Acórdão nº 140/17.7T8CBC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 02 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelJOAQUIM ESPINHEIRA BALTAR
Data da Resolução02 de Maio de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam em Conferência na Secção Cível da Relação de Guimarães B. T. e mulher M. P., intentaram a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra o Município X, formulando os seguintes pedidos: 1. Que se declare, e seja o réu condenado a reconhecer, o seu direito de propriedade sobre o prédio denominado “Tapada ...”, descrito na Conservatória do Registo Predial de X com o n.º ... e inscrito na matriz na respetiva matriz sob o artigo ....º; 2. que seja o réu condenado a repor o referido prédio na situação anterior às escavações e remoção de terra ocorridos em 12-06-2017, pelas 09:10 horas; 3. que seja o réu condenado a não praticar quaisquer atos que atentem contra o direito de propriedade dos autores.

Para o efeito, e em suma, invocando factos conducentes, na sua perspetiva, ao reconhecimento, derivado e originário, do seu direito de propriedade sobre o prédio “Tapada ...”, os autores alegaram que o réu, por intermédio dos seus funcionários, no dia 12 de junho de 2017, pelas 09:10 horas, com uma máquina retroescavadora, começou a escavar na borda sul, a meio daquele prédio dos autores, tendo daí removido terra, que carregou e transportou para local desconhecido num veículo propriedade da Câmara.

O réu apresentou contestação, por impugnação e por exceção, alegando, com relevo e em síntese, que a parcela de terreno em que procedeu à escavação e à remoção de terras, faz parte integrante de um caminho público, conhecido como “caminho do ...”, designadamente a área do entroncamento entre esse caminho e a Rua ..., onde, entre finais de 2015 e inícios de 2016, os autores já haviam procedido à movimentação de terras e à colocação de pedras de dimensão significativa, assim impedindo a passagem de qualquer tipo de trânsito.

Responderam os autores, impugnando, em suma, a matéria de exceção invocada pelo réu e, bem assim, a fidedignidade da documentação junta com a contestação.

Foi realizada audiência prévia, onde foram fixados o objeto do litígio (para onde se remete) e os temas da prova, conforme resulta da respetiva ata (de fls. 129 e ss.).

Realizado o julgamento com a observância do formalismo legal foi proferida sentença que decidiu: “Nestes termos, por parcialmente provada, julgo parcialmente procedente a presente ação e, em consequência: a) Declaro os autores proprietários do prédio denominado “Tapada ...”, descrito na Conservatória do Registo Predial de X com o n.º ... e inscrito na matriz na respetiva matriz sob o artigo ....º; b) Absolvo o réu dos restantes pedidos.” Inconformados com o decidido os autores interpuseram recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões: “I.- DA IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO 1.- Os Recorrentes não se conformam com a decisão sobre a matéria de facto provada sob os pontos 5 a 18 da decisão sobre a matéria de facto provada, que deveria antes ter sido declarada não provada.

  1. - E também não se conformam com a decisão do ponto da matéria de facto declarada não provada, que deveria antes ter sido declarada provada.

  2. - Decorre do depoimento dos Autores e ainda das testemunhas M. G., M. F., S. R. e M. C., que a parcela de terreno em discussão, e que fazia parte integrante do prédio dos Recorrentes, não integra a via pública conhecida como “caminho do ...”, com o trajeto, fim e inicio e composição, apontados aos pontos 5, 6, 7, 8, 12, 13 e 14 dos factos provados.

  3. - A jusante do prédio dos Recorrentes acede-se ao rio, não existindo qualquer utilidade ou afetação de interesse público em tal travessia.

  4. - A travessia que era feita, vários anos atrás, era restrita ao acesso aos moleiros, e por um outro trajeto, direto, e afastado do prédio dos Recorrentes; 6.- A única passagem que existia no prédio dos Recorrentes restringia-se à necessidade de roçar o mato, e nunca era feita com entrada a montante e saída a jusante, pois que quem exercia tal tarefa, aí acedendo com tratores, regressava para a rua por onde entrava.

  5. - Decorre do depoimento da testemunha M. F. que o prédio dos Autores, e a parcela de terreno em discussão, não constituía qualquer caminho público, e que anteriormente existira um caminho, mas não inteiramente transitável por veículos, que tinha um trajeto diferente e que atravessava outras propriedades, distantes do prédio dos Autores, e alcançava a Rua ... apenas a pé, mas que prosseguia noutra direção, oposta ao prédio dos Autores.

  6. – Decorre do depoimento da testemunha S. R. que existia previamente um caminho que tinha um trajeto diferente, e que passava junto à casa dos seus tios (os moleiros), e na propriedade destes, mas que ia numa direção oposta do prédio dos seus pais e aqui Autores, ao alcançar a Rua ..., sendo que os vestígios de tal trajeto estavam a ser ocultados com entulho.

  7. - Mais decorre de tal depoimento que a referida parcela de terreno que integra a propriedade dos Autores, e reclamada pelo município, não era usada por qualquer freguês.

