Acórdão nº 190/16.0T8BCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 21 de Fevereiro de 2019

Magistrado ResponsávelSANDRA MELO
Data da Resolução21 de Fevereiro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães Autores e apelantes: PAULA (…) e marido JOSÉ (…), residentes na Rua do …, casa …, freguesia de …, Barcelos, Ré e apelada: ANA (…), residente na Rua da …, nº …, freguesia de …, Barcelos, pedindo que se condene a Ré a pagar-lhes a quantia de € 11 107,91, acrescida de juros de mora vencidos, no valor de € 2 484,55, e dos vincendos, até integral pagamento.

Autos de: apelação em ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum.

I - RELATÓRIO Seguindo-se de perto os relatórios já efetuados nos autos, na parte em que não necessitam de ser alterados face à atual fase processual e questões que ora se levantam, relatam-se os principais acontecimentos ocorridos no processo.

Os Autores, na petição inicial, pediram a condenação da Ré a pagar-lhes a quantia global de €11.107,91, acrescida de juros vencidos no montante de €2.484,55 e de juros vincendos até efetivo pagamento.

Alegaram, em síntese, que em 27 de Julho de 2010, outorgaram escritura de doação, nos termos da qual a Ré lhes doou um prédio misto, com reserva de usufruto para a doadora e com a obrigação de os donatários a tratarem e acompanharem na saúde e na doença; na sequência da escritura, a Autora passou a viver na casa usufruída pela Ré, fazendo a limpeza e as compras, prestando àquela todos os cuidados, acompanhando-a ao médico e levando-a a passear; por essa altura, e por indicações do advogado da Ré, foi aberta uma conta bancária conjunta da Autora e da Ré, para aquela ir pagando as despesas da casa e quaisquer outras que a Ré determinasse; em Setembro de 2010, a Ré solicitou ao Autor que lhe emprestasse a quantia de 2.000,00€, com vista ao pagamento de um imposto de selo, tendo este, aceitando tal pedido, depositado essa quantia na conta bancária acima aludida; em Outubro de 2010, a Ré recebeu a notificação fiscal para pagamento do imposto de selo em causa, no valor de € 9 107,91, a pagar até final do ano, dispondo, nessa altura, a dita conta bancária apenas de saldo € 3 219,02; a solicitação da Ré, a Autora pediu emprestado a Adelaide o valor do imposto de selo a pagar, depositando tal montante na mesma conta; em 23 de Novembro de 2010, a Autora emitiu a favor do IGCP um cheque, no valor de € 9 107,91, para pagamento do dito imposto de selo; em 25 de Novembro de 2010, a Ré impediu a Autora de continuar a residir na habitação; nesse mesmo dia, a Autora solicitou, mas não obteve, a devolução dos valores de € 2000.00 e € 9 107,91.

Contestou a Ré, impugnando a totalidade da matéria de facto da petição inicial, com exceção da celebração da referida escritura de doação; a quantia de € 2000,00 diz respeito ao subsídio por morte, no montante de € 2 500,00, que a Ré recebeu da Segurança Social, através de vale, e que o Autor se prontificou a depositar na conta bancária titulada por Autora e Ré, apropriando-se, todavia, do remanescente de € 500,00; o depósito, no valor de 9 107,91 € deveu-se à ocultação da inexistência de saldo na conta, provocada pelos variados levantamento a que haviam procedido.

Deduziu reconvenção, alegando que, apesar das obrigações contraídas e exaradas na doação, os Autores deixaram de lhe prestar os cuidados de higiene, limpeza, tratamento de roupas e fornecimento de refeições e se apropriaram de valores em dinheiro existentes em contas suas e de objetos em ouro e valores que encontraram na sua casa; especifica que os Autores para pagamento de despesas próprias e sem o seu consentimento, despenderam o valor global de € 32 371,06 , proveniente conta bancária; as obrigações assumidas pelos AA. na doação correspondiam à prestação de serviços através de trabalhos pessoais ou de terceiros, em valor nunca inferior ao do salário mínimo nacional; desde 25/11/2010, tem acumulado danos de montante não inferior a € 31 500,00, a que acrescerão os vincendos, até que cesse o incumprimento dos AA.; por força das obrigações assumidas na doação, os AA. têm obrigação de pagar as despesas de saúde, designadamente as já suportadas por si, no valor de € 863,56, bem como as respeitantes à habitabilidade do imóvel, designadamente as dos consumos e alugueres de contadores da Eletricidade, no valor de € 4 001,07; o seu estado de saúde foi agravado pelo descrito comportamento dos AA., provocando-lhe humilhação, ansiedade, nervosismo e preocupações, danos para cuja compensação reclama o pagamento de € 9 450,00; detém, nesta data, em vista do exposto, um crédito sobre os AA. de € 78 185,69, a que haverá que deduzir, por efeito de compensação, o valor indicado na petição de € 9 107,91; conclui, pedindo (i) que a ação seja julgada não provada e improcedente, sendo absolvida do pedido e (ii) que a reconvenção seja julgada provada e procedente, sendo os AA. condenados a pagar-lhe a quantia de € 78 185,69 ou, deduzido por compensação o valor de € 9 107,91, a quantia de € 69 077,78, acrescida de juros de mora, bem como as demais quantias que se vencerem, a partir desta data e até que cesse o incumprimento dos AA., a liquidar em execução de sentença.

