Acórdão nº 1933/17.0T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 02 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelPAULO REIS
Data da Resolução02 de Maio de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I. Relatório M. A., M. J., e F. N. instauraram ação declarativa sob a forma de processo comum contra X Portugal - Companhia de Seguros, S.A., pedindo a condenação da ré no pagamento: A) À autora M. A.: Da quantia de € 15.436,20, sendo € 6.625,17 referente ao valor de reparação da viatura; € 7.965,00 relativa ao dano pela privação do uso do veículo LH; e € 846,03 respeitante ao relatório pericial, aos IUC e à cópia do auto da GNR; B) À autora M. J.: Da quantia de € 29.091,54 sendo: € 13.000,00 referente a danos não patrimoniais; € 692,80 respeitante à perda de retribuições durante a baixa médica; € 1.610,18 referente a despesas médicas, medicamentosas e outras; € 13.788,56 a título de IPP e dano futuro que ficou a padecer; C) Ao autor F. N.: Da quantia de € 5.688,57, sendo € 688,57 (seiscentos e oitenta e oito euros e cinquenta e sete cêntimos), relativa a danos patrimoniais; e € 5.000,00 (cinco mil euros), a título de danos não patrimoniais.

Mais pediram a condenação da ré no pagamento de juros de mora que deverão acrescer às quantias parcelares indicadas em A) a C), à taxa legal de 4% desde a citação e até à data do efetivo e integral pagamento.

Os autores formularam os aludidos pedidos a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos em virtude de acidente de viação, ocorrido a 03-04-2014, pelas 1h10, na Avenida …, na freguesia de ..., Barcelos, EN n.º 306 em que foram intervenientes os veículos LH, propriedade da autora M. A. e, na altura, conduzido pelo autor F. N., e QQ, na altura conduzido por J. F., a cujo condutor atribuem a culpa exclusiva na produção do acidente, alegando ainda que o proprietário de tal veículo tinha transferido para a ré a responsabilidade civil por danos causados a terceiros.

A ré contestou, impugnando, por desconhecimento, a descrição do acidente efetuada pelos autores e os danos invocados, bem como sustentando a excessiva onerosidade da reparação do veículo e, quanto à privação do uso, alegando que a 1.ª Autora M. A. dispunha de outros meios de deslocação.

Dispensada a realização da audiência prévia, foi proferido o despacho saneador, após o que foi selecionado o objeto do litígio e enunciaram-se os temas da prova, em termos que não mereceram reclamação das partes.

Admitidos os meios de prova, foi realizada a audiência final, após o que foi proferida sentença que decidiu o seguinte: «Em face do exposto, julgo a ação parcialmente procedente, e, em consequência: A. Condeno a Ré X PORTUGAL – COMPANHIA DE SEGUROS, SA, a pagar: i) À 1.ª Autora M. A. a quantia de € 1.870,00 (mil oitocentos e setenta euros), a título de danos patrimoniais, vencendo juros à taxa legal de 4%, desde a citação até integral pagamento, sem prejuízo de posterior alteração legislativa; ii) À 2.ª Autora M. J.: 1. A quantia indemnizatória de € 4.376,42 (quatro mil trezentos e setenta e seis euros e quarenta e dois cêntimos), a título de danos patrimoniais, vencendo juros à taxa legal de 4%, desde a citação até integral pagamento, sem prejuízo de posterior alteração legislativa; 2. A quantia indemnizatória de € 8.000,00 (oito mil euros), para compensação do dano biológico, sobre a qual vencem juros, desde a data da prolação da presente decisão até integral pagamento, à taxa legal de 4% (sem prejuízo de posterior alteração legislativa); 3. A quantia indemnizatória de € 5.000,00 (cinco mil euros), para compensação dos danos não patrimoniais, sobre a qual vencem juros, desde a data da prolação da presente decisão até integral pagamento, à taxa legal de 4% (sem prejuízo de posterior alteração legislativa); e i) Ao 3.º Autor F. N. a quantia indemnizatória de € 338,57 (trezentos e trinta e oito euros e cinquenta e sete cêntimos), a título de danos patrimoniais, vencendo juros à taxa legal de 4%, desde a citação até integral pagamento, sem prejuízo de posterior alteração legislativa; B.

Absolvo a Ré X PORTUGAL – COMPANHIA DE SEGUROS, SA, do restante peticionado.

As custas da presente ação são da responsabilidade de ambas partes, na proporção do respetivo decaimento (cfr. artigo 527º/1,2, do CPCiv).

Valor da ação: o fixado a fls. 97.

Registe e notifique.

Dê pagamentos às faturas apresentadas pelo GML (cfr. fls. 152 e 165), entrando, oportunamente, em regra de custas.» Inconformada, veio a ré interpor recurso da sentença proferida, terminando as respetivas alegações com as seguintes conclusões (que se transcrevem): «1. Os pontos da matéria de facto dada como provada sob os itens 6, 7, 8, 9, 10, 11, 13 e 14 não deveriam ter sido dados como provados, devendo antes ser dados como não provados.

  1. Com efeito, como resulta das declarações de parte do próprio autor F. N., condutor do LH - transcritas no corpo das presentes alegações e que aqui se dão por reproduzidas - a responsabilidade na ocorrência do acidente dos autos compete-lhe exclusivamente.

