Acórdão nº 97/19.0T8VNC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Setembro de 2019

Magistrado ResponsávelALCIDES RODRIGUES
Data da Resolução19 de Setembro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório M .G. (Estabelecimento Comercial X), instaurou contra M. C. (Estabelecimento Comercial A) procedimento cautelar comum, peticionando: - A condenação da Requerida a retirar todas as cadeiras, mesas e guarda-sóis e outros equipamentos que coloca em frente da fachada virada a norte do estabelecimento da Requerente; - A condenação da Requerida a retirar todas as mesas, cadeiras e guarda-sóis que coloca em frente das portas principais do estabelecimento da Requerente, o que permitirá o livre e incondicional acesso de pessoas e bens ao estabelecimento “X”; - A condenação da Requerida a abster-se de todos os comportamentos que de alguma forma colidam com o exercício normal da atividade económica da Requerente, nomeadamente seja aquela impedida de “arrumar” todo o mobiliário da esplanada encostado à fachada do “X”.

- A condenação da Requerida, nos termos do n.º 2 do artigo 365º do CPC, no pagamento de uma multa e indemnização a título de sanção pecuniária compulsória, adequada a assegurar a efetividade da providência decretada; Para tanto alegou, em resumo, que é proprietária de um estabelecimento comercial denominado “X”, destinado a comércio e serviços, estabelecimento esse que possui quatro portas, duas viradas a poente e outras duas viradas a norte, sendo que estas últimas são as portas principais do estabelecimento, uma vez que deitam diretamente para a zona mais ampla do Largo ....

A Requerida, proprietária do estabelecimento “vizinho” ao da Requerente, denominado “A”, dispõe a “sua” esplanada ocupando todo o espaço em frente e ao longo de toda a fachada virada a norte do estabelecimento “X”, colocando mesas e cadeiras “coladas” à fachada do estabelecimento da Requerente, chegando mesmo ao ponto de colocar algumas dessas mesas e respetivas cadeiras em frente às portas do “X”, facto este que impede o acesso ao interior do estabelecimento da requerente.

As mesas, cadeiras, guarda-sóis e respetivas estruturas, pertencentes ao estabelecimento “A”, são, por vezes, amontoados, colocados e “arrumados” de forma a que, também por esta via, o acesso de pessoas e bens, ao estabelecimento ”X”, através das suas principais portas seja estorvado e, por vezes, até mesmo impedido.

Os comportamentos da Requerida supra descritos e na circunstância de tempo em que ocorreram e ocorrem já causaram, ainda hoje causam e causarão no futuro, vultuosos prejuízos económicos e financeiros à atividade económica desenvolvida no estabelecimento da Requerente, bem assim como muito perturbaram, hoje são causa de transtornos emocionais da Requerente, e, ainda, dos maiores temores relativamente ao futuro, causando-lhe grande angústia e sofrimento com implicações na qualidade de vida, da Requerente, nomeadamente no seu relacionamento familiar, situação com tendência para se agravar com o decorrer do tempo e a manutenção da situação descrita.

*Citada, a requerida M. C. deduziu oposição, invocando a exceção de incompetência absoluta dos tribunais judiciais para apreciarem a providência ou, assim não se entendendo, concluindo pelo não decretamento da providência (cfr. fls. 28 a 34).

Alegou, em síntese, que a sua esplanada está devidamente licenciada e que a requerente não está impedida de realizar o seu negócio, na medida em que o acesso ao seu estabelecimento pode ser efetuado pelas duas portas viradas a poente.

*Realizada a produção de prova, o Tribunal “a quo” julgou improcedente a providência cautelar requerida e, em consequência, não decretou a mesma (cfr. fls. 57 a 66).

*Inconformada com esta decisão, a requerente dela interpôs recurso e, a terminar as respectivas alegações, formulou as seguintes conclusões (cfr. fls. 67 a 78): «Primeira conclusão O presente recurso é interposto da aliás douta sentença que, naqueles precisos termos, “(...) julgo improcedente por não provada a presente providência cautelar e em consequência não decreto a mesma”, e versa sobre matéria de facto e de direito.

Segunda Conclusão Na sentença em análise, considerou o MMº. Juiz a quo “(...) com relevância para a decisão da causa, não está indiciariamente provado que:

  1. O impedimento de entrada pelas portas viradas a norte causa prejuízos à requerente.

    b) E perturba emocionalmente a Requerente, causando-lhe grande angústia e sofrimento com implicações na qualidade de vida, da Requerente, nomeadamente no seu relacionamento familiar. (…)” Terceira Conclusão Em conformidade com o teor dos depoimentos supra transcritos, as conclusões do MMº. Juiz a quo, constantes das referidas alíneas a) e b) dos factos não provados, não se encontram sustentadas.

    Quarta Conclusão Ao invés, e no que à prova exigida em sede de providência cautelar diz respeito, e tendo em conta os critérios definidos, e as exigências da lei quanto à prova a produzir nestes processos, tudo conjugado com a regra da experiência comum, sempre deveria, o MMº. Juiz ter concluído que: c) O impedimento da entrada pelas portas viradas a norte causa prejuízos à requerente; d) E perturba emocionalmente a requerente causando grande angústia e sofrimento.

    Quinta Conclusão Por ser essa a decisão que se impunha em resultado da prova produzida em audiência de julgamento, nomeadamente os depoimentos das testemunhas, que para efeito da sua valoração, foram atendidos pelo MMº. Juiz porque possuíam “conhecimentos, objetivos e convincentes sobre a referida matéria controvertida”(artigo 640º do CPC n.º 1 al. c)) Sexta Conclusão Sem prescindir e ainda no âmbito do julgamento da matéria de facto, São suficientes os factos dados como provados e que constam da fundamentação na matéria dada como provada pelo MMº. Juiz a quo, nomeadamente os artigos 1º), 2º), 3º), 4º), 6º), 7º), 11º), 12º), 13º), 17º), para se poder concluir pelo preenchimento dos requisitos de que a lei faz depender o decretamento da providência.

    Sétima Conclusão Face à matéria supra dada como provada, estão preenchidos os requisitos de que a lei faz depender o decretamento da providência cautelar, nomeadamente o requisito fumus boni iuris quanto à existência do direito a acautelar e o requisito do periculum in mora.

    Oitava Conclusão Contrariamente ao teor da conclusão ínsita do ponto 14º) da matéria dada como provada pelo MMº. Juiz do processo, os documentos juntos a fls 41v-43 conjugados com o depoimento da testemunha M. A., fiscal da Câmara Municipal de ..., a requerida não possui uma esplanada devidamente licenciada pela Câmara Municipal de ....

    Nona Conclusão Os documentos referidos na conclusão anterior não são aptos a que deles se possa extrair ”A esplanada da requerida está licenciada pela Câmara Municipal de ....” Décima Conclusão Mas tão somente de que a requerida é titular de uma Autorização para ocupação do espaço público que impõe o cumprimento das normas do DL 48/2011 e a mesma não cumpre.

    Décima Primeira Conclusão Em conclusão, com a decisão da matéria de facto, e a respetiva motivação, ora posta em crise, andou mal o MMº. Juiz a quo, extraindo daquele julgamento as consequências para a decisão final do não decretamento da providência, o que não poderia ter feito, tendo incorrido em erro na apreciação da prova.

    Décima Segunda Conclusão O MMº. Juiz a quo, concluiu, em nosso modesto entendimento, erradamente, que no presente no pleito o que está em causa: “(…) São dois direitos que estão no mesmo grau e que dizem respeito ao exercício das atividades económicas que ambas prosseguem. “ Décima Terceira Conclusão Dos factos dados como provados em 11º), 12º) e 13º), deveria o MMº. Juiz ter concluído que o direito da requerente se encontra fortemente diminuído em razão do exercício do mesmo direito, tal como a requerida o materializa.

    Décima Quarta Conclusão Em razão dos factos dados como provados em 11º), 12º) e 13º), deveria o MMº. Juiz a quo ter concluído que a requerida ao adotar tais comportamentos, exerce, relativamente à requerente, concorrência desleal, porquanto, conforme ensina Oliveira Ascensão, Concorrência Desleal, 1994, págs. 91.) “(…) um acto exterior ao exercício da empresa, tendente a outorgar uma posição de vantagem no mercado, contrário às normas e usos honestos, de qualquer ramo de actividade económica, assumindo a natureza de desleal quando seja dotado de virtualidades que lhe permitam operar uma subtracção, efectiva ou potencial, da clientela de outra pessoa. (…)” Décima Quinta Conclusão A decisão proferida padece de falta de fundamentação de direito quanto à matéria alegada pela requerente no que à concorrência desleal diz respeito, nos termos e para os efeitos do artigo 615º n.º 1 al. b) do CPC.

    Décima Quinta Conclusão A aplicação do artigo 61º da CRP, no entendimento adotado pelo MMª., in casu, permite que a requerida viole o direito da requerente constitucionalmente previsto no artigo 62º da CRP, uma vez que impede esta de aceder ao estabelecimento comercial da sua propriedade.

    Décima Sexta Conclusão A requerida não cumpre o estabelecido no DL 48/2011 e respetivos anexos, na sua formulação atual.

    Décima Sexta Conclusão Em razão do teor das conclusões anteriores e dos factos dados como provados nos artigos 1º), 2º), 3º), 4º), 6º), 7º), 11º), 12º), 13º), 17º), mostram-se verificados os requisitos fumus boni iuris e periculum in mora, e como tal, deveria a presente providencia cautelar ter sido decretada.

    Décima Sétima Conclusão Ao não ter sido decretada, nos teremos referidos nas conclusões anteriores, incumpriu o MMº. Juiz a quo os dispositivos dos artigos 58º, 61º, 62º e 99 º da CRP, o DL 48/2011 e ainda os artigos 615º nº1 al. b) e 362º ambos do CPC.

    Nestes termos, e nos mais de direito que V. Exas Senhores Juízes Desembargadores do Respeitável Tribunal da Relação de Guimarães, doutamente suprirão, deve ser revogada a decisão do Tribunal a quo e substituída por outra que decrete a providência cautelar inominada interposta, nos precisos termos em que foi requerida.

    Com o que se fará JUSTIÇA».

    *Contra-alegou a requerida, pugnando pela improcedência do...

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