Replicaram os AA., impugnando a totalidade dos factos constantes da contestação e da reconvenção.

Aduziram ainda que tais factos já foram alegados e discutidos na ação ordinária n.º 461/13.8TBBCL, do Tribunal da Comarca de Braga e no processo crime n.º 372/11.1TABCL, do então Juízo Criminal do Tribunal de Barcelos; concluíram, pedindo que se decida pela inadmissibilidade da reconvenção quanto aos factos já discutidos e julgados na ação ordinária anterior e que se decida pela inadmissibilidade da reconvenção quanto aos novos factos invocados pela Ré, uma vez que os mesmos derivam e estão diretamente relacionados com aqueles outros.

Após julgamento, foi proferida sentença a julgar a ação totalmente improcedente e a reconvenção parcialmente procedente, com a condenação dos Autores a pagar à Ré a quantia de € 31 500,00, devida até ao momento da apresentação da reconvenção, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4 %, a contar da notificação da reconvenção e até efetivo e integral pagamento, bem como a quantia mensal de € 500,00 a partir dessa data e até que cesse o incumprimento dos AA. Mais condenou os AA. a pagar à Ré a quantia por esta gasta a título de despesas de saúde, desde 25 de Novembro de 2010 e até que cesse o incumprimento dos AA., cujo montante se relegou para liquidação.

Assinalou-se na sentença, quanto aos factos enquadrados nos temas de prova 3 a 7, que «os mesmos foram considerados não provados [no anterior processo 461/13.8TBBCL e como tal (. . .) não se formou a força de caso impeditiva dos mesmos serem novamente discutidos».

Apelaram os AA., dissentindo da sentença da 1a instância quanto à não verificação da autoridade do caso julgado, à fixação da matéria de facto e à interpretação da cláusula modal da doação.

O acórdão proferido por esta Relação, em síntese, considerou que não se formou a autoridade do caso julgado, atenta a diversidade de pedidos em ambas as ações e que este não se estende ao conjunto de factos como provados e não provados em sentença anterior; manteve a factualidade provada e concluiu que era necessária a ampliação da matéria de facto de forma a abranger o invocado nos artigos 8°, 9° e 18° da contestação para interpretar o conteúdo da cláusula modal, remetendo o processo à 1ª instância.

Deste acórdão foi interposta revista pelos Autores, defendendo que sem ofensa da autoridade do caso julgado não era possível voltar a apreciar e decidir de forma diferente os factos relativos à “apropriação de objetos de ouro", "abandono da casa da recorrida" e "dependência da recorrida do apoio da família" nas quais a recorrida fundamenta o pedido reconvencional da presente ação, porquanto estas foram já apreciadas na ação anterior nº 461/13.8TBBCL, que considerou toda essa factualidade "não provada". . Mais apontou que havia que conhecer questão da exigência do cumprimento dos encargos previstos na doação como pressuposto para o pagamento de uma eventual indemnização à recorrida.

Admitido o recurso, foi proferido acórdão pelo Supremo Tribunal de Justiça que anulou “o acórdão recorrido, enquanto no mesmo foram dados como provados pontos da matéria de facto com violação do caso julgado formado sobre a sentença anteriormente proferida no Proc. 461/13.8TBBCL, nos termos definidos no presente acórdão, devendo o processo voltar à Relação para, nessa parte, à luz da apontada vinculação, e no que entendido for por consequente, ser reapreciada a decisão, pelos mesmos juízes, sendo possível.” São as seguintes as conclusões apresentas pelos apelantes: 1.

Na ação anterior nº 461/13.8TBBCL resultaram "não provados" os factos nos quais a recorrida fundamenta o pedido reconvencional da presente ação, não podendo, por isso, o tribunal "a quo" voltar a apreciar e decidir de forma diferente tais factos - cf fls. 78v. a 79v. (artº 580º do CPC).

2. Formou-se, pois, a autoridade do caso julgado quanto aos factos dos pontos 10º a 15º, 19º, 20º, 43º a 45º e 52º a 58º da contestação, não podendo o tribunal "a quo" basear a sentença num suposto "incumprimento das condições da doação pelos recorrentes, "apropriação de objectos de ouro ", "abandono da casa da recorrida" e "dependência da recorrida do apoio da família " - Vd. N° 2 do artº 580º do CPC e fls. 189v. da sentença.

3. Face à autoridade do caso julgado, os pontos 27º a 30º, dados como provados não podiam ser novamente apreciados, nem, pois, incluídos nos temas de prova, devendo, por isso, ser eliminados.

4.Dos depoimentos dos recorrentes resulta que o relógio em ouro que a Recorrente em sua posse, foi-lhe oferecido pelo falecido irmão da Ré e, quanto às argolas em ouro, não foi feita qualquer prova nesta ação, devendo, por isso, o ponto 27 ter a seguinte redação: "A Autora tem na sua posse um relógio em ouro, com corrente, que lhe foi oferecido pelo irmão da Ré. " - cf concretas passagens dos depoimentos dos Recorrentes, transcritas a fls. 16 a 18 destas alegações.

5.Dos depoimentos dos Recorrentes...

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