  2. Perante a aproximação de um veículo em contramão, o condutor do LH deveria, além de alertar o outro condutor por sinais luminosos e sonoros, ter reduzido a velocidade ou imobilizado o seu veículo e encostar-se o mais possível à sua direita, de modo a deixar livre o máximo espaço possível na via que permitisse a passagem do outro veículo.

  3. Inversamente, o condutor do LH (o autor F. N.), não obstante ter feito sinais luminosos e sonoros, não só não abrandou nem encostou o mais possível à sua direita como, pelo contrário, acelerou e guinou totalmente para a sua esquerda, ocupando a faixa contrária.

  4. O condutor do QQ, ainda que corrigindo a sua trajectória, encontrou a sua faixa de rodagem ocupada pelo LH e ficou sem qualquer espaço para passar, não podendo evitar o acidente.

  5. O condutor do QQ foi surpreendido pela manobra do LH, de tal modo que travou, deixando rastos dessa travagem no pavimento, como consta do auto de ocorrência.

  6. No desenho aposto na declaração amigável de fls. 102 e 103 assinada pelo próprio F. N., junta pela Companhia de Seguros Y (e que não foi impugnada pelos autores), pode ver-se que o veículo QQ (“veículo B”) é figurado inteiramente dentro da sua hemifaixa, enquanto o veículo LH (“veículo A”) transpõe a linha descontínua e invade integralmente a faixa daquele.

  7. Este documento, conjugado com as declarações do F. N., condutor do LH e acima transcritas, impõe a conclusão de que o acidente só aconteceu pela sua manifesta imperícia e falta de senso comum, ao realizar a manobra temerária que realizou.

  8. O excesso de velocidade do veículo QQ não foi a causa do acidente dos autos.

  9. Deste modo, impõe-se a revogação da douta sentença recorrida e a absolvição da ré dos pedidos formulados pelos autores.

  10. A douta sentença recorrida violou o disposto no artigo 607º, nº 5 do C.P.C.

    Termos em que deve ser revogada a douta decisão recorrida e a recorrente absolvida dos pedidos, como é de inteira JUSTIÇA».

    Também os autores vieram interpor recurso recurso da sentença proferida, terminando as respetivas alegações com as seguintes conclusões (que se transcrevem): «1. O presente recurso de apelação tem por objecto o julgamento da matéria de direito, e visa parte da decisão que foi desfavorável aos AA. M. A., M. J. e F. N.; 2. A recorrente M. A. não concorda com a compensação atribuída a título de indemnização pela privação do uso de veículo, no valor de 60,00 €, por entender que a mesma é irrisória desproporcional, desajustada e injusta ao caso em apreço, violadora do princípio da equidade e justiça, e por isso merece censura; 3. Desde logo, mostra-se provado nos pontos 22, 23, 24 e 25 da matéria fáctica, que a 1.ª A. viu-se privada da utilização do seu veículo desde a data do acidente, uma vez que este não mais pode circular, cobrando as empresas de rent-a-car aluguer diário de uma viatura de gama média o montante de € 7,50; 4. Salvo melhor entendimento, entende a recorrente M. A. que se encontra desajustada a indemnização atribuída de 60,00 € pela privação do uso do veículo, na justa medida em que estamos diante uma viatura com perda total, o que por si só configura um grande desgosto e sentimento de perda para a A.; 5. Apesar de nos presentes autos não se ter apurado a concreta realização de despesas feitas pela lesada em consequência dessa privação, resultou apurado que não lhe foi atribuído veículo de substituição e que a A. emprestava o uso do LH à sua filha, a falta deste veículo causou transtornos na vida privada da 1.ª A., que deixou de o poder destinar às necessidades da sua filha, a 2.ª A.; 6. A medida da indemnização terá que ser determinada com recurso à equidade (art. 566º, nº 3 do C.C.), havendo que encontrar em termos quantitativos um valor que se mostre adequado a indemnizar o lesado pela paralisação diária de um veículo que satisfaz as suas necessidades básicas diárias.

  11. Os meros dados conferidos pela experiência revelam que de modo algum se pode considerar que a quantia de 60,00 € arbitrada pela perda total de uma viatura, cuja privação do uso decorre desde a data do acidente (03.04.2014) até, pelo menos, à data da propositura da acção, se revele justa e equitativa; 8. Tal quantia arbitrada para indemnização pela privação do uso é seguramente bem inferior àquela que porventura a A. teria de suportar se tivesse usado, como era seu direito, da outra alternativa, isto é, da apresentação das facturas relacionadas com o aluguer de um veículo ou da apresentação de recibos pela utilização de transportes públicos, incluindo o uso de táxi.

  12. Tendem a admitir a doutrina e jurisprudência que, ao lado do dano de natureza patrimonial, possa surgir um outro, relativo à perturbação e, mesmo, ao sofrimento psicológico que a privação de uso venha a implicar: se, «em bom rigor, estamos a falar dum bem imaterial ou que, pelo menos, só se materializa pelo sentimento de bem-estar que o gozo, fruição e disposição da viatura proporcionam ou pelo sentimento de perda e frustração que a não possibilidade de usar, fruir ou dispor da viatura incutem» (Ac. da RL, de...

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