Acórdão nº 2601/10.0TBBCL-D.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 03 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelMARIA DOS ANJOS NOGUEIRA
Data da Resolução03 de Outubro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES- I. Relatório “Calendário X, Lda.”, veio, por apenso à execução sob o n.º 2601/10.0TBBCL, requerer a sua habilitação nos autos executivos, no lugar do exequente.

Para o efeito, alega que, por contrato de cessão de créditos, a requerente adquiriu o crédito exequendo, com transmissão dos respectivos direitos e garantias.

*Notificada a parte contrária, veio o executada/requerido A. C. apresentar contestação, alegando, em síntese, que: 1º - O contrato de cessão de créditos não havia sido antes deste incidente comunicado ao executado/requerido, o que a torna ineficaz em relação ao requerido; 2º - A cessão de créditos apenas foi outorgada pelas partes que nela intervieram (exequente e requerente, sendo aquele representante legal desta) com o único objectivo de permitir que a requerente possa requerer a adjudicação dos bens penhorados na execução, com dispensa do depósito do preço, evitando despesas com escritura e pagamento de impostos, permitindo a transmissão dos bens directamente para a requerente, sendo que o preço da cessão não foi pago. Refere ainda que a cessão prejudica o Estado, pelos impostos que não serão pagos com a aquisição dos bens penhorados e prejudica os executados, por os bens serem vendidos por valores inferiores aos valores de mercado. Conclui, por isso, o requerido que o contrato de cessão foi simulado.

*A requerente, na sequência de interpelação do tribunal quanto à forma do contrato de cessão de créditos, veio alegar ter agora autenticado tal contrato, juntando a autenticação, com ratificação do mesmo.

*O requerimento da requerente foi admitido como articulado superveniente e, notificada a parte contrária, veio o requerido contestar, mantendo, no fundo a posição vertida na contestação.

*Considerando o tribunal a quo, face à prova junta julgada suficiente, por não haver qualquer diligência probatória relevante a produzir, foi proferida sentença, que deferiu a requerida habilitação de cessionário e, em conformidade, declarou habilitada a requerente, para com ela, no lugar do exequente, prosseguir a execução.

*II-Objecto do recurso Não se conformando com essa decisão, A. C., requerido, veio interpor o presente recurso, formulando as seguintes conclusões: A - QUESTÃO PRÉVIA: DA NULIDADE DA SENTENÇA 1 ° - Ao não produzir prova para aferir do pagamento ou não pagamento do preço constante da cessão de crédito, o douto tribunal recorrido deixou de apreciar questões que devia ter apreciado, ao abrigo do artigo 615°, n. ° 1 al. d) do C.P.C., pelo que a sentença é nula B - DO RECURSO 2° - O recorrente não pode conformar-se com a douta sentença proferida nos presentes autos, que deferiu o incidente de habilitação de cessionário e em consequência declarou habilitada a requerente, para com ela, no lugar do exequente, prosseguir com a execução.

  1. - É nosso entendimento que a contestação oferecida merecia provimento e o incidente deveria ter sido declarado improcedente, pelo que, o que está em causa, no presente recurso é apurar se há fundamentos legais para a impugnação da validade do ato de cessão de crédito.

  2. - Resulta da sentença recorrida que o Mmo Juiz "a quo" julgou suficientes os documentos juntos nos autos, e assim prescindiu da produção de qualquer outra diligência probatória relevante e por isso, com base nos documentos juntos, entendeu que os requisitos do instituto da simulação não estavam preenchidos.

  3. - Também para o tribunal "a quo" a questão do preço é irrelevante como circunstância invalidante da cessão, e que o contrato de cessão de créditos é válido perante a junção, pela Apelada, dos termos de autenticação pelo Notário, cumprindo assim o disposto no artigo 578° do C.C.

  4. - Mas, salvo melhor opinião, não foi produzida prova suficiente para aferir do preenchimento de todos os elementos integradores do conceito de simulação, pelo que existe vício de insuficiência da matéria de facto, que aqui expressamente se alega nos termos do artigo 662°, n.º 2 c), e que conduz à anulação da decisão judicial proferida nos presentes autos.

  5. - Refere a douta sentença colocada em crise, que o Apelante não alega factos que consubstanciem a divergência entre a vontade e a declaração negocial das partes na cessão de créditos, o primeiro requisito para a existência da simulação.

  6. - Contudo, nenhuma sessão de julgamento foi realizada e por ISSO, o Requerido não pode produzir a sua prova e demonstrar a existência de simulação nos presentes autos.

  7. - E mesmo que o articulado do Apelante padecesse de irregularidades na alegação dos factos atinentes ao pressuposto enunciado, este não foi convidado a aperfeiçoar o seu articulado, ao abrigo dos números 2, 3 e 4 do artigo 590° do C.P.C., o que permitiria a discussão em sede de primeira instância de uma cessão de créditos simulada.

    SEM PRESCINDIR, 10° - Corresponde à verdade que na contestação ao incidente de habilitação de cessionário, o artigo 356°, n.º 1 al. a) do C.P.C. permite aos requeridos a utilização de dois fundamentos para obstar à procedência do incidente. Mas no que concerne à validade do acto, ensinam-nos Lebre de Freitas e Isabel Alexandre que "o correspondente artigo 381 do CPC de 1939 limitava-se, na falta de oposição, a impor (a validade da transmissão segundo o seu objecto e a qualidade das pessoas que nela intervieram' [...] em vez da verificação de que (o documento prova a aquisição ou a cessão', o que levava Alberto dos Reis […] a fazer a interpretação extensiva do preceito, de modo a abranger também os casos de (nulidade extrínseca ou formal) e de (inexistência da cessão ou transmissão) (CPC anotado, 1.0 vol., 3.

    a edição, Coimbra Editora, 2013, pág. 692).

    11 ° - E a seguir (pág. 693) lembram que "na contestação, pode ser impugnada a validade do acto, com qualquer fundamento de nulidade ou de anulabilidade da lei substantiva [...] e o tribunal conhece oficiosamente dos fundamentos de nulidade que não hajam sido alegados, mesmo não havendo contestação [...]".

  8. - Infelizmente e apesar dos citados autores indicarem que o tribunal conhece oficiosamente dos fundamentos da nulidade, mesmo que não hajam sido alegados, o douto tribunal "a quo" considerou apenas e só que a simulação não se verificou, por ausência de alegação de factos, prescindindo de ser a verdadeira casa da Justiça! 13 ° - Mais, invoca a decisão agora em crise que a questão do preço não é condição invalidante da cessão, por o Apelado não ter legitimidade para discutir o cumprimento ou incumprimento da obrigação, e que a cessão pode ser gratuita.

  9. - Em primeiro lugar, quanto à gratuitidade invocada pelo tribunal recorrido, se a vontade das partes era que a cessão fosse gratuita, a verdade é que estas estipularam um preço pela cessão. Por este prisma, há uma divergência na intenção das partes, isto é, entre a sua vontade - queriam celebrar uma cessão de...

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