Acórdão nº 5336/15.3T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 31 de Janeiro de 2019
Magistrado Responsável | FERNANDO FERNANDES FREITAS |
Data da Resolução | 31 de Janeiro de 2019 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES
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RELATÓRIO I.
- R. N., identificado nos autos, intentou a presente acção declarativa comum contra “Construções X, S. A.” e “Y – Companhia de Seguros, S.A.”, também aqui identificadas, pedindo que: a) se declare que a causa do incêndio ocorrido em 8 de Novembro de 2014 na fracção propriedade dele, Autor, se deveu a culpa exclusiva da 1.ª Ré, em virtude de vício na construção; b) se condene a 1.ª Ré a pagar-lhe, a ele Autor, o custo necessário para reparação dos danos sofridos na fracção, que se estima, de momento, em € 11.480,00 € (a que acresce o IVA) e cujo valor exacto se deverá apurar em sede de prova pericial; c) se condene a 1.ª Ré a pagar-lhe, a ele Autor, a título de danos patrimoniais suportados até ao momento, um valor global não inferior a € 25.917,21; d) se condene a 1.ª Ré a pagar-lhe, a ele Autor, o valor global que vier a apurar-se em sede de incidente de liquidação de sentença, quanto aos gastos com electricidade, comunicações e água que irá despender sem que possa usufruir da moradia; e) se condene a 1.ª Ré a pagar-lhe, a ele Autor, a título de indemnização por danos não patrimoniais, quantia nunca inferior a € 7.500,00; f) Subsidiariamente, no caso de se entender não ser imputável à 1.ª Ré a ocorrência do incêndio, deverá a 2.ª Ré ser obrigada a pagar-lhe, a ele Autor, o custo necessário para reparação dos danos sofridos na fracção em questão, bem como os demais prejuízos supra alegados.
Tudo acrescido de juros de mora, contados desde a data de citação até efectivo e integral pagamento, com as demais consequências legais.
Fundamenta estes pedidos alegando, em síntese, ser dono da fracção autónoma destinada a habitação designada pelas letras “AB”, que adquiriu à 1.ª Ré por contrato de compra e venda e mútuo com hipoteca, encontrando-se a respectiva propriedade registada a seu favor.
A 1.ª Ré é uma sociedade comercial que se dedica à actividade comercial de construção civil, nomeadamente de edifícios habitacionais e não habitacionais, tendo, no exercício da sua actividade, construído o prédio urbano acima descrito, que vendeu a ele, Autor, no estado de novo.
Em 8 de Novembro de 2014 deflagrou um incêndio no interior da referida fracção, o qual ficou a dever-se a vício na instalação e montagem do tubo de exaustão do recuperador de calor (fogão de sala) e teve origem na fuga de calor - proveniente da normal combustão de material lenhoso - que se verificou no tubo de desenfumagem do fogão de sala, sendo, por isso, culpa da 1.ª Ré.
Como consequência do incêndio descrito, e do facto de a 1.ª Ré se recusar, ao longo do tempo, a assumir a responsabilidade pelo evento, ele, Autor, sofreu prejuízos patrimoniais e não patrimoniais que pretende ver ressarcidos.
Mais alegou o Autor ter celebrado com a 2.ª Ré um contrato de seguro do ramo “multirriscos habitação”, tendo por objecto a fracção autónoma acima titulado pela apólice número ..., o qual prevê a cobertura de incêndio. Daí que, caso não se entenda ter havido culpa da 1.ª Ré no incêndio ocorrido, deverá esta 2.ª Ré ser obrigada a proceder ao pagamento da indemnização acima concretizada.
Citada, a Ré “Y” reconheceu a validade e eficácia do contrato de seguro que celebrou com o Autor, como tomador do seguro, o qual abrange o incêndio, tendo sido convencionalmente limitada a cobertura pela “privação temporária de uso da residência permanente” a um máximo de € 1.250,00. Os lucros cessantes, os danos não patrimoniais e os honorários com técnicos estão contratualmente excluídos. Mais alega que o incêndio não foi um evento súbito e imprevisto, antes residindo num vício de construção, pelo que mais tarde ou mais cedo ir-se-ia verificar.
A ré “Construções X, Ld.ª” pugnou pela improcedência da acção no que a si respeita, impugnando a quase totalidade da factualidade alegada pelo Autor, afirmando desconhecer se o incêndio deflagrado ocorreu mesmo de modo súbito e inesperado ou se existiram causas potenciadas pelo Autor ou terceiros numa eventual utilização abusiva e contra as normas de utilização indicadas pelo fabricante e diferentes elementos técnicos fornecidos pelo construtor sobre o recuperador de calor, nomeadamente a Ficha Técnica da Habitação. Mais alega que apresentou ao Autor o orçamento de reparação e colocou à sua disposição a indemnização, tendo ele recusado o valor oferecido.
