Acórdão nº 3640/18.8T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 31 de Janeiro de 2019
Magistrado Responsável | PAULO REIS |
Data da Resolução | 31 de Janeiro de 2019 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I. Relatório M. L., divorciada, instaurou providência cautelar de arrolamento contra A. M., divorciado, na Rua …, requerendo o arrolamento de diversos bens que identifica na petição inicial, sem audiência do Requerido.
Mais requer seja o requerido nomeado depositário dos bens que se encontram na casa de morada de família e a requerida nomeada depositária dos veículos automóveis de marca Seat Cordoba, com a matrícula ..., e o veículo automóvel Ford, modelo Transit com a matrícula ..., identificado na relação junta, devendo ser ordenada a imediata entrega dos bens à requerente por banda do Requerido. Mais requer seja oficiado o Banco de Portugal para prestar esclarecimentos sobre as contas bancárias existentes em nome de um ou de ambos Requerente e requerido, desde a data do matrimonio até à data da dissolução e, uma vez identificadas, serem as aludidas entidades notificadas para prestar esclarecimentos sobre os saldos existentes à data da dissolução e nos 12 meses anteriores.
Alega para o efeito, em síntese: Requerente e Requerido contraíram entre si casamento em 3 de Agosto de 1985, sem convenção antenupcial, entretanto dissolvido em 01-07-2009 por divórcio por mútuo consentimento requerido na Conservatória do Registo Civil; na constância do casamento, foi por ambos adquirido o prédio urbano sito no Lugar …, freguesia de ..., concelho de Viana do Castelo, inscrita na matriz urbana sob o artigo … e descrita na conservatória do Registo Predial sob o número … da freguesia de ..., o qual constituiu a casa de morada de família, bem como todo o recheio lá existente e, ainda, um veículo da marca Seat, modelo Cordoba, do ano de 1996 com a matrícula ...; contudo, não foi efectuada a partilha dos bens comuns do casal uma vez que Requerente e Requerido decidiram conciliar-se, pelo que voltaram a residir juntos na supra referida casa de morada de família ainda que no estado civil de divorciados, o que veio a suceder até ao dia 25 de maio de 2018, data em que a Requerente saiu de casa não mais lá voltando; após o decretamento do divórcio, foi pela Requerente e Requerido adquiridos, com dinheiros comuns, dois veículos automóveis, o primeiro da marca Mercedes-Benz, modelo C 204, do ano de 2009 com a matrícula ... e o segundo da marca Ford, modelo Transit, do ano de 1990 com a matrícula ..., os quais foram registados no nome do requerido, pese embora tivessem sido adquiridos com dinheiro de ambos; desde o passado dia 3 de março de 2017, a requerente deixou de avistar o automóvel da marca Mercedes; confrontado o Requerido, o mesmo referiu que o automóvel teria ido para reparar; ainda assim, a requerente procurou obter informações acerca do paradeiro do veículo, tendo-lhe sido informado que o mesmo havia sido vendido, razão que leva a Requerente a crer que o requerido pretende dissipar o património comum do casal, pois que, aquando da sua saída de casa, a Requerente informou o requerido de que iria requerer a partilha dos bens de ambos; o comportamento adotado pelo Requerido, anteriormente descrito, pela venda do referido veículo sem que para o efeito o tivesse justificado à Requerente, demonstram claramente o ambiente de conflito que rodeia a Requerente e o Requerido, o que agrava o receio de dissipação/ocultação dos bens comuns até à realização efectiva da partilha.
Conclui que a instauração da providência cautelar de arrolamento não perde sentido quando é preliminar à partilha dos bens comuns do casal, ocorrendo, igualmente nestes casos, situação merecedora de tutela especial, justificando o desvio às regras gerais na tramitação da providência, ou seja, no que se reporta à dispensabilidade de alegação e demonstração de um dos seus requisitos: o justo receio de extravio, ocultação ou dissipação de bens.
Juntou documentos e arrolou testemunhas.