  8. - Decorre do depoimento da testemunha M. C., que participou na compra e venda do referido terreno e prédio dos Autores, que pelo seu interior não existia qualquer caminho, e que existia apenas um carreiro onde os tratores entravam, muitas vezes de marcha-atrás, para carregar o mato.

  9. - Mais decorre de tal depoimento que um anterior caminho que existia para passagem a pé, mais adiante a alcançar a Rua ..., atravessava os prédios de António, o moleiro, que os vedou com a construção de vinhas.

  10. - As testemunhas arroladas pelo Réu Município, e que foram levadas pelo Presidente da Junta e “umas senhoras” a ver a putativa saída do caminho pela parcela de terreno do prédio dos Recorrentes, demonstraram ser tendenciosas e parciais.

  11. - A testemunha I. P. apenas conhecia e via utilidade no caminho até aos moleiros, para ir à farinha, não vendo o motivo pelo qual haveria necessidade de prosseguir tal caminho para jusante.

  12. - A referida testemunha I. M. comprova que o caminho do ... não passava pelo prédio dos Autores, que era terreno de monte. De resto, questionada sobre se ia “lá baixo” a mesma colocou a seguinte interrogativa: “vinha cá baixo fazer o quê? 15.- A testemunha I. P., de 88 anos de idade, foi recolhida em casa por umas senhoras encomendadas pelo Presidente da Junta, para ir ver a casa dos Autores e para afirmar que a parcela de terreno que integra o prédio destes, e em que o Município Réu pretendeu realizar obras, era um antigo caminho.

  13. - Mas essa testemunha, orientada nesse depoimento, acabou por atestar e comprovar precisamente o contrário do que o que o Réu Município pretendia demonstrar: a) O único trajeto existente anteriormente ia desembocar ao moleiro (prédio vizinho, do cunhado dos Autores); b) “aquilo”, referindo-se a tais terrenos, era “tudo monte”; c) E a testemunha “o que é que ia fazer lá abaixo?”, revela que para baixo, e no sentido para onde o Réu pretende abrir um caminho, atravessando o prédio dos Autores, não existia nem existe qualquer destino, sendo que o único atravessadouro que existia destinava-se a aceder ao moleiro.

  14. - Por outro lado, não deixa de ser no mínimo curioso que o Réu tenha tido a necessidade de ir recolher uma pessoa de 88 anos de idade a casa, sem poder locomover-se, para procurar demonstrar a existência de um caminho público que alega existir desde tempos imemoriais e sempre ter sido transitado a pé e de carro por habitantes da freguesia.

  15. - As testemunhas I. P. e Maria realçaram que não havia acesso a jusante, pois que de outra forma teriam que “saltar” as bordas, ou seja, os taludes.

  16. - Decorre do depoimento desta testemunha que o caminho que ela utilizava destinava-se a ir ao moleiro, porque não ia avançar bordas (taludes).

  17. - Esta testemunha confirma a tese e versão dos Autores que o único trajeto que existia era um atravessadouro para os locais se deslocarem ao moleiro, e regressarem, a pé.

  18. - E tal trajeto não era pelo prédio dos Autores, pois que, conforme referiu a testemunha F. S., Presidente da Junta, era um desvio muito grande ter que passar por aquele caminho, para depois voltar atrás e ir ao moleiro.

  19. - E mais comprova tal testemunha que os caminhos públicos que ligavam a tal moleiro estavam com bordas ou taludes que não permitiam saltar, ou seja, não existia qualquer caminho, senão um atravessadouro até tal moleiro.

    Por outro lado, e sem prescindir, 23.- A referida testemunha comprova que o caminho era utilizado apenas a pé, para aceder aos moleiros, e que não passavam no mesmo animais ou veículos, senão tratores para ir roçar o mato dos terrenos 24.- A testemunha F. S., Presidente da Junta, confirmou que não existia qualquer sentido em prosseguir qualquer caminho pelo prédio dos Recorrentes, para aceder aos moleiros, pois que teria que regressar-se para trás e por isso percorrer várias centenas de metros.

  20. - E essa é a mesma testemunha que no seu depoimento refere que o moleiro prosseguia de camioneta até chegar ao moinho, acrescentando que só fez esse trajeto a pé algumas vezes e para aceder ao rio (sendo que ouviu dizer do ex-presidente da junta que ali tinha passado de carro) 26.- Essa testemunha, F. S., confirma que esse putativo caminho é da freguesia (e não do município Réu).

  21. - A testemunha F. S., presidente da Junta, declarou ter estado emigrado durante 13/14 anos e ter presenciado o alargamento do caminho da parte de cima para poder erigir-se a casa dos Autores, porque não havia largura para passarem os carros, o que denota claramente o contrário daquilo que foram as suas anteriores declarações com as quais o mesmo pretendia iludir o Tribunal que ali passaram sempre carros e ele próprio.

  22. - Também a testemunha M. B. atestou que tal “caminho”, que atravessaria o prédio dos Recorrentes, só tinha utilização pelos pescadores para irem caçar trutas ao rio.

  23. - De...

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