Acórdão nº 281/14.2TBCMN.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Julho de 2019

Magistrado ResponsávelMARGARIDA SOUSA
Data da Resolução10 de Julho de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO: R. M. e marido, J. C., a primeira por si e na qualidade de administradora do Bloco ..., do prédio constituído no regime da propriedade horizontal, sito na Indicada Rua …, freguesia de ..., concelho de Caminha, instauraram contra “X, LDA.” e A. F. a presente ação declarativa sob a forma de processo comum, pedindo: a) - Que seja declarado parcialmente nulo o negócio constitutivo da propriedade horizontal, titulado pelo requerimento e escritura pública juntos a esta ação como “Doc. 5” e “Doc. 6”, na parte em que integra na fração “AF”, propriedade do 2º réu, o terraço – cobertura do Bloco ...; b) - Seja declarado que o referido terraço – cobertura do Bloco ..., constitui parte comum do edifício a que este mesmo bloco diz respeito; c) - Seja o 2º réu condenado a eliminar definitivamente a porta de acesso ao terraço – cobertura existente na varanda da sua fração “AF” e qualquer outro acesso que, a partir da sua fração, exista para o redito terraço – cobertura; d) - Que seja ordenada a alteração da descrição do registo predial do prédio, em conformidade com o que vier a ser decretado, designadamente, com referência à composição da aludida fração “AF”; e) - Que seja condenado o 2º Réu a realizar no terraço – cobertura do Bloco ..., todas as obras que forem necessárias a impedir infiltrações de água para o interior do edifício a que corresponde aquele bloco, seja para as suas partes comuns, seja para as frações que o compõem; f) - Que seja condenado o 2º Réu a indemnizar os autores, os proprietários das demais frações que compõem o Bloco ... e o condomínio do mesmo bloco, aqui representado pela A. mulher, sua administradora, numa indemnização a liquidar em execução de sentença, equivalente ao valor necessário à reparação de todos os danos sofridos, quer nas frações, quer nas partes comuns do edifício, por virtude das infiltrações de água provenientes do terraço – cobertura.

Alegaram, para o que ora interessa e em síntese, que os Autores são proprietários de uma fração num prédio constituído em propriedade horizontal (Bloco ...), sendo a Autora-mulher administradora do condomínio e, por seu lado, o réu A. F. proprietário de uma fração autónoma no Bloco ... constituída também pelo terraço-cobertura no Bloco ... – na detenção exclusiva do qual o Réu tem estado –, sucedendo que, devido a infiltrações provenientes do terraço, deficiente impermeabilização na ligação da cobertura com o tubo da queda das águas pluviais – em virtude da ausência de quaisquer obras ou trabalhos de conservação do dito terraço por parte do Réu, que o detém em exclusividade – e infiltrações provenientes da claraboia ali existente – em virtude da degradação e falta de manutenção do isolamento e selagem das juntas de ligação do tijolo de vidro –, ocorreram danos em partes comuns e próprias do Bloco .... Mais defenderam que aquele terraço nunca poderia ter sido vendido ao réu por se tratar de uma parte que a lei qualifica como comum.

O Réu A. F. contestou, invocando as exceções de caso julgado, ineptidão da petição inicial e ilegitimidade ativa e alegando que não existe qualquer condomínio autónomo do Bloco .... Além disso, defende que o terraço é próprio da sua fração e não parte comum do prédio e que sempre o utilizou nessa convicção. Deduziu reconvenção.

A Ré X, Lda. foi absolvida da instância, uma vez que se apurou que a sociedade foi extinta (fls. 145).

Os Autores deduziram réplica, concluindo como na petição inicial.

Realizada audiência prévia foram os Autores convidados a chamar à ação os demais condóminos do prédio, convite a que estes não acederam.

Foi, então, proferido despacho que julgou procedente a ilegitimidade ativa dos Autores para a formulação dos pedidos das alíneas a) a d) da PI, absolvendo o Réu da instância quanto a esses pedidos e determinou que a ação prosseguiria para conhecimento dos pedidos das alíneas e) e f).

Ulteriormente, foi proferido despacho de não admissão da reconvenção deduzida.

Procedeu-se a audiência de discussão e julgamento.

Já nesta fase, os Autores R. M. e J. C. foram considerados “parte ilegítima”, tendo sido determinado que o processo prosseguiria apenas para conhecimento dos pedidos formulados pelo Condomínio contra o Réu A. F..

Mais foi decidido, “relativamente a fls. 267 verso”, admitir “a desistência parcial do pedido formulado na alínea f) na parte em que se pede a condenação do segundo réu a indemnizar os autores pelos danos sofridos nas frações que compõem o Bloco ...º, mantendo-se o pedido na parte relativa aos danos sofridos nas partes comuns daquele bloco”. (cfr. fls. 282-verso).

Seguidamente, foi proferida sentença a julgar a ação totalmente improcedente e a absolver o Réu do pedido.

