Acórdão nº 901/17.7T8VRL.G2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 14 de Março de 2019

Data14 Março 2019

Sumário do acórdão (art. 663.º n.º 7, do CPC): I - Verificado o facto voluntário do Réu, na modalidade de comissão por omissão de um dever de informação, ou dolo omissivo do dever de elucidar, e cuja ilicitude resulta do não cumprimento do referido dever/obrigação de informação, a que acresce a culpa, pelo menos com base em presunção não ilidida, o dano, correspondente ao não reembolso de capital investido em instrumento financeiro, e o nexo de causalidade entre o facto e o dano, inevitável se torna a obrigação do Banco de indemnizar, ao violar o dever de informação, não elucidando convenientemente o cliente sobre as características do produto financeiro que lhe propôs/sugeriu.

v ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES 1. Relatório O Autor A. C., com domicílio no lugar …, da União das freguesias de …, concelho de Peso da Régua, intentou a acção de processo comum contra o BANCO A S.A., NIPC …, sito na Avenida …, Peso da Régua, peticionando: A) Condenar-se a Ré a pagar (restituir) ao Autor a importância de € 50.000,00, acrescida de juros remuneratórios garantidos com uma rentabilidade anual de 1,5%, desde 09.11.2015 até 09.05.2016, que se cifram na importância global de € 1.123,97, bem como juros de mora à taxa legal desde a data de citação até integral reembolso do capital e juros; Ou, subsidiariamente, B) Ser declarado, e ser a Ré condenada a reconhecer, a ineficácia em relação ao Autor da aquisição da obrigação denominada SNRM2 - SN 2006, melhor identificada nos arts. 5º a 7º da presente petição inicial; C) Condenar-se a Ré a pagar (restituir) ao Autor a importância de € 50.000,00, acrescida de juros remuneratórios garantidos com uma rentabilidade anual de 1,5%, desde 09.11.2015 até 09.05.2016, que se cifram na importância global de € 1.123,97, bem como juros de mora à taxa legal desde a data de citação até integral reembolso do capital e juros; E, sempre, D.

Condenar-se a Ré a pagar ao Autor, a título de danos não patrimoniais, a importância de € 3.000,00; Alega, sinteticamente, que: (i) O Autor era cliente do Banco ..., agência de Peso da Régua, com a conta à ordem n.º …, onde deposita e movimentava dinheiro, constitua poupanças e efectuava pagamentos; (ii) Em 18 de Abril de 2006, o Autor subscreveu um “boletim de subscrição” de 1 (uma) obrigação no valor nominal de € 50.000,00 (cinquenta mil euros), com a designação SNRM21 - SN 2006; (iii) O Autor desconhecia em absoluto a natureza e extensão da denominada obrigação SNRM2 - SN 2006 de que figura como titular; (iv) O Autor estava convicto que nessa altura havia efectuado uma aplicação do capital de € 50.000,00 cuja liquidez estava assegurada com retorno garantido do capital e juros pelo Banco A; (v) Em 18 de Abril de 2006 o gerente do Banco ... da agência de Peso da Régua disse ao Autor que tinha uma aplicação em tudo igual a um depósito a prazo e com capital garantido por essa instituição e rentabilidade assegurada, assegurando que tal aplicação tinha uma rendibilidade semestral garantida, nos termos constantes do antecedente art.º 3º, e que, sendo uma aplicação do grupo Banco ..., estava garantido o reembolso do capital e juros, não comportando qualquer risco; (vi) Não ignorava o dito funcionário que Autor não possuía conhecimentos, formação e qualificação técnica, ou sequer experiência adquirida, que lhe permitisse conhecer e diferenciar os diversos tipos de produtos financeiros e avaliar os riscos de cada um deles, a não ser que lhos explicassem devidamente; (vii) No entanto em tempo algum informou o Autor que estava perante uma operação não adequada ao seu perfil; (viii) O pagamento tempestivo de juros operado manteve-se até ao semestre terminado em 8 de Outubro de 2015; (ix) Além desses juros a Ré Banco A não procedeu ao pagamento de mais nenhuns juros nem reembolso do capital; (x) Caso o Autor tivesse percebido que poderia estar a dar ordem de compra de obrigações SN 2006, produto de risco e que o capital não era garantido pelo Banco ..., não o autorizaria.

*O Réu Banco A S.A. apresentou contestação, arguindo as excepções de incompetência territorial e de prescrição, impugnando as alegações do Autor com referência ao não conhecimento das condições da obrigação subscrita.

Concluiu, propugnando a procedência da excepção de incompetência territorial e a improcedência da acção.

*Proferiu-se saneador-sentença, o qual julgou improcedente a excepção de incompetência territorial e a acção.

*O autor aduziu recurso do sobredito saneador-sentença.

*Por Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães, revogou-se a predita decisão, determinando-se o prosseguimento dos autos para aferição da responsabilidade pré-contratual e contratual do Réu.

Exarou-se o despacho que identificou o objecto do litígio e enunciou os temas da prova.

*Após realização da audiência final foi proferida sentença que julgou a acção totalmente improcedente e, consequentemente, absolveu o Réu Banco A S.A. do pedido.

*II. O Recurso Não se conformando com a decisão proferida veio o A. apresentar recurso, nele formulando as seguintes conclusões: I.

Impugnação da decisão sobre a matéria de facto A.

Razão de fundo de discordância do recorrente.

1º. Através da presente acção invocava o autor/recorrente que o Banco ..., actual Banco A, S.A, o determinou em 10.04.2006 a aplicar € 50.000,00 numa aplicação igual a um depósito a prazo, sem riscos, com capital e juros garantidos pelo Banco ..., e que podia movimentar o capital quando quisesse, desde que avisasse o Banco ... com três dias de antecedência; 2º. Confiando em tal informação, o autor fez uma aplicação de € 50.000,00, convicto de que o Banco ... lhe restituiria o capital e os juros, à data do seu vencimento ou quando o solicitasse, o que não veio a suceder; 3º. O capital que investiu acabou por ser colocado pelo Réu numa obrigação SN 2006, sendo certo que se o autor tivesse percebido que poderia estar a dar ordem de compra de obrigações SN 2006 e que o capital não era garantido pelo Banco ..., não a autorizaria; 4º. A acção foi julgada totalmente improcedente, decorrente do facto de o Tribunal se ter limitado, no essencial, a dar como provado que o autor em 18 de Abril de 2006, na agência do Banco ... sita em Peso da Régua, o Autor subscreveu um “boletim de subscrição” de 1 (uma) obrigação no valor nominal de € 50.000,00 (cinquenta mil euros), com a designação SNRM21 -SN 2006, que se encontra depositada em seu nome no Banco A, S.A. (ponto 2. dos factos provados) sendo que o gerente do Banco ... da agência de Peso da Régua disse ao Autor que, sendo uma aplicação do grupo Banco ..., estava garantido o reembolso do capital e juros (ponto 4. dos factos provados). – Sublinhado de nossa autoria 5º. Reconheceu o Tribunal “a quo” que as declarações prestadas pelas “…testemunhas R. J. (gerente da agência do Banco ... de Peso da Régua à data dos factos) e E. F. (funcionária da predita agência), num primeiro plano de análise, efectivaram declarações eivadas de razão de ciência e sustentabilidade objectiva com referência ao quadro subjacente à venda pelo Banco ... das obrigações emitidas pela SN, referenciando que as mesmas eram expostas como um investimento seguro, com uma rentabilidade garantida equivalente à dos depósitos a prazo, o que o que se antolhou linearmente plausível, sendo circunstância de conhecimento geral que os funcionários do Banco ..., no âmbito de um diktat hierárquico-organizacional, comercializavam as anteditas obrigações com o referenciado “verniz cativante”.” – negrito e sublinhado de nossa autoria 6º. Para o Tribunal o facto dos funcionários do Banco ..., cuja depoimento quanto à clareza, espontaneidade e prontidão não mereceu qualquer reparo, terem assegurado ao autor (investidor não qualificado) que as obrigações em mérito eram (i) um investimento seguro, (ii) e com rentabilidade equivalente aos depósitos a prazo mais não era de que um natural “verniz cativante”.

7º. Discorda o autor/recorrente, frontalmente, com a lisonjeira brandura absolutamente descabida e branqueadora do dever de boa fé, de diligência, de lealdade, de informação a que os serviços de intermediação financeira estão obrigados, como ao diante se irá demonstrar. -cfr. artigos 30º, 304º e 312º e ss CVM 8º. Essa afirmação é absolutamente distorcida e contrário às declarações da testemunha R. J., bem como da funcionária E. F., que ao longo do seu depoimento por diversas e insistentes vezes referiram que as ordens superiores do Banco ... era para venderem as obrigações em mérito como depósitos a prazo, sem qualquer risco e com garantia de restituição do capital pelo Banco ..., sendo precisamente dessa forma que aconselharam a sua subscrição ao autor e a todos os outros clientes; 9º. E mais. A testemunha R. J. pouco sabia acerca do que era uma “obrigação” muito menos uma “obrigação subordinada”, nunca tendo explicado isso a qualquer cliente -incluído o autor/recorrente – e a testemunha E. F. nem sequer sabia o que era uma “obrigação”. Tudo era feito na base da confiança, ou seja, como se de um depósito a prazo com garantia de reembolso pelo Banco ....

10º. Nada disto foi apreciado na douta sentença em mérito, sendo certo que a “obrigação” em mérito não era um produto semelhante a um depósito a prazo nem o Banco ..., enquanto intermediário financeiro, garantia o reembolso do capital.

11º. Finalmente, o Tribunal permitiu-se extrair do depoimento da testemunha J. M., quando ao facto de ter admitido que o autor/recorrente foi funcionário do Banco B, que ele inexoravelmente tinha “…experiência profissional de dezenas de anos no mesmo, … tinha a cristalina consciência da subscrição de uma estrita obrigação emitida pela SN e comercializada pelo Banco ...”, o que não é lícito inferir uma vez que não foi dado como provado tal facto; -art.º 351º do Código Civil e art.º 608º, n.º 2 do CPC; 12º. Resulta, isso sim, que o autor/recorrente era avesso a qualquer aplicação que não fosse aplicação a prazo (depósitos a prazo), nunca dado a...

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