Acórdão nº 1982/15.3T8VRL-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Julho de 2019

Magistrado ResponsávelEUGÉNIA CUNHA
Data da Resolução10 de Julho de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães (1) I.

RELATÓRIO Recorrente: João (..) Recorrida: Maria (…) Maria (…), com residência em (…) , Espanha, veio intentar a presente ação para alteração da regulação do exercício das responsabilidades parentais relativamente ao seu filho menor João (…), nascido em …, contra o progenitor, João (..), pedindo que o menor fique aos seus cuidados e a consigo residir.

Alega, para tanto e em síntese, que na sequência do divórcio entre a Requerente e Requerido, o menor ficou aos cuidados do pai, por ser essa a vontade do menor, mas que o mesmo manifesta um grande desejo de ir morar consigo, em Espanha, além de que tem todas as condições para o acolher, sendo certo que o pai é pessoa impulsiva, nervosa e mal-humorada, descarregando sobre o menor o seu mau humor.

O Requerido apresentou alegações, nos termos de fls. 20 a 25, sustentando não existir motivo para alterar a regulação das responsabilidades parentais.

Em conferência de pais, não foi possível obter acordo quanto à alteração requerida (cfr. fls. 32).

Em audição técnica especializada, não foi possível obter qualquer consenso (cfr. fls. 41 a 44).

Em nova conferência de pais, ambos reiteram as suas posições e ambos sustentaram que o menor verbaliza querer ficar com cada um deles (fls. 49).

Foi designada data para audição do menor e procedeu-se à sua audição, nos termos de fls. 51.

Foi expedida carta rogatória a Espanha, país de residência da Requerente/progenitora, com vista a apurar se a mesma tinha condições para ali acolher o seu filho menor de 11 anos de idade (cfr. fls. 49-v).

As autoridades espanholas responderam nos termos de fls. 75 a 88, cuja tradução do relatório social consta de fls. 96.

As partes foram notificadas para apresentarem alegações ou arrolarem testemunhas, o que fizeram nos termos de fls. 53 a 57 e 70 a 71.

Designado dia para audiência de discussão e julgamento, a ele se procedeu.

*Foi proferida Sentença com a seguinte parte dispositiva: “Face ao exposto, decido alterar o regime fixado do exercício das responsabilidades parentais, nos seguintes termos: 1. O menor, João M.

, nascido em ..-..-2007, filho de Maria e de João fica a residir com a mãe, em …, Espanha, a partir de 24-06-2019, sendo mantido em comum, por ambos os progenitores, o exercício das responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do menor. Já o exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente do menor, passam a caber à progenitora, com quem o menor passa a residir habitualmente. No entanto, quando o menor estiver com o pai temporariamente, cabe a este o exercício dessas responsabilidades parentais, mas sem contrariar as orientações da mãe (cfr. artigo 1906º do Código Civil); 2. A deslocação do menor para a residência da mãe, em Espanha, só pode ocorrer a partir de 24 de Junho de 2019, por forma a não perturbar o percurso escolar do menor, mantendo-se, até então, o progenitor como encarregado de educação do menor.

  1. A progenitora fica obrigada a criar condições para contactos diários entre o progenitor e o menor, através da internet ou telefone; 4. A progenitora fica obrigada a suportar os custos de uma viagem mensal do menor a Portugal, para passar um fim-de-semana com o pai; 5. O progenitor estará com o menor, além desse fim-de-semana cujos custos são suportados pela progenitora, sempre que o desejar, podendo visitar o menor em Espanha, sem prejuízo das horas de descanso e das actividades escolares do menor, mediante aviso prévio à progenitora com 48 horas de antecedência.

  2. O progenitor estará com o menor nas suas pausas escolares, por metade desse período e incumbindo a ambos os progenitores suportar, em partes iguais, as respectivas despesas de deslocação do menor.

  3. O progenitor pagará, a título de pensão de alimentos, a quantia de € 125,00 (cento e vinte e cinco euros) mensais, valor a ser pago à progenitora até ao dia 10 (dez) de cada mês e com início em Julho de 2019, por transferência bancária ou qualquer outra forma de pagamento, acrescido de metade das despesas médicas, medicamentosas e escolares na parte não comparticipada.

    Custas pelo Requerido [artigo 527º do CPC] Comunique à respectiva Conservatória do Registo Civil, nos termos dos artigos 69º, al. e) e 78º do C.R. Civil”.

    *O Requerido, notificado de tal decisão, apresentou recurso, pugnando pela procedência do mesmo, e, em consequência, por que seja considerado improcedente, o pedido de alteração da regulação do exercício das responsabilidades parentais. Formula as seguintes CONCLUSÕES: “1- Desde o divórcio ocorrido entre as partes, 25 de Fevereiro de 2016, momento em que ficaram reguladas as responsabilidades parentais do menor João M., que este ficou á guarda e cuidados do Recorrente, e com ele a residir até aos dias de hoje.

    2- De lá para cá nenhum incidente ocorreu que pusesse em causa a Regulação Parental entretanto acordada.

