Acórdão nº 140/16.4T8CBC.G2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 30 de Maio de 2019
Magistrado Responsável | RAQUEL BAPTISTA TAVARES |
Data da Resolução | 30 de Maio de 2019 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I. Relatório J. M.
e mulher, A. F.
, residentes no lugar e freguesia de ...
, concelho de ...
, e J. F.
e mulher, D. F.
, residentes no lugar de ...
, freguesia de ...
, concelho de ...
, propuseram a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra J. P.
e mulher, M. A.
, residentes na Rua da …, freguesia de ...
, concelho de ...
, pedindo: - seja reconhecido e declarado o direito dos Autores sobre ao prédio rústico sito no lugar e freguesia de ...
, denominado “...
” a confrontar do norte com A. A., sul corgo, nascente, caminho público e A. A. e do poente com António, inscrito na matriz sob o artigo ...
da agora União de Freguesias de ...
e ...
; - seja reconhecida e declarada a constituição de uma servidão, a favor do prédio dos Autores, de passagem, com assento na extrema norte do prédio dos Réus, ligando a estrada municipal ao prédio dos Autores; - a condenação dos Réus a ver reconhecido tal direito de servidão e a absterem-se da prática de quaisquer actos que a perturbem; - a condenação dos Réus a desobstruir a aludida servidão – caminho de passagem a pé para o prédio dos Autores - retirando todos os obstáculos aí colocados, designadamente as grades colocadas nos topos ou extremos da mesma; - a condenação dos Réus a pagar aos Autores uma indemnização pelos prejuízos sofridos pela impossibilidade do uso do prédio, a liquidar em execução de sentença, assim como numa sanção compulsória no valor de €50,00 por dia após trânsito em julgado da sentença que ordene a desobstrução da servidão.
Alegam, para tanto, e em síntese, que o seu prédio, bem como o prédio dos Réus, integrava um único prédio que pertencia aos avós de Autores e Réus; que o prédio foi posteriormente dividido em parcelas; que, para acesso à parcela de terreno que actualmente pertence aos Autores, era utilizado um caminho visível e trilhado, através da faixa de terreno actualmente pertencente aos Réus; que os Réus, após a divisão dos terrenos; construíram uma casa e um pátio, alterando por duas vezes o aludido caminho, com autorização dos Autores; que os Autores e seus antepossuidores sempre utilizaram o caminho bem como as sucessivas alterações para acesso ao seu terreno, à vista de toda a gente, sem qualquer oposição e na convicção que exerciam um direito próprio; e que os Réus taparam tal caminho, inicialmente com um muro e posteriormente com uma rede de vedação.
Citados os Réus, os mesmos apresentaram contestação, negando a existência da servidão, referindo que os Autores tinham acesso ao seu prédio através de outro caminho e alegando que, mesmo que tivesse existido, já se mostrava extinta por desnecessidade e não uso.
Foi realizada audiência prévia, onde foi proferido despacho saneador, se identificou o objecto do litígio e se enunciaram os temas da prova.
Veio a efectivar-se a audiência de discussão e julgamento com a prolação de sentença nos seguintes termos, no que concerne à parte dispositiva: “Em face do exposto, o Tribunal decide julgar a presente acção parcialmente procedente e, em consequência: “a) Declarar que os Autores são donos e legítimos proprietários do prédio rústico denominado “...
” a confrontar do norte com A. A., sul corgo, nascente, caminho público e A. A. e do poente com António, inscrito na matriz sob o artigo ...
da agora União de Freguesias de ...
e ...
; b) Absolver os Réus do demais peticionado.
* Não obstante o reconhecimento da propriedade do terreno reivindicado pelos Autores, entende-se que, atenta a irrelevância prática de tal reconhecimento, deverão ser estes a arcar com a totalidade das custas da presente acção, nos termos do art.º 527.º, n.ºs 1 e 2, do Cód. Proc. Civil).
Registe e notifique”.
Inconformados, os Autores vieram interpor recurso da sentença.
Foi proferido acórdão nesta Relação (fls. 266 a 287) onde se decidiu anular a sentença recorrida e determinar a ampliação da matéria de facto e a repetição parcial do julgamento para apurar se a passagem deixada pelos Réus após a aquisição do terreno a H. F. se destinou a dar acesso à mãe dos Autores para o seu prédio (servidão de passagem) e por isso lhe entregaram a chave (artigo 82º da petição inicial) ou a dar acesso aos próprios Réus, a sua mãe e irmãos nos termos alegados nos artigos 64º e 65º da contestação e a que título foi efectuada a entrega da chave aos pais dos Autores, e ainda a actuação (utilização) dos próprios Autores relativamente a tal passagem, nos termos indicados no acórdão, sem prejuízo da apreciação de outros pontos da matéria de facto com o fim de evitar contradições, devendo ainda o tribunal a quo pronunciar-se sobre a existência dos lapsos invocados pelas partes nas alegações e contra-alegações.
Veio a efectivar-se novamente audiência de discussão e julgamento com a prolação de sentença nos seguintes termos, no que concerne à parte dispositiva: “Em face do exposto, o Tribunal decide julgar a presente acção parcialmente procedente e, em consequência: a) Declarar que os Autores são donos e legítimos proprietários do prédio rústico denominado “...” a confrontar do norte com A. A., sul corgo, nascente, caminho público e A. A. e do poente com António, inscrito na matriz sob o artigo ... da agora União de Freguesias de ... e ...; b) Absolver os Réus do demais peticionado”.
Novamente inconformados vieram os Autores interpor recurso, concluindo as suas alegações da seguinte forma: “III – CONCLUSÕES 1. Os Autores propuseram a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra os Réus, pedindo, entre o mais, que se reconheça e declare a existência de uma servidão de passagem, a pé, a favor do prédio dos Autores, com assento na extrema norte do prédio dos Réus, ligando a estrada municipal à ....
-
Para tanto, os Autores alegaram que o seu prédio, bem como o prédio dos Réus, constituíram um único prédio, sito no lugar e freguesia de ..., denominado “Campo dos ...”, que foi propriedade de M. J. e José, avós de Autores e Réus – cfr. facto provado n.º 3.
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Por óbito de M. J., em 11/04/1962, procedeu-se – por escritura pública lavrada no dia 14 de Outubro de 1964, no livro nº 54 do extinto Cartório Notarial de ..., de fls. 11-V a 16 V - … – à partilha dos bens que constituíam a herança deixada pela falecida – cfr. factos provados n.os 4 e 5.
-
No âmbito de tal partilha, entre o mais, foi adjudicado a José, viúvo de M. J., metade do prédio denominado “Campo dos ...” e, a cada um dos seus filhos – F. A. e C. F. – uma quarta parte indivisa de tal prédio – cfr. facto provado n.º 6.
-
Após a operação de partilha, o José doou aos seus filhos os bens que lhe haviam sido adjudicados em consequência da referida partilha, pelo que o prédio denominado “Campo dos ...” ficou a pertencer em partes iguais aos seus filhos F. A. e C. F., respectivamente pai da Autora e mãe da Ré – cfr. facto provado n.º 7.
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Em data não concretamente apurada, mas anteriormente ao ano 1971, os irmãos F. A. e C. F. acordaram, verbalmente, em dividir o prédio denominado “Campo dos ...” em duas partes, ficando a pertencer desde então: − A parte nascente, constituída por uma vessada conhecida por “...”, ao António, pai e sogro dos Autores; − A parte poente, conhecida por “...”, à C. F., mãe e sogra dos Réus (cfr. facto provado n.º 8).
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O prédio denominado “...” adveio, posteriormente – por escritura de 23 de Outubro de 2009 da Notária L. M., com Cartório em ... - ... –, à posse e propriedade dos Autores por lhes haver sido adjudicado na partilha das heranças abertas por óbito de F. A. e L. F., pais dos Autores Aurora e J. F. – cfr. facto provado n.º 9.
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Por sua vez, a parte denominada “...” foi sucessivamente dividida, tendo os pais da Ré construído uma casa de habitação de rés-do-chão e primeiro andar na extrema sul poente dessa parte, e autorizado três das suas filhas, entre as quais a Ré, a construírem casas ao longo da Estrada Municipal que confronta com tal prédio – cfr. facto provado n.º 10.
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Os Réus, no terreno que lhes foi doado – parcela extraída da esquina norte-poente do terreno denominado “...” – iniciaram, em 1977, próximo do limite norte, a construção de uma casa (cfr. factos provados n.os 11 e 12), implantando-a sobre um caminho de passagem a pé, que seguia, já anteriormente à propriedade ter sido dividida, até à “...”.
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Quando os Réus construíram a sua habitação e destruíram o trilho original daquele caminho, deixaram em aberto um espaço, de cerca de um metro de largura, entre a sua habitação e o terreno pertencente ao vizinho H. F. – cfr. facto provado n.º 23 –, alterando, então, para esse local, o aludido caminho.
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Alguns anos mais tarde, aquando da aquisição do terreno ao vizinho H. F., os Réus ocuparam e vedaram o espaço que então haviam deixado em aberto, nele tendo construído um jardim e um quintal. Porém, novamente, foi deixado em aberto um espaço, com um metro de largura, entre a vedação por si construída e o prédio vizinho – cfr. factos provados n.os 23, 24 e 25 –, pelo que foi, então, aquele caminho de servidão para aí mudado.
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Após terem construído e vedado a sua casa de habitação, os Réus colocaram no início do tal espaço deixado em aberto, junto à Estrada Municipal, uma cancela, tendo sido entregue uma cópia da chave da mesma aos pais dos Autores – cfr. factos provados n.os 27 e 28.
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Tal passagem foi utilizada por diversas pessoas, entre as quais a mãe dos Autores, e era trilhada e calcada, tendo bordos perfeitamente definidos e delimitados – cfr. facto provado n.º 29.
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Os Autores e a sua mãe, a partir, pelo menos, de 1977, utilizaram o caminho para acederem, a pé, aos seus terrenos – a “...” –, à vista e com o conhecimento de toda a gente – designadamente dos Réus e seus antepossuidores –, sem interrupção, nem qualquer oposição e na convicção de que exerciam um direito próprio de passagem – cfr. factos provados n.os 22 e 30.
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No ano de 2011, os Réus taparam tal caminho com um muro em cimento, tendo-o posteriormente substituído por uma vedação em grade de...
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