Acórdão nº 1976/17.4T8VRL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 06 de Junho de 2019

Magistrado ResponsávelRAMOS LOPES
Data da Resolução06 de Junho de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães (1) RELATÓRIO Co-ré/apelante: (…) Autora/apelada: (…) Intentou o (…), a presente acção comum demandando os réus(…) , advogado, e a companhia de seguros (…) ., pedindo que, declarado que o primeiro réu exerceu o mandato que lhe foi conferido pela autora com negligência grave, omitindo actos processuais que poderia e deveria ter praticado e, por isso, adequados à perda de chance da autora, fossem os réus condenados a pagar-lhe, a título de indemnização por perda de chance, a quantia de 411.671,51€, cabendo à ré seguradora a responsabilidade do pagamento da quantia de 250,000,00€ e o restante ao primeiro réu, tudo com juros calculados à taxa legal de 4%, desde a citação e até integral pagamento.

Fundamentou a sua pretensão alegando (em resumo): - ter mandatado o primeiro réu, advogado, para tanto lhe concedendo poderes forenses gerais e especiais, para a patrocinar no processo de insolvência da sociedade(…) , que sob o nº(…) .T8AMT correu termos pelo Juízo de Comércio de Amarante, - no âmbito de tal patrocínio, o primeiro réu reclamou no identificado processo de insolvência, em nome da autora, crédito que viria a ser reconhecido como comum, no montante de 286.531,33€ (sustentado em contrato promessa de compra e venda celebrado em 15/12/2011, com tradição das fracções prediais que dele eram objecto), decidindo o primeiro réu, de acordo com os seus conhecimentos técnicos, impugnar tal lista de credores, por requerimento que fez chegar aos autos em 23/01/2015, sustentando que o reclamado crédito gozava de direito de retenção sobre fracções prediais, - tendo a Administradora da Insolvência dirigido à aqui autora (em 27/02/2015) notificação destinada à resolução em benefício da massa insolvente do contrato promessa de compra e venda datado de 15/12/2011 (e seu aditamento celebrado a 4/10/2013), viria a autora a entregar tal notificação, em mão, ao primeiro réu, não reagindo este àquele acto da administradora da insolvência, não instaurando acção de impugnação da resolução (deixando esgotar todos os prazos para o efeito), - em consequência de tal conduta grosseiramente negligente do primeiro réu viu a autora gorada a possibilidade de satisfazer o seu crédito sobre a insolvente, perdendo a chance naquele processo (alegando ainda que, no caso, a oposição à resolução tinha todos os fundamentos para proceder), - que a segunda ré celebrou com a Ordem dos Advogados contrato de seguro para garantir o pagamento dos danos causados pelos advogados no exercício da sua actividade profissional.

Apenas a segunda ré contestou, concluindo pela improcedência da acção, com a sua consequente absolvição do pedido.

Aceitando a celebração de contrato de seguro com a Ordem dos Advogados, com cobertura dos riscos inerentes ao exercício da actividade advocacia desenvolvida pelo advogados com inscrição em vigor, conforme regulado no Estatuto da Ordem dos Advogados, sendo o limite indemnizatório máximo fixado em 150.000,00€, com franquia contratual, a cargo do segurado, de 5.000,00€ por sinistro, impugnou a demais matéria alegada pela autora, sustentando não se encontrarem preenchidos os pressupostos para o surgimento da obrigação de indemnizar (seja a ilicitude, seja a actuação negligente do primeiro réu, não sendo possível afirmar a probabilidade da procedência da pretensão da autora a deduzir no processo pretérito – aduzindo matéria em seu entender adequada a demonstrar que tal pretensão não teria acolhimento).

Dispensada a audiência prévia, proferido despacho saneador que tabelarmente afirmou a regularidade e validade da instância, identificado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova e realizado o julgamento, foi proferida sentença que, julgando parcialmente procedente a acção, decidiu condenar: - a ré (...) Seguros, S.A., a pagar à autora a quantia de cento e cinquenta mil euros (150.000,00€), acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação até integral pagamento, - o réu (...) a pagar à autora a quantia de trinta mil euros (30.000,00€), acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação até integral pagamento.

Inconformada, apela a autora, defendendo, na procedência do recurso, a revogação da sentença, extraindo das suas alegações as seguintes conclusões: 1.

Não tendo resultado demonstrado nos autos, atendendo às regras da distribuição do ónus da prova previstas no artigo 342.º do C.C., a efectiva ocorrência de uma conduta profissional ilícita e/ou omissiva incorrida pelo R. advogado no âmbito de determinado patrocínio forense assumido perante a A., não se encontrará desde logo preenchido o primeiro requisito legal, previsto no artigo 483.º do C.C., passível de gerar uma obrigação de indemnizar; 2.

Não poderá o douto Tribunal a quo presumir a existência de um (pretenso) facto ilícito imputável ao advogado, por via de prova meramente indiciária, ou mesmo manifestamente genérica, sem qualquer equivalência e/ou ponderação com todos os demais indícios e/ou meios probatórios constantes dos autos; 3.

