Acórdão nº 209/09.1TBPTL.G2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 06 de Junho de 2019

Magistrado ResponsávelJOSÉ ALBERTO MOREIRA DIAS
Data da Resolução06 de Junho de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.

I. RELATÓRIO.

Recorrentes: Ministério Público e (…) Recorridos: (..) O Ministério Público intentou a presente ação declarativa, que intitulou de “ação de tutela dos interesses difusos”, contra(..), residentes em (…) e (…), esta residente em (..) pedindo que: a- se declare a nulidade da doação efetuada pela R. (…) ao Réu (…); b- se declare a inexistência do prédio urbano levado a registo e descrito sob o art.(..), ou quaisquer outros a que este deu origem; c- se ordene o cancelamento da descrição nº(..), da freguesia de (...) e de qualquer outro a que deu origem; d- a consequente inutilização das correspondentes inscrições; e- bem como das inscrições matriciais que eventualmente tenham sido efetuadas pelo serviço de Finanças com base na participação efetuada pelos Réus.

Para tanto alega, em síntese, que no dia 28/05/1993, a Ré (…) adquiriu, por compra, o prédio rústico denominado “…”, descrito na CRP sob o nº (..) e inscrito na matriz sob o art. (…) prédio este que tinha, e tem, a localização, configurações e confrontações constantes da planta topográfica que reproduz no art. 3º da p.i.; Aquela Ré acordou com os restantes Réus a cedência de parte desse prédio com vista à construção de uma casa de residência; Porém, como todo ele se encontrava integrado na Reserva Agrícola Nacional e as normas legais relativas ao fracionamento de prédios rústicos impediam essa cedência, os Réus levaram a cabo o seguinte procedimento: em 15/10/2004, a 1ª Ré (…) outorgou uma escritura de habilitação tendo declarado que no dia 06 de novembro de 1977 falecera o seu marido e que tinha deixado como herdeiros aquela e os filhos, (…) e(…) , respetivamente, 2º e 4º RR; Nesse mesmo dia, a 1ª Ré declarou na Repartição de Finanças de (...), para inscrição na matriz predial urbana, como pertencendo à herança do seu falecido marido, um prédio urbano com um piso, três divisões e 213 m2 de área bruta de construção, prédio este que não foi avaliado pela Repartição de Finanças dada a impossibilidade da sua localização; Em 19/10/2004, a 1ª Ré requereu, na Conservatória do Registo Predial de (...), o registo de aquisição em comum e sem determinação de parte desse prédio, a seu favor e dos 2º a 4º Réus, a qual, por força desse pedido, veio a obter a descrição nº (…) e viu inscrita a sua aquisição, em comum e sem determinação de parte a favor dos 1º a 4º Réus; Em 14/12/2005, os 1º a 4º Réus procederam à partilha dos bens da herança do falecido (..) e adjudicaram ao 4º Réu, (…), o referido prédio; Nesse mesmo dia, a Ré (...) fez uma doação ao Réu J. A. de uma parcela de terreno com a área de 3.600 m2, a desanexar do prédio rústico – Quinta (...) – e cuja parcela se destinava ao aumento do logradouro do prédio descrito na CRP sob o nº 725; Acontece que o prédio descrito sob o art. 725 é parte do prédio descrito na CRP sob o nº 335 (inscrito na matriz sob o art. 303 – Quinta (...)), sendo que, nessa parcela, não existe, nem nunca existiu, qualquer casa de habitação, arrecadação, curral ou outra edificação semelhante, funcional ou em ruínas; Em 30/03/2005, os 1º a 4º Réus requereram à Câmara Municipal de (...) a aprovação de um projeto para a construção de uma habitação no prédio descrito na CRP sob o nº 725; De concerto com a Ré (...) ou com mera anuência desta, os restantes Réus deram curso ao procedimento em causa, celebrando a escritura de habilitação supra referida, declarando perante a Repartição de Finanças de (...) parte do prédio inscrito na matriz sob o art. 303º; requereram a descrição e inscrição a seu favor, na Conservatória do Registo Predial, dessa mesma parte do prédio que fazia parte do prédio rústico denominado “Quinta (...)”, sabendo que essa parcela de terreno fazia parte da Quinta (...), mas como única forma de adquirem essa parcela de terreno, ultrapassando a impossibilidade de fracionamento deste prédio rústico prédio, que integra a RAN; Apesar da Câmara Municipal ainda não ter aprovado o projeto de construção nela apresentado pelos 1º a 4º Réus, o certo é que estes têm registado a ser favor, na CRP, um prédio que não existe, sequer nunca existiu, e que põe em causa a área protegida enquanto RAN.

A Ré (...) contestou, impugnando parte da factualidade alegada pelo Autor, sustentando que se limitou a doar parte do prédio rústico de que é proprietária, parcela de terreno essa a desanexar deste, o que fez de boa fé e com a consciência de não afetar quaisquer interesses de terceiros ou imperativos legais, até porque essa parcela de terreno não lhe interessava e, inclusivamente, lhe estava a criar problemas com a Câmara Municipal de (...), por exigir permanente limpeza, sob pena de instauração de processo contra-ordenacional; Conclui pela improcedência da ação, pedindo que seja absolvida do pedido.

Os Réus (...), (...), (...) e (...) contestaram, defendendo-se por exceção e por impugnação; Invocaram a exceção dilatória do caso julgado em relação ao que ficou decidido, por sentenças transitadas em julgado, no âmbito dos Processos n.ºs 751/08.0TBPTL e 15057706.5TBPTL, ambos do 2º Juízo; Mais se defenderam por exceção, alegando que o prédio que o Autor afirma ser inexistente, existe efetivamente, tratando-se de um prédio adquirido, por compra verbal, pela Ré (...) e o seu falecido marido ao anterior proprietário da denominada “Quinta (...)”, Sr. G., prédio esse cujo direito de propriedade, à data em que a Ré (...) fez a doação do invocado terreno ao 4º Réu, a fim de ampliar o primeiro, os Réus tinham adquirido por via originária, mediante o funcionamento do instituto da usucapião; Impugnaram parte da factualidade alegada pelo Autor; Concluem pedindo que se julgue procedente a exceção do caso julgado e, subsidiariamente, que se julgue improcedente a ação e se absolva aqueles do pedido.

O Ministério Público replicou, concluindo pela improcedência da exceção do caso julgado invocada pelos 1º a 4º Réus, isto porque a 1ª ação que por eles vem invocada culminou com uma decisão processual, que absolveu os Réus da instância com fundamento na ilegitimidade passiva destes; Já na 2ª ação, houve decisão de mérito, que declarou que os 1º a 4ª Réus são donos e legítimos proprietários e possuidores do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de (...) sob o n.º (...)/20041019, (...), e inscrito na matriz predial urbana sob o art. provisório 832º, prédio este cujo objeto se encontra em discussão nos presentes autos, mas não ocorre identidade de partes entre ambas as ações, isto porque, naquela outra ação, os aqui Réus figuram aí como Autores, figurando nela como Ré a Câmara Municipal de (...), que não é parte nos presentes autos.

Dispensou-se a realização de audiência prévia, fixou-se o valor da ação em 30.001,00 euros, proferiu-se despacho saneador, em que se conheceu da exceção dilatória do caso julgado suscitada pelos 1º a 4º Réus, julgando-a improcedente, fixaram-se os factos assentes e a base instrutória, dos quais aqueles 1º a 4º Réus reclamaram, não tendo essa reclamação sido atendida (cfr. despacho de fls. 314 a 316).

A fls. 239 a 249, (...) e (...), residente na Casa e Quinta (...), (...), (...), requereu a sua intervenção espontânea nos presentes autos, declarando fazer seus os articulados do Autor.

Este incidente foi admitido por decisão de fls. 281 a 290.

Entretanto, a fls. 270 a 271, o Ministério Público requereu a ampliação do pedido.

Essa ampliação foi admitida por despacho proferido a fls. 295 a 299, estando a mesma já contemplada no pedido supra identificado.

Realizada audiência final, foi proferida sentença, julgando a ação totalmente improcedente e absolvendo os Réus do pedido (cfr. fls. 408 a 417).

Inconformada com o assim decidido, a interveniente (...) e (...) interpôs recurso de apelação para a presente Relação, que, por acórdão de 10/09/2013 (fls. 588 a 612), ainda que por razões diferentes, confirmou a sentença recorrida.

A interveniente interpôs recurso de revista excecional (fls. 619 a 655).

Por acórdão de fls. 754 a 766, o STJ determinou “a remessa dos autos à Relação para que nesta ou, se necessário, na 1ª instância, seja ampliada a matéria de facto alegada pelos 1º a 4º Réus na sua contestação a respeito da titularidade do prédio confinante com a parcela na ocasião em que foi outorgada a escritura de doação cuja anulação se pretende”.

Devolvidos os autos à Relação de Guimarães, ordenou-se a remessa dos autos à 1ª Instância para efeitos previstos no acórdão do STJ (fls. 775).

Nessa sequência, a 1ª Instância, “em complemento à matéria de facto fixada nos autos”, aditou o seguinte tema da prova (fls. 778): “- apurar se o prédio urbano atualmente inscrito na matriz sob o art. 877 e descrito na CRP de (...) a favor dos RR sob o n.º 724 constituiu a casa de morada de família do falecido (...) e mulher, tendo sido adquirido por compra verbal ao ex-proprietário da Quinta (...), Sr. G., sem oposição de ninguém, como coisa sua se tratasse, na convicção de serem seus donos há mais de 30 anos”.

A interveniente (...) requereu a realização de audiência prévia, o que foi deferido (fls. 795 a 798).

Após várias suspensões da instância a requerimento das partes, com fundamento de que estariam prestes a chegar a uma solução amigável para o presente litígio, frustrado o almejado acordo, realizou-se audiência prévia, em que foi aditado o tema de prova acima referido, mas, após reclamação apresentada pela interveniente (...), deferindo parcialmente a essa reclamação, a 1ª Instância alterou a redação desse tema de prova, que passou a constar do seguinte: “Apurar se o prédio urbano atualmente inscrito na matriz sob os artigos 872, 877 e 878 e descrito na CRP de (...) a favor dos RR sob o art. 725 e (...) (e que deu origem à descrição (...)), constituía, à data da doação aqui em causa, a casa de morada de família do falecido (...) e mulher, tendo sido adquirida por compra verbal ao ex-proprietário da Quinta (...), Sr. G., sem oposição de ninguém, como de coisa sua...

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