Acórdão nº 52/18.7T8CHV–A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Setembro de 2019

Magistrado ResponsávelALEXANDRA ROLIM MENDES
Data da Resolução19 de Setembro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães Relatório: Por apenso aos autos de execução comum n.º 52/18.7T8CHV, veio a Executada M. C., intentar contra os Exequentes O. C. e F. F. a presente oposição à execução.

Para tanto, alega, em síntese: - a nulidade do negócio (simulação e falta de forma); - a nulidade da hipoteca (simulação); - a inexistência da dívida, o que determinará a extinção da execução.

Alega que no dia 24 de janeiro de 2002, os Exequentes e os devedores A. B. e B. A., assinaram três documentos: - uma escritura pública de compra e venda; - uma escritura pública de confissão de dívida e de hipoteca (aqui título executivo); - um documento particular, que designaram por contrato promessa de permuta e reconhecimento de dívida, sendo que nos termos do primeiro documento, os Exequentes venderam à sociedade X, Construções, Lda., representada por A. B. (seu sócio e gerente), o prédio urbano sito no lugar de ..., freguesia de ..., concelho de Chaves, inscrito na matriz predial respetiva sob o artigo ..., pelo preço de € 99.759,58; nos termos do segundo documento, A. B. e B. A. confessaram-se devedores aos Exequentes da quantia de € 199.519,15, por tal quantia lhes ter sido emprestada em várias parcelas, tendo ainda constituído hipoteca voluntária sobre o prédio urbano sito na Estrada de ..., freguesia de ..., concelho de Chaves, composto de casa de habitação de rés-do-chão e primeiro andar, inscrito na matriz predial respetiva sob o artigo ... e descrito na Conservatória do Registo Predial de Chaves com o número ..., sendo este o prédio de que a Executada/Embargante é proprietária.

Nos termos do terceiro documento, A. B. e B. A. confessaram-se devedores da quantia de € 326.213,82 e comprometeram-se a entregar aos Exequentes quatro frações a construir sobre o imóvel que lhes haviam adquirido nesse mesmo dia, através do primeiro documento.

Mais alega que, como se percebe dos três documentos assinados pelas partes naquele 24 de janeiro, existe um negócio que de facto as partes quiseram celebrar (o “negócio real”), que consiste numa permuta de imóveis, em que os Exequentes procederiam à entrega do imóvel que consta da escritura de compra e venda e A. B. e B. A. entregariam quatro frações a construir naquele imóvel, valorizando ambas as prestações em € 326.213,82, sendo este o negócio que, de facto, se veio a realizar, e correspondendo apenas esta transação à vontade real das partes, é através deste que devemos analisar a validade dos três documentos assinados.

Realça que, quanto ao primeiro documento, percebe-se que o mesmo é um negócio simulado, na medida em que as partes, por acordo, declararam uma vontade distinta da sua vontade real, com o intuito de enganar terceiros (a Administração Tributária, desde logo em resultado da simulação de preço), sendo simulado quanto ao objeto, na medida em que não se tratava de uma compra e venda, mas sim de uma permuta, é simulado quanto ao preço, uma vez que não era aquele o o valor atribuído ao bem, e uma vez que o mesmo não foi, nem era suposto, ser pago em dinheiro, sendo por isso nula a dita escritura de compra e venda que constitui o primeiro documento.

Alega também que, relativamente ao negócio real ou dissimulado, tratando-se de uma permuta de bens imóveis, é um negócio formal, que, à data da sua celebração, apenas seria válido se fosse realizado por escritura pública, nos termos do artigo 875.º do CC, o que não foi feito pelo que, não respeitando o negócio dissimulado a forma legalmente prescrita, resta então concluir que também este é nulo, nos termos do artigo 241.º, n.º 2 do CC.

Por outro lado, alega também que a hipoteca é um negócio simulado, na medida em que a vontade declarada pelas partes não tem correspondência com a sua vontade real pois é falso que os Exequentes tivessem emprestado qualquer montante aos devedores A. B. e B. A., conforme aí declararam.

Também diz que é evidente a falsidade dessas declarações, que os Exequentes vieram inicialmente tentar cobrar a mesma dívida exequenda com base no documento que suporta o negócio real de permuta e não na confissão de dívida, nunca se tendo baseado no empréstimo de quaisquer montantes, conforme requerimento executivo no Processo n.º 425/13.1TBCHV que correu neste Juízo de Execução.

Refere ainda que o negócio dissimulado era, ainda assim, o da constituição de uma hipoteca para garantia de uma obrigação dos devedores, todavia, sendo o negócio dissimulado da permuta nulo, por falta de forma, como referido anteriormente, também o negócio dissimulado da hipoteca padece de nulidade, na medida em que não tem subjacente qualquer dívida real ou válida, ou seja, se é nulo o negócio dissimulado de permuta, são consequentemente nulas as obrigações que daí resultavam para as partes e, se são nulas tais obrigações, não podem de qualquer forma ser garantidas sendo, por isso, nula a hipoteca registada sobre o imóvel de que é proprietária a Executada, ora Embargante.

Mais alega que, quando a Executada, ora Embargante, adquiriu o imóvel hipotecado aos Executados A. B. e B. A., estes apenas eram devedores da quantia de € 20.000,00 pelo que, tendo os Exequentes recebido as frações acordadas, nenhum valor lhes é devido pois ficaram com um apartamento T3 em seu nome e tendo vendido as demais frações (dois apartamentos T3 e uma loja) diretamente a terceiros sem passar pela sua titularidade e, apesar de não surgirem nessas escrituras como os vendedores, a verdade é que eram, na realidade, os vendedores e receberam o respetivo preço.

Invoca ainda a prescrição dos juros anteriores a cinco anos contados da citação nestes autos, que foi notificada à Executada, ora Embargante, no dia 11 de junho de 2018.

Por último, requer a condenação dos Exequentes como litigantes de má-fé por estes alterarem a verdade dos fatos e omitirem fatos relevantes para a decisão da causa, o que fazem de forma dolosa, designadamente porque omitem a existência dos três documentos que na mesma data assinaram; quando dizem que a dívida é proveniente de um empréstimo aos devedores e quando se assumem como credores de quantia tão avultada pelo que devem indemnizar a Executada, ora Embargante, no reembolso de todas as suas despesas e prejuízos, incluindo os honorários com o mandatário, que se avaliam em € 2.000,00 (dois mil euros), bem como devem ser condenados na respetiva multa.

Conclui pela procedência dos embargos declarando-se nulos todos os negócios supra identificados, bem como a constituição da hipoteca e ordenando-se o seu cancelamento mas, caso assim se não entenda, deverá ser declarada a inexistência da dívida exequenda e a prescrição dos juros de mora. Requer ainda que os Exequentes sejam condenados como litigantes de má-fé no pagamento de uma multa e no reembolso à Executada, ora Embargante, de todas as suas despesas e prejuízos, incluindo os honorários com o mandatário que se avaliam em € 2.000,00.

*Após admissão liminar da oposição foi a exequente notificada, tendo apresentado contestação, alegando em síntese que em Janeiro de 2002 os aqui embargados transmitiram à sociedade X, Construções, Ldª um imóvel destinado a construção, pelo preço convencionado de € 326.213,82, que à data não receberam, tendo ficado de o receber por via da entrega de frações prediais do mesmo valor até à data limite de 30 de Junho de 2004 e, para garantia parcial do cumprimento desta obrigação de pagamento, os representantes legais da sociedade compradora reconheceram-se pessoalmente responsáveis pelo pagamento da quantia de € 199.519,16, tendo constituído hipoteca voluntária sobre imóvel para garantia desse pagamento, tudo nos termos do título dado à execução, inexistindo, por isso, qualquer nulidade tal qual vem invocado pela embargante, existindo, quando muito, uma simulação relativa quanto ao preço, que não afeta a validade do negócio real, correspondente ao acordo de vontades das partes.

Mais alegam que, o crédito dos embargados não se encontra extinto por pagamento (seja por entrega das frações prediais acordadas, seja por pagamento pecuniário do valor respetivo).

Dizem também que, no dia 25 de Janeiro de 2006, a sociedade compradora X, Construções, Ldª, que, entretanto, alterou a sua denominação social para X, Construções, Lda, transmitiu para os embargados, pelo preço de € 83.560,00, o direito de propriedade sobre fração destinada a habitação, do tipo T3, sita no 3º andar esquerdo do prédio urbano edificado no lote de terreno para construção que havia sido vendido pelos embargados e, com esta transmissão, a sociedade compradora cumpriu parcialmente o acordo constante do documento junto à petição de embargos sob o nº 3, transmitindo para os embargados uma das quatro frações prediais a que se havia obrigado, sendo certo que, contra a transmissão, os ora embargados devolveram aos representantes legais da sociedade compradora o cheque-caução no valor de € 126.694,67 que destes haviam recebido em 24 de Janeiro de 2002.

Também referem que os ora embargados destinaram a fração predial que assim lhes foi transmitida ao mercado do arrendamento, tendo, entretanto, efetuado a sua revenda a terceiro, acrescentando que, porquanto os embargados pretendiam destinar as restantes frações prediais a receber nos termos do acordo celebrado à sua revenda imediata, anuíram em permitir que a sociedade construtora fosse vendendo diretamente a terceiros as frações prediais construídas, entregando aos embargados o remanescente em dívida à medida da concretização dessas vendas.

Mais dizem que, em 03 de Fevereiro de 2006 a sociedade construtora entregou aos ora embargantes cheque do montante de € 12.500,00, sacado sobre conta titulada por M. G., cheque esse que, apresentado a pagamento no dia útil seguinte, obteve boa cobrança, sendo que, em 19 de Abril de 2006 a sociedade construtora entregou aos ora embargantes novo cheque sacado sobre conta titulada por M. G., no montante de € 50.000,00, o qual, apresentado a pagamento no dia seguinte, obteve boa cobrança, sendo certo...

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