    3- Entendeu a Recorrida requerer a alteração da regulação do poder paternal com o objetivo último de reclamar para si a guarda diária do menor, alegando em síntese que o pai do menor é uma pessoa impulsiva, nervosa e mal-humorada, descarregando sobre o menor o seu mau humor, de que o menor mostrava vontade de ir viver para Espanha, e que tinha condições para o acolher.

    4- Compulsada a sentença, verifica-se que em lado algum se dá como provado as alegadas características do Recorrente (impulsivo, nervoso e mal humorado), facto que seria impossível já que nenhuma testemunha se referiu ao Recorrente nesses termos.

    5- No caso em concreto não estamos perante qualquer incumprimento do acordado ou sentenciado, mas sim, de acordo com a douta sentença da figura de “circunstâncias supervenientes”.

    6- Os progenitores têm direitos e deveres iguais. No caso em concreto, ambos manifestaram o mesmo desejo – ter a guarda diária do menor. Ora, a realidade é que a guarda diária do menor pertencia ao Recorrente. Este nunca deu aso a que essa mesma guarda fosse posta em causa, nem da própria decisão recorrida isso decorre.

    7- Não estando a forma do exercício da guarda diária do Recorrente relativamente ao menor em causa, é do interesse do menor, com 11 anos de idade, em percurso escolar, a frequentar o 6º ano de escolaridade, na Escola Básica …, na Freguesia de ..., no Concelho de Fafe, onde está bem integrado, colocá-lo a viver em Espanha, outro País, outra língua, onde inevitavelmente, atrasará o seu percurso escolar, quanto mais não seja, porque tem que aprender uma língua nova? 8- É do interesse do menor quando, atualmente residindo com o Recorrente e recebendo a visita da Recorrida, “uma ou duas vezes por mês “, a qual tem casa em …, portanto, bem perto de Fafe, obrigar o Recorrente a perfazer 600Km (ida e vinda de Fafe a …, Espanha), para visitar o seu filho. Arrenda um apartamento?, hospeda-se num hotel? 9- É do interesse do menor, colocar um encargo financeiro tremendo no Recorrente sempre que este queira visitar o seu filho em Espanha? Tendo um rendimento superior ao salário mínimo nacional, se amanhã por questões financeiras se vir impedido de se deslocar a Espanha para visitar o seu filho, é assim que se cumpre o desiderato de se “assegurar o estabelecimento de relações afetivas contínuas com ambos os pais, particularmente, e como bem se compreende, com o progenitor a quem o menor não tenha sido confiado” (Paulo Guerra, área de família e menores, sentença de regulação do exercício do poder paternal, novembro de 2002), citada na Douta sentença recorrida.

    10- É do interesse do menor, nesta fase da sua vida (11 anos),em percurso escolar sujeitá-lo a experimentalismos? sim, porque é a própria sentença recorrida que deixa a porta aberta quando refere “comprometendo-se a alterar novamente a regulação do exercício das responsabilidades parentais caso o menor não se adapte a Espanha”.

    11- No caso em concreto, estamos perante a audição de uma criança com idade inferior a 12 anos, a qual foi ouvida pelo Ministério Público, em representação do menor, e pelo Sr. Dr. Juiz, sujeita a gravação.

    12- A audição da criança deveria ter sido feita acompanhada por técnico especializado, o que não aconteceu, o que gera a nulidade do seu depoimento. Art.195 do C.P.C.

    13- Independentemente da verificação, ou não, da alegada nulidade, a verdade é que o depoimento do menor também não é suficientemente esclarecedor. Sendo verdade que transparece uma inclinação para ir viver para Espanha, na realidade julgamos não se poder aferir uma vontade clara e inequívoca por parte da criança quanto ao seu futuro. O que, também, não é surpreendente já que o Menor se encontra muito afeiçoado ao Recorrente.

    14- Face ao exposto, constata-se que a douta decisão recorrida violou o nº 3 do artigo 35º, e o artigo 42º, ambos do Decreto-Lei nº 141/2015 de 8 de Setembro (Regime Geral do Processo Tutelar Cível), e o artigo 195º do C.P.C.”.

    *A progenitora respondeu pugnando pela improcedência do recurso e por que seja confirmada a sentença recorrida, concluindo: “

    1. A sentença recorrida não merece qualquer reparo, encontra-se devidamente fundamentada, justa, correcta, adequada e necessária.

    2. A matéria de facto dada como provada tem-se por definitivamente assente, dado que nenhuma alteração foi pedida a este respeito.

    3. Entendeu e bem o Sr. Juiz do Tribunal a quo que a circunstância de o menor, com 11 anos de idade pedir à mãe para passar a residir consigo constitui uma circunstância superveniente suscetível de alterar o local da residência do menor e, como tal, alterar o estabelecido quanto à respetiva regulação das responsabilidades parentais.

    4. Tanto mais que, o critério fundamental para essa decisão é o interesse da criança. E não o interesse da mãe, nem do pai.

    5. Sendo certo que, a conclusão que se retira das alegações do apelante é que o Tribunal deve ponderar não o interesse da criança, mas sim o interesse do pai, que não se poderá deslocar para ver o filho, com os consequentes encargos...

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