Foi proferido despacho dispensando o prévio contraditório do Requerido nesta fase e procedeu-se à inquirição das testemunhas indicadas pela Requerente bem como à audição desta em declarações de parte.
Foi então proferida decisão, datada de 29-11-2018, nos seguintes termos: “ (…) Consideramos improcedente a pretensão da R.te (art.º403º, 405º e 409º do C.P.C.).
Custas do procedimento cautelar pela requerente, art.º. 527.°, nº 1 do CPC, sem prejuízo do apoio judiciário concedido.
Registe e notifique.
Valor: €30.000.01.” Inconformada, a Requerente apresentou-se a recorrer, pugnando no sentido da revogação da decisão proferida, terminando as respetivas alegações com as seguintes conclusões (que se transcrevem): «I.
Vem o presente recurso interposto do douta sentença que decidiu julgar improcedente o presente arrolamento com o fundamento de não estarmos perante uma pendencia de um divórcio.
II.
Ora com tal fundamento, não pode a requerente concordar senão vejamos; III.
Requerente e requerido foram casados entre si, segundo o regime de bens de comunhão de adquiridos, tendo o casamento sido dissolvido por divórcio decretado a 14-03-2013, no âmbito de processo que correu termos sob o n.º 2012/2013 na Conservatória do Registo Civil, encontrando-se pendente processo de inventário para partilha dos bens comuns do ex-casal, IV.
Sendo que, após o divórcio, requerente e requerido, reconciliaram-se tendo vivido juntos até meados de Maio deste ano, tendo deixado a administração do património a cargo do requerido e da única filha do casal; V. Porém, e conforme referiu a mesma teve a mesma conhecimento que o requerido tem vindo a dissipar bens comuns do casal, removendo bens móveis pertencentes ao ex-casal e que integravam a casa de morada de família, pelo que tem receio da perda e da dissipação desses bens, dado que se mantém uma situação de conflito entre as partes.
-
A requerente juntou documentos e arrolou testemunhas.
-
Porém, veio o meritíssimo juiz decidir pela improcedência do arrolamento, tendo em que, enquanto ação instrumental, o fundamento do pedido de arrolamento é precisamente acautelar que no divórcio ou na separação judicial de pessoas e bens o bem em causa venha a ser incluído na listagem de bens comuns.
-
Tratando-se de uma providência cautelar que é, necessariamente, uma tutela antecipatória de um direito, o arrolamento é preliminar ou incidente da ação de separação judicial de pessoas e bens, divórcio, declaração de nulidade ou anulação de casamento em que qualquer dos cônjuges pode requerer o arrolamento de bens comuns ou de bens próprios que estejam sob a administração do outro cônjuge.
-
Ocorrida a dissolução do casamento não existe fundamento para lançar mão a esta providência, a qual já nada acautelará.
-
Ora, como resulta igualmente demonstrado pelo Requerente através de cópia da certidão de divórcio, o casamento foi dissolvido por divórcio declarado por decisão de 14 de Março de 2013, transitada em julgado em julgado, o que obsta ao decretamento da providência requerida.
-
Efetivamente, tem vindo a ser entendido pela doutrina que o arrolamento se destina a descrever os bens com vista à sua conservação, isto é, descrever-se (“arrolar”) o que existia numa dada altura, e eventualmente proceder à guarda ou depósito dos bens, caso estes se possam dissipar, até à decisão da ação definitiva.
-
Uma vez decretada a providência é então elaborado o rol do património em causa. Como dispõe o artigo 406º, n.º 2, do CPC, os bens são descritos num auto, em verbas numeradas, como num inventário, e entregues ao depositário. “O âmbito do procedimento cautelar de arrolamento é proceder-se a uma descrição de bens, com vista a assegurar a sua permanência (ou o não extravio, ocultação ou dissipação), em ordem a fazer valer a titularidade de direitos sobre esses bens na acção principal.
-
Como referia Alberto dos Reis «se uma...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO