Acórdão nº 2036/17.3T8VRL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 30 de Maio de 2019

Data30 Maio 2019

Acordam em Conferência na Secção Cível da Relação de Guimarães A Autora CENTRO ABASTECEDOR DE ..., LDA, intentou ação de processo comum contra J. L., advogado, e ... COMPANHIA DE SEGUROS, S.A., peticionando: 1) Declarar-se que o primeiro réu exerceu o mandato que lhe foi conferido pela autora com negligência grave, omitindo atos processuais que poderia e deveria ter praticado e, por isso, adequados à perda de chance da autora e, nessa sequência: 2) Condenarem-se solidariamente os réus a pagar à autora, a título de indemnização por perda de chance a quantia global de 143.643,67€, tudo com juros calculados à taxa legal de 4%, desde a citação e até integral pagamento.

Alega, sinteticamente, que: (i) A autora mandatou o primeiro réu, a quem concedeu poderes forenses gerais e especiais para a representar no processo que correu termos sob o nº 3975/16.4T8VIS, na Comarca de Viseu, Viseu - Inst. Central - Sec. Comércio - J1 de Viseu; (ii) Por sentença de 01/08/2016, onde foi requerente, “C. L., Filho & Genro, Lda.”, foi declarada a insolvência desta, fixado o prazo de reclamação de créditos e designada a data da assembleia de credores; (iii) O primeiro réu, mandatado para o efeito deduziu a reclamação de créditos junto do Administrador da Insolvência em 25/08/2016, reclamando um crédito no montante de €. 143.643,67; (iv) Na sequência dessa reclamação foi elaborada a relação de créditos nos termos do artº 129º do CIRE, facto que foi notificado ao primeiro réu, por correio eletrónico a si dirigido; (v) Na relação de créditos foi reconhecido o crédito da autora, no montante de €. 58.486,01, tendo o crédito a natureza de privilegiado; (vi) Acontece que, em 28/09/2016 a ... – Caixa ... deduziu, no apenso processo de reclamação de créditos, impugnação de créditos onde se encontrava também impugnado o crédito da autora e que correu termos sob o nº 975/16.4T8VIS-A, do mesmo tribunal; (vii) O primeiro réu foi notificado dessa impugnação, através da plataforma “Citius” em 20/12/2016; (vii) Face a tal notificação o primeiro réu não deduziu qualquer resposta, no prazo de 10 dias que era o legal e desse facto não deu conhecimento à aqui autora e ali impugnada; (viii) Porque a referida impugnação não foi objeto de qualquer resposta foi a mesma julgada totalmente procedente e o crédito da autora eliminado da lista de créditos reconhecidos.

A Ré ... COMPANHIA DE SEGUROS, S.A. deduziu contestação, impugnando as alegações da Autora.

Concluiu, propugnando a improcedência da ação.

O Réu J. L., regularmente citado, não apresentou contestação Proferiu-se despacho saneador, bem como o despacho que identificou o objeto do litígio e enunciaram os temas da prova.

Efetivou-se a audiência final com observância do formalismo processual e foi proferida sentença que decidiu nos seguintes termos: “

