Acórdão nº 314/17.0PBCHV.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Março de 2019

Magistrado ResponsávelPEDRO CUNHA LOPES
Data da Resolução11 de Março de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

1 – Relatório Por Acórdão nestes autos proferido em 29 de Maio de 2 018, foi o arguido D. X.

condenado, nos seguintes termos: - pela prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art.º 152º/1, a), 2), 4) a 6) C.P.

, na pena de 3 (três) anos de prisão – na pessoa da Mulher, I. P.; - pela prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art.º 152º/1, d) e ns.º 2), 4) a 6) C.P.

, na pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão – na pessoa da filha, J. X.; - em cúmulo jurídico, foi condenado na pena única de 4 (quatro) anos de prisão efetiva.

Foi ainda condenado: - no pagamento de uma indemnização equitativa à Mulher, no valor de 5 000€ (cinco mil euros); - nas penas acessórias de proibição de contactos com a vítima e de proibição de uso e porte de arma, pelo período de 6 (seis) a 5 (cinco) anos e da obrigação de frequência de programas específicos de prevenção da violência doméstica.

Discordando desta decisão, da mesma recorreu o arguido D. X.

. No seu recurso apresenta as seguintes conclusões: “A- Para dar como provados os factos vertidos sob os nºs. 3, 4, 6, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 15 a 22, 24, 25, 27, 30 a 34 da factualidade tida por assente o colectivo desconsiderou totalmente as declarações do arguido, que teve como inconsequentes, ilógicas e sem o mínimo de credibilidade, em linha com a atitude considerada arrogante assumida perante o Tribunal na audiência de julgamento e, em contrapartida, teve por verídicas, lógicas e dignas de todo o crédito as declarações das ofendidas, que considerou espontâneas, objectivas e contextualizadas no espaço e no tempo, merecedoras de toda a credibilidade e aceitação.

B- A reapreciação, por parte do tribunal da 2.ª instância, da decisão de facto impugnada implica uma reapreciação do julgado sobre os pontos impugnados, em termos de formação, pelo tribunal de recurso, da sua própria convicção, em resultado do exame das provas produzidas e das que lhe for lícito ainda renovar ou produzir, para só, em face dessa convicção, decidir sobre a verificação ou não do erro invocado, mantendo ou alterando os juízos probatórios em causa. No âmbito dessa apreciação, dispõe o Tribunal da Relação de margem suficiente para, com base na prova produzida, em função do que for alegado, bem como da fundamentação do tribunal da 1.ª instância, ajustar o nível de argumentação probatória de modo a revelar os factores decisivos da reapreciação empreendida.

C- É por isso que os factores de imediação colhidos pela 1.ª instância na produção da prova que sejam relevantes para a formação do juízo probatório devem ser objectivados na fundamentação da decisão de facto, de modo a serem susceptíveis de discussão racional, para evitar os riscos da arbitrariedade.

D- Acontece que, na audiência de julgamento foi junto, e incorporado no processo um documento que corporiza a sentença proferida no processo nº 1296/17.4T8FIG, do Tribunal Judicial da Comarca de Coimbra, Juízo de Família e Menores da Figueira da Foz, a 7 de Maio de 2018, hoje já transitada em julgado, relativa à Regularização das Responsabilidades Parentais dos filhos do aqui arguido D. X. e ofendida I. P., ambos requeridos nessa acção.

E- Nessa acção, estando em causa a regulação das responsabilidades parentais relativamente aos filhos do arguido e ofendida I. P., foi apreciada toda a vivência em comum de ambos, o seu comportamento e relacionamento, bem como o seu modo de vida.

F- E os factos aí dados como assentes contrariam quase integralmente aqueles que no acórdão recorrido foram tidos por provados e da fundamentação da convicção do julgador naquela acção decorre que as ofendidas I. P. mentiram ao longo de todo o julgamento e que os conflitos entre o casal foram sobretudo motivados pela vida que a mulher levava em Inglaterra, fazendo dos furtos o seu modo de vida e incentivando os filhos a fazerem-no também, razão por que não mereceram qualquer crédito ao julgador as suas declarações.

G - E foi precisamente porque “o requerido nos oferece melhores garantias de transmissão de valores e integração em práticas de vida mais consentâneos com a legalidade e a honestidade de vida em sociedade, comparativamente com a requerida”, que se decidiu que dois dos filhos ficariam a residir com o pai, bem como a outra filha passaria com ele um fim de semana por mês.

H- A factualidade apurada nesta sentença, bem como a motivação que suportou a convicção do julgador, tudo fundamentado em relatórios periciais e testemunhais específicos abundantes, levam forçosa e necessariamente a por em crise a seriedade, a espontaneidade e acima de tudo a veracidade das declarações das ofendidas, requisitos estes aceites pelo colectivo no presente processo.

I - Tudo isso tem, pelo menos, a virtualidade de por em causa a credibilidade que as declarações das ofendidas mereceram ao colectivo e, por outro, também de colocar em crise a desconsideração das declarações do arguido perante o mesmo colectivo.

