Acórdão nº 4555/17.2T8BGR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Junho de 2019

Magistrado ResponsávelJOSÉ FLORES
Data da Resolução19 de Junho de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Recorrente(s): - (…); Recorrido(s): - (…) e (…).

Acordam os Juízes na 1ª Secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães: 1. RELATÓRIO A Recorrente propôs a presente acção contra os Recorridos pedindo que se (I) condenem estes a reconhecer que ela é proprietária do prédio identificado em um e que dela faz parte o terreno onerado com o caminho de servidão em benefício do prédio destes últimos, identificado em 17º da sua p.i., bem como (II) se declare a extinção por desnecessidade da servidão de passagem de pessoas, de animais e de veículos de tracção animal e mecânica que onera o prédio dos autos identificado em 1º da p.i. em proveito do prédio dos Réus identificado em 17º, nos moldes identificados na p.i., sendo estes condenados a reconhecer tal extinção por desnecessidade.

Os demandados contestaram, impugnando e excepcionando a versão dos Autores para concluírem pedindo a absolvição dos pedidos.

Em reconvenção, pedem que se declare constituída uma servidão por destinação de pai de família, ou, subsidiariamente, por usucapião, que, onerando o prédio da reconvinda, beneficia o prédio dos reconvintes, e, em consequência, condenar-se aquela a abster-se de todo e qualquer acto que possa afectar ou perturbar, seja de que forma for, o exercício desse direito.

Em réplica, a Autora contraria as excepções invocadas pelos Réus e conclui pela improcedência da sua reconvenção.

Saneado o processo, foi realizada audiência de discussão e julgamento que culminou com a seguinte sentença.

“Face ao exposto julga-se: a) totalmente improcedente a acção; b) totalmente procedente o pedido subsidiário dos RR., declarando a existência de uma servidão de passagem a pé e de carro que onera o prédio da A. em favor do prédio dos RR. (melhor descrita em 6. e 16 a 19 dos factos dados como provados) e condenando-se a A. a abster-se de todo e qualquer acto que possa afectar ou perturbar, seja de que forma for, o exercício desse direito; c) improcede o pedido de condenação em litigância de má-fé.

Custas da acção e reconvenção a cargo da A., sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficie.” Inconformada com essa decisão, a Recorrente M. L., acima identificada, apresentou recurso da mesma, que culmina com as seguintes Conclusões (i).

I. O tribunal a quo, desde logo, em face dos factos provados em 1), 2), 3) e 5) dos factos provados, não podia deixar de apreciar o pedido vertido em I) da demanda da recorrente.

II. Com efeito, a aqui recorrente sustenta o seu pedido em dois pontos, sendo o primeiro, que os RR sejam condenados a Reconhecer que a autora é proprietária do prédio identificado em um e que dele faz parte o trato de terreno onerado com o caminho de servidão em beneficio do prédio dos RR, identificado em 17º, da petição inicial (p. i.), III. Ora, o tribunal a quo dá como provado os pontos 1), 2), 3) e 5) dos factos provados, que aqui se dão por reproduzidos, transcritos na presente motivação, devendo desde logo, sem prejuízo da apreciação do ponto II) do pedido, quanto a este pedido vertido em I), julgar este segmento procedente.

IV. Não o fez o tribunal a quo, motivo pelo qual a aqui recorrente desde já manifesta a sua sindicância neste recurso.

V. Por outro lado, o segmento da sentença que resulta do pedido vertido no ponto II) do pedido da demanda da autora, merecia pelo Tribunal a quo uma apreciação distinta daquela que foi efectuada, em face também não só dos factos dados como provados, resultantes dos factos provados em 1) a 28) dos factos provados, cujo teor se dá aqui por reproduzidos, constantes da presente motivação, mas também da prova que foi feita em sede de audiência de julgamento.

DAS NULIDADES VI. Humildemente, está convicta a recorrente que o Tribunal ao ter improcedido o pedido respeitante ao segmento da sentença em que a aqui recorrente, no ponto I) do pedido, pede que os RR sejam condenados a Reconhecer que a autora é proprietária do prédio identificado em um e que dele faz parte o trato de terreno onerado com o caminho de servidão em beneficio do prédio dos RR, identificado em 17º, da petição inicial (p. i.), em face dos factos provados em 1), 2), 3) e 5) dos factos provados, não podia deixar de apreciar o pedido vertido em I) da petição da autora, não tendo especificado detalhadamente os fundamentos de facto ou de direito relevantes para essa decisão, violando o dever de motivação ou fundamentação das decisões judiciais (art. 208º, n.º 1, C. R. P. e art. 154º, n.º 1, do C. P. Civil VII.

Em face dos pontos 1), 2), 3) e 5) dos factos provados, o pedido em I) deveria ter sido julgado procedente, e assim os recorridos condenados a Reconhecer que a autora é proprietária do prédio identificado em um e que dele faz parte o trato de terreno onerado com o caminho de servidão em benefício do prédio dos RR, identificado em 17º, da petição inicial (p. i.) VIII. A questão da desnecessidade está vertida no ponto II) do pedido, sendo o segmento em I) do pedido reportado apenas à propriedade, e, quanto a isso, os pontos 1), 2), 3) e 5) dos factos provados por si só determinam a procedência dessa parte do pedido, isto sem prejuízo da apreciação do ponto II) do pedido.

IX.

Ao improceder o pedido em I), o Tribunal a quo teria de fundamentar, apresentando os fundamentos de facto ou de direito relevantes para essa decisão, o que não ocorreu, violando o dever de motivação ou fundamentação das decisões judiciais (art. 208º, n.º 1, C. R. P. e art. 154º, n.º 1, do C. P. Civil.

X. O Tribunal a quo apenas apresenta fundamentos de facto ou de direito relevantes para apreciação do ponto II) do pedido da autora, não o ponto I). Quanto a este não se vislumbra fundamentação, motivo pelo qual, se invoca para todos e os devidos efeitos, a nulidade da sentença, a que alude a al. b), do n.º 1, do art. 615º do c.p.

XI.

Entende muito humildemente a Recorrente que a douta sentença padece também de ambiguidade e/ou obscuridade, determinando nos termos do nº 1 alínea c) do artº 615º do CPC a sua nulidade que expressamente se invoca.

XII. O Tribunal a quo julgou a demanda da aqui recorrente totalmente improcedente.

XIII. Contudo, dá como provado os factos vertidos em pontos 1), 2), 3) e 5) dos factos provados.

XIV. O pedido da autora em I) era precisamente o pedido de reconhecimento que a autora é proprietária do prédio identificado em um e que dele faz parte o trato de terreno onerado com o caminho de servidão em beneficio do prédio dos RR, identificado em 17º, da petição inicial (p. i.).

XV. Tais factos vertidos em pontos 1), 2), 3) e 5) dos factos provados levariam naturalmente a procedência do pedido vertido em I) XVI. Na fundamentação da Sentença, nenhuma referência é feita que leve à improcedência do segmento vertido em I) da p.i.

XVII. Entende muito humildemente a autora que falta uma coerência logica no desenrolar da Sentença no que respeita ao segmento do pedido I) da autora.

XVIII. A nulidade da sentença a que se refere a 1.ª parte da alínea c), do n.º1, do art.º 615.º do C. P. Civil, remete-nos para o princípio da coerência lógica da sentença, pois que entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica.

XIX. Entendem também muito humildemente a Recorrente que o Tribunal a quo, na verdade, deixou de se pronunciar sobre questões que eram determinantes para o desfecho da demanda, verificando-se assim a nulidade expressa na alínea d) do bº 1 do artº 615º do NCPC, o que expressamente se invoca.

XX. O Tribunal a quo desvalorizou a realidade que resultou da existência e abertura de um outro caminho, por parte dos RR, que, por si só, balizava em grande parte a analise dos pressupostos da extinção da servidão que a autora sempre admitiu.

XXI. O Tribunal a quo dá como assente e provado os factos vertidos em 8) e 9) dos factos assentes, cujo teor se dá aqui por integralmente transcritos, constantes da presente motivação de recurso.

XXII. É patente na nossa lei que as servidões constituídas por usucapião serão judicialmente declaradas extintas, a requerimento do proprietário do prédio serviente, desde que se mostrem desnecessárias ao prédio dominante (art.º 1569.º, n.º 2, do CC).

XXIII. A aqui recorrente manifestou essa vontade, no pedido vertido em II) e, carreou para o processo factos para provar essa desnecessidade.

XXIV. A desnecessidade, de harmonia com o ensinamento do Prof. Oliveira Ascensão, em Desnecessidade e Extinção de Direitos Reais, 1964, citado e seguido pela jurisprudência, A servidão assenta numa relação predial estabelecida de maneira que a valia do prédio aumenta, graças a uma utilização latu sensu de prédio alheio. Quando essa utilização de nada aproveite ao prédio dominante, surge-nos a figura da desnecessidade» (cfr., por exemplo, acórdãos da RC de 25/10/1983 e de 28/09/2004, respectivamente, em CJ, ano VIII (1983), 4, pág. 62/64, e em CJ, ano XXIX (2004), IV, pág.18/22, e acórdãos do STJ de 27/05/1999 e de 07/11/2002, ambos em www.dgsi.pt XXVI. O Código Civil vigente, através do seu art.º 1569.º enumerou os factos jurídicos causais da extinção das servidões, estatuindo no seu n.º 2 que as servidões constituídas por usucapião serão judicialmente declaradas extintas, a requerimento do proprietário do prédio serviente, desde que se mostrem desnecessárias ao prédio dominante.

XXVI. A expressão que se mostrem desnecessárias do n.º 2 do art.º 1569.º abrange não só as situações em que, posteriormente à constituição da servidão de passagem, o prédio dominante obteve comunicação directa, ou comunicação indirecta através de terrenos contíguos do dono do prédio dominante, com a via pública, apta à sua integral exploração económica, mas também as situações em que, sem excessivo incómodo ou dispêndio, pode ser estabelecida, através dele ou através de terrenos contíguos do mesmo proprietário, comunicação, com a via pública, apta à sua integral exploração económica. E, caso seja necessário proceder a obras, o seu custo é da responsabilidade do dono do prédio serviente, porque beneficiado com a cessação da servidão...

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