Acórdão nº 2059/17.2T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 14 de Março de 2019

Magistrado ResponsávelMARIA PURIFICAÇÃO CARVALHO
Data da Resolução14 de Março de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

- Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães – I.

RELATÓRIO J. S. e esposa M. P., intentaram a presente acção declarativa sob a forma de processo comum, contra J. N. E C. F., melhor identificados nos autos, peticionando, a final, serem os Réus condenados a reconhecerem o crédito dos Autores sobre o primeiro Réu no valor de € 23.268,24 e ainda no seu pagamento, acrescido dos respectivos juros moratórios contados a partir da citação; ser declarado e os Réus reconhecerem o direito dos Autores a aceitar a herança repudiada pelo 1º Réu, ficando sub-rogado na posição deste, ser declarado o direito dos Autores, como credores do 1º Réu, a executar e indicar à penhora o quinhão hereditário respectivo; ser declarado que essa execução e penhora do quinhão hereditário seja totalmente livre de ónus e encargos, podendo ainda os Autores praticar todos os actos de conservação derivados da aceitação da herança tudo na medida do valor do interesse dos Autores, correspondente ao seu crédito. Subsidiariamente seja o acto de repúdio da herança declarado nulo e de nenhum efeito, por simulado, e, consequentemente, ordenar o cancelamento dos registos, entretanto efectuados junto da Conservatória do Registo Predial.

Alegam, em síntese, que deram de arrendamento ao 1º Réu, o rés-do-chão frente do prédio urbano, sito na Rua …, na cidade de Viana do Castelo, inscrito na matriz predial respectiva sob o artigo … da União de freguesias de Viana do Castelo, destinada ao comércio de importação, exportação, representação e comercialização de vestuário, calçado e acessórios de moda, e a primeira sala para quem entra no rés-do-chão traseiro do prédio urbano sito na Rua …, inscrito na matriz predial respectiva sob o artigo …, respectivamente, mediante o pagamento da renda mensal de € 1.150,00 e € 130,00, a serem pagas no primeiro dia útil do mês a que dissessem respeito. Mercê das actualizações a que foram sujeitas as rendas são actualmente, respectivamente, de € 1.161,39 e € 131,29.

Sucede que o primeiro Réu deixou de pagar pontualmente as rendas devidas pela ocupação dos locados, razão pela qual, e após interpelação do Réu, o Autor instaurou acção executiva para pagamento da quantia de € 12.926,80, execução que corre termos no Juízo Local Cível (J1) com o nº 1111/16.6 T8VCT. No âmbito da execução foi penhorado o quinhão hereditário do 1º Réu na herança ilíquida e indivisa aberta por óbito do seu pai J. M., a qual integra, as fracções autónomas individualizadas pelas letras “A” e “C”, do prédio urbano sito na Rua …, inscrito na matriz respectiva sob o artigo … e descrito na Conservatória do Registo Predial de Viana do Castelo sob o nº ….

Acontece que ambos os descendentes do falecido, o primeiro Réu e a sua irmã L. N. repudiaram a herança do seu pai, sendo chamada à herança C. F., neta do Autor da herança e filha da L. N., factos dos quais os Autores tomaram conhecimento em Abril de 2017.

Mais, alegam que o repúdio da herança é um acto simulado, não passando de um puro estratagema para que os Autores não pudessem penhorar bens à herança, com intenção de subtrair os bens ou direito à penhora, e que impede os Autores de penhorar o que quer que for ao primeiro Réu por manifesta falta de bens.

Citados os Réus não contestaram.

Findos os articulados, dispensou-se a realização da audiência prévia, em face da não contestação da acção, e na inoperância da revelia da Ré C. F., dada a sua incapacidade, em razão da idade, nos termos do disposto nos art.º 568º, al. b) e 592º, nº 1, al. a) do CPC.

De seguida procedeu-se à fixação do objecto do processo e enunciação dos temas de prova.

Realizou-se a audiência de julgamento de acordo com o formalismo legal, conforme resulta da respectiva acta.

Seguiu-se decisão que terminou com o seguinte dispositivo legal: Pelo exposto, decide-se julgar a acção parcialmente procedente e, em consequência: 5.1.

Condeno os Réus a reconhecerem o crédito dos Autores sobre o primeiro Réu, no valor de € 22.379,73 (vinte e dois mil trezentos e setenta e nove euros e setenta e três cêntimos), e no seu pagamento, acrescido dos respectivos juros moratórios a contar da citação até efectivo e integral pagamento.

5.2.

Declaro os Autores sub-rogados no direito de aceitar a herança repudiada pelo primeiro Réu e, consequentemente, reconheço aos Autores o direito de executar a herança, nos termos do disposto no art.º 1041º, nº 2 do CPC.

5.3.

Absolvo os Réus do demais peticionado.

Custas pelos Réus (art.º 527º, nº 1 e 2 do CPC).

Registe e notifique.