J - E assim, na falta dessa credibilidade e na dúvida, já que o arguido, por sua vez, negou a quase totalidade dos factos tidos por assentes no acórdão recorrido e porque nenhuns outros elementos probatórios foram aqui produzidos, devem ser tidos como não provados os factos vertidos sob os nºs 3, 4, 6, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 15 a 22, 24, 25, 27, 30 a 34.

L - Porém, o tribunal na fundamentação da matéria de facto não faz uma referência detalhada aos factos apurados nessa sentença, omitindo pura e simplesmente o conteúdo desse documento incorporado no processo e tudo o que dele consta, o que claramente integra erro notório na apreciação da prova – al. c) do nº e do art. 410º C.Pr.Penal.

M- Mas para além disso e a ele se sobrepondo, o princípio non bis in idem, com consagração constitucional (nº 5 do art. 29º Constituição da República), que preconiza que ninguém pode ser julgado mais do que uma vez pela prática do mesmo crime, proíbe nomeadamente que se proceda a uma dupla valoração do mesmo substrato material, isto é, que se aprecie em processos distintos a mesma factualidade e isto pela razão de se evitarem pronúncias díspares sobre factos unitários.

N - Assim sendo e por força deste princípio, os factos apurados naquela acção de Regulação das Responsabilidades Parentais têm que ser aceites neste processo e, também por esta via, os factos aqui vertidos sob os nºs 8, 9, 11, 12, 15, 21 e 25 têm de ser tidos como não provados porque já apreciados naquela acção e porque em oposição com o aí decidido.

O - Mesmo que assim se não entendesse –serem desconsideradas por falta de credibilidade as declarações das ofendidas- então os factos dados como assentes sob os nºs 8, 9, 11, 12, 15, 21 e 25 do acórdão recorrido sempre teriam de ser dados como não provados porquanto são contraditados frontalmente pela factualidade dada como assente na sentença proferida naquela acção de Regulação das Responsabilidades Parentais, concretamente: - o nº 8 pela factualidade vertida sob os nºs 30 e 37; - o nº 9 pela factualidade vertida sob os nºs 15 e 18; - o nº 11 pela factualidade vertida sob os nºs 15, 30 e 31; - o nº 12 pela factualidade vertida sob os nºs 21,30, 31 e 46; - o nº 15 pela factualidade vertida sob os nºs 43 e 44; - o nº 21 pela factualidade vertida sob o nºs 23; - o nº 25 pela factualidade vertida sob os nº 24.

P - Acresce, e ainda subsidiariamente, que os factos dados como assentes no acórdão recorrido sob os nºs 3, 4, 10, 16, 31 e 32 sempre teriam de ser considerados como não provados porquanto nenhuma prova foi feita quanto à sua veracidade.

Q - Na verdade, nunca em qualquer passagem de suas declarações as ofendidas afirmam de modo categórico e taxativo que: - desde o início da sua relação e de modo contínuo o arguido controlasse a sua ex-mulher e se deslocasse permanentemente ao seu local de trabalho e que a insultasse e molestasse fisicamente de modo constante durante 12 anos –nºs 3, 4 e 10; - no ano de 2016, frequente e continuamente a apelidasse de puta, cabra e ladra –nº 16; - o arguido actuasse com o objectivo de atentar contra a segurança da ofendida e com a intenção de a atingir psiquicamente e humilhá-la –nºs 31 e 32, como decorre das suas declarações –(I. P., gravado em suporte digital, de 10:29:13 a 10:34:45; e 10:40:32 a 10:45: 24); e J. X., gravado em suporte digital, de de 11:29:10 a 11:34:20).

R- Para além disso, sempre as penas parcelares aplicadas, bem como a pena única encontrada são indubitavelmente exageradas, não se coadunando com os princípios que devem nortear a fixação da medida concreta da pena.

S - Na verdade, a determinação da medida concreta da apena deve ser encontrada em função da culpa e das exigências de prevenção geral de integração e da prevenção especial de socialização, em conformidade com o que decorre do disposto nos arts. 71º, nº 1 e 40º C.Penal, ou seja, haverá que ponderar as necessidades de tutela do bem jurídico violado, bem como as exigências sociais que emanam dessa lesão, assim como a necessidade de preservação da dignidade do infractor, tendo em vista a sua recuperação e reintegração social.

T - Sendo certo que não podem, na determinação da medida concreta da pena, relevar aqueles elementos que já foram considerados pelo legislador para quantificação da moldura abstracta da pena, tendo ainda sempre presente que a pena não deve ultrapassar o limite imposto pela culpa –nº 2 do art. 40º C.Penal.

U- Não obstante o clima de crispação, desentendimento e agressões físicas e morais entre o casal, eles acabavam por ultrapassar esse clima, iam-se desculpando e refaziam a vida em comum, sendo que das lesões físicas nenhuma sequela danosa é relatada, pelo que o tal sofrimento psicológico e físico sofrido pela ofendida, referido no acórdão, não terá atingido assim um grau tão elevado.

V- Por outro lado, se é certo que é condenável a todos os títulos a violência doméstica e que são elevadas as exigências de prevenção geral, já não se pode perder de vista pelo menos as circunstâncias concretas que rodearam o cometimento do crime...

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