Acórdão nº 448/17.1T8MNC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 27 de Junho de 2019
Magistrado Responsável | ALCIDES RODRIGUES |
Data da Resolução | 27 de Junho de 2019 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório X & Associados – Sociedade de Advogados, S.P., RL, instaurou, no Juízo de Competência Genérica de Y do Tribunal Judicial da Comarca de Viana de Castelo, ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra Maria e H. D., pedindo a condenação solidária destes no pagamento da quantia de € 5.125,00, acrescida de IVA à tabela em vigor e juros de mora vincendos desde a data da factura, até efectivo e integral pagamento.
Para tanto, e em síntese, alegou que, no exercício da sua actividade, prestou serviços à 1ª ré, tendo esta outorgado uma procuração forense a favor do sócio da autora para que a representasse na execução dos procedimentos legais destinados a obter a condenação do Município de Y a praticar um acto de deferimento do projecto de construção apresentado pela mesma ou, em alternativa, a obter a expropriação do prédio em questão.
Mais alegou que, pese embora a questão em causa respeitasse à 1ª ré, o 2º réu, seu irmão, sempre assumiu um papel muito importante para a prestação do serviço, tendo alegado que possuía um interesse pessoal na questão, além de que era o próprio quem tratava dos assuntos da irmã.
Os serviços jurídicos iniciaram-se em 25.10.2006 e cessaram em Novembro de 2015; os réus pagaram o valor de € 500,00 no início do processo e, em 16.05.2016, foi remetida a nota de honorários aos réus, que foi devolvida pelo facto de os mesmos não terem procedido ao seu levantamento nos correios.
*Regularmente citados, contestaram os Réus (cfr. fls. 75 a 80), invocando a exceção de ilegitimidade passiva do réu H. D. uma vez que este agiu como mero núncio da sua irmã Maria, devido ao facto desta residir habitualmente em França; mais invocaram a exceção de prescrição presuntiva, alegando para o efeito que no início do contrato a sua irmã pagou à autora, em numerário, a quantia de € 800,00 a título de provisão para honorários e de € 500,00 a título de provisão para despesas; que a acção em causa terminou por transacção judicial, tendo a ré, a final, entregue à autora o valor de € 1.250,00 em numerário, para liquidação das contas; que o sócio da autora nunca lhe passou qualquer recibo e exigiu sempre que os pagamentos fossem efectuados em numerário; e que a presente acção apenas foi interposta, porque a sociedade comercial “K – Imobiliária, Lda.”, da qual o réu é sócio, revogou uma procuração forense à autora (tratando-se de uma perseguição pessoal ao réu).
*No exercício do contraditório, veio a autora responder às excepções arguidas pelos réus, alegando, em síntese, que o réu H. D. informou o advogado P. V., sócio da autora, que tinha um interesse pessoal no assunto, não podendo confundir-se a legitimidade processual com a legitimidade substantiva (cfr. fls. 90 a 92).
Alegou, ainda, que a autora apenas recebeu a quantia de € 500,00, acrescida de IVA, a título de provisão para honorários, não tendo os réus pago qualquer outro quantia, até porque tal não lhes foi solicitado pela autora, que apenas apresentou a conta final em Maio de 2016. Por outro lado, os réus praticaram actos em juízo, incompatíveis com a presunção de cumprimento que invocam (concretamente a alegação de que nada devem, de que pagaram tudo e que, ainda assim, os honorários peticionados são excessivos).
*Foi dispensada a realização da audiência prévia e proferido despacho saneador, tendo sido julgada improcedente a exceção de ilegitimidade passiva; foi fixado o valor da causa, o objecto do processo e os temas da prova, bem como admitidos os meios de prova (cfr. fls. 99 e 100).
*Procedeu-se a audiência de julgamento (cfr. fls. 117 a 119 e 124 a 127).
*Posteriormente, a Mm.ª Julgadora “a quo” proferiu sentença (cfr. fls. 128 a 139), nos termos da qual julgou a presente ação parcialmente procedente e, em consequência, decidiu: a) Condenar a Ré, Maria, no pagamento à autora, X & Associados – Sociedade de Advogados, S.P., RL, da quantia de € 2.740,00, acrescida de IVA à taxa em vigor e de juros moratórios vencidos e vincendos à taxa legal em vigor, desde 13.05.2016, até efectivo e integral pagamento; b) Absolver o réu, H. D., do pedido; c) Absolver a ré, Maria, das restantes quantias peticionadas.
*Inconformada, a Ré Maria interpôs recurso dessa sentença (cfr. fls. 140 a 148) e formulou, a terminar as respetivas alegações, as seguintes conclusões (que se transcrevem): «1º. Salvo melhor juízo, e com o devido respeito, entende a Recorrente que o tribunal a quo andou mal quando considerou que, no caso dos autos, a Ré praticou em juízo actos incompatíveis com a presunção de cumprimento.
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O tribunal, erroneamente, concluiu que na contestação a Ré/Recorrente invocara já ter pago os honorários devidos à Autora, embora, ao mesmo tempo, tivesse impugnado o montante peticionado, alegando serem excessivos os honorários em causa.