  1. Condenar os Réus ... COMPANHIA DE SEGUROS, S.A. e J. L., solidariamente, a pagar à Autora sociedade CENTRO ABASTECEDOR DE ..., LDA a quantia de 85.000,00€ (oitenta e cinco mil euros), acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação até integral pagamento; B) Absolver os Réus ... COMPANHIA DE SEGUROS, S.A. e J. L. do demais peticionado; C) Condenar a Autora sociedade CENTRO ABASTECEDOR DE ..., LDA e os Réus ... COMPANHIA DE SEGUROS, S.A. e J. L. no pagamento das custas processuais em função do respectivo decaimento.” Inconformada com o decidido a ré seguradora interpôs recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões: “1. A doutrina da perda de chance apenas poderá ser atendida e/ou concretamente aplicada quando se demonstre a probabilidade séria, real e credível de sucesso de uma pretensão, não fosse a actuação profissional negligente e/ou omissiva incorrida pelo advogado, continuando a impender sobre o Autor (enquanto pretenso lesado) a demonstração dos factos que possam, a final, conduzir a apreciação positiva do juízo de prognose sobre a "chance perdida"; 2. No caso dos autos, encontrando-se inequivocamente demonstrado que a alegada omissão que a A. imputa ao Réu advogado nos autos do processo de insolvência n.º 3975/16.4T8VIS, foi de todo indiferente para o resultado final obtido pela aqui A. na aludida acção, nomeadamente no que diz respeito ao seu concreto ressarcimento dos (pretensos) créditos ali reclamados, não se encontrará demonstrado o nexo de causalidade necessário passível de gerar a responsabilização civil do R. advogado, e consequentemente, da R. seguradora, por via do contrato de seguro celebrado com a Ordem dos Advogados; 3. Tendo o douto Tribunal a quo delimitado os temas da prova, relativamente aos quais entendeu ser necessária a devida produção de prova, circunscrevendo assim a sua apreciação, por um lado, sobre a “1) conduta culposa do Réu J. L.", e bem assim sobre “2) A matéria atinente ao dano da perda de chance", não emitiu o douto Tribunal recorrido qualquer juízo de apreciação sobre os factos alegados em sede de contestação pela Recorrente, os quais integram precisamente o aludido 2.º tema de prova, ou seja, a matéria atinente ao dano de perda de chance; 4. Na verdade, os factos julgados provados na douta sentença em apreço, e que ficaram a constar dos pontos l.º a 20.º dos factos provados, apenas permitem a apreciação do julgador sobre o primeiro dos pressupostos legais previstos no artigo 483.º do c.c., passíveis de conduzir à obrigação de indemnizar - in casu, sobre o (pretenso) acto e/ou facto ilícito incorrido pelo Réu advogado; 5. Não permitindo, contudo, qualquer apreciação crítica e fundamentada sobre o (pretenso) dano de perda de chance, constante do tema da prova 2), o qual foi assim, salvo o devido respeito, incorrectamente apreciado e julgado pelo douto Tribunal a quo; 6. No que respeita à “matéria atinente ao dano de perda de chance", alegou a ora Recorrente ..., em sede de contestação, o seguinte facto hipotético, cuja apreciação concreta, afigurando-se essencial para a decisão respeitante ao aludido tema de prova 2) delimitado em sede de despacho saneador, foi absolutamente (e incompreensivelmente) olvidada pelo douto Tribunal a quo: “§ caso o l.º Réu tivesse apresentado reclamação à relação de créditos elaborada pelo Administrador de Insolvência nomeado nos autos do processos n.º 3975/16.4T8VIS (a qual reconheceu, efectivamente, o valor de € 58.486,01, como crédito privilegiado); ou ainda, §§ caso o l.º. Réu tivesse apresentado resposta à impugnação de créditos apresentada pela ... - Caixa ...; §§§ qual era a probabilidade do alegado crédito ser totalmente reconhecido e integralmente pago à A.?" -cfr. artigo 30.º da contestação da Ré, agora Recorrente ...; 7. Tendo a R. ... alegado ainda em sede de contestação que, para que se pudesse aferir do grau de probabilidade de sucesso da pretensão da A., não fosse a alegada conduta omissiva que imputa ao Réu advogado, sempre seria fundamental aferir-se: (i) "qual a composição do activo e do passivo constante da massa insolvente da referida sociedade "C. L., Filho & Genro, Lda." (cfr. artigo 34.º da contestação da Ré ...); (ii) "quais foram os créditos reclamados e reconhecidos nos autos do referido processo de insolvência (n.º 3975/16.4T8VIS), qual a sua graduação, e bem assim quais deles foram efectivamente pagos com o capital disponível na massa insolvente" (cfr. artigo 35.º da contestação da Ré ...); (iii) "qual a razão pela qual o crédito da A. sobre a massa insolvente no montante de € 58.486,01, foi inicialmente graduado como crédito privilegiado" (cfr. artigo 36.º da contestação da Ré ...); 8. Sendo que, a apreciação concreta de tais factos, afigura-se essencial para que o douto Tribunal recorrido possa emitir um juízo de probabilidade sobre a alegada "chance perdida", com base na qual a A. fundamenta a sua pretensão indemnizatória; 9. A esse respeito, resulta desde logo muito claro do depoimento prestado nos autos pela Administradora de Insolvência nomeada nos autos do processo n.º 3975/16.4T8VIS, Dra. A. G. (o qual se encontra gravado em ficheiro de áudio sob n.º 20180618122741_1331114_2871878, com início ao minuto 1.24 e fim ao minuto 11.59), que, contrariamente à conclusão inexplicavelmente alcançada pelo douto Tribunal a quo, a probabilidade do alegado crédito da A. ser reconhecido e integralmente pago à A. era manifestamente inexistente; 10. Na verdade, resultou ainda claro do depoimento prestado nos autos pela Administradora de Insolvência A. G. (com início ao minuto 3.43 do seu depoimento), que "o montante dos créditos reclamados e reconhecidos nos autos do processo de insolvência da sociedade C. L., Filho & Genro, Lda. rondam muito perto dos 6 milhões de euros"; 11. Esclarecendo ainda que os "bens móveis que nesta fase já estão liquidados ascendem à quantia de € 7.000,00", encontrando-se ainda em fase de avaliação os 18 a 20 bens imóveis apreendidos a favor da massa insolvente da sociedade "C. L., Filho & Genro, Lda.", cujo produto final não rondará, contudo, mais do que 1 milhão de euros; 12. Assim, e atendendo à delimitação do 2.º tema da prova, sempre deveria o douto Tribunal a quo ter dado como provado o seguinte facto, cuja redação muito respeitosamente, se sugere, e que permitirá a apreciação do tema respeitante à alegada perda de chance da A.: "20.A) O montante constante do passivo (créditos reclamados e reconhecidos) da sociedade insolvente "C. L., Filho & Genro, Lda." nos autos do processo n.º 3975/16.4T8VIS, ascende a 6 milhões de euros, constando, por outro lado, do activo da massa insolvente um acervo de 18 a 20 bens imóveis, avaliados em valor inferior a 1 milhão de euros"; 13. Para além disso, do depoimento prestado nos autos pela testemunha Dra. A. G. (com início ao...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT