintegra-lo é distinto daquele que antes de 13 de outubro de 2014 lhe era destinado.
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- Este facto é relevante para estabelecer o comportamento não desejado pelo Recorrente.
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- Com fundamento no teor dos recibos de vencimento do Recorrente (Docs. 86 a 94 da PI), assim como no depoimento da testemunha C. F. (cfr. 00:10:35 a 00:10:52 do registo do respetivo depoimento), decorre que em consequência do serviço distribuído ao Recorrente após a reintegração, este passou a auferir uma remuneração mensal inferior; 11ª- Em consequência, como facto provado nº 11.2, pode o tribunal de recurso dar como provado o teor dos artigos 39º, 44º e 49º da PI, com a seguinte redação: Objetivamente, existe uma alteração da situação profissional do Recorrente desde a sua reintegração, que afeta a sua qualidade de vida e a sua dignidade, desfavoravelmente, causando danos patrimoniais correspondentes ao montante da retribuição da Cláusula 74ª que deixou de auferir desde março de 2016 a abril de 2017 e nos subsídios de férias e de Natal, em 5500,80€ (343,80€ X 16).
12º- Este facto é relevante para comprovar a existência de consequências nefastas para o Recorrente do comportamento da Recorrida.
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- Para estabelecer o modo como antes do despedimento do Recorrente decorriam as viagens que este conduzia em território nacional, e assim tornar apreensível a medida da diferença do tratamento a que é submetido pela Recorrida após a sua reintegração, o tribunal de primeira instância devia ter valorado a declaração da testemunha A. A. (cfr. de 00:01:54 a 00:02:49 do respetivo registo), 14ª- E assim, dar como provado o teor dos artigos 6º e 7º da resposta, como facto provado nº 11.3, ou seja: Tanto o Recorrente (antes de outubro de 2014), como todos os outros motoristas de TIR, entre a chegada de uma viagem internacional e a partida para a seguinte, enquanto aguardam pela partida, fazem o transporte de mercadorias em território nacional.
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- Tendo considerado como facto assente o teor dos documentos juntos pela Recorrida a fls. 107 a 170 verso e 209 a 229 verso, e contendo estes o cadastro de remunerações e descontos relativos ao Recorrente e aos motoristas da Recorrida indicados como os sujeitos em relação aos quais se considera o Recorrente discriminado, o tribunal de primeira instância podia e devia ter dado como assentes as diferenças de vencimento que se verificam, em complemento aos factos provados nº 12, 14 e 15, nos seguintes termos: - A média do vencimento líquido do Recorrente foi de 781,28€ em 2008, de 1065,07€ em 2009, de 1592,01€ em 2010, de 1558,81€ em 2011, de 1591,68€ em 2012, de 1550,71€ em 2013, de 1451,15€ em 2014, de 799,35€ em 2016 e de 660,92€ em 2017.
- A média mensal do vencimento líquido do motorista P. F., contratado em novembro de 2015, foi de 653,09€ em 2015, 1569,67€ em 2016 e de 1609,35€ em 2017; - A média mensal do vencimento líquido do motorista M. P., contratado em maio de 2014, foi de 1559,24€ em 2014, 1704,86€ em 2015; 1633,81€ em 2016 e 1824,42€ em 2017; - A média mensal do vencimento líquido do motorista C. A., contratado em março de 2014, foi de 1542,30€ em 2014, 1648,39€ em 2015, 1585,31€ em 2016 e de 1623,35€ em 2017; - A média mensal do vencimento líquido do motorista P. H., contratado em setembro de 2017, foi de 1572,67€ em setembro e outubro de 2017; - A média mensal do vencimentto líquido do motorista A. R., também contratado em setembro de 2017, foi de 1584,05€ nos mesmos meses de setembro e outubro 16ª- Estes, são factos relevantes para o apuramento das consequências negativas do comportamento da Recorrida e que o tribunal de primeira instância parece ter julgado irrelevantes.
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- Os factos distinguidos nas conclusões supra conduzem à condenação da Recorrida pela prática de assédio, sob pena de violação do artigo 29º do CT/2009, em que a sentença incorre.
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- A sentença em recurso viola também os artigos 23 e 25º, nº 5 do CT/2009, na medida em que reconhece ter o recorrente identificado os trabalhadores em relação aos quais se verifica o tratamento discriminatório, mas não confere à Recorrida o ónus da prova de que a diferença de tratamento não assenta no facto de ter sido judicialmente compelida a reintegrar o Recorrente, fator de discriminação identificado. Cfr. Acórdão do STJ de 18 de dezembro de 2013 (processo 248/10.0TTBG.P1.S1), disponível em www.dgsi.pt .
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- O teor dos nº 1, 4, 6 e 7 da cláusula 74ª do CCT aplicável, determina que para a condução em TIR o motorista dê o seu acordo expresso, do qual se pode desvincular cumprindo os requisitos indicados no nº 4, sem perda da retribuição específica prevista no nº 7.
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- Desta forma, a Recorrida não cumpre os requisitos da boa fé na execução do contrato de trabalho quando, sem justificação objetiva, desloca o motorista para o transporte de mercadorias exclusivamente em âmbito nacional e suprime a retribuição prevista na cláusula 74ª nº 7 do CCT aplicável, devida em relação a 30 dias por mês, todos os meses do ano; 21ª- E, ao admitir este comportamento como lícito, a sentença do tribunal de primeira instância viola a referida cláusula, os artigos 126º e 129º do CT/2009, e os princípios da estabilidade no emprego e da igualdade, previstos nos artigos 53º e 59, nº 1, alíneas a) e b) do Constituição da República Portuguesa. Cfr. sumário do acórdão do STJ de 12/09/2007, proferido no processo 07S1803, relatado pelo Conselheiro Bravo Serra, publicado em www.dgsi.pt e CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA ANOTADA, 2ª edição revista e ampliada, 1º volume, de J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Coimbra Editora, 1984, pág. 293.» A ré apresentou resposta ao recurso do autor, pugnando pela sua...
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