Descontente com esta decisão apresentam os réus recurso cujas alegações terminam com as seguintes conclusões: 1 - Os Réus/Recorrentes não se podem conformar com a decisão proferida, na parte em que: - Os condena a reconhecerem o crédito dos autores sobre o 1º Réu no valor de € 23.268,24 (vinte e três mil duzentos e sessenta e oito euros e vinte e quatro cêntimos) e ainda no seu pagamento, acrescido dos respetivos juros moratórios contados a partir da citação até efetivo pagamento; - A ser declarado e os réus reconhecerem o direito dos autores a aceitar a herança repudiada pelo 1º Réu, ficando sub-rogados na posição deste nos termos do artigo 2067º do Código Civil e artigo 1041º do CPC; - a ser declarado o direito dos autores, como credores do primeiro réu a executar e indicar à penhora, por força do repúdio da herança pelo 1º réu, por óbito de seu pai, o quinhão hereditário respetivo e ainda ser declarado que essa execução e penhora do quinhão hereditário seja totalmente livre de ónus e encargos, podendo ainda os autores praticar todos os atos de conservação derivados da sua aceitação da herança, tudo na medida do valor do interesse dos mesmos autores, correspondente ao seu crédito, incluindo o capital e juros, vencidos e vincendos, até ao integral pagamento; 2 – Pelo que vêm apresentar recurso da mesma, quanto às decisões supra elencadas, impugnando também a decisão sobre a matéria de fato, quanto aos pontos em concreto infra especificados.

Do Recurso da matéria de direito: 3 - J. M. faleceu no dia .. de … de 2015, deixando como únicos e universais herdeiros o ora 1º réu e uma neta, C. F., solteira, menor, filha de sua filha L. N., que repudiou a herança de seu pai por escritura pública lavrada no dia 07/05/2015 no Cartório Notarial de L. G. sito na Praça …, Porto; 4 - O primeiro Réu repudiou a herança por óbito de seu pai, o referido J. M., por escritura pública outorgada no dia 21 de Novembro de 2015, exarada a folhas 63 do livro de notas para escrituras diversas número … do Cartório Notarial L. G., sito na Praça …, Porto.

5 – Consta da douta sentença “que os efeitos do repúdio retrotraem-se ao momento da abertura da sucessão, considerando-se como não chamado o sucessível que a repudia (art.º 2062º do Cód. Civil). Isto quer dizer que tudo se passa como se o repudiante nunca tivesse figurado no quadro dos sucessíveis (Espinhosa Gomes da Silva, Sucessões, 1980, pág. 303), e chamados passassem a ser, como se fossem ab initio aqueles que a lei teria chamado no caso do repudiante não ter chegado a existir (cf. Pires de Lima e Antunes Varela, in Cód. Civil, Anotado, Vol. VI, pág. 105).

Revertendo ao caso dos autos, verificamos que o Autor da sucessão J. M. deixou a suceder-lhe dois filhos, o primeiro Réu J. N. e a L. N..

Ambos os filhos repudiaram à herança, primeiro a L. N., a quem sucedeu a sua filha, a aqui segunda Ré C. F., e posteriormente o Réu J. N., que é solteiro e não tem descendentes.

Ora, tendo ambos os descendentes diretos do autor da sucessão repudiado a herança, e considerando que os efeitos dos respectivo repúdios retroagem ao momento da abertura da sucessão, tudo se passa como se tais sucessíveis não tivessem sido chamados à sucessão, pelo que ao falecido sucedeu apenas a neta C. F. (art.º 2133º, nº 1 do Cód. Civil), que passou a ser a sua única e universal herdeira.

Afigura-se-nos ser totalmente inócua ou irrelevante as datas dos repúdios, sendo que os efeitos de uma e outra reportam-se sempre à data do falecimento do Autor da sucessão (art ºs 2031º e 2062º do Cód. Civil)” 6 - Os Réus/Recorrentes não se conformam com tal aplicação do direito nomeadamente quanto à seguinte conclusão “tudo se passa como se tais sucessíveis não tivessem sido chamados à sucessão, pelo que ao falecido sucedeu apenas a neta C. F. (art.º 2133º, nº 1 do Cód. Civil), que passou a ser a sua única e universal herdeira.

Afigura-se-nos ser totalmente inócua ou irrelevante as datas dos repúdios, sendo que os efeitos de uma e outra reportam-se sempre à data do falecimento do Autor da sucessão (artºs 2031º e 2062º do Cód. Civil)” 7 - Ambos os filhos de José renunciaram à herança deste, em datas diferentes, tendo o filho e aqui Réu J. N. renunciado à herança em 21 de Novembro de 2015 8 – No entanto a filha deste L. N. – apesar de ter renunciado à herança do seu pai em 07/05/2015 por escritura pública lavrada no Cartório Notarial de L. G. não perdeu nem tão pouco renunciou à sua qualidade de herdeira de J. N. (sublinhado nosso) aqui réu e irmão daquela.

9 - A irmã do Réu quando renunciou à herança do seu pai, tudo se passa como se não tivesse sido chamada à sucessão do seu pai; no entanto, tal não afeta a sua qualidade de herdeira do seu irmão.

10 – Estabelece o artigo 2062º do C.C. que “os efeitos do repúdio da herança retrotraem-se ao momento da abertura da sucessão, considerando-se como não chamado o sucessível que a repudia, salvo para efeitos de representação”.

11 - Como escrevem Pires de Lima e A. Varela em anotação a este artigo, o que a lei prescreve é que, quando o sucessível chamado repudia a herança, a destruição retroactiva dos efeitos operada pelo repúdio faz com que tudo se passe como se o sucessível não tivesse sido chamado - e chamados passassem a ser, como se o fossem ab initio, aqueles que a lei teria chamado, no caso de o repudiante não ter chegado a existir. (cf. Cód. Civ. Anotado Vol. VI, p. 105).

12 – O réu ao repudiar a herança do seu pai é como se este não tivesse...

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