Acórdão nº 412/18.3T8MDL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 02 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelJOSÉ CRAVO
Data da Resolução02 de Maio de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães *1 – RELATÓRIO X Investimento, S.A.

, anteriormente designado por Banco ..., S.A., Instituição de crédito, com sede na Rua …, Porto requereu a insolvência(1) de M. S.

, solteira, maior, residente na Rua …, em Mirandela, sustentando, em suma, que a requerida se encontra impossibilitada de cumprir as suas obrigações, dando conta da existência de outros processos executivos e da insuficiência do único imóvel por ela detido (melhor identificado em 5º da p.i.) para satisfazer o respectivo passivo.

A requerida opôs-se, sustentando, em suma, a sua solvência, explicitando as razões do incumprimento, questionando o montante que a requerente afirma estar em dívida, afirmando ter celebrado planos prestacionais com os demais credores que vem cumprindo pontualmente e alegando que o seu activo é superior ao passivo (sendo que o imóvel já não é uma parcela de terreno para construção, outrossim, integra moradia com o valor aproximado de € 200.000,00), encontrando-se a requerida e o seu companheiro presentemente empregados e a granjear um rendimento mensal nunca inferior a € 1.200,00.

Realizou-se a audiência de julgamento, com produção de prova, tendo sido observadas todas as formalidades legais.

No final, foi proferida sentença, declarando-se a acção improcedente por não provada.

* Inconformado com essa decisão, o requerente interpôs recurso de apelação contra a mesma, cujas alegações finalizou com a apresentação das seguintes conclusões: A.

Por notificação elaborada a 27.02.2019, foi a ora Recorrente notificada da Sentença proferida nos autos supra identificados, nos seguintes termos: “Por tudo o exposto, (…) julgo a presente ação improcedente, por não provada, e, em consequência, não decreto a insolvência da requerida.”.

B.

Como fundamento de tal decisão é referido pelo tribunal a quo que a Recorrida é proprietária de um bem imóvel avaliado em € 193.550,00, e que aufere um vencimento mensal nunca inferior a € 600,00 como feirante, considerando, a final, que a mesma “não se encontra impossibilitada de cumprir as suas obrigações vencidas, pois tem património suficiente para o fazer.” C.

Não concordando com a decisão proferida na aludida Sentença, a Recorrente vem dela interpor recurso, pois no seu entender, não foi devidamente apreciada a prova produzida, nem os pressupostos da Insolvência.

D.

Parece igualmente desajustada a visão que é preconizada pelo Tribunal a quo acerca de quem recai o ónus de provar a efetiva situação de insolvência.

E.

A final, entende a ora Recorrente que o Tribunal a quo não levou a cabo uma apreciação acertada dos elementos constantes nos autos.

F.

Do teor da Sentença proferida nos autos supra identificados, resulta que: “(…) a Requerida é feirante, auferindo a quantia mensal nunca inferior a € 600,00, sendo que o seu companheiro, que quando em Portugal, exerce a mesma atividade e com idêntico proveito, fazendo, ainda, campanhas em França de, pelo menos, 5 meses por ano, em que aufere um rendimento mensal líquido nunca inferior a € 1.200,00. (…)” G.

Nos termos da mesma, veio o douto Tribunal a quo considerar que “Ora, desde já se diga que perante esta factualidade resulta que o ativo da requerida é muito superior ao seu passivo. (…)” H.

Não pode a ora Recorrente perfilhar de tal decisão.

I.

Em momento algum, nos presentes autos, a Recorrida juntou aos autos um único recibo de vencimento, que prove que aufere, através da sua atividade, um vencimento líquido, certo e regular, ou até mesmo a declaração de rendimentos.

J.

O único facto que resultou da prova produzida é que a Recorrida é feirante.

K.

Auferindo, no âmbito da atividade que exerce, um vencimento irregular e imprevisível, variando consoante o número de feiras que a mesma faça por mês, bem como do número de vendas que faça em cada feira a que assiste.

L.