Inconformado, o Autor – Condomínio - interpôs recurso, no final do qual formulou as seguintes conclusões: 1ª O título constitutivo da PH junto como “doc. 6” à petição inicial, descreve o edifício submetido àquele regime como constituído por ... Blocos, descriminando as fracções que compõem cada Bloco e prescrevendo que … São comuns das fracções englobadas em cada Bloco: os alicerces, os pilares, as estruturas resistentes, as instalações gerais de água, electricidade, esgotos, telefone e telhado respectivo – al. e) do facto provado 6º; 2ª Face a este “desenho” da PH, está admitido aos proprietários das fracções que compõem cada Bloco e, por conseguinte, aos proprietários do Bloco ... constituírem um condomínio parcelar e exclusivo desse Bloco, não exigindo a lei qualquer formalidade ou autorização prévia, nomeadamente, a deliberação do condomínio global que, como flui do processo, nem sequer alguma vez existiu; 3ª O art. 1438º - A do Código Civil veio consagrar a figura do condomínio parcelar, em concreto, a possibilidade e legitimação da sua constituição e funcionamento, sem prejuízo da sua coordenação com o condomínio global, caso o mesmo exista ou venha a ser constituído – neste sentido veja-se, entre muitos outros, o Ac. Desse Venerando Tribunal de 05.02.2016, proferido no processo nº 132/14.3TBBCL.G1., relatado pela Srª Desembargadora Anabela Tenreiro, onde se sumaria que … A autonomização de uma assembleia de condóminos com a finalidade de administrar partes comuns respeitante a uma zona do edifício não é proibida por lei e poderá contribuir para uma gestão mais eficiente; 4ª Nada obsta, pois, ao reconhecimento da autonomia jurídica do condomínio específico do Bloco ..., não sendo necessária para esse reconhecimento a deliberação (prévia ou não) do condomínio global (que no caso, nem existe); 5ª Entender-se de forma diferente, seja no sentido da impossibilidade legal da constituição de condomínios parcelares, seja no sentido da necessidade da aprovação prévia desses condomínios pelo condomínio global, configura uma intolerável restrição ao direito de propriedade dos proprietários das fracções do Bloco ..., que são os exclusivos titulares do direito de compropriedade das partes comuns especificas àquele Bloco, tal como descritas no titulo constitutivo da PH, restrição que a lei não admite e que é violadora, entre outras, das disposições dos arts. 1305º e 1306º do Código Civil; 6ª Tal como resulta do titulo constitutivo da PH, que não está posto em causa, a fração “AF” propriedade do recorrido, da qual faz parte integrante o terraço e, por conseguinte, a clarabóia por onde ocorrem as escorrências e infiltrações para o interior do Bloco ..., localiza-se apenas no Bloco ... e não neste e no Bloco ..., consoante entendeu (em nosso entender mal) o Mmo. Juiz “a quo”, pelo que, não faz qualquer sentido pretender-se a convocação daquele para as assembleias do condomínio recorrente; 7ª Aliás, sempre com o muito sincero respeito, essa académica pretensão constituiria um total absurdo, pois que, se traduziria na sujeição ao escrutínio do próprio e relapso infractor, da decisão quanto à reparação dos danos que o próprio provocou e que teima em não fazer cessar; 8ª A escritura de aquisição da fracção “AF” a favor do recorrido e, por conseguinte, do terraço do qual faz parte a clarabóia, mantém-se vigente na ordem jurídica, pelo que, é ele o titular legitimo e possuidor exclusivo daquela fracção em todas as suas partes integrantes; 9ª Nessa qualidade de proprietário e possuidor, o recorrido tem a obrigação de reparar os danos provocados pelas infiltrações e escorrências que ocorrem através do terraço/clarabóia para o interior do Bloco ... e, bem assim, de realizar os trabalhos destinados a obstar que continuem a verificar-se, nomeadamente, ao abrigo do disposto no nº 1, do art. 493º, do Código Civil que, aliás, prescreve a presunção de culpa daquele que tem a coisa em seu poder, in casu, o recorrido (que o afirma na sua contestação), presunção que não foi ilidida; recorrido, terraço que está, aliás, em poder e na posse exclusiva dele desde que o adquiriu e, porque, por assim ser, impende sobre ele a responsabilidade civil relativamente aos danos causados a terceiro, deve ser condenado nos pedidos formulados pelo recorrente; 11ª Ao assim não ter entendido, a sentença sob recurso viola, entre outras, as normas dos arts. 1438º - A (por errada interpretação), 1305º, 1306º e 493º nº 1, todas do Código Civil.

Termina pedindo que seja revogada a sentença recorrida, condenando-se o Recorrido a realizar no terraço – cobertura do Bloco ..., todas as obras necessárias a impedir as infiltrações de água para as partes comuns do edifício a que corresponde aquele bloco e a indemnizar o condomínio do Bloco ..., no valor necessário à reparação dos danos sofridos nas partes comuns, por virtude daquelas infiltrações, tudo com as legais consequências.

O Réu não contra-alegou.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

*II. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO: O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, ressalvadas as questões que sejam do conhecimento oficioso do tribunal (artigos 635º, n.º 4 e 639º, n.º 1 do CPC).

No caso vertente, as...

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