Acórdão nº 2132/17.7T8VCT-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 23 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelFERNANDA PROENÇA FERNANDES
Data da Resolução23 de Maio de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório.

(…) instaurou, a 14 de Junho de 2017, a presente acção executiva, que corre termos sob o nº(…) , no Juízo Local Cível de ..., J3, para pagamento da quantia de € 38.844,14.

No âmbito dos presentes autos foi penhorado o imóvel onerado com hipoteca a favor da Caixa ... para garantia do financiamento aqui executado, assim identificado: fracção autónoma designada pela letra “D”, descrita na Conservatória de Registo Predial de ... sob o n.º ...-“D” e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o art. ....º-“D”.

Por decisão da Sra. Agente de Execução em funções, de 13 de Outubro de 2017, foram os presentes autos sustados quanto a ½ indivisa do imóvel onerado com hipoteca em benefício da Caixa ..., por existência de penhora anterior.

A aqui recorrente, Caixa ..., reclamou o seu crédito hipotecário no processo da (primeira) penhora, o qual com o n.º ...62 e Aps. corre termos pelo Serviço de Finanças de ....

Considerando a entrada em vigor a 24 de Maio de 2016 da Lei n.º 13/2016, de 23 de Maio, nomeadamente o disposto pelo art. 244º nºs 2 e 3 do CPPT, e tratando-se o imóvel penhorado de habitação própria e permanente do executado, estando proibida a venda do mesmo (no processo de execução fiscal), a aqui recorrente peticionou o prosseguimento dos presentes autos com a venda da integralidade do imóvel hipotecado e aqui penhorado.

O Tribunal a quo indeferiu tal pedido, por entender que a existência de penhora anterior registada a favor da Fazenda Nacional determina a sustação dos presentes autos.

Tem o seguinte teor a decisão em causa, proferida a 26/11/2018: “ Requerimento de fls. 69 e seguintes: Nos termos do artigo 794º, do C.P.C., pendendo mais de uma execução sobre os mesmos bens, o agente de execução susta quanto a estes a execução em que a penhora tiver sido posterior, podendo o exequente reclamar o respectivo crédito no processo em que a penhora seja mais antiga.

No âmbito dos presentes autos sobre o imóvel penhorado pende uma penhora anterior à realizada à ordem dos presentes autos, encontrando-se, por isso, a presente execução, sustada quanto a esse bem.

As razões ora invocadas pelo exequente para sustentar o seu pedido de prosseguimento dos autos quanto à penhora do imóvel (1/2) objecto de sustação carece de fundamento legal, sendo certo que, enquanto se mantiver a aludida penhora, ter-se-á de manter a sustação já determinada pelo agente de execução. O exequente terá de exercer o seu direito, no âmbito da execução fiscal, nos termos previstos no artigo 794º, do C.P.C. – a propósito desta questão veja-se o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 24 de Outubro de 2017 (relatora: Sílvia Pires, www.dgsi.t).

Nestes termos e em face do exposto, por falta de fundamento legal, indefere-se o requerido.

Notifique.”*É desta decisão que a Caixa ... veio recorrer, concluindo as suas alegações com as seguintes conclusões, que se transcrevem: “(Conclusões) 1. A aqui Recorrente instaurou a presente acção executiva a 14 de Junho de 2017 para pagamento da quantia de € 38.844,14 (trinta e oito mil oitocentos e quarenta e quatro euros e catorze cêntimos).

  1. No âmbito dos presentes autos foi penhorado o imóvel onerado com hipoteca a favor da Caixa ... para garantia do financiamento aqui executado, que assim se identifica: fracção autónoma designada pela letra “D”, descrita na Conservatória de Registo Predial de ... sob o n.º ...-“D” e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o art.....º-“D”.

  2. Por decisão da Agente de Execução em funções, de 13 de Outubro de 2017, foram os presentes autos sustados quanto a ½ indivisa do imóvel onerado com hipoteca em benefício da Caixa ..., 4. Sendo que a Caixa ... reclamou o seu crédito hipotecário no processo da (primeira) penhora, o qual com o n.º ...62 e Aps. corre termos pelo Serviço de Finanças de ...

  3. Ocorre que, a 24 de Maio de 2016 entrou em vigor a Lei n.º 13/2016, de 23 de Maio que veio proteger as casas de morada de família no âmbito dos processos de execução fiscal.

  4. Atenta a letra de tal lei, veio a Caixa ... peticionar o prosseguimento dos presentes autos quanto a ½ onerada com penhora anterior a favor da Fazenda Nacional.

  5. Tal pedido foi, contudo, indeferido.

  6. O presente recurso vem interposto do despacho que indeferiu o pedido de prosseguimento dos presentes autos e o levantamento da sustação da execução, com vista à venda do imóvel penhorado, por existir penhora anterior registada da Fazenda Nacional, fazendo incorrecta aplicação e interpretação do art. 794.º do CPC.

  7. Senão vejamos: em Maio de 2016 entrou em vigor a Lei n.º 13/2016, de 23 de Maio, que prevê que, sendo penhorada em execução fiscal bem imóvel que corresponda a habitação própria e permanente do executado, não há lugar à realização da venda na execução fiscal; ou seja, a nova lei vem estabelecer um impedimento legal à venda dos imóveis que se encontrem nessas circunstâncias.

  8. Face ao exposto, está a Recorrente numa situação de impasse, não podendo obter nem pela via dos presentes autos, nem pela via dos autos em que reclamou crédito, o pagamento da dívida hipotecária (de elevado montante).

  9. Tal situação é claramente lesiva dos interesses da Recorrente, bem como, dos interesses dos Executados que têm visto penhorados os seus bens, uma vez que a presente execução está sustada quanto ao imóvel e na execução fiscal há um impedimento legal à realização da venda, do bem hipotecado e penhorado, mantendo-se a penhora do Fisco apenas como mera garantia do crédito fiscal, sem quaisquer outras consequências processuais, pois a venda não se irá realizar.

  10. Requereu, deste modo, a Recorrente que o Tribunal reconhecendo o impedimento legal à realização da venda nas Finanças, levantasse a sustação e ordenasse o prosseguimento da execução, por não se verificar o circunstancialismo do art. 794.º, n.º1 do CPC (pendência de duas ou mais execuções dinâmicas sobre o mesmo bem).

  11. Argumentando ainda que, tendo em conta que a Autoridade Tributária será sempre citada para reclamar créditos, os direitos desta não são prejudicados pelo prosseguimento da execução.

  12. Como já se viu, o douto Tribunal ad quo indeferiu a pretensão da Recorrente, ordenando que esta fosse diligenciar pela venda n o processo da primeira penhora, com o que não se concorda.

  13. A disposição normativa constante do art. 794.º do CPC visa impedir a sobreposição de direitos sobre os mesmos bens, criando assim uma regra de prioridade temporal cujo objectivo é o de ordenar em um só processo (o da primeira penhora) a tramitação dos actos tendentes à venda executiva e subsequente distribuição do produto dessa venda.

  14. Pretende o legislador, assim, impedir que o mesmo bem possa ser alienado duas ou mais vezes em dois ou mais processos distintos, ou que o direito de um primeiro exequente (o que mais cedo logrou obter penhora) possa ser postergado apenas porque outro credor posterior viu o seu processo correr em tribunal ou juízo de tramitação mais célere (ou por menor pendência ou por maior eficácia dos seus serviços) ou adstrito a solicitador de execução mais diligente.

  15. Tem o normativo em apreço igualmente a função de garantir ao primeiro credor penhorante a manutenção da garantia proveniente da penhora e a respectiva execução no seu processo, uma vez que essa qualidade de credor com penhora efectuada não lhe atribui qualquer especial protecção em sede de citação de credores, designadamente para os efeitos previstos no art. 786.º do CPC.

  16. No entanto, a protecção conferida ao credor com primeira penhora é, nos termos da lei processual civil, controlável pelos credores com penhora subsequente e que ao processo primeiro tenham vindo reclamar créditos por força do disposto no aludido art. 794.º.

  17. Com efeito, estando a instância suspensa por inércia do exequente em promover os seus termos, pode o credor reclamante requerer o prosseguimento da execução para satisfação do seu crédito.

  18. Existe, assim, uma tutela do credor reclamante por força do preceituado no art. 794.º do CPC que lhe garante a execução do seu crédito em tempo útil, não ficando, por isso, totalmente refém da promoção do processo por parte do exequente.

  19. Aliás, jurisprudência há no sentido de que a sustação da execução nos termos do art. 794.º do CPC só deverá ocorrer se a execução da primeira penhora estiver em movimento, não fazendo sentido que se admita a reclamação de um crédito numa execução parada por inércia do exequente (neste sentido, Ac RP, de 30.05.89, BMJ 398º-581; Ac RP, de 21.07.83, BMJ 329º-620; Ac STJ, de 12.12.72, BMJ 222º-360).

  20. A razão de ser deste entendimento jurisprudencial prende-se com a circunstância de a protecção do credor reclamante no domínio da legislação processual civil não ocorrer na execução fiscal.

  21. Resulta daqui que encontrando-se o credor reclamante na absoluta dependência da iniciativa do Serviço de Finanças territorialmente competente, nenhum ato processual poderá praticar que lhe permita tomar a direcção do processo, impulsionando-o.

  22. Por este motivo, não podendo promover o serviço de finanças local o andamento dos autos de execução fiscal, o credor reclamante com execução própria instaurada e penhora registada posteriormente poderá ficar indefinidamente à espera de uma iniciativa processual que não consegue controlar e que poderá nunca vir a ocorrer.

  23. Tal situação é particularmente danosa para o credor reclamante que, tal como sucede no caso...

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