A prova de rendimentos e capacidade económica da Recorrida não se pode bastar com a prova testemunhal produzida, prova esta com interesse direto na causa, uma vez que a testemunha G. M. é fiador do contrato incumprido perante a Recorrente.

M.

Não pretendendo a Recorrente colocar em causa o princípio da livre apreciação da prova observado pelo tribunal a quo, a verdade é que o mesmo se bastou com prova testemunhal pela prova de factos que são facilmente comprovados por prova documental.

N.

Na própria prática jurídica é a esse meio de prova que as partes em juízo normalmente recorrem para provar rendimentos auferidos, por via da junção da Declaração Anual de Rendimentos, pelo que não se compreende que neste caso em concreto o tribunal a quo tenha dado como provados tais factos, sem recurso aos mesmos.

O.

A final, não resulta provada da prova produzida nos presentes autos, a liquidez da Recorrida para cumprir com as suas obrigações vencidas, quando era ónus da própria provar que não preenche os pressupostos da Insolvência e juntar documentos nos termos do artigo 24.º, n.º 1, alínea c) do CIRE e artigo 342.º do CC.

P.

A Recorrente pediu a Insolvência da Recorrida, e apenas desta, pelo que não se entende a valoração e apreciação de rendimentos igualmente não provados do companheiro da Recorrida.

Q.

Os presentes autos têm como finalidade julgar a situação de insolvência, tão somente, da Recorrida M. S.

, pessoa singular, com estado civil de solteira.

R.

A Recorrente considera não poder ter qualquer pertinência para a causa decidendi qualquer referência à liquidez do companheiro da Recorrida, quando o mesmo não faz parte do seu agregado familiar.

S.

Entende, ainda, o Tribunal a quo que a Recorrida “apesar de se encontrar numa situação de incumprimento para com a Requerente, o seu património imobiliário é suficiente para pagamento dessas obrigações.”.

T.

Proferindo ainda, em jeito conclusivo que: “Com efeito, de tudo o exposto resulta claro que a requerida não se encontra impossibilitada de cumprir as suas obrigações vencidas, pois tem património suficiente para o fazer.”.

U.

Tal não corresponde à verdade dos factos.

V.

Não é o facto de a Recorrida ser detentora de um bem de elevado valor patrimonial que a torna viabilizada para cumprir com as suas obrigações.

W.

Razão pela qual, considera a ora Recorrente, que o douto tribunal a quo aplicou erradamente o direito, ajuizando a liquidez da Recorrida com referência a um único bem que a mesma detém na sua esfera patrimonial.

X.

Ainda que, de facto, tal bem exista na esfera patrimonial daquela, e esteja, de facto, avaliado num valor elevado – e superior ao valor da quantia em dívida da Recorrida à Recorrente – não significa que a Recorrida seja capaz de cumprir pontualmente com as obrigações a que está adstrita.

Y.

Tal factualidade não é relevante para efeitos de apreciação da liquidez da pessoa em causa.

Z.

O que está em causa para efeitos de qualificação de Insolvência de alguém é o seu ativo líquido disponível face ao seu passivo.

AA.

Neste sentido, preceitua o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 24.01.2006, com o n.º 05A3958 (2), ao referir o que “É considerada em situação de insolvência a empresa que se encontre impossibilitada de cumprir pontualmente as suas obrigações, em virtude de o seu ativo disponível ser insuficiente para satisfazer o seu passivo exigível (…)”, referindo ainda que “O que verdadeiramente caracteriza a insolvência é a insuficiência do ativo líquido face ao passivo exigível.

”, bem como que “O devedor pode ser titular de bens livres e disponíveis de valor superior ao ativo, e mesmo assim, estar insolvente por esse ativo não ser líquido e o devedor não conseguir com ele cumprir pontualmente as suas obrigações.

”.

(negrito e sublinhado nossos) BB.

Ora, tal factualidade é a que se verifica precisamente in casu.

CC.

Pois que se a Recorrida tivesse capacidade e liquidez para cumprir as suas obrigações, não estaria em incumprimento para com a...

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