De facto, tendo em conta toda a prova que, com credibilidade e isenção, foi produzida nos autos, entende ainda a ora Recorrente que a factualidade que ficou a constar dos pontos 13), 18) e 19) dos factos provados, foi (salvo o devido respeito) incorrectamente apreciada, ponderada e decidida pelo douto Tribunal a quo, devendo, nessa medida (e atentos os concretos pontos da prova produzida, que adiante se irão descrever), passar a constar do elenco dos factos julgados não provados; 4.

Com efeito, resulta desde logo claro do depoimento de parte prestado nos autos pelo 1.º Réu, Dr. (...), a pedido da A. (o qual se encontra gravado em ficheiro de áudio sob n.º 20180822100906_1330605_2871878, com início ao minuto 4.54) que os representantes da A. estiveram sempre absolutamente cientes de todas as fragilidades e vicissitudes ocorridas no processo, nomeadamente aquando da falta de comparência do 1.º Réu na Assembleia de Credores ocorrida em 13 de Janeiro de 2015; 5.

Tendo resultado da prova produzida que o 1.º Réu admitiu a sua falta à referida diligência (pese embora a inexistência de qualquer consequência negativa para a A., decorrente de tal pretensa falta e/ou omissão), junto dos Legais Representantes da A., derivado até da relação de confiança que existia entre os representantes da A. e o Réu, Dr. (...), assim que se apercebeu que a mesma teria ocorrido; 6. O que contraria, desde logo, frontalmente, a factualidade que o douto Tribunal a quo fez constar do ponto 13), última parte, dos factos julgados provados, a qual deverá ser dada como não provada, nomeadamente na parte que refere “facto de que não deu conhecimento à aqui autora”, a qual deverá, assim, ser suprimida no referido quesito; 7.

Por outro lado, e no que respeita à alegada entrega ao Réu advogado, pela A., da carta resolutiva do contrato promessa de compra e venda, remetida pela Administradora de Insolvência (...), em 27.02.2015, resultou ainda do depoimento de parte prestado pelo Réu Dr. (...) (com início ao minuto 6.06 e fim ao minuto 8.52 do seu depoimento), que, na verdade, nunca foi lhe entregue pela A. a aludida carta resolutiva; 8.

Tendo o Réu afirmado peremptoriamente ao Tribunal (ao minuto 4.54 do seu depoimento) “Eu não tenho ideia de ter recebido a carta, não tenho nada de entrado no meu sistema, porque eu digitalizava de imediato as coisas que fosse recebendo da sociedade, portanto não tenho ideia absolutamente nenhuma disso, e o percurso foi esse; 9.

Tendo resultado ainda claro do depoimento prestado nos autos pela Administradora de Insolvência, Dra. (...) (o qual se encontra gravado em ficheiro de áudio sob n.º 20180618115634_1330605_2871878, cfr. minuto 3.11 ao minuto 4.33 do seu depoimento), que a aludida carta resolutiva foi enviada directamente para a A., Centro Abastecedor de (...), Lda.; 10.

Confirmando, ainda, a Administradora de Insolvência, Dra. (...), não ter a aludida carta resolutiva sido igualmente remetida ao Réu advogado, Dr. (...); 11.

Tendo, ao que parece, o douto Tribunal a quo fundado a sua convicção relativamente a esta matéria, única e exclusivamente com base no depoimento (manifestamente genérico) prestado nos autos pela testemunha (...) (o qual se encontra gravado em ficheiro de áudio com n.º 20180618100016_1330605_2871878), o qual limita-se a afirmar, em termos genéricos, quais eram os alegados procedimentos dos Legais Representantes da A. relativamente aos assuntos confiados ao advogado, Dr. (...), nomeadamente no que concerne à entrega de correspondência (cfr. minutos 11.04 a 12.51 do seu depoimento); 12.

Limitando-se ainda a testemunha a referir que “sabe que esta é a suposta carta que entregou o Sr. António (Legal Representante da sociedade A.) ao Dr. (...), “por causa da data” – cfr. minuto 11.35 (sem que se perceba o que a testemunha pretende dizer com tal expressão) – o que, de todo, não se poderá admitir; 13.

Ainda com início ao minuto 10.07 do depoimento de parte (cfr. ficheiro de áudio sob n.º 20180822100906_1330605_2871878), explicou o 1.º Réu ao Tribunal quais terão sido as estratégias processuais com vista à eventual manutenção do contrato promessa das fracções, tendo explicado nomeadamente quais as diligências processuais adoptadas; 14.

De modo que, resultando manifestamente claro da prova produzida nos autos que o 1.º Réu tudo fez no sentido de fazer valer a pretensão da A., não é de todo crível que, caso o 1.º Réu tivesse efectivamente recebido tal comunicação/carta resolutiva datada de 27.02.2015, não se tivesse pronunciado sobre a mesma; 15.

Sendo, pelo contrário, manifestamente evidente que a referida carta de 27.02.2015, tendo sido emitida directamente (e exclusivamente) para a morada da A., nunca terá sido entregue ao Réu advogado, Dr. (...); 16.

Razão pela qual, sempre deverão os factos constantes dos pontos 18) e 19) dos factos julgados provados ser julgados não provados, nomeadamente com base nos depoimentos descritos, e bem assim na manifesta...

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