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Tal conclusão carece de qualquer fundamento e, por certo, só se concretizou no espirito da Meritíssima Juiz a quo devido a uma interpretação errada dos factos articulados pela Recorrente na contestação.
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A ora Recorrente, em sede de Contestação, diante das horas supostamente despendidas pelo sócio da Autora no estudo da causa e elaboração da petição inicial (33 horas!), limitou-se a considerá-las excessivas, num exercício meramente abstracto.
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Não tendo a Ré/Recorrente praticado em juízo actos incompatíveis com a presunção de cumprimento, ao invocar em seu benefício a prescrição presuntiva prevista pela alínea c) do artigo 317.º do Código Civil, logrou a inversão do ónus da prova, sem prejuízo de a Autora/Recorrida ilidir a presunção em causa por acto confessório tácito ou expresso, judicial ou extrajudicial do devedor, provando o não cumprimento (art.º 344.º, n.º 1 do Código Civil).
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A Recorrente não confessou a divida, nem expressa nem implicitamente.
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Muito menos a Recorrente praticou em juízo actos incompatíveis com a presunção de cumprimento, sendo certo que o facto de ter considerado, em abstracto, excessivas as horas falsamente despendidas com o estudo e elaboração, pela Recorrida, da petição inicial que impulsionou a acção 1040/07.4BEBRG, que correu termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga - Unidade Orgânica 1, não pode de modo algum ser integrado na previsão do artigo 314.º do Código Civil, considerando-se que tal alegação configura um acto praticado em juízo que é incompatível com a presunção de cumprimento.
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Não houve, pois, confissão tácita da dívida por parte da Recorrente, o que, a somar- se à falta de demais elemento probatórios em benefício da teses da Recorrida, deveria levar o tribunal a quo a concluir pela improcedência total do pedido, sendo dele a Ré absolutamente absolvida.
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A decisão recorrida violou, assim, o disposto pelos artigos 314.º e 317.º do Código Civil.
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Tendo feito um raciocínio lógico-subsuntivo erróneo daquelas disposições legais aos factos apurados em juízo.
*Consequentemente, em conformidade com as conclusões expostas e o douto suprimento de V.as Ex.as, deve conceder-se provimento à presente Apelação e, nessa sequência, revogar-se a sentença recorrida, substituindo-a por uma outra que, verificando, in casu, o preenchimento cumulativo dos requisitos ínsitos na previsão da alínea d) do artigo 317.º do Código Civil, absolva do pedido a Recorrente, na medida em que a Autora não logrou provar a sua confissão, expressa ou tácita, com custas e demais encargos processuais a expensas da Recorrida.
Como é de inteira e sã JUSTIÇA.»*Também a autora X & Associados – Sociedade de Advogados, S.P., RL, interpôs recurso da sentença (cfr. fls. 150 a 166), rematando as suas alegações com as seguintes conclusões (que se transcrevem): «1. A sentença a quo deu por provado que o advogado (organizado na sociedade autora) despendeu 12 horas em contactos, deslocações e diligências no âmbito do processo identificado com o nº 1040/07.4BEBRG, que correu termos pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga (doravante, o processo administrativo) - Ponto 20 dos Factos Provados; 2. E deu por não provado o número de horas que a autora alegou ter despendido com o estudo do caso, preparação e redacção da petição inicial [ponto c) dos Factos não Provados], rejeitando também o carácter complexo da causa [ponto d) dos Factos não Provados].
RECURSO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO 3. A sentença deu como provado que a condução do processo foi da exclusiva responsabilidade do sócio da autora, Dr. P. V., que com exclusão de qualquer outro, elaborou a petição inicial e o requerimento de desistência da instância, atendeu a todas as reuniões e esteve presente na diligência instrutória do dia 25.02.2007, no âmbito do processo nº 1040/07.4BEBRG, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga (ponto 19 dos Factos provados); 4. E que a estratégia processual por si montada conduziu à solução preconizada por si e pelo cliente (pontos 10, 11, 21 e 22 dos Factos Provados); 5. Mas refere que nenhuma prova foi produzida a respeito do número de horas despendidas no estudo do caso e redacção da petição inicial.
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Ora, tendo o Dr. P. V. realizado o estudo do caso e redigido a petição inicial, os únicos meios de prova abstractamente configuráveis para demonstrar tais factos seriam (i) a apreciação (em abstracto) da complexidade do processo, (ii) a análise da própria petição inicial elaborada no âmbito daquele processo administrativo, e junta aos presentes autos por requerimento da autora de 28 de Junho de 2018, (iii) as declarações prestadas pelo advogado que conduziu o processo administrativo em causa.
i) Da complexidade abstracta do processo: 7. A sentença a quo afirma que ”a jurisdição administrativa é uma jurisdição muito específica, que corre termos em tribunais distintos dos tribunais comuns e exige especialização dos Ilustres Causídicos.”.
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Para afastar dessa qualificação genérica o processo administrativo dos autos, a sentença a quo teria de, fundamentadamente, classificar o patrocínio sub judice como tendo sido simples, e não...
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