Os autos prosseguiram os seus termos, vindo a proceder-se ao julgamento que culminou com a prolação de douta sentença que, julgando a acção parcialmente procedente: - declarou que a causa do incêndio ocorrido em 8 de Novembro de 2014 na fracção autónoma propriedade do Autor se deveu a culpa exclusiva da 1.ªRé, em virtude de imperícia na instalação do recuperador de calor ali existente; - condenou a 1.ª Ré a pagar ao Autor o montante global de € 19.864,92, a título de indemnização, pelos danos sofridos em consequência do incêndio (sendo € 5.000,00 a título de danos não patrimoniais e € 14.864,92 a título de danos patrimoniais), montantes estes acrescidos de juros de mora, à taxa legal de 4% até integral pagamento, contados desde a citação quanto aos danos patrimoniais e contados desde a prolação da presente decisão quanto aos danos não patrimoniais, absolvendo-a do mais peticionado.
- Absolveu a 2.ª Ré do pedido formulado.
Nem o Autor nem a 1.ª Ré se conformaram com a decisão, pretendendo esta ser absolvida “dos pedidos contra si formulados” e aquele ser indemnizado “pela totalidade dos prejuízos sofridos”.
Não foram oferecidas contra-alegações.
Os recursos foram recebidos como de apelação, com efeito suspensivo.
Colhidos, que se mostram, os vistos legais, cumpre decidir.
**II.- A Apelante/1.ª RÉ ofereceu as seguintes conclusões:
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A valoração da prova é livre, no entanto deve obedecer a critérios de razoabilidade e assentar no bom senso, resultante da experiência.
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Assim foi dado como provado na sentença que se recorre o seguinte: C) “Mais pede o A. uma indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos no valor não inferior a 7500,00€.
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Os danos de natureza não patrimonial são os danos insusceptíveis de avaliação pecuniária, porque atingem bens que não integram o património do lesado e apenas podem ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, que funciona como uma satisfação. Dispõe o artigo 496.º n.º 1 do Código Civil que na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito; caso em que o montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal.
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No caso concreto, resultou provado que o autor sofreu e continua a sofrer profunda tristeza, amargura e ansiedade, bem como a angústia e inquietação inerente ao momento em que o sinistro ocorreu, que poderia ter provocado uma tragédia com a sua mãe e a destruição completa da fracção, e à incerteza de não saber quando poderá voltar a viver em sua casa. O autor sentiu medo e receio, e perdeu a alegria na casa que tinha comprado com gosto pouco tempo antes – e onde investiu com esforço as suas economias e o produto do seu trabalho - ao vê-la destruída por um incêndio. Tendo ficado privado de a poder habitar, usufruir ou dispor, e sido obrigado a viver em unidades hoteleiras.
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São, portanto, vários os danos de natureza não patrimonial sofridos pelo demandante, danos esses que são gravosos, pelo que são indemnizáveis nos termos legais.
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Recorrendo às regras da equidade e tendo em atenção acima tecidas, considera-se adequado fixar (nos termos do n.º 3 do artigo 496.º n.º 1 e do artigo 494.º do Código Civil) em € 5000,00 (cinco mil euros) o valor a arbitrar ao demandante por tais danos.".
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Ora é nosso entender que houve uma má interpretação do artigo 496º do Código Civil, e por conseguinte uma má aplicação dos princípios da proporcionalidade e essencialmente de equidade no momento da fixação do montante a indemnizar pelos danos não patrimoniais sofridos.
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Assim, sem voltar a tecer as considerações doutrinais e jurisprudenciais já atrás aduzidas, é nosso entender que o tribunal a quo violou tal norma ao não levar em conta o concurso do autor para o agravamento dos prejuízos.
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A verdade é que em momento algum se pode deixar de levar em conta a mora do credor - ainda que não tenha sido expressamente reivindicada na acção -, pois que a mesma ficou provada, senão vejamos: K) " ... note-se que o A. e a sua mãe expressamente questionados referiram que não permitiram a reparação, nem aceitaram a quantia da companhia de seguros por ser insuficiente para reparar a totalidade dos danos verificados, sempre tendo dado conta que estavam a viver em hotéis por não terem para onde ir, e que dado o sinistro ter origem na construção da R. (atentos os relatórios que o A. dispunha) seria esta a responsável pela reparação da totalidade dos danos ....”.
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E tal mora é também ela responsável por grande parte dos danos sofridos inclusive nos danos não patrimoniais, M) Situação à qual o tribunal a quo não foi sensível no momento da aplicação do artigo 496º do Código Civil.
**III.- O Apelante/AUTOR formulou as seguintes conclusões: 1.
A sentença recorrida quantificou erradamente os danos sofridos pelo recorrente em consequência do incêndio na sua habitação, causado por vício construtivo imputável à Ré Construções X, S.A., 2. Desconsiderando parte deles por não os ter considerado provados - erro na apreciação da prova e de julgamento - 3. E negando tutela jurídica a outros, apesar de demonstrados em juízo, por entender que o recorrente agiu em abuso de direito - erro na aplicação do direito.
4. Arbitrando assim indemnização muito inferior aos danos verificados, em violação do princípio da reparação integral do dano, ínsito na obrigação de indemnização e do nexo de causalidade previstos no Código Civil (artigos 562.° e 563.°).
5.
Ora, a factualidade dada por provada atesta a denúncia atempada do defeito de construção pelo recorrente, a interpelação da ré empreiteira para o sanar, a...
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