Acórdão nº 6689/18.7T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Junho de 2019

Magistrado ResponsávelMARIA JOÃO MATOS
Data da Resolução19 de Junho de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência (após corridos os vistos legais) os Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de ..., *I – RELATÓRIO 1.1.

Decisão impugnada 1.1.1. (…) (aqui Recorrente), residente na Rua D.(…), em ..., propôs a presente acção especial de alimentos a filhos maiores, contra (…) (aqui Recorrido), residente na Rua (…) pedindo que: · o Requerido fosse condenado a pagar-lhe uma prestação de alimentos, em valor mensal nunca inferior a € 100,00, e a actualizar anualmente de acordo com o IAS.

Alegou para o efeito, em síntese, ter nascido a (..) ser filha do Requerido (…), encontrarem-se os respectivos progenitores divorciados desde Setembro de 2017, e ser exclusivamente a sua progenitora quem, desde então, tem suportado todos os encargos devidos pela sua sobrevivência.

Mais alegou encontrar-se a frequentar o 2.º ano do Mestrado integrado em (…), pagar uma propina mensal de € 127,00, despender cerca de € 150,00 por mês com a sua alimentação, e não possuir quaisquer bens ou rendimentos que lhe permitam fazer face a tais despesas, e às demais exigidas pelo seu sustento e pela conclusão dos seus estudos.

Por fim, alegou que o Requerido (…) trabalha, e teria possibilidade de lhe prestar alimentos, em valor mensal não inferior a € 100,00.

1.1.2.

Realizada uma conferência, nos termos do art. 46.º do RJPTC, não foi possível obter a conciliação entre Requerente (…) e Requerido (…).

1.1.3.

Regularmente notificado para o efeito, o Requerido (…) contestou, pedindo que a acção fosse julgada improcedente.

Alegou para o efeito, em síntese, não ter condições para pagar a prestação de alimentos impetrada, uma vez que estaria desempregado, auferiria mensalmente a esse título € 429,00, suportaria a amortização mensal do empréstimo contraído para aquisição da que foi casa de morada de família (onde ainda viveria), no valor de € 225,00, teria gastos mensais com condomínio, água, luz e gás de € 60,00, e disporia apena de € 145,00 por mês para assegurar o seu sustento, o que só era possível mercê de irregulares biscates e do apoio de outros dois filhos seus e de uma irmã.

Mais alegou trabalhar a Requerente (…) ao fim-de-semana, num bar em ....

1.1.4.

Realizada audiência de julgamento, foi proferida sentença, julgando a acção improcedente, lendo-se nomeadamente na mesma: «(…) IV. Nestes termos, decide-se julgar a presente acção improcedente e, em consequência, absolver o requerido … do pedido formulado pela requerente ….

Custas pela requerente, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário de que beneficia.

Registe e notifique.

(…)»*1.2. Recurso 1.2.1.

Fundamentos Inconformada com esta decisão, a Requerente (…) interpôs o presente recurso de apelação, pedindo que se revogasse a decisão recorrida, e se determinasse o montante da prestação de alimentos que se mostrasse mais adequado e proporcional às suas necessidades.

Concluiu as suas alegações da seguinte forma (aqui se reproduzindo ipsis verbis as respectivas conclusões): I.

A fundamentação da sentença considera-se insuficiente e errónea.

II.

In casu, o Mmo. Juiz a quo limitou-se a julgar improcedente o pedido de alimentos a maiores formulado pela Recorrente, sem que, para tanto, face à matéria de facto que considerou relevante, tenha efectuado a apreciação crítica da prova produzida que alicerçou a sua convicção.

III.

Atento o disposto nos artigos 1880º e 1905º nº 2 do C.C., a argumentação que sustenta a decisão é insuficiente para determinar a improcedência do pedido.

IV.

De facto, ao contrário do concluído pelo Mmo. Juiz a quo, face ao quadro jurídico vigente e à prova produzida nos autos, deveria o Recorrido ter sido condenado a prestar alimentos à sua filha maior, ora Recorrente.

V.

A circunstância de o Tribunal a quo ter concluído que a Recorrente tem capacidade para prosseguir com estudos a nível superior, destinados a completar a sua formação, e que assim o vem fazendo com aproveitamento, pois tendo-se provado que a Recorrente não tem qualquer fonte de rendimento relevante, dependendo da progenitora, que aufere um vencimento mensal exiguo para fazer face a todas as despesas (ponto 2.2), é de concluir que a mesmo não possui possibilidades de prover ao seu próprio sustento.

VI.

Por outro lado, errou o Tribunal a quo ao avaliar as condições económicas do Recorrido, na medida em que os factos considerados relevantes para alicerçar a sentença recorrida impunham decisão diversa.

VII.

Desde logo, os trabalhos agrícolas ocasionais realizados pelo Recorrido.

VIII.

O Recorrido vive sozinho e além de receber € 429 de subsídio de desemprego, ainda realiza trabalhos agrícolas, donde aufere rendimento não apurado (facto ponto 19).

IX.

O Tribunal a quo errou ao não ter apresentado qualquer consideração relativamente ao montante auferido pelos trabalhos agrícolas e daí não ter avaliado as verdadeiras condições económicas do recorrido.

X.

Para se avaliar as possibilidades económicas do obrigado a alimentos, este tem de abranger o acervo de todos os rendimentos, não abrangendo apenas o rendimento do subsídio de desemprego do recorrido mas também todos os rendimentos, fixos ou variáveis e até os de caracter eventual, como os trabalhos agrícolas que o recorrido faz.

XI.

O recorrido, relativamente a estes trabalhos, ocultou ao tribunal a quo, o montante que aufere mas, entende a recorrente, que deveria também entrar no cálculo da obrigação de alimentos.

XII.

Como impõe a lei, no que se refere aos elementos objectivos, no disposto no artigo 2003.º e seguintes do Código Civil.

XIII.

O Tribunal a quo, deveria ter apurado qual o valor que o recorrido aufere com os trabalhos agrícolas que faz ocasionalmente, bem como averiguar qual o património do recorrido, nomeadamente bens imóveis, contas bancárias e bens móveis.

XIV.

Ou, de acordo com as regras da experiência, apontar para um valor dos rendimentos obtidos pelos trabalhos agrícolas e adicioná-lo ao rendimento do recorrido.

XV.

De forma, a apurar a verdadeira condição económica e a situação patrimonial do recorrido.

XVI.

O tribunal a quo ao ter concluído no ponto 2.4. que «Não está demonstrada factualidade que permita a imputação culposa de tal situação ao progenitor, aqui requerido.

Neste contexto – e enquanto ele se mantiver –, por muito que custe aceitar (por se reconhecer um pendor pessoal, corresponsabilizador e comprometedor da pessoa que presta alimentos para com quem os recebe) entende-se que não é razoável exigir que o requerido contribua para a educação e instrução da requerente, o que vale por dizer que a questão enunciada deve ter uma resposta negativa».

XVII.

Olvidou o Mmo. Juiz a quo que o recorrido deve cooperar no sustento da filha.

XVIII.

E entendeu que é razoável continuar a exigir apenas à progenitora, que contribua sem ajudo do recorrido, para o sustento, educação e instrução da recorrente, quando a filha e a progenitora vivem numa situação patrimonial inferior à do recorrido: «É, também, manifesto que a requerente não tem qualquer fonte de rendimento relevante, dependendo da progenitor, que aufere um vencimento mensal exíguo para fazer face a toas as despesas», conforme parágrafo 2.2 da sentença recorrida.

XIX.

Na perspectiva constitucional, a educação e a manutenção dos filhos constitui, não apenas um dever, mas também um direito dos pais, em igualdade de circunstâncias, conforme artigo 36.º n.º 3 e 5 da CRP.

XX.

Pelo que, deveria o Mmo Juiz a quo ter fixado uma prestação de alimentos, nem que fosse inferior ao peticionado, de modo a conseguir que o recorrido se sinta “implicado” e “responsável” pela educação e sustento da recorrente.

XXI.

O tribunal a quo não ponderou que as necessidades dos filhos sobrelevam a disponibilidade económica do progenitor devedor de alimentos, devendo estes em momentos menos propícios adequar as suas despesas aos seus rendimentos e impondo que as necessidades dos filhos tenham uma importância prioritária.

XXII.

Tendo concluído pela irrazoabilidade de exigir que o recorrido contribua para a educação e instrução da recorrente, sem ter ponderado os critérios subjectivos e objectivos legalmente exigidos.

XXIII.

Pelo que, ao decidir como decidiu, o Mmo. Juiz a quo violou, por errada interpretação e aplicação, o disposto nos artigos 36.º, n.º 3 e 5 da Constituição da República Portuguesa e 1880º e 1905º n.º2 do Código Civil.

*1.2.2. Contra-alegações O Requerido (…) contra-alegou, pedindo que se negasse provimento ao recurso.

Concluiu as suas alegações da seguinte forma (aqui se reproduzindo ipsis verbis as respectivas conclusões): 1.ª - Quando um sujeito processual se refere a um determinado facto, como o de fazer alguns “biscates”, não pode considerar-se que o próprio o ocultou ou ocultou o rendimento desses “biscates”, pois que isso pode significar, entre o mais, que o rendimento desses trabalhos agrícolas não tem relevo; 2.ª - Apesar do princípio da investigação, constando dos autos que um sujeito processual faz trabalhos agrícolas ocasionais, deve a parte interessada na prova dos rendimentos daí obtidos fazer algum esforço para os demonstrar, não sendo admissível que, sem ter feito esforço nenhum na primeira instância, venha, em recurso, sustentar que o tribunal não investigou, sugerindo, só agora, que o tribunal devia ter consultado o património e contas bancárias do visado; 3.ª - Estando no âmbito de um processo de alimentos a filho maior, e, por isso, dentro das relações familiares, em que os filhos bem conhecem o património e trabalho dos pais, não indicando o requerente filho, perante a primeira instância, qualquer suspeita de património ou rendimento, nada requerendo a respeito disso, não pode exigir-se que o faça o tribunal, pois que, nesse caso, o que é evidente é que nada existe de relevante; 4.ª - Tendo o progenitor da filha maior um custo com habitação inferior ao custo com habitação da requerente e progenitora com quem esta vive, tendo o progenitor uma despesa em alimentação, vestuário e calçado, semelhante à despesa da requerente em alimentação; é de concluir que...

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