Acórdão nº 4912/17.4T8VNF-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Dezembro de 2019
Magistrado Responsável | MARGARIDA ALMEIDA FERNANDES |
Data da Resolução | 17 de Dezembro de 2019 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I – Relatório CP. – Embalagem Têxtil, Lda.
, com sede na Rua …, Barcelos, instaurou, em 18/07/2017, acção especial requerendo a sua declaração de insolvência.
*Foi proferida sentença a 20/07/2017, transitada em julgado, a declarar a insolvência da sociedade Requerente. Foi nomeado Administrador da Insolvência o Dr. M. P.. Aí se fez constar: “Não havendo elementos que justifiquem a abertura do incidente de qualificação da insolvência, por ora, não o declaro aberto (cfr. Artigo 36º, nº 1, alínea i), do CIRE)”.
Em 21/07/2017 foi notificada a devedora para entregar ao A.I. os documentos previstos no art. 24º nº 1 do C.I.R.E..
*Em 01/09/2017 o Sr. A.I. apresentou relatório a que alude o art. 155º do C.I.R.E.. Aí fez constar designadamente o seguinte: “A insolvente não apresentou a declaração a que se refere o artigo 24.º, n.º 1, alínea c), do CIRE.” e “A análise incide sobre os exercícios de 2014, 2015 e 2016. Existe suporte informático da contabilidade, que se encontra em equipamento informático nas instalações do Técnico Oficial de Contas (TOC) que procedeu à elaboração da contabilidade.”.
Em 11/09/2017 procedeu-se a assembleia de credores e de apreciação do relatório.
Nesta foi ordenada a notificação do A.I. para esclarecer as condições de venda de um veículo automóvel que foi propriedade da Requerente, o seu previsível valor na data da venda, se seria de ponderar a resolução do dito negócio em função de tal valor e o valor dos bens móveis inventariados.
*O Sr. A.I. pronunciou-se dizendo que, em 04/07/2017, a insolvente terá vendido a L. C., um veículo automóvel da marca Citroen, modelo Jumpy, com a matrícula VH. Referiu que, em 02/08/2017, enviou uma carta registada à gerente da insolvente, C. S., notificando-a, entre outras coisas, para lhe fornecer os elementos constantes do art. 24º do C.I.R.E. e para lhe remeter informação sobre o valor da venda do referido veículo, o destino desse valor e ainda os documentos contabilísticos inerentes, sendo que esta, apesar de ter recebido a carta em 04/08/2017, nunca respondeu, nem entrou em contacto consigo pelo que desconhece alguns elementos essenciais da venda do veículo. Mais refere tratar-se de um automóvel do ano de 2002.
*Por despacho de 11/12/2017, em face dos factos relatados pelo A.I. quanto à falta de colaboração da gerente da insolvente, foi declarado aberto o incidente de qualificação da insolvência.
*Neste apenso o A.I. juntou parecer de qualificação de insolvência pronunciando-se no sentido da mesma ser qualificada como culposa nos termos do art. 186º nº 2 i), nº 3 a) e 189º nº 2 a) do C.I.R.E. uma vez que a insolvente violou o dever de colaboração e de se apresentar à insolvência, devendo C. S., única sócia, ser afectada pela mesma.
O Tribunal ordenou a junção aos autos de vários documentos sugeridos pelo Ministério Público, bem como solicitou esclarecimentos ao Sr. A.I..
O A.I. prestou os esclarecimentos referindo designadamente que o veículo, na data da venda, teria o valor de € 1.500,00/2.000,00. E juntou os documentos solicitados.
O Ministério Público emitiu parecer no sentido da insolvência dever ser considerada culposa, nos termos do artº 186º, nº 1, nº 2, a), d) i), h) e nº 3, al. b) do C.I.R.E.; dever ser afectada pela qualificação C. S., sua gerente de facto e de direito; bem como decretadas as demais sanções previstas nas al. b) a e) do art. 189º nº 2 do mesmo diploma.
Foi ordenado o cumprimento do disposto no art. 188º, nº 6 do C.I.R.E..
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S. deduziu oposição dizendo nunca ter actuado com prejuízo para os credores; negou ter incumprido o dever de apresentação à insolvência uma vez que entre a consciencialização do estado de insolvência em Março de 2017 e a apresentação decorreram apenas quatro meses; apenas não respondeu a uma carta do A.I. por descuido pelo que não se pode falar em incumprimento de forma reiterada; e foram elaboradas contas anuais até ao ano de 2017. Termina pedindo a qualificação da insolvência como fortuita.
*Foi proferido despacho saneador que fixou o objecto do litígio, enunciou os temas da prova, admitiu os requerimentos probatórios e designou dia para audiência de julgamento.
*Procedeu-se a audiência de julgamento.
*Em 29/04/2019 foi proferida sentença cuja parte decisória reproduzimos: “Pelo exposto: a) qualifico como culposa a insolvência de CP. – Embalagem Têxtil, Ldª, declarando afectada pela mesma C. S.; b) fixo em 5 anos o período da sua inibição para o exercício do comércio, ocupação de cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de actividade económica, empresa pública ou cooperativa e em igual período a inibição do requerido para administrar patrimónios de terceiros; c) determino a perda de quaisquer créditos sobre a insolvência ou sobre a massa insolvente detidos por C. S. e condeno-a na restituição dos bens ou direitos já recebidos em pagamento desses créditos; d) condeno, ainda, a requerida C. S. a pagar aos credores o montante correspondente ao total dos créditos reconhecidos na lista apresentada pelo senhor Administrador da Insolvência nos termos do art. 129º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
(…)”*Não se conformando com esta sentença vieram a insolvente e C. S. dela interpor recurso de apelação, apresentando alegações e formulando as seguintes conclusões: “A. Ora, com o devido respeito, o entendimento sufragado na Sentença recorrida merece ser censurado, pois, além de injusta, decidiu em sentido contrário à prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento.
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Da audição dos depoimentos prestado por TODAS AS TESTEMUNHAS, de TODAS AS PARTES, e da prova DOCUMENTAL, é lícito concluir que foram erradamente apreciados e valorados, pelo que ocorre notório erro de julgamento.
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No presente Recurso, as Recorrentes, aqui insolvente e afectada, designadamente almejam impugnar os seguintes pontos de facto: pontos D, E, G..
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Do facto dado como não provado no ponto D. e E. da Fundamentação de Facto, constante da Sentença, ora objecto de recurso: Mediante a prova produzida em sede de audiência final, pelas declarações da sócia gerente, é pela mesma referido que não conseguiu levantar a carta nos correios porque a empresa estava encerrada, e os funcionários dos CTT não permitiram o levantamento.
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Assim, face à prova produzida em sede de discussão e julgamento, o Tribunal a quo deveria ter JULGADO COMO NÃO PROVADO, os pontos D. e E. dos factos dados como provados.
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Do facto dado como não provado no ponto G. da Fundamentação de Facto, constante da Sentença, ora objecto de recurso: a afectada Afirma que vendeu o veículo automóvel para tentar equilibrar as contas da empresa. Vendeu o mesmo veículo, pela quantia de € 700,00 (setecentos euros), para pagamento de despesas, como água, electricidade, entre outras. Mais acrescenta que apenas apresentou a empresa à insolvência em Maio de 2017, pois se encontrava a tentar “segurar a empresa, porém, não conseguiu. A gerente ficou debilitada com a doença do marido.
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- Assim, face à prova produzida em sede de discussão e julgamento, o Tribunal a quo deveria ter JULGADO COMO NÃO PROVADO, o ponto G. dos factos dados como provados.
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Consta no disposto enunciado no art. 186º, nº 2, al. i) do CIRE, que: “Considera-se sempre culposa a insolvência do devedor que não seja uma pessoa singular quando os seus administradores, de direito ou de facto, tenham:(…) - Incumprido, de forma reiterada, os seus deveres de apresentação e de colaboração até à data da elaboração do parecer referido no nº 2 do artigo 188º.
I. Contudo, o Ex.mo Sr. Administrador de Insolvência, apenas e tão-só endereçou uma missiva à gerente da insolvente. Pelo que, até à presente data, nada mais requereu a colaboração da gerente da insolvente.
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Por outra banda, a sócia gerente da insolvente, NÃO INCUMPRIU DE FORMA REITERADA, o seu dever de colaboração. Aliás, um possível incumprimento de colaboração nos presentes autos, apenas sucedeu por uma única vez, não se consubstanciado numa prática reiterada.
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Pelo que, que a gerente da insolvente não incumpriu o dever de colaboração – art. 186’º, nº 3, al. a) do CIRE.
L. A matéria de facto dada como provada na sentença é insuficiente para a qualificação da insolvência como culposa nos termos do disposto na alínea i) do n.º 2 do art.º 186º do CIRE.
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Dos factos dados como provados – nomeadamente nos pontos D. e E., - não se entende como se pode inferir que houve da parte da insolvente ou da sua gerente uma REITERADA violação do dever de colaboração com o AI, preenchendo-se assim a alínea i) do n.º 2 do art.º 186º do CIRE, quando o AI apenas enviou uma carta ao gerente, nada mais, ou qualquer outra diligência tenha feito.
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A recusa de prestação de informações ou de colaboração é livremente apreciada pelo juiz, nomeadamente para efeitos da qualificação da insolvência; quando este comportamento é reiterado a insolvência é sempre qualificada como culposa, nos termos do disposto na alínea i) do n.º 2 do art.º 186º. Violou o Tribunal os arts. 186º.
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A data da consciencialização do estado de insolvência (Março de 2017) e a sua apresentação à insolvência em juízo (Julho de 2017), decorreram apenas quatro meses. Pelo que, entendem as Opoentes que a insolvente não incumpriu o dever de requerer a sua declaração de insolvência – art. 188º, nº 2, al. i) e 3 do CIRE.
SEM PREJUÍZO, CASO ASSIM NÃO SE ENTENDA: DA DESPROPORCIONALIDADE DO QUANTUM INDEMNIZATÓRIO.
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Pelo Tribunal a quo, foi Decidido o seguinte:“d) condeno, ainda, a requerida C. S. a pagar aos credores o montante correspondente ao total dos créditos reconhecidos na lista apresentada pelo senhor Administrador da Insolvência nos termos do art. 129º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas”.
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Cumpre referenciar que, o montante de créditos reconhecidos, sendo proferida douta Sentença, já transitada em julgado, sob o apenso A do presente processo, cifra-se em € 42.479,41 (quarenta e dois...
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