Acórdão nº 1012/15.5T8VRL-AT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 02 de Maio de 2019
Magistrado Responsável | ALCIDES RODRIGUES |
Data da Resolução | 02 de Maio de 2019 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório No apenso de reclamação de créditos, na sequência da declaração de insolvência de “M. R., Lda.”, a correr termos Juízo Local Cível de Vila Real – Juiz 1 – do Tribunal Judicial da Comarca de Vila Real, veio o credor “Banco ..., SA”, atualmente substituído processualmente por “X, SA” e “Banco ..., SA”, impugnar o crédito (de € 57.000,00) reconhecido a C. F. e mulher A. M..
Impugna o aludido crédito, quer quanto à sua existência, quer quanto à natureza garantida do mesmo, por direito de retenção sobre a verba n.º 30 do auto de arrolamento de bens.
*Responderam à impugnação do Banco ... os credores C. F. e A. M., mantendo o alegado na reclamação e pugnando pela improcedência da impugnação.
*Na sequência do despacho que ordenou a adequação formal dos autos, com vista à tramitação em separado das impugnações, foi proferido despacho saneador quanto à presente impugnação, com a identificação do objeto do processo e enunciação dos temas da prova.
*Realizou-se audiência de julgamento.
*No decurso da audiência, os credores C. F. e A. M. declararam pretender que fossem atendidos os factos atinentes à qualidade de consumidores resultantes da audiência, nos termos do disposto, entre outras normas, no artigo 5º, nº 2, al. b) do CPC “ex vi” do artigo 17º do CIRE.
* Posteriormente, a Mm.ª Julgadora “a quo” proferiu decisão final, datada de 8/11/2018, (cfr. fls. 32 a 41), nos termos da qual decidiu julgar «a impugnação deduzida pelo credor hipotecário totalmente improcedente e em consequência: I – Reconhece[u] o crédito reclamado pelos credores C. F. e A. M., nos termos constantes da lista de créditos reconhecidos, pelo valor de € 57.0000,00 (cinquenta e sete mil euros), garantido por direito de retenção sobre a verba nº 30 do auto de arrolamento (ref.ª 644452, apenso M)».
*Inconformada, a impugnante X, S.A. interpôs recurso da sentença (cfr. fls. 2 a 10) e, a terminar as respectivas alegações, formulou as seguintes conclusões (que se transcrevem): «A. Vem a aqui Recorrente interpor o presente recurso da sentença que reconhece o crédito reclamado pelos credores C. F. e A. M., pelo valor de € 57.0000,00 (cinquenta e sete mil euros), garantido por direito de retenção sobre a verba n.º 30, por não se conformar com a mesma.
-
A matéria de facto assente e dada como provada na douta sentença em apreço e relevante para a boa decisão da causa é a seguinte: 1. Por sentença de 10/07/2015, transitada em julgado, foi decretada a insolvência de “M. R., Lda.”.
-
Por escritura pública celebrada em 28/04/2009, e competente documento complementar que a integra, no Cartório Notarial de Vila Real, perante a Notária M. J., a insolvente “M. R., Lda.” Constituiu a favor do Banco impugnante hipoteca para garantia do bom cumprimento de todas e quaisquer obrigações e responsabilidades que existam ou venham a existir, em seu nome, emergentes ou resultantes de operações de crédito concedidas ou a conceder pelo Banco impugnante, até ao valor limite de quatro milhões e seiscentos mil euros, conforme Doc.1 junto com a impugnação do Banco cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido.
-
A referida hipoteca foi constituída sobre diversos imóveis, bem como sobre quaisquer benfeitorias neles a realizar, todos situados na Quinta do ..., freguesia de Vila Real (...), concelho de Vila Real, inscritos a favor da insolvente pela Ap. 1 de 1991/12/09, nomeadamente: a. Prédio urbano, composto por parcela de terreno para construção, designado por lote ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Real, sob o número .../Vila Real (...), inscrito na respetiva matriz sob o artigo ... (cfr. Doc.1); b. Prédio urbano, composto por parcela de terreno para construção, designado por lote ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Real, sob o número .../Vila Real (...), inscrito na respetiva matriz sob o artigo ... (cfr. Doc.1); c. Prédio urbano, composto por parcela de terreno para construção, designado por lote ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Real, sob o número .../Vila Real (...), inscrito na respetiva matriz sob o artigo ... (cfr. Doc.1).
-
A hipoteca foi registada a favor do Banco impugnante na Conservatória do Registo Predial de Vila Real pela AP. 3043 de 2009/04/07, conforme Doc. 2, Doc. 3 e Doc. 4 juntos com a impugnação do credor “Banco ...”, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
-
Por documento particular datado de 19/07/2013, com reconhecimento por semelhança de assinaturas datado de 31/10/2014, denominado “Contrato Promessa de Compra e Venda”, “M. R., Lda.” representada pelo seu sócio gerente M. R., declarou prometer vender C. F. e A. M., e estes declararam prometer comprar, livre de ónus e encargos, pelo preço de € 142.500,00 (cento e quarenta e dois mil e quinhentos euros), a fração autónoma designada pela letra .., tipo T3, situada no .. andar direito, com 1 lugar de garagem na cave n.º .., situado no prédio a construir em regime de propriedade horizontal descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Real sob o n.º .../20090127 e inscrito na matriz sob o artigo ...°, atual artigo 21 da União de Freguesias de Vila Real no loteamento do ..., Vila Real (conforme doc. nº 1 junto com a resposta dos credores C. F. e A. M., que aqui se dá por reproduzido).
-
Mais declararam os outorgantes que o ajustado preço de € 142.500,00 seria pago nos termos e prazos seguintes: a. A título de sinal e princípio de pagamento, a quantia de € 20.000,00 (vinte mil euros) no dia 24/07/2013; b. Em 05/08/2013 a quantia de € 37.500,00 (trinta e sete mil e quinhentos euros); c. A restante parte do preço seria paga pelos promitentes-compradores, no ato da escritura prometida, no valor de € 85.000,00 (oitenta e cinco mil euros).
-
Por documento particular, datado de 01/08/2013, a insolvente e os credores celebraram um aditamento ao acordo mencionado em 6, nos termos do qual: a. Em 5/08/2013 os credores pagariam a quantia de 37.000,00€ (trinta e sete mil euros); b. E o restante valor de 85.500,00 € (oitenta e cinco mil e quinhentos euros) seria pago no ato da escritura definitiva de compra e venda (cfr. Doc. 3 junto com a resposta dos credores, que aqui se dá por reproduzido).
-
Os Credores entregaram à insolvente a quantia de € 57.000,00 (cinquenta e sete mil euros), através dos cheques nº 6160407506, datado de 22 de julho de 2013 e nº 5260407507, datado de 5 de agosto de 2013, sacados sobre a Caixa ..., cuja titular é M. C., os quais foram descontados da sua conta, respetivamente, em 26/07/2013 e 09/08/2013.
-
-
A matéria de facto não provada salienta o facto de que não ficou provado que os Credores praticaram atos sobre a fração e lugar de garagem na intenção e convicção de que os mesmos lhes pertenciam, como se a coisa sua fosse.
-
Ao contrário do entendimento do douto Tribunal a quo, não ficaram provados os seguintes factos: 1. Os Credores entregaram à insolvente a quantia de € 57.000,00 (cinquenta e sete mil euros), a título de sinal, através dos cheques nº 6160407506, datado de 22 de julho de 2013 e nº 5260407507, datado de 5 de agosto de 2013, sacados sobre a Caixa ..., cuja titular é M. C., os quais foram descontados da sua conta, respetivamente, em 26/07/2013 e 09/08/2013.
-
A fração destinava-se à sua habitação.
-
-
Em sede de audiência e discussão de julgamento e com o depoimento das várias testemunhas arroladas pelos Credores, ficou claro e tal como consta da douta sentença ora recorrida, que os credores entregaram dois cheques, um no valor de € 20.000,00 (vinte mil euros) e outro no valor de € 37.000,00 (trinta e sete mil euros), em datas distintas.
-
Dir-se-á que andou mal o douto Tribunal ao considerar o pagamento destes dois cheques como pagamento a título de sinal de um contrato-promessa, quando nem o próprio contrato-promessa o classifica como tal, dando essa classificação apenas e tão só ao pagamento do valor de € 20.000,00 (vinte mil euros).
-
Uma coisa é o valor pago a título de sinal, outra coisa completamente distinta é o valor de uma entrada inicial para beneficiar de algum privilégio junto de uma instituição bancária, pelo que não se concebe aqui o entendimento do douto Tribunal a quo.
-
Mais, não pode a aqui Recorrente concordar com a afirmação de que a fração ora em apreço se destinava a habitação dos Credores, porquanto os mesmos nada fizeram para que a mesma se tornasse habitável, nem tão-pouco alguma vez lá moraram, como aliás, ficou provado com toda a prova testemunhal produzida, como melhor se entenderá com a exposição infra.
I. Surpreendeu-se a aqui Recorrente com a afirmação pelo douto Tribunal a quo de que existiu um acordo entre a insolvente e os credores A. S. e A. A. para que estes procedessem à conclusão das obras na fração sub judice.
-
Ora, não pode a aqui Recorrente concordar com tal afirmação, porquanto ficou provado de que os Credores nunca fizeram qualquer obra no apartamento, nem tão-pouco nele habitaram alguma vez.
-
Diz-nos o artigo 441.º do Código Civil (adiante abreviadamente designado por CC) que: “No contrato-promessa de compra e venda presume-se que tem carácter de sinal toda a quantia entregue pelo promitente-comprador ao promitente-vendedor (…)”.
L. No aditamento do contrato-promessa sob análise, consta da sua cláusula Segunda, n.º 1, al. a) que a título de sinal seria entregue pelos promitentes-compradores (os aqui Credores) ao promitente-vendedor (o aqui Insolvente), a quantia de € 20.000,00 (vinte mil euros).
-
Ora, não se concebe que o Tribunal a quo tenha entendido como pagamento de sinal a quantia de € 57.000,00 (cinquenta e sete mil euros), quando na verdade o próprio contrato-promessa apenas se refere à quantia de € 20.000,00 (vinte mil euros), como tendo sido paga a título de sinal.
-
Assim, conclui-se que a ter sido paga qualquer quantia a título de sinal, questão que só por um mero dever de patrocínio se coloca, terá sido a quantia de € 20.000,00 (vinte